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No primeiro capítulo deste trabalho, apresentei a idéia de que a competência comunicativa dos usuários da língua se manifesta através do sistema de desempenho lingüístico, composto pelos subsistemas fonológico, morfossintático e textual. As estratégias de construção textual que caracterizam o funcionamento do subsistema textual emergem da interação, o que caracteriza o fenômeno da inscrição do interacional no lingüístico. No segundo capítulo, discuti a topicalidade como um princípio de organização textual a partir do qual é possível compreender a organização do texto, numa perspectiva textual-interativa. Neste capítulo, eu me detenho na articulação tópica, entendendo-a como uma estratégia de construção do texto, assentada em propósitos interacionais. Identifico, em um corpus constituído de diferentes gêneros textuais, falados e escritos, os mecanismos através dos quais a estratégia de articulação tópica se manifesta, e os descrevo como fatos de formulação e interação.

4.1. PROCEDIMENTOS ADOTADOS NA ANÁLISE

Conforme expus no capítulo anterior, a organização tópica se manifesta por meio de relações de interdependência no plano hierárquico (dependência de super- ordenação e sub-ordenação entre tópicos determinada pelo grau de abrangência do assunto) e no plano seqüencial (relação de adjacência ou interposição de segmentos

tópicos na linha discursiva)21. Considerando essa concepção de organização tópica, identifiquei, em cada texto do corpus, a particularização hierarquizada dos tópicos e a sua distribuição seqüencial na linha discursiva. Para isso todos os textos22 foram divididos em segmentos lineares, e foram atribuídos rótulos aos tópicos recobertos por cada segmento, com base no critério da centração.

No que diz respeito à delimitação, Jubran et al. (1992, p. 371) constatam que “a delimitação dos segmentos tópicos pode ser justificada por marcas, cuja identificação constitui um critério auxiliar de segmentação, já que elas não configuram um padrão de ocorrências que possibilite a categorização segura”. Não foi utilizado, portanto, nenhum critério formal para delimitar os segmentos tópicos, o que prevaleceu foi mesmo o critério da centração no conjunto de enunciados.

Após a segmentação dos textos em seus tópicos constituintes, observei as dependências desses tópicos no plano vertical, detectando as relações de super e sub- ordenação entre eles e demonstrando a sua organização hierarquizada por meio de diagramas. A seguir, verifiquei os mecanismos através dos quais os segmentos tópicos se constroem e se articulam nos diferentes planos hierárquicos.

Para efeito de exemplificação, descrevo o procedimento adotado para a análise de um dos textos, a palestra F-033. O texto foi dividido em 13 segmentos, organizados em torno de dois tópicos principais, correspondentes a um primeiro nível da organização tópica hierárquica: (A) A palestra e (B) Efetividade de três princípios

constitucionais. O tópico (A) apresenta apenas um segundo plano de desdobramento,

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A segmentação de todos os textos do corpus se encontra no anexo B, p. 230. Os segmentos estão delimitados por colchetes e identificados por numerais ordinais. A organização tópica hierárquica está representada pelos diagramas, no anexo C, p. 380.

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compreendendo os subtópicos: (A1) O palestrante, (A2) Saudação do palestrante, (A3)

Estrutura e enfoque de análise do assunto e (A4) Pontos de partida para a análise. Já o

tópico (B) se subdivide em níveis sucessivos de detalhamento, de modo que os seus subtópicos se desdobram em outros. Assim, (B) apresenta, no segundo nível hierárquico do texto, três tópicos: (B1) Direito justo, (B2) Conciliação e (B3) Desobediência civil. Dentro de (B1) há um terceiro plano, com os subtópicos (B1.1) Demora na entrega da

prestação jurisdicional e (B1.2) Conceito de direito justo. E há, ainda, um quarto plano, já que cada um desses dois subtópicos, por sua vez, se subdivide em outros dois: (B1.1) comporta o (b1.1) Popularização da demora e o (b1.2) Exemplo do segurado 663681-

04/43, enquanto (B1.2) engloba o (b2.1) Linhas que definem e o (b2.2) Aplicação no caso do segurado 663681-04/43. Os desdobramentos dos tópicos (B2) e (B3) atingem

somente o terceiro nível da hierarquia tópica do texto. (B2) tem por subtópicos (B2.1)

Conceitos, (B2.2) Postura do processo brasileiro e (B2.3) Proposta para o cumprimento do direito à conciliação. (B3) se desdobra em (B3.1) Conceitos e (B3.2) Conseqüência do exercício do direito à desobediência civil23.

