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Os dois episódios de interação selecionados para análise deste trabalho buscaram alcançar os dois governos e também dois formatos distintos. O primeiro, realizado em 2013, foi uma consulta pública ao movimento cultural realizada de forma estruturada. O segundo, mais informal, revela um agenciamento djunto aos membros do CCDF. Na gestão entre 2015 a 2018 as consultas formais se utilizaram de uma plataforma eletrônica que foi desativada e não há ficaram registros destas consultas.

A consulta pública realizada em 2013 se deu mediante o envio, por meio eletrônico, de demandas e contribuições às minutas dos editais disponibilizados pelo site do FAC. Depois, os gestores realizaram um encontro presencial para apresentar as solicitações de alteração recebidas e, nesse encontro, foi feito o debate sobre quais mudanças no texto seriam realizadas. Esse é o momento do debate político antes do envio da minuta do edital paras as instâncias jurídicas. Também se realiza antes do debate dentro do CCDF. A Tabela 24 mostra os resultados do documento de sistematização decorrentes do encontro.

Tabela 28 - Análise do resultado da consulta pública sobre as minutas dos editais 2013

Classificação das

propostas propostas Quant.

Tipos de decisão Justificativa da decisão

Aceitas integralmente

Aceitas

parcialmente Rejeitadas Jurídicos Políticos Técnicas

Considerações Gerais Estrutura de seleção 9 9 4 5 Contrapartidas 3 3 2 1 Pontuação 5 1 2 2 3 2 Prazos 3 1 2 2 Outros 7 2 2 3 2 2 3 Considerações Específicas Alteração nos valores 15 1 9 4 4 7 3 Criação de novas modalidades 11 5 6 4 7 Alteração na avaliação 3 1 1 1 1 Alteração nos requisitos 11 4 3 3 2 2 6 Contribuições Complementares Questões diversas 8 1 6 1 2 5 2 Total 75 10 29 33 13 28 31 Percentual 100% 13,3% 38,6% 44% 17,3% 37,3% 41,3% Fonte: Elaborada pelo autor com base em dados extraídos de Consulta FAC 2013: Sistematização (DISTRITO FEDERAL, 2013).

A classificação das propostas segue a nomenclatura do documento disponibilizado no site do FAC. Foi possível analisar o percentual das contribuições realizadas pela sociedade civil que foram rejeitadas, aprovadas integralmente ou parcialmente. Criou-se uma classificação para cada tipo de justificativa das decisões também constantes do documento disponibilizado em três aspectos: jurídicas, políticas e técnicas. A justificativa jurídica diz respeito a todas as decisões cujo texto aponta para um impeditivo de ordem normativa ou cujo discurso se refere a algum órgão do Poder Judiciário. Por exemplo, foi solicitado que fosse possível a realização de dois projetos financiados pelo FAC simultaneamente. O pedido foi negado sob o argumento que seria necessário alterar a Lei Complementar para que isso ocorresse.

Nas classificadas como “políticas”, estão agregadas todas as decisões cujo texto se refere a uma justificativa que parte da discricionariedade do gestor ou de uma avaliação da política pública. O termo “político”, utilizado na tabela para efeito de análise das motivações para tomada de decisão, é empregado em suas duas dimensões que o termo possibilita e que a língua inglesa ajuda em diferenciar: a policy, relacionada às políticas públicas; e politics, no sentido de impacto eleitoral, uma vez que o gestor responde as demandas e avalia as possibilidades de atendimento da comunidade cultural realizando um cotejamento de custo- benefício político. Um exemplo de decisão baseada na justificação da manutenção da política cultural (policys) definida pelo governo é a resposta quanto à solicitação da “extinção da divisão dos editais por etapas da cadeia produtiva”, que foi negada por ser “elemento fundamental da política de fomento em curso”. Há, ainda, uma justificação de que essa demanda será resolvida por meio de “outros mecanismos”. Uma decisão interpretada como decisão baseada no custo- benefício político (politcs) é a de ceder no aumento do prazo para atender ao chamado para assinatura de contrato após a publicação do resultado final de cinco para 10 dias, sendo que, neste caso, foi uma demanda aceita parcialmente, uma vez que o solicitado era de 30 dias.

No mesmo sentido, o termo “técnica” trata das questões cujo texto aborda como ordem administrativa e/ou operacionais. Nesse quesito, foram analisadas questões como substituições de nomes e conceitos.

O documento foi classificado pelos gestores em tipos de propostas que se relacionam com a estrutura dos editais (coluna “Classificação das Propostas” – Tabela 2). Na classificação, o item “Estrutura da seleção” reuniu as contribuições que abordaram exatamente a nova organização dos editais divididas pelos elos da cadeia produtiva e não mais nas linguagens artísticas. Além disso, houve modalidades criadas pela gestão que não eram usuais e que espelhavam uma opção da política pública do governo como a circulação em cidades e no entorno do Distrito Federal. Nesse item, central da política de fomento que passou a ser implementada, não houve nenhuma proposta aceita. Uma demonstração que os gestores não flexibilizaram sua política.

Por outro lado, o item que houve maior quantidade de propostas incorporadas, com 66% de acolhimento, foi o que tratou da alteração dos valores disponibilizados por modalidade de financiamento. Esse item foi, também, o que mais recebeu solicitações de alteração num total de 15, correspondendo a 20% do total de propostas.

Boa parte das regras não é da cabeça do gestor [...], porque ele quer criar a regra. Boa parte das regras decorre das próprias normas de regência. E tem uma parte menor dessas regras que, a priori, não são alteradas, que fazem parte

da política que são desenvolvidas pelo gestor. A margem de mudança ou não desse conjunto de regras vai depender da avaliação do gestor. (AGENTE B, 2020)

A distribuição dos recursos entre as finalidades (tipos de editais) e as modalidades (linhas específicas de financiamento) também é uma forma de analisar as prioridades da política de fomento e os resultados das relações dos campos na elaboração dos instrumentos editalícios. De modo geral, houve um acolhimento das demandas – somando-se as alterações parciais e integrais –, representando 52% contra 44% de rejeição. No entanto, questões centrais da política cultural como a divisão dos editais por “etapas da cadeia produtiva” e não por segmentos culturais e a questão da quantidade de modalidades não foram consideradas pelos gestores. O documento ainda registrou, em alguns casos, que as decisões foram tomadas em acordo com os presentes na reunião presencial. Ou seja, agentes culturais participaram e decidiram sobre contribuições enviadas. Não houve registro da participação do Conselho de Cultura nesse processo da consulta.

Esse episódio demonstra uma interação formal onde uma racionalidade foi aplicada com diferentes frentes de justificação. Os atores envolvidos travaram um debate técnico-político e onde, claramente, houve pouco avanço da pauta central do campo dos artistas embora tenha tido, segundo nossa análise, um percentual maior de atendimentos das proposições elencadas.