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1. Introdução

2.3. Interação

Nesta seção nos dedicaremos a autores que abordam as ações linguísticas de professores de língua estrangeira durante a interação em sala de aula. Para isso, nos basearemos em pesquisas de importantes estudiosos sobre o tema que, apesar de enfatizarem ações

linguísticas do professor e, portanto, com objetivos didáticos, discorrem sobre aspectos relevantes para a interação que podem ser estendidos para outros contextos, como o envolvido na avaliação de proficiência oral do exame Celpe-Bras. Dentre esses aspectos, destacamos os quatro que darão subsídio para nossa análise e serão fundamentais para respondermos nossas perguntas de pesquisa: as questões, o feedback, as modificações de insumo e as modificações de interação. É importante destacarmos que vamos nos deter apenas às ações do examinador- interlocutor, pois esse é o nosso objetivo nesta pesquisa.

A seguir, explicamos cada uma dessas ações, apresentando quais funções assumem e suas possíveis consequências para a interação.

2.3.1. As questões

Em breve levantamento de pesquisas sobre as questões do professor, desenvolvido por Tsui (1995), destacamos Barnes (apud TSUI, 1995), que classifica as questões de acordo com os pronomes interrogativos nelas empregados. Segundo o autor, a maioria das questões que iniciam com “o que”, “quando”, “quem” e “onde” são denominadas “questões reais”, ou seja, não exigem muito raciocínio, mas sim observação e descrição do que é observado. Barnes (apud TSUI, 1995) também cria outra categorização a partir das perguntas iniciadas com “como” e “por que”, classificando-as como “questões de raciocínio”, nas quais é necessário argumentação coerente com o contexto da conversa.

No entanto, a classificação das questões baseadas em seus pronomes interrogativos não é possível em todas as situações (TSUI, 1995), como ocorre em perguntas do tipo como é

essa mulher? que, de acordo com a classificação proposta por Barnes (apud TSUI, 1995), seria

uma questão de raciocínio. A autora nos mostra que essa questão não exige raciocínio e pode ser respondida apenas por meio da observação e da descrição, assumindo papel de uma questão real.

Barnes (op. cit.) também classifica as questões de acordo com as respostas provocadas. Enquanto as perguntas que permitem gama de repostas são consideradas “abertas”, as que possuem apenas uma resposta aceitável são denominadas de “fechadas”. Estas limitam a produção dos alunos quando comparadas às questões abertas. Assim, apesar da questão “fechada” ser importante em sala de aula devido ao seu valor didático, “é um recurso que restringe a produção oral dos alunos, podendo resultar em respostas limitadas, além de não dar oportunidades para que eles se expressem livremente, o que possibilitaria o uso criativo da

língua” (NIEDERAUER, 1998, p. 3)23.

Em discussão empreendida por Long e Sato (apud TSUI, 1995) sobre a relação das perguntas com a natureza da interação que geram, classificam-nas como “expositivas” e “referenciais”. Na primeira, a intenção do professor é verificar o conhecimento do aluno, desenvolvendo “interações típicas do discurso didático” (NIEDERAUER, 1998, p. 4). Por outro lado, as questões “referenciais”, por não serem conhecidas pelos professores e os alunos responderem para informar-lhes, dão significado à interação, o que condiz com o “uso adequado da língua para desempenhar ações no mundo” (BRASIL, 2013b, p. 8), objetivo da avaliação oral do Celpe-Bras. Assim, a natureza da questão influencia na produção oral e na interação gerada, estimulando ou limitando o uso da língua-alvo.

Os estudos de Tsui (1995) nos mostram que, quando exposto a perguntas referenciais, o aluno não precisa temer a adequação de sua resposta em termos de correto e incorreto, visto que a professora não tem a expectativa de receber uma única resposta aceitável. Isso quer dizer que o aluno tem a liberdade de responder o que desejar, desde que a resposta seja coerente e não se distancie do objetivo da pergunta.

Assim como as questões do professor exercem grande importância em sala de aula de línguas, as perguntas formuladas pelo avaliador-interlocutor para os examinandos de uma interação face a face de um exame de proficiência são fundamentais para a criação de um ambiente favorável à produção oral do participante, uma vez que as oportunidades de produção da língua-alvo dadas a ele terão um grande impacto em seu desempenho ao longo da avaliação e, consequentemente, refletirá em sua nota final.

2.3.2. O feedback

De acordo com Tsui (1995), o feedback é uma ação do professor muito relevante para a interação, podendo funcionar como indicativo de pontos positivos ou negativos da fala do aluno. A inexistência de um feedback24 ao longo ou após a participação do aluno também pode ser muito significativa ao aprendiz, que possivelmente concluirá que sua resposta está incorreta ou apresenta inadequações. Desse modo, o silêncio do professor é considerado um

feedback negativo. Portanto, segundo Niederauer (1998), é preciso que o professor explicite o

23 Nos referimos ao estudo não publicado e desenvolvido pela pesquisadora e Profª. Drª. Marcia Niederauer intitulado As ações linguísticas do professor e a promoção da interação em sala de aula de português como língua

adicional.

feedback positivo caso essa seja sua intenção.

A função principal do feedback é, segundo Tsui (1995), dar uma resposta aos alunos sobre seu desempenho. Porém, também tem a função de acrescentar informação ao que foi respondido ou de fornecer comentário pessoal. Segundo a pesquisadora, o feedback positivo pode criar ambiente amigável e agradável, motivando o estudante a participar da interação.