Em termos de linearidade discursiva, o tópico (A) recobre os segmentos de 1 a 4, correspondentes a seus quatro subtópicos e o (B) abarca os segmentos de 5 a 13, assim distribuídos: os de 5 a 8 configuram o tópico (B1), sendo que 5 e 6 integram respectivamente as subdivisões de (B1.1) em (b1.1) e (b1.2), e 7 e 8 as subdivisões de (B1.2) em (b2.1) e (b2.2); os segmentos de 9 a 11 constituem os desdobramentos de (B2) nos seus três subtópicos; e, finalmente, o 12 e o 13 formam os dois subtópicos de (B3). No interior de alguns desses segmentos ocorrem inserções parentéticas24.

23 Essa organização pode ser acompanhada pelo diagrama 25, anexo C, p. 413. 24

Essa distribuição seqüencial dos tópicos na linha discursiva, claramente visível no diagrama referente a esta palestra, mostra que, nesse texto, a sucessão tópica caracteriza-se pela continuidade (relação de adjacência entre os tópicos).

Assim, analisei primeiramente os mecanismos de articulação entre os segmentos de cada um dos quadros tópicos. Por exemplo, no quadro tópico (A), verifiquei como se articulam os segmentos 1, 2, 3 e 4, que o constituem. No caso do quadro tópico (B), como há quadros tópicos em diferentes níveis hierárquicos, a análise contemplou a articulação entre 5 e 6, de um lado, e entre 7 e 8, de outro, e depois entre 9, 10 e 11 do quadro tópico (B2), e entre 12 e 13 do quadro tópico (B3). Depois analisei a articulação entre os conjuntos de segmentos. O 5 e 6 passaram a ser vistos como um só segmento, que se conecta ao conjunto formado por 7 e 8. Esses 4 segmentos, por sua vez, passaram a ser vistos como um só, na medida em que formam o quadro tópico (B1), que se conecta ao conjunto 9, 10 e 11 do quadro tópico (B2), que se articula com o conjunto 12 e 13 do quadro tópico (B3). E assim até chegar aos dois grandes segmentos (conjuntos formados por 1 a 4 e por 5 a 13), que recobrem os dois principais tópicos (A) e (B), desenvolvidos no texto. Esse nível de análise denominei de intertópico.

Num segundo momento, analisei cada um dos 13 segmentos, de acordo com sua apresentação na linearidade textual, observando como eles se estruturam internamente, como é realizada a articulação entre os enunciados que os constituem. É o que denominei de nível intratópico.

Na verdade, a distinção inter e intratópica é apenas uma opção metodológica, para englobar tanto a análise interna de cada segmento tópico mínimo, depreendido na linearidade textual, quanto a análise das articulações entre esses

segmentos. A partir do momento em que levo em consideração a hierarquia tópica, a relação entre os segmentos do mesmo nível, integrantes de um quadro tópico, é inter e intratópica. Por exemplo, a relação entre os tópicos A1 e A2, da palestra F-033, é intertópica, se estiver em foco o nível hierárquico mais baixo e último, mas é também intratópica, se levo em consideração que eles estão no interior do tópico A, e a análise passa para o plano hierárquico imediatamente superior, focalizando o tópico A, ou seja, vendo como um único segmento textual a porção recoberta por A1 e A2.

Na medida em que fui aplicando esse procedimento em cada um dos textos que compõem o corpus, fui identificando recorrências na interligação dos segmentos tópicos e dos enunciados que os integram. Os fatos recorrentes no conjunto da análise foram categorizados como mecanismos de articulação tópica.

4.2. MECANISMOS DE ARTICULAÇÃO TÓPICA

Os mecanismos de articulação tópica identificados na análise dos textos foram divididos em cinco grupos, conforme os recursos lingüísticos empregados: a) marcadores discursivos, b) formas referenciais c) formulações metadiscursivas, d) perguntas e e) paráfrases. A análise consiste na descrição da funcionalidade desses mecanismos no processo de formulação textual e interação. A descrição de cada um desses mecanismos foi feita a partir dos tipos de relações que se estabelecem entre os tópicos e entre os enunciados intratópicos: seqüenciação, retomada ou mudança.

