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2 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

2.2 SIMBOLISMO E REPRESENTAÇÃO

2.2.1 Interacionismo simbólico

O interacionismo simbólico surgiu na Escola de Chicago, criada no século XIX, com teóricos importantes, como Mead, Blumer e Goffman, que “ficaram conhecidos mundialmente pelos estudos empíricos, em especial das relações raciais e urbanas” (BOTTOMORE; NISBET, 1980, p. 598).

Os teóricos dessa vertente verificaram que o mundo é constituído por símbolos que são interpretados e compreendidos pelos indivíduos, os quais atuam socialmente, desempenhando diversos papéis, conduzindo suas ações visando a demonstrar sentido e significância. Ao interagirem, as pessoas ultrapassam o simples ato de reagir a um comportamento, elas interpretam as reações umas das outras e agem de acordo com essa interpretação. Sendo assim, o interacionismo simbólico constitui-se como uma vertente da Sociologia que se volta para o estudo dos símbolos, suas interpretações e as representações que surgem a partir dessa relação (MENDONÇA, 2002).

A interpretação depende do significado que cada ser humano atribui à realidade. Significa dizer que, diante dessa prática, as pessoas vão transformando e ajustando seus comportamentos, visando a controlar o retorno das suas ações, para que a reação do outro, no processo de interação, esteja compatível com o que se espera. Gadea (2013, p. 244) afirma que “Herbert Blumer (1969) [...] diria que o meio de toda interação é, necessariamente, um meio definido, simbolicamente, na medida em que as pessoas interpretam e definem as ações alheias, dado-lhes respostas baseadas nos significados que outorgam às mesmas”.

O interacionismo simbólico atua nessa esfera de interação, sendo o significado a base para entender as ações e relações, considerando que os seres humanos são atores na vida social: “o tema central abordado são os processos de interação social – ação social caracterizada por uma orientação imediatamente recíproca – ao passo que o exame desses processos se baseia em um conceito específico de interação que privilegia o caráter simbólico da ação social” (CARVALHO; BORGES; RÊGO, 2009, p. 153).

Dessa forma, é definido por Carvalho, Borges e Rêgo (2009, p. 148) como sendo “uma perspectiva teórica que possibilita a compreensão do modo como os indivíduos interpretam os objetos e as outras pessoas com as quais interagem e como tal processo de interpretação conduz o comportamento individual em situações específicas”.

Ennes (2013) acredita que o elo que o indivíduo estabelece com o mundo, considerado um tipo de interação social influenciado por suas interpretações, serve de base para a sua ação. O autor apresenta as três premissas do interacionismo simbólico definidas por Blumer:

A primeira estabelece que os seres humanos agem em relação ao mundo fundamentando-se nos significados que esse lhes oferece. [...] A segunda premissa consiste no fato de os significados destes elementos serem provenientes da ou provocados pela interação social que se mantém com as demais pessoas. A terceira premissa reza que tais significados são manipulados por um processo interpretativo (e por este modificado) utilizado pela pessoa ao se relacionar com os elementos com que entra em contato (BLUMER, 1980 apud ENNES, 2013, p. 70).

No momento da interação, a pessoa age de forma a repassar uma impressão que é considerada a mais apropriada, na tentativa de induzir a forma como os acontecimentos se darão. Pode proceder de forma intencional e consciente, agindo com o único objetivo de transmitir uma impressão que acarrete o retorno que deseja. Ou pode, mesmo agindo para ter o resultado esperado, não ter muita consciência do que está fazendo (GOFFMAN, 2013).

Goffman (2013) defende que as pessoas são capazes de demonstrar uma impressão mediante “expressões” transmitidas e emitidas. A primeira delas relaciona-se com as informações fornecidas de forma consciente, enquanto que a segunda se relaciona às mensagens inconscientes. E ressalta que, “independentemente do objetivo particular que o indivíduo tenha em mente e da razão desse objetivo, será do interesse dele regular a conduta dos outros, principalmente a maneira como o tratam” (GOFFMAN, 2013, p. 15).

Segundo Gadea (2013, p. 254), “o indivíduo ‘se apresenta’ como um significante que traduz uma ‘ordem simbólica’ decorrente de toda interação social e, por consequência, fazendo parte de relações de poder”. Porém, ressalta que o papel desempenhado pelas pessoas interfere na forma como veem a realidade: “os símbolos decorrentes de toda interação social não são universais nem objetivos; os significados são individuais e subjetivos, no sentido de que é o próprio receptor quem os outorga aos símbolos de acordo com a maneira em que os interpreta” (GADEA, 2013, p. 247).

