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Instrução explícita ou implícita: como ensinar as variedades linguísticas?

1 SOCIOLINGUÍSTICA E ENSINO DE LÍNGUAS

1.5 Instrução explícita ou implícita: como ensinar as variedades linguísticas?

Definimos na seção anterior o conceito de competência sociolinguística e mostramos sua relação com a competência comunicativa. Agora, buscaremos refletir sobre qual a melhor maneira de oferecer oportunidades aos aprendizes para desenvolvê-la, ou seja, discutiremos se é melhor que lhes sejam oferecidos exemplos de língua que contenham traços das variedades linguísticas, sem que eles tenham consciência daquilo a que estão sendo expostos, ou se é mais eficiente quando o material didático ou os professores abordam diretamente tais fenômenos.

Rod Ellis, em Implicit and explicit learning, knowledge and instruction (2009), especifica a finalidade da instrução implícita afirmando que:

[...] visa a permitir que os alunos infiram regras sem ter consciência. Isto é, procura fornecer aos alunos a experiência de exemplares específicos de uma regra ou um modelo, enquanto eles não estão se esforçando para aprendê-los. (p. 16)

[[...] is directed at enabling learners to infer rules without awareness. That is, it seeks to provide learners with experience of specific exemplars of a rule or pattern while they are not attempting to learn it].

69 É, portanto, função do ensino implícito fornecer um input que contenha o que o aprendiz deve aprender, sem que lhes sejam dadas explicações.

Ellis (2009, p. 18) reproduz uma tabela de Housen e Pierrard (2006, p. 10) na qual são evidenciadas as diferenças entre as perspectivas de ensino com instrução implícita e explícita que reproduzimos abaixo:

Tabela 15: Diferenças entre instrução implícita e explícita

Instrução implícita Instrução explícita

Atrai a atenção para as formas desejadas Direciona a atenção para as formas desejadas É fornecida espontaneamente

(em atividades orientadas para a comunicação) É predeterminada e planejada (é o foco e o objetivo da atividade do professor) É discreta

(mínima interrupção da comunicação do significado) É invasiva (interrupção da comunicação do significado) Apresenta as formas desejadas em contexto Apresenta as formas desejadas de forma isolada Não faz uso de metalinguagem Usa terminologia metalingüística

Estimula o uso livre das formas desejadas Envolve práticas controladas das formas desejadas

Uma abordagem é em vários pontos o oposto da outra, fazendo com que aqueles que estão envolvidos no ensino de línguas se questionem quanto à maneira mais eficiente de ensinar um determinado conteúdo. Para solucionarem esse impasse, estudiosos têm tentado evidenciar os efeitos dos dois tipos de instrução para o ensino de estruturas gramaticais (LOEWEN, ERLAM, ELLIS, 2009; NARDELI, 2012) e de aspectos pragmáticos (COOK, 2001; TATEYAMA, 2001).

Doughty (1991), focalizando o ensino de orações relativas em inglês, compara o aprendizado de um grupo controle, que não recebeu nenhum tipo de instrução acerca das orações relativas, ao de dois outros grupos: um que recebeu instrução implícita e outro que foi instruído de forma explícita. O pesquisador não nota grandes diferenças entre os dois grupos expostos à instrução, mas chega à conclusão de que os grupos que receberam orientação, seja ela explícita ou implícita, superaram o grupo controle na habilidade em relativizar as orações, mostrando que há diferenças entre aprendizes que recebem instrução e aqueles que não as recebem.

Confirmando os resultados da pesquisa de Doughty, Gauci e Nuzzo (2012) mostram, através de uma revisão bibliográfica das obras publicadas no campo da pragmática, que aprendizes aos quais é oferecido tratamento didático (não é sempre claro se por meio de

70 instrução implícita ou explícita) obtêm resultados melhores em relação aos grupos controle, mesmo que nem todos os elementos ensinados sejam aprendidos com a mesma facilidade.

A partir de uma ótica estrutural, Robert DeKeyser, em seu artigo Implicit and explicit learning (2003), conclui que, se uma estrutura gramatical é muito abstrata ou difícil de ser notada, o processo de ensino explícito parece ser mais adequado, pois faz com que o aprendiz perceba essa forma que, de outro modo, passaria facilmente despercebida. Por outro lado, afirma que, se o elemento a ser ensinado é bastante saliente, a instrução implícita parece ser a mais eficaz.

Já Kasper e Rose (2001), no artigo Pragmatics in language teaching, falam que adultos podem aprender de forma espontânea uma quantidade considerável de elementos pragmáticos em línguas segundas, porque alguns desses conhecimentos são universais e outros porque podem ser satisfatoriamente transferidos da língua materna para a segunda língua.

No mesmo artigo, chamam a atenção para a existência de aprendizes que, embora tenham um amplo conhecimento pragmático em sua língua materna, não conseguem transferir as regras pragmáticas que dominam às situações de uso da língua que estão aprendendo. Assim, os autores sustentam que esse é um campo que requer a intervenção pedagógica, não com o propósito de fornecer novas informações aos aprendizes, mas para conscientizá-los sobre aquilo que já conhecem.

Além deles, Amy Snyder Ohta (2001), que comparou a performance de dois grupos instruídos implicitamente e explicitamente, advoga a favor do ensino explícito, que, segundo a pesquisadora, parece ser mais efetivo do que o implícito para facilitar a aquisição de aspectos pragmáticos da língua aprendida.

Em geral, as pesquisas mencionadas acima ainda não são definitivas em estabelecer o melhor modo de ensinar aspectos gramaticais e pragmáticos, mas sugerem 1. que o tratamento didático é melhor do que a simples exposição ao input; 2. que a instrução explícita traz maiores benefícios do que a implícita, pois faz com que os aprendizes notem, reflitam e usem em exercícios específicos aquilo que estão aprendendo.

Ainda que essas conclusões se refiram ao ensino de aspectos gramaticais e pragmáticos e que não tenhamos identificado pesquisas que abordem o ensino de traços sociolinguísticos, partimos do pressuposto que não é fácil para um aprendiz, qualquer que seja

71 o seu nível de conhecimento da língua, depreender a conotação sociolinguística atribuída às produções linguísticas às quais é exposto e que, portanto, é muito difícil que ele desenvolva competência sociolinguística somente a partir de instrução implícita.

Sendo assim, em concordância com as pesquisas desenvolvidas na área, acreditamos que, para favorecer o desenvolvimento dessa competência, seria desejável que as variedades da língua italiana fossem apresentadas explicitamente por meio de explicações e que fossem propostas atividades de recepção e produção que as contemplassem.

Entretanto, tendo em mente que, como mostram Doughty (1991) e Gauci e Nuzzo (2012), qualquer um dos dois tipos de instrução é mais eficaz que não receber nenhuma, estudamos também se há tratamento de tipo implícito nos manuais, observando se nos diálogos apresentados pelos livros que escolhemos utilizar como corpus de referência são inseridos elementos marcados sociolinguisticamente.

No próximo capítulo, evidenciaremos as escolhas metodológicas realizadas e os procedimentos adotados para que pudéssemos alcançar respostas satisfatórias aos nossos questionamentos de base.

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