Alguns estudos desenvolvidos por pesquisadores brasileiros sobre a organização do texto falado dão destaque à seqüenciação como uma função que justifica o emprego de muitos dos termos que servem para estabelecer ligações entre partes do

texto. Em uma pesquisa sobre marcadores conversacionais no português falado, Andrade (1990) mostra que uma das funções de aí, daí e então é a de indicar seqüência. Risso (1996) destaca a função do articulador então de apresentar, de forma linear, dentro de um dado tópico as várias porções de informações. A autora vê no encadeamento de porções de informações pelo então “o efeito de alinhavo carreado por esse articulador” (1996, p.435). Em pesquisa sobre o emprego variável de um grupo de conectores, Tavares (1999) também destaca o papel de aí, daí, então e e no estabelecimento de sucessão entre eventos, idéias, tópicos. Naturalmente, cada pesquisa interpreta os resultados conforme sua perspectiva teórica e o tipo de dados, mas o fenômeno da seqüenciação se mostra significativo na discussão de todos os resultados.

Nesta pesquisa, a seqüenciação tópica foi interpretada como o processo que estabelece uma ponte entre os enunciados que constituem as partes internas de um dado segmento tópico ou entre tópicos co-constituintes de um supertópico, no sentido de que o primeiro enunciado ou tópico serve de base para o que será dito no segundo. Além de apresentar essa noção ampliada de seqüenciação, focalizo outros mecanismos de articulação tópica que também são seqüenciadores, além dos marcadores discursivos.

No capítulo anterior, mostrei que dois tópicos podem ser descontínuos e até distanciados na linearidade discursiva, por efeito da inserção de outro tópico ou outro quadro tópico. Pode haver também descontinuidade dentro de um mesmo segmento tópico mínimo, provocada por inserções não tópicas. O processo através do qual ocorre a compensação dessa descontinuidade é o que estou considerando de retomada.

Conforme também expus no capítulo em que tratei da topicalidade, o tópico discursivo envolve a noção mais geral de “assunto” ou “tema” que é abordado em um

texto. Dependendo dos propósitos e das condições de produção, em um mesmo texto podem ser desenvolvidos diferentes assuntos, que podem ou não estar vinculados no plano da organização tópica hierárquica do texto. Numa conversação espontânea, por exemplo, em que os locutores, a princípio, não têm pré-definidos os assuntos sobre os quais irão conversar, é comum que diferentes tópicos, não concernentes entre si, sejam desenvolvidos. Nesse caso, ocorre o processo de mudança entre tópicos do primeiro plano da hierarquia. Mas a mudança também pode ocorrer no interior de um mesmo tópico, através do seu desdobramento em quadros tópicos, e destes em subtópicos.

4.2.1. Emprego de Marcadores Discursivos

Diferentes são as designações encontradas na literatura lingüística para os elementos que exercem a função de ligar seqüências textuais. Conectores, operadores argumentativos, articuladores, marcadores discursivos são algumas dessas designações. Naturalmente, cada uma está relacionada a um olhar teórico acerca do movimento de junção entre partes do texto; o que, na verdade, evidencia que não são diferentes apenas as designações, mas também os conceitos.

Os conectores são elementos entendidos por alguns estudiosos como sinais de articulação, responsáveis pelo tipo de coesão textual denominado de conexão ou junção25. Trata-se de um conjunto heterogêneo de formas lingüísticas que envolvem não só as conjunções, tradicionalmente conhecidas como elos de ligação entre orações, mas também alguns advérbios, locuções adverbiais, prepositivas e conjuntivas.

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Segundo Koch (1991), as relações lógico-semânticas entre orações que compõem um enunciado são estabelecidas por conectores do tipo lógico. Já as relações do tipo discursivas, que ocorrem entre partes maiores de texto, são estabelecidas por conectores discursivos. Uma outra distinção para os conectores é proposta por Van Dijk (1979). Para esse autor, há conectores semânticos, que servem para expressar uma relação semântica entre proposições ou fatos; e conectores pragmáticos, que servem para expressar relações entre atos de fala.

Dessa forma, o critério que parece mais significativo para definir os conectores é a existência de algum tipo de relação que se estabelece, através deles, entre partes do texto. Assim é que, segundo Roulet (1997), os conectores são as marcas que servem para especificar uma relação, que pode ser percebida por meio de inferência.

Tavares (1999), por exemplo, utiliza esse critério para classificar os elementos aí, daí, e, e então como conectores, numa pesquisa variacionista. Segundo a pesquisadora, aí, daí, e, e então conectam orações ou partes maiores do discurso, desempenhando as seguintes funções semântico-discursivas: seqüenciação retroativo- propulsora, adversão, adição”(1999, p. 19).

