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CAPÍTULO II INSTRUMENTOS DE POLÍTICAS PÚBLICAS

2.1. Instrumentos de acção política

Entende-se por “instrumentos de acção política”, o conjunto de meios de acção à disposição do governo para concretizar os objectivos das políticas públicas, mediante o uso combinado de recursos como, entre outros, o direito, a informação, a organização e o consenso (Lascoumes e Galès, 2004; Subirats et al., 2008).

Importa também ter presente que todos estes instrumentos são reveladores e portadores de significados e representações, em função dos quais se organizam as relações sociais específicas entre o poder político e os destinatários das suas acções num determinado domínio (Lascoumes e Le Galès, 2004a). Estes mesmos autores (2004b; 2007) defendem que a escolha e concepção dos instrumentos não são meras questões técnicas, pois há uma dimensão política, ideológica e axiológica nesse processo20, na medida em que esses instrumentos não são neutros: manifestam valores suportados numa interpretação do social e por concepções do(s) modo(s) de regulação. Por esta razão, a tomada de decisões deve ser vista como um processo contínuo de escolhas (Hassenteufel, 2008), não necessariamente expresso em actos formais mas diluído numa soma de pequenas decisões de todos os dias (Halpern, 2004).

Os instrumentos permitem, igualmente, revelar as características do Estado (através do Governo) em acção (Barroso, 2006), evidenciando os sinais característicos das suas posições, em função da escolha do tipo de instrumentos considerado adequado: velhos (legislativo e regulamentar; económico e fiscal) e novos (convencional e incitante; informativo e comunicacional; normas e boas práticas). A título de exemplo, a introdução de instrumentos técnicos parece uma tentativa de despolitizar a acção pública (Lascoumes e Le Galès, 2007) e através deles o Governo procura impor as suas representações e regras de jogo, face às quais os restantes actores se vão posicionar.

20 É por isso que é importante conhecer as ideias que suportam as decisões dos responsáveis quando

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Nesta perspectiva, os instrumentos constituem um tipo particular de instituições (Lascoumes e Le Galès, 2007), no sentido sociológico do termo, que tornam possível a acção pública e que estabilizam os modos de cooperação entre os actores recorrendo à implementação de regras de jogo formais e informais, rotinas, procedimentos, convenções, estratégias, formas de organização, tecnologias, mas também através de crenças, paradigmas, códigos, culturas, conhecimentos que envolvem, sustentam e interpretam ou contradizem rotinas e papeis.

Os tipos de instrumentos políticos disponíveis para governar incluem (Christiansen, 2001; Farah e Masera, 2003; Jörg et al., 2004; Mackay e Shaxton, (s/d)):

• Instrumentos sociais: influenciar as pessoas através da transferência de conhecimento, comunicação e persuasão moral (comportamento é baseado em conhecimentos, crenças e valores). Este é o menos coercivo dos instrumentos. • Instrumentos económicos: o dinheiro é usado como um instrumento directo

para alcançar resultados (i.e.: impostos e subsídios, subvenções, contribuições,

vouchers, etc.)

• Instrumentos reguladores: estabelecem novas regras, normas e leis no sentido de potenciar determinado objectivo, comportamento ou atitude.

• Instrumentos de avaliação e controlo: são todos os indicadores que servem para medir o desempenho dos programas e eficácia das medidas tomadas.

• Acção directa: o fornecimento de um serviço directo para obter um resultado (em vez de trabalhar através de cidadãos ou organizações para atingir as metas). • Não acção: decidir não intervir.

A acção governativa democrática na contemporaneidade enfrenta um conjunto de desafios que acabam por se reflectir no processo holístico que são as Políticas Públicas: globalização, governança e governação multinível; transversalidade (mainstreaming) e complexidade dos problemas; territorialismo e contextualização; abordagem centrada na pessoa; racionalidade, sustentabilidade ou a influência internacional.

