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3 – Instrumentos técnicos de recolha de dados

CAPÍTULO IV – OPÇÕES METODOLÓGICAS E TÉCNICAS

IV. 3 – Instrumentos técnicos de recolha de dados

Entre as várias técnicas de recolha de dados disponíveis, tendo em consideração a estratégia definida para trabalhar a maneira como os Animadores Socioculturais se envolvem nas disputas em torno dos problemas suscitados pela Animação Sociocultural, optou-se pela utilização de um inquérito por questionário contendo, para além de outras, uma área de observação em que os inquiridos, colocados perante vários cenários que encerram dilemas de ordem profissional, expressaram as suas diversas posições (apêndice A);ao mesmo tempo, optou-se por uma entrevista semiestruturada (apêndice

B),em que os entrevistados foram chamados a reflectir sobre várias dimensões das suas experiências de trabalho.

Reconhecendo-se o alcance diferenciado do questionário e da entrevista, considerou-se que, ao serem usados em simultâneo, constituiriam um bom complemento um do outro (Almeida & Pinto, 1980; Ghiglione & Matalon, 1993) e, sendo assim, ajustados à fase empírica da investigação. Enquanto o questionário se ajusta a uma estratégia de natureza predominantemente quantitativa, a entrevista ajusta- se a uma estratégia de natureza qualitativa. Significa que a prática do inquérito – nas suas duas versões – torna possível a captação dos motivos que levam os actores a agir, sendo por isso inconsistente, tal como Ghiglione e Matalon (ibid.) referem, a crítica de que a utilização deste instrumento se inscreveria na tradição “explicativa” da Sociologia que concebe a acção social como susceptível de ser observada exteriormente, ou seja, uma tradição que considera as causas e não os motivos do comportamento.

Na verdade, a utilização da entrevista, colocando os Animadores Socioculturais em situação de serem analistas do passado, do presente e do futuro das suas próprias vidas profissionais, permitiu, através dos seus testemunhos individuais, a obtenção de informações particularmente significativas sobre o modo como percebem as várias problemáticas que afectam a Animação Sociocultural enquanto actividade profissional, elucidando os resultados quantitativos fornecidos pelo questionário nas suas várias vertentes de observação.

Na opção técnica que se tomou, também foi tida em conta a opinião de Ferreira, citada por Silva e Pinto (1986, p. 193), que considera que o

“inquérito continua a ser o único instrumento que permite detectar a presença e a intensidade de certas características e práticas de vastos conjuntos de indivíduos em níveis adequados de eficácia e eficiência (…)” [entendendo que] “(…) é uma das vias de acesso às racionalizações que os sujeitos fazem das suas escolhas e das suas práticas e é o único processo de obtenção de elementos sobre comportamentos passados e presentes que escapam totalmente a outras formas de observação” 137. Ainda de acordo com a opinião da mesma autora (cit. in ibid, p. 193) e de modo a potenciar a eficácia das técnicas de recolha de dados utilizadas, aceitou-se como desejável a “acumulação da qualidade de investigador com a de inquiridor, de modo a

diminuir a cadeia de filtragem entre a resposta e o ‗dado‘ e o aprofundamento da uniformização controlada das decisões que dirigem o processo de produção de dados”.

Preparação, difusão e recolha do questionário:

Na preparação do inquérito por questionário, tendo em conta o propósito da investigação, consideraram-se sete vertentes de observação:

 uma primeira, incluindo questões com vista à caracterização da população inquirida: género, idade, designação do curso frequentado, estabelecimento de ensino onde foi obtida a formação, zona do país onde é exercido o trabalho e nível de escolaridade e de qualificação profissional do pai e da mãe;

 uma segunda, considerando questões relacionadas com o curso de Animação Sociocultural: em que medida o curso prepara para a vida profissional, se há ou não arrependimento em relação à escolha feita e se o curso é ou não recomendável a pessoas próximas;

 uma terceira, composta por questões respeitantes à actividade profissional actual: relação entre o curso e a actividade exercida, tipo de organização onde é exercido o trabalho, classificação profissional, vínculo contratual, nível salarial, relação entre o salário e o trabalho efectuado, acumulação do trabalho actual com outros trabalhos, frequência de acções de formação

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profissional, grau de satisfação em relação a vários aspectos do trabalho actual e a maneira como os familiares e amigos consideram o trabalho de animação;

 uma quarta, sobre o primeiro emprego: tempo de demora a encontrar o primeiro emprego e tipo de vínculo contratual estabelecido;

 uma quinta, sobre as mudanças de emprego: número de vezes em que houve mudança de emprego e avaliação do emprego actual em comparação com empregos anteriores;

 uma sexta, sobre a Animação Sociocultural: garantias dadas a pessoas que estejam a ponderar trabalhar na área da Animação Sociocultural, projecto profissional, associativismo profissional, opinião sobre vários aspectos relacionados com a Animação Sociocultural;

 uma sétima, colocando os inquiridos perante cenários que encerram dilemas de ordem profissional, pô-los a avaliar a sua actividade e a reflectir sobre as posições que assumem em relação a esses cenários, permitindo, desse modo, identificar os dispositivos/gramáticas em que assentam essas mesmas posições.