Quando os conectores estabelecem, entre partes do texto, uma relação do tipo argumentativa, eles são tratados especificamente como operadores argumentativos. Essa concepção de conector se baseia na perspectiva da semântica argumentativa (ANSCOMBRE E DUCROT, 1979).

Segundo esses autores, a argumentação é intrínseca à língua, constitutiva dos enunciados. Isso quer dizer que um locutor argumenta em favor de uma

determinada conclusão (que pode ser simbolizada por C), quando apresenta um determinado enunciado (que pode ser simbolizado por A) através do qual pretende levar seu interlocutor àquela conclusão. Nos termos dos autores, assim, “argumentar para C (uma conclusão) através de A (empregar A em favor da conclusão C) é apresentar A como devendo levar o destinatário a concluir C”, “dar A como uma razão para crer em C” (ANSCOMBRE E DUCROT, 1979, p. 14).

Guimarães (1995, p. 78) esclarece essa noção de argumentação e a define como a orientação da seqüência do discurso em uma certa direção. Nas palavras do autor, “mais especificamente, argumentar é dar uma diretividade ao dizer”.

Há na língua uma diversidade de tipos de elementos que servem para conferir aos enunciados uma certa orientação argumentativa. Alguns desses elementos são exatamente os conectores argumentativos, que estabelecem a conexão entre os enunciados.

A articulação das informações, expressa em enunciados lingüísticos, por meio de um conector, está vinculada à interpretação ou diretividade do enunciado. “Conectores são signos que podem servir à união de dois ou mais enunciados, assinalando neles um papel particular em uma estratégia argumentativa” (DUCROT, 1983, p. 9). Assim, além de vincular partes do discurso, os conectores dão a elas um papel argumentativo.

Ao analisar as relações que se estabelecem entre os tópicos e os enunciados que formam os segmentos tópicos, observei que elas não podem ser vistas apenas do ponto de vista semântico ou argumentativo. Como mostrarei mais adiante, as relações

são do tipo discursivas, no sentido de que são construídas pelo falante/escritor no ato da produção do discurso, tendo em vista os objetivos interacionais. Dessa forma, a noção de conector como elemento que serve para ligar partes do texto, estabelecendo entre elas relação do tipo semântica ou argumentativa, é, assim, redutora para os limites teóricos desta pesquisa.

Uma outra visão a partir da qual podem ser interpretados os elementos lingüísticos usados para ligar partes do texto é proposta por Koch (2002). Segundo essa autora, os recursos lingüísticos utilizados no encadeamento de segmentos textuais constituem uma categoria identificada como articuladores textuais. Para a autora, a função dos articuladores não é apenas a de estabelecer a coesão textual. Eles “são multifuncionais, já que desempenham no texto funções das mais variadas, de ordem cognitiva, discursivo-argumentativa, organizacional, meta-enunciativa e interacional” (2002, p. 141).

Koch classifica os articuladores em três classes: os de conteúdo proposicional, os enunciativos e os meta-enunciativos. Os articuladores da primeira classe atuam no plano do conteúdo e servem para indicar relações espaço-temporais e lógico-semânticas. Os da segunda atuam no plano dos atos de fala e servem para indicar relações do tipo discursivo-argumentativo. Essas duas classes de articuladores parecem corresponder à de conectores, tal como discuti anteriormente. Finalmente, os articuladores da terceira “conectam, de alguma forma, a própria enunciação” (KOCH, 2002, p. 138).

Nessa classificação, os articuladores meta-enunciativos apresentam ainda outras subdivisões. Mas essa subdivisão é feita a partir de critérios de naturezas

diversas, o que a torna confusa. Por exemplo, o tipo de articulador que forma o subgrupo dos metaformulativos inclui, entre outros, comentadores da forma como o enunciador se representa perante o outro no ato de enunciação, introdutores de reformulações ou correções e marcadores conversacionais que operam no “amarramento” de porções textuais. Ora, todos os articuladores, segundo a própria definição da autora, atuam no “amarramento” de porções textuais, tanto que sua função primeira é exatamente a de estabelecer a coesão textual. Assim, a função de ligar partes do texto não define apenas um subtipo, mas a classe dos articuladores como um todo. Além disso, fica confuso entender como um marcador conversacional pode ser um subtipo de articulador, haja vista que, pelo menos no domínio da Análise da Conversação (MARCUSCHI, 1991), os marcadores conversacionais constituem uma classe de elementos e não uma função.