A repetição de respostas da professora também é positiva durante a interação, pois demonstra que está de acordo com o que foi dito pelos alunos, motivando-os quando percebem que estão sendo compreendidos e, consequentemente, estão sendo bem avaliados. Outras maneiras de fornecer um feedback positivo são possíveis, como “sim”, “muito bem”, “perfeito”, “exatamente”. O mesmo acontece com os feedbacks negativos que, além do silêncio, podem ser dados por meio de expressões de negação, de dúvida e de desacordo.

Niederauer (1988) pontua que o feedback positivo cria um ambiente motivador e encorajador ao aluno, que sente quando sua participação é valorizada e controlada em conjunto com o professor, incentivando-o a interagir em sala de aula. Essa teoria pode ser estendida para a avaliação de desempenho oral, pois quando o avaliador-interlocutor fornece feedbacks positivos ao examinando, este sente-se mais seguro e menos tenso, sentimentos que envolvem com frequência contextos avaliativos, no qual o indivíduo teme cometer erros.

2.3.3. Modificações de insumo

Tsui (1995) analisa as modificações realizadas pelos professores a fim de serem compreendidos pelos alunos quando estes não respondem quando questionados, mesmo após repetição. De acordo com Lynch (1996), toda a linguagem a que o aluno é exposto é considerada insumo, seja compreensível ou não. Segundo Schimidt (apud LYNCH), se o insumo não for compreendido, a aprendizagem pode não acontecer. De acordo com Tsui (1995), as modificações de insumo realizadas pelo professor podem objetivar a compreensão ou a resposta do aluno, uma vez que torna a pergunta mais acessível. O mesmo deve ocorrer em exames de proficiência: uma vez que o examinando não tenha compreendido a pergunta do examinador- interlocutor, é necessária a reformulação, tornando-a mais clara para que seja compreendida e respondida.

Quando as modificações são elaboradas para atingir a compreensão do aluno, podem ser introduzidas mudanças sintáticas ou semânticas que visam simplificar as questões e levar os alunos a compreendê-la com mais facilidade (TSUI, 1995). Assim, para orientar e

facilitar a resposta dos alunos, os professores realizam mudanças em suas perguntas, de modo a fornecer pistas e motivar a participação dos aprendizes.

Apesar de as ações de mudanças serem importantes no desenvolvimento da interação, Lynch (1996) pontua que podem apresentar desvantagens também, como tornar a fala mais lenta, artifício que nem sempre auxilia a compreensão do interlocutor. Outra desvantagem, colocada por Niederauer (1988), é quando o professor, ao modificar seu modo de falar, se distancia da forma como os falantes interagem no contexto extraclasse, podendo resultar em problemas de comunicação dos alunos fora de sala de aula.

2.3.4. Mudanças de interação

De acordo com Tsui (1995), as modificações de interação são muito importantes, uma vez que fornecem alterações decisivas que auxiliam na compreensão do interlocutor quando comparadas com as mudanças de gramática e vocabulário, por exemplo. A autora cita que estudos recentes mostram que essa ação é mais eficiente do que as modificações de insumo quando se trata de facilitar a compreensão. Tsui (1995) nos mostra que pesquisas evidenciam que as mudanças ocorrem em conversas entre falantes de diferentes línguas e é utilizada por ambos. Alguns exemplos de modificação de interação são: verificação de confirmação, para certificação de que o interlocutor compreendeu corretamente o que outro falante disse; pedido de esclarecimento, quando o falante não entendeu o que foi dito pelo outro e precisa de ajuda; pedido de repetição, quando um dos falantes não entendeu ou não ouviu o que foi dito pelo seu interlocutor.

Outra forma de mudar a interação é a decomposição, que é dividir a pergunta inicial em outras questões, com o objetivo de torná-la mais fácil de ser respondida. Há também a verificação de compreensão, estratégia importante usada pelo falante nativo quando quer evitar problemas de comunicação (LONG, apud TSUI, 1995). Quando o aluno não responde a uma questão do professor, por exemplo, é possível verificar se ele não compreendeu a pergunta ou se não sabe a resposta por meio dessa ação linguística.Essas modificações podem configurar- se como apoios que podem auxiliar a compreensão dos alunos da questão proposta e, consequentemente, na obtenção de respostas. Outra modificação que pode ser observada é a verificação de compreensão ao questionar se os alunos entenderam, a fim de conhecer o porquê não formularam resposta: se não haviam compreendido a pergunta ou se o problema era contextual.

A última modificação de interação é a auto-repetição. Nela, o falante repete o que disse antes ou faz alguma mudança (NIEDERAUER, 1998), que pode contemplar a repetição de forma mais lenta e a inclusão de gestos.

De acordo com Long apud Tsui (1995), enquanto as estratégias verificação de compreensão, auto-repetição e decomposição são usadas pelos professores para produzir insumo compreensível, a verificação de confirmação, o pedido de esclarecimento e o pedido de repetição são utilizadas para que compreendam o insumo dos alunos.

Os estudos enfatizados nesta seção sugerem que as conversas espontâneas e informais podem apresentar barreiras na comunicação, as quais podem ser resolvidas por meio de artifícios existentes na própria língua (NIEDERAUER, 1998). Assim como em sala de aula, esses impasses também ocorrem em testes de línguas e é importante que sejam resolvidos para que a avaliação aconteça de maneira satisfatória de acordo com o construto estabelecido. Desse modo, o avaliador que irá interagir com o examinando durante a avaliação oral deve estar preparado para lidar e resolver com os possíveis impasses durante a conversa de acordo com os estudos acima, pois é um profissional da área de LA e não “um falante nativo ‘comum’ interagindo em conversas espontâneas e informais” (NIEDERAUER, 1998, p. 20)