Dentro dos instrumentos de acção política que complementam a legislação de comando e controlo tradicional podemos encontrar:

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• Benchmarking: estabelece padrões comparativos para um determinado sector. • Acordos de auto-regulação: permitem uma autonomia considerável dos actores

sectoriais dentro de parâmetros claramente definidos e estabelecidos num quadro legal. Também permitem uma maior flexibilidade e eficiência dentro do sistema, oferecendo os mesmos níveis de protecção por meios mais tradicionais de regulação.

• Códigos de conduta voluntários e acordos negociados: estabelecem normas de conduta específicas de como uma indústria deve lidar com os seus clientes. As empresas concordam voluntariamente em manter esses padrões ao subscreverem o código. Normalmente existem sanções para as empresas que violam o código, que podem incluir: terem de pagar uma multa, serem expulsas da associação da indústria ou terem de anunciar que violaram o código e explicarem o que vão fazer para resolver uma reclamação.

As abordagens de “comando e controlo” são vistas muitas vezes, por sectores não-economistas e autoridades governamentais, como um instrumento eficaz para desencadear processos de transição e forçar mudanças comportamentais específicas ou fazer determinadas opções tecnológicas. A regra principal da intervenção governamental é, neste caso, conceber normas apropriadas e assegurar que as partes reguladas cumpram os padrões de desempenho e/ou que as tecnologias indicadas sejam, de facto, utilizadas. Formular regras, procedimentos e modalidades para que se actue em conformidade é, assim, um objectivo nuclear.

Há, contudo, diversas linhas de crítica e de conflito relativamente ao impacto directo da regulação nos processos de transição e de promoção da inovação.

1. Sendo difícil aos decisores políticos obterem informação precisa sobre funções de custo em diferentes firmas e/ou sectores industriais, os custos do uso de normas podem ser excessivos comparativamente aos resultados atingidos (Hoel, 1998, citado por Oliveira, 2011). Pode revelar-se igualmente difícil a celebração de acordos relativamente à definição dos padrões mais adequados para diferentes aplicações e recursos, assim como a sua monitorização. Por outro

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lado, a desejável melhoria das normas é sempre dificultada pela natureza lenta e descontínua dos processos decisórios da regulação (Watson et al., 1996).

2. Se não houverem incentivos para os actores desenvolverem acções para além das exigências legais, os requerimentos obrigatórios podem acanhar os investimentos em inovação e deste modo imprimir-lhe um fraco rendimento, eficiência e dinâmica (Heaton e Banks, 1999; Kemp, 2000), dando origem a processos de “congelamento” em vez de “estímulo” tecnológico, que depende sempre da percepção das vantagens competitivas por parte dos agentes regulados (Wagner, 2000).

3. A regulação contínua pode aumentar a apreensão relativamente a uma nova tecnologia, produto ou processo, pois pode ser desadequada e dar origem a bloqueios tecnológicos ou trajectórias dependentes. Estes bloqueios podem mostrar-se desfavoráveis à mudança e à adopção de novas práticas, especialmente se ocorrerem durante as fases iniciais de desenvolvimento.

Os incentivos de base de mercado, na generalidade das políticas, têm como objectivo primário ajudar a induzir – mais do que comandar – mudanças comportamentais (e tecnológicas), disponibilizando incentivos financeiros ou similares (subsídios, empréstimos, instrumentos fiscais e financeiros, e as aquisições públicas (public procurement)) para que os agentes regulados melhorem o seu desempenho.

As vantagens destes incentivos não só se justificam em termos da relação custo/benefício, mas também pela sua capacidade em estimular a mudança e a inovação, assim como pela flexibilidade de provisão que apresentam, na medida em que dão liberdade de escolha, os meios e o momento de aceitação para agir em conformidade ao agente regulado.

Assim, baseado no estudo realizado por Jörg et al. (2004), nas secções que se seguem analisaremos com algum detalhe alguns instrumentos de base de mercado segmentados em subsídios, incentivos fiscais, instrumentos financeiros e instrumentos sociais (capacitação e notoriedade).

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