Por outro lado, nessa perspectiva de entender os articuladores textuais, os fatos de natureza textual se separam dos de natureza interacional. Isso acaba por deixar também essa noção de articulador incompatível com a perspectiva teórica desta pesquisa.

Assim como os conectores e os articuladores textuais, os marcadores discursivos são também elementos lingüísticos a que se faz referência nos estudos sobre a ligação de entre partes do texto. Risso, Silva e Urbano (1996, p. 55-6) apresentam a seguinte definição para esses elementos:

(...) mecanismos verbais da enunciação, atuam no plano da organização textual-interativa, com funções normalmente distribuídas entre a projeção das relações interpessoais – quando o foco funcional não está na seqüência entre de partes do texto, e a proeminência da articulação textual – quando a dominante deixa de estar no eixo da interação.

Esses autores depreenderam as regularidades constantes em ocorrências de marcadores em quinze inquéritos do projeto NURC-Br e propuseram matizes de traços que dão suporte a uma delimitação dessa classe de elementos. Os dados apurados apontaram para as seguintes características:

a) atuam no plano da organização textual-interativa, com tônica na função de articulação entre segmentos textuais ou na sinalização de relações interpessoais;

b) são exteriores ao conteúdo informativo do tópico;

c) não são transparentes do ponto de vista semântico-referencial; d) apresentam pouca variação fonológica, flexional ou sintática; e) são sintaticamente independentes;

f) geralmente, acompanham-se de uma pauta prosódica demarcativa, bem definida; g) apresentam massa fônica reduzida.

Esses traços foram tomados como critérios para o estabelecimento de um núcleo-piloto que define um contínuo de marcadores prototípicos, não prototípicos e unidades limítrofes à classe. O preenchimento ou afastamento gradativo de combinações desses traços serve de critério para enquadrar um dado elemento em algum dos pontos desse contínuo.

O subconjunto de marcadores discursivos prototípicos, assim definidos por apresentarem combinações de traços estatisticamente relevantes, inclui elementos fortemente seqüenciadores e interativos, ou seja, exercem, conjuntamente, na construção do texto, funções articuladoras e interacionais. Trata-se, portanto, de uma noção perfeitamente compatível com a perspectiva teórica desta pesquisa.

A análise realmente revelou que os marcadores discursivos exercem a função de unir segmentos tópicos ou enunciados intratópicos, contíguos ou não, na superfície textual. A essa função de organizador da estruturação do texto se congregam outras, de natureza interacional. O locutor imprime a seu texto uma certa orientação de sentido e pretende que seu interlocutor a assimile. Essa orientação de sentido corresponde às relações discursivas que se instauram no texto e constitui uma das demandas interacionais para o emprego de marcadores discursivos na articulação tópica.

No capítulo de fundamentação teórica, mostrei que, para alguns autores, se estabelece, na superfície textual, uma relação, que pode ser dois tipos: semântica ou pragmática. Detenho-me, aqui, apenas na análise de Koch (1991, 1995a, 1996), porque é nos trabalhos dessa autora em que essas relações são explicitamente distinguíveis.

Para Koch, as relações semânticas são as dadas objetivamente, em termos de função referencial da linguagem. As relações pragmáticas, também chamadas de discursivas, argumentativas, são dadas subjetivamente.

Koch (1996) faz essa distinção em conformidade com o princípio geral da Retórica segundo o qual existe diferença entre convencer e persuadir. Para se convencer utiliza-se de provas, para se persuadir, de argumentos. Assim, se p é apresentado como prova de r, p é condição suficiente para r. Por outro lado, p é argumento para r, se de p for possível tirar uma conclusão, dentro de uma determinada situação.

Na visão da autora, as relações semânticas são, portanto, as relações do provar, baseadas no pressuposto da “condição suficiente”. No texto, essas relações são apenas reveladas, em virtude de serem inerentes aos enunciados, daí objetivas. As

relações pragmáticas, por outro lado, são criadas, construídas subjetivamente pelo usuário, em um contexto específico de produção do discurso. São da ordem do convencer.

A análise dos dados desta pesquisa aponta para o fato de que, na articulação tópica, estabelecida por marcadores discursivos, ocorrem alguns tipos de relações (como

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