Ao longo da redacção do questionário, tomaram-se alguns cuidados habituais na construção de instrumentos de recolha de dados desta natureza. Desde logo, que a formulação das perguntas não induzisse a resposta e, ao mesmo tempo, que o seu encadeamento respeitasse uma sequência lógica.

Com a finalidade de aferir da pertinência das perguntas (de modo a adequá-las o mais possível à informação pretendida), bem como de aferir da maneira como estas se encontravam formuladas (com vista a proceder a ajustamentos na linguagem utilizada), procedeu-se a testagem do questionário, tendo o mesmo sido testado por 10 Animadores Socioculturais não incluídos na amostra final e com um nível de experiência acima dos seis anos em organizações de apoio social a crianças e idosos.

A testagem revelou-se útil. Ela permitiu detectar algumas lacunas, tendo sido acrescentadas e retiradas algumas perguntas, assim como corrigidas outras que apresentavam termos pouco claros, que foram substituídos por não serem acessíveis.

Com vista a optimizar a distribuição e a recolha do questionário, tirou-se proveito do Google Drive, tendo-se gerado um link que permitiu, entre os meses de Maio e Julho de 2017, a difusão do questionário por via de pessoas de referência em vários estabelecimentos de ensino superior que ministram cursos de licenciatura, de mestrado e de doutoramento na área da Animação Sociocultural: Universidade de Trás- os-Montes e Alto Douro, Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Coimbra, Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Lisboa, Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Portalegre e, ainda, Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Beja.

Refira-se, ao mesmo tempo, que o contributo dado pela APDASC-Associação

Portuguesa para o Desenvolvimento da Animação Sociocultural se revelou crucial ao

difundir o questionário pelos seus associados.

Foram validados um total de 103 questionários, tendo o recurso ao Google Drive permitido, à medida que as respostas iam surgindo, a sua inserção automática na base de dados SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) e a sua posterior análise estatística.

A avaliação do grau de fidedignidade do questionário apontou para a consistência interna das perguntas que o constituem. Esta avaliação foi efectuada através do coeficiente Alpha de Cronbach que mede a capacidade explicativa de uma determinada variável ou factor pelas perguntas que a compõem. Quando o valor de

Alpha de Cronbach é superior a .70 é lícito afirmar que as variáveis em causa são bem

explicadas pelas perguntas consideradas. A análise foi efectuada para o conjunto das 37 perguntas, obtendo-se um Alpha de Cronbach de .86. Ora, de acordo com Kline (1993, p. 10-11), esta análise deve ser feita com uma amostra “of suficiente size to minimize

statistical error. A minimum sample size would be 100 subjects (…) alfas should never drop below .70”.

Preparação e realização da entrevista:

A opção por uma entrevista semi-estruturada, instrumento que se situa “a meio-

caminho entre um conhecimento completo e anterior da situação por parte do investigador (…) e uma ausência de conhecimento” (Ghiglione & Matalon, 1993, pp.

93-94), teve como propósito, como atrás se disse, a clarificação do sentido lógico que os indivíduos inquiridos encontram para explicar algumas das suas posições assumidas relativamente às várias problemáticas que a Animação Sociocultural encerra, conferindo, assim, maior qualidade aos dados fornecidos pelo questionário.

Nesse sentido, foram efectuadas seis entrevistas na primeira quinzena do mês de Setembro de 2018, cada uma com uma duração média de 30 minutos, tendo a selecção recaído aleatoriamente no conjunto dos 40 inquiridos que manifestaram disponibilidade para serem entrevistados e que, para o efeito, deixaram o seu contacto no fim de terem respondido às várias questões incluídas no questionário. Todas as seis entrevistas decorreram no local de trabalho dos/as entrevistados/as. No final da sexta entrevista, tomou-se a decisão de fechar a amostra por saturação. E uma vez que a saturação é definida como um instrumento epistemológico que determina quando as observações deixam de ser necessárias, pois nenhum novo elemento permite ampliar o número de propriedades do objecto investigado, considerou-se que se atingiu o ponto de saturação, pois nenhum dado adicional possibilitaria acrescentar informações para além das informações já fornecidas pelos seis Animadores entrevistados (Thiry-Cherques, 2009 e Glaser & Strauss,1967).

IV.3 – Em síntese:

Tendo em consideração a estratégia definida para trabalhar a maneira como os Animadores Socioculturais se envolvem nas disputas em torno dos problemas suscitados pela Animação Sociocultural, optou-se pela utilização de um inquérito por questionário contendo, para além de outras, uma área de observação em que os inquiridos, colocados perante vários cenários que encerram dilemas de ordem profissional, expressaram as suas diversas posições; ao mesmo tempo, optou-se por uma entrevista semiestruturada, em que os entrevistados foram chamados a reflectir sobre várias dimensões das suas experiências de trabalho.