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3.5 ELABORAÇÃO DOS CONCEITOS USADOS NA

3.5.3 Interação Metacomunicativa

3.5.3.2 Interação Metacomunicativa de Gerenciamento Interacional

O vocabulário controlado “Gerenciamento Interacional” rotula falas que tenham a intenção de ceder, solicitar ou negar o turno, ou seja, dar ou pedir oportunidade de fala para alguém, incluindo também as falas dos alunos demonstrando seu desejo de não ter a fala interpretada.

As falas mais comuns do gerenciamento interacional vêm dos intérpretes, quando perguntam aos alunos, assim que percebem que estão com dúvidas, se desejam que as mesmas sejam interpretadas. A resposta dada pelo aluno pode ser negativa, e também é categorizada como gerenciamento interacional. Percebeu-se que caso o aluno queira realmente fazer sua pergunta, ele leva a cabo sua questão.

Um exemplo pode ser retirado da Disciplina 2, quando a Aluna 2 pergunta diretamente para a Intérprete 3 se o nome para determinado sinal que estava sendo realizado era “empoderamento” e a intérprete responde que sim e diz que o empoderamento possui limitações impostas pela ideologia. A aluna diz que esse sinal possui significados diferentes e, então, a intérprete pergunta se a aluna gostaria que sua fala fosse interpretada quando ela responde negativamente.

Outra fala comum vinda dos intérpretes é um gesto facial e corporal que indica que aquele é um momento propício para que o aluno exponha sua dúvida já que não tinha conseguido expô-la até então. Nesses casos, verificou-se que o aluno não nega expor sua dúvida ao grupo.

Na Disciplina 2, o Aluno 3 demonstra que tem a intenção de falar levantando o braço, em seguida a Intérprete 4 chama pelo professor, conseguindo a atenção daqueles que falavam no momento, porém, uma das falantes correntes entende que a intérprete estava pedindo para que falassem mais devagar em vez de entender que ela interpretava o surdo solicitando o turno. Com essa compreensão, a aluna continua falando, de forma mais devagar. Percebe-se que a responsabilidade pela não inserção do Aluno 3, naquele momento, foi da Intérprete 4, que aproveitando que os alunos ouvintes tinham dado uma pausa depois que ouviram sua voz chamando pelo professor, deveria ter interpretado o aluno surdo naquele momento. Depois, aproveitando que as falas tinham cessado, a Intérprete 3 olha diretamente para o Aluno 3 com as sobrancelhas um pouco franzidas, expressão séria e com a mão direita

espalmada para cima ela faz um gesto como que o convidando a falar naquele momento. O aluno refletiu rapidamente se ainda seria coerente fazer a pergunta e a seguir ele a realiza perante a turma.

O gerenciamento interacional também é representado por acenos e expressões faciais nos quais o intérprete expõe ao aluno que ele pode prosseguir com sua fala já iniciada. Isso pode acontecer quando o aluno surdo está falando e, por algum motivo, acha que sua fala foi interrompida por um ouvinte, o intérprete, então, o informa de que deve prosseguir.

Por parte dos alunos ouvintes, o gerenciamento interacional surge quando percebem que o aluno surdo gostaria de falar, seja naquele momento ou em momento anterior, e cedem o turno especificamente para ele.

O último exemplo da Disciplina 2 vai ao encontro de marcas encontradas no estudo de Roy (2000), ao detalhar os tipos de tomada de turnos gerados pelos intérpretes, sendo um deles a oferta de turnos. Aqui, o intérprete percebe que o estudante demonstra ter algo a dizer, porém, não consegue fazê-lo, levando o intérprete a produzir uma expressão corporal como a estimular que ele diga o que está pensando em outro momento que se fez oportuno.

Os gestos da intérprete foram constituídos por um curtíssimo aceno com a cabeça e um gesto com a mão com a palma para cima realizando um movimento no qual a mão estava mais distante do corpo da intérprete e se aproxima como a dizer ao Aluno 3 que ele pode se pronunciar.

Interessante é a observação de Roy (2000, p. 95), quando a mesma afirma que “[...] the Interpreter must take a turn to offer a turn. Both taking a turn and offering a turn are indicative of the complex nature of an interpreter’s involvement in the communicative process of an interpreted event”38. Esse movimento ocorre silenciosamente e é mais um exemplo da responsabilidade do intérprete em contextos dialogados. Foram encontradas seis ocorrências desse tipo de interação na Disciplina 1 e na Disciplina 3. Na Disciplina 2, puderam ser observadas dezessete interações de gerenciamento interacional.

38

“[...] o intérprete deve tomar um turno para oferecer um turno. Ambos, tomar um turno e oferecer um turno, são indicativos da natureza complexa do envolvimento do intérprete no processo comunicativo de um evento interpretado” (ROY, 2000, p. 95, tradução minha).

3.5.3.3 Interação Metacomunicativa de Orientação da Atenção

A orientação da atenção foi observada em todas as disciplinas e originada por motivos diferentes. Na maior parte dos casos, aconteceu em momentos nos quais o assunto discutido entre o grupo era interessante aos alunos surdos, em especial, ou importante a todos os alunos, mas que por estarem conversando entre si, os alunos surdos ficavam alheios a essas informações. Dessa forma, as intérpretes realizavam um gesto com o intuito de chamar a atenção dos alunos para o que estava sendo interpretado. Mas, em menor número, a orientação da atenção também foi utilizada quando o aluno estava lendo ou escrevendo algo (um caso de cada um).

Um exemplo dos casos que mais aconteceram é um trecho da Disciplina 2 onde as intérpretes chamam a atenção dos alunos surdos que no momento travavam entre si uma interação paralela. O tema levantado por uma das alunas ouvintes era a respeito do Encontro Nacional dos Estudantes de Letras (ENEL) que estava prestes a acontecer. A aluna chama a atenção para o fato de a língua de sinais ser um dos temas para discussão no Encontro e começa a falar um pouco mais da organização desse tema no evento. No momento em que a aluna cita a Libras, ambas as intérpretes chamam a atenção dos alunos surdos.

No caso mencionado acima, as intérpretes poderiam

simplesmente não realizar qualquer tipo de aviso aos alunos, porém, como o tema era a língua de sinais, era provável que alguma pergunta, ou comentário, pudesse ser feito aos alunos, ou mesmo era possível que eles não estivessem a par do evento e seria conveniente que a informação passasse a ser de seu conhecimento.

Outro momento em que ocorre a orientação da atenção é aquele no qual o professor começa a explicar o procedimento de entrega das avaliações finais. Nesse caso, a data de entrega dos trabalhos era importante para o conhecimento de todos os alunos presentes e os alunos surdos, assim como a maioria dos alunos ouvintes, queriam compreender melhor o que o professor estava propondo para a turma e demonstravam muitas dúvidas em relação ao assunto.

O fato de o intérprete orientar a atenção dos alunos pode ser considerado uma troca de papel de intérprete para o de colega, afinal, o aluno é o responsável por prestar atenção ao que está sendo interpretado e chamar a atenção do aluno estaria fora da responsabilidade do profissional. Todavia, optou-se por não rotular essas orientações de atenção como troca de papel para o de colega, a partir da ideia de que essa seja uma estratégia do intérprete com a finalidade de evitar algum

problema interacional ou mal entendido que o leve a repetir a fala do colega ouvinte porque o surdo não viu, ou problemas como deixar o ouvinte esperando uma resposta que deveria vir do surdo e não vem porque ele não estava olhando, levando o intérprete a explicar a situação, resumindo o assunto, por exemplo. Ao encaixar essa categoria em interação metacomunicativa subentende-se que a orientação da atenção não leva à troca de papel.

Metzger (1999) argumenta que orientação da atenção dos surdos acontece para que eles saibam quando uma fala começa a ser produzida. A necessidade dessa ação vem do fato de que o interlocutor surdo geralmente está com a atenção voltada para outro ponto, no caso da pesquisa da autora, para o filho. No caso da presente pesquisa, os momentos nos quais a atenção foi chamada eram aqueles nos quais os alunos conversavam entre si. Mesmo conversando entre si, os alunos sabiam que havia alguém falando por verem o intérprete atuando, ou seja, a orientação da atenção não era para indicar que alguém estava falando, mas para indicar que o assunto era importante de alguma maneira.

Na Disciplina 1, foi registrada uma ocorrência do tipo orientação da atenção, assim como na Disciplina 3, já na Disciplina 2 foram produzidas quatro interações.