Corroborando essa linha de raciocínio, Carvalho, Borges e Rêgo (2009) defendem que é no comportamento social que se encontra o alicerce para o significado, a partir dos símbolos significantes que surgem “quando um determinado gesto representa a ideia que há por trás de si e provoca essa ideia no outro indivíduo, tem-se um símbolo significante” (CARVALHO; BORGES; RÊGO, 2009, p. 150). Os autores ressaltam que o significado se torna consciente quando ocorre a identificação das pessoas com os símbolos, ocasionando o controle das que vão corresponder e apresentar as reações almejadas.

Ao analisarem a realidade por meio das relações sociais, os interacionistas simbólicos consideram de grande relevância a interferência da “situação” ou “contexto” para entender o

sistema interacional. Tais conceitos são utilizados para mencionar a “materialização das interações no espaço e no tempo” (ENNES, 2013, p. 72). Segundo Mendonça (2002), a exploração do meio é uma atividade que precede a ação, por meio dela o indivíduo decide o rumo a ser seguido. Nesse contexto, os interacionistas simbólicos falam do conceito de “self”. Para Mead (1967), o “self” é construído por meio do processo de interação entre as pessoas, a partir do qual estruturam as ações que serão desenvolvidas dentro do grupo social ao qual pertencem. Os processos sociais são responsáveis pela sua elaboração, tendo como ferramenta importante a comunicação, a qual facilita a compreensão, reconstrução e transmissão dos símbolos, sendo utilizada não só na relação com outras pessoas, como, também, no processo individual de internalização do “self”. Dessa forma, o autor acredita que o “self” está diretamente relacionado ao comportamento social praticado nos diversos grupos sociais. Mendonça (2002) ressalta que o “self” se compõe do “Eu” e do “Mim”:

O “Mim” contém as visões que os seres humanos têm de si mesmos como os outros os veem. Ao passo que o “Eu” encerra os desejos interiores do indivíduo, o “Mim” é a fonte de reflexão sobre como o indivíduo deveria atuar em uma situação particular a luz de como seus comportamentos serão vistos pelos outros. O ser humano vê a si mesmo como os outros o veem e adotando esta estância, está refletindo a defensividade de uma linha particular de atuação, como vista pelos outros (MENDONÇA, 2002, p. 11).

Nessa dinâmica, Mead (1967) destaca a importância do “outro generalizado”, que é construído a partir de um processo de identificação com algo/alguém do grupo social, o qual é observado, admirado e internalizado pelo indivíduo. A partir de então, o seu comportamento social buscará seguir essa referência.

Para Carvalho, Borges e Rêgo (2009), o outro generalizado é capaz de interferir no comportamento das pessoas, sendo utilizado como forma de controle das ações. Pode ser considerado um parâmetro a ser seguido, interferindo, assim, na construção do “self”: “Para Mead, estas duas noções são centrais para se entender que o “self” é o indivíduo socializado e a socialização do indivíduo, por sua vez, depende do outro generalizado” (ENNES, 2013, p. 75).

Os autores mencionados acima acreditam que seria apropriado fazer uso dos fundamentos do interacionismo simbólico para entender “a mobilização de mudanças de opiniões, comportamentos, expectativas e exigências sociais” (CARVALHO; BORGES; RÊGO, 2009, p. 148), ações tão presentes no desempenho das atividades de gestão dentro de uma organização.

Goffman (2013, p. 28) considera que “um ‘desempenho’ pode ser definido como toda atividade de um determinado participante, em dada ocasião, que sirva para influenciar, de algum modo, qualquer um dos outros participantes”. Dessa forma, constata-se que o desempenho de um gestor, objeto deste trabalho, depende diretamente desse processo de interação entre as pessoas. Bottomore e Nisbet (1980, p. 615) ressaltam que “o evolucionismo de Thomas supunha que qualquer liderança só poderia ter êxito quando genuinamente interacional”.

Observa-se, então, que “as organizações não são formações estruturadas por regras normativas unívocas; as ações nelas executadas não estão determinadas pela mera aplicação de prescrições ou orientações livres de toda intervenção do eu do agente” (JOAS, 1999, p. 162). A atuação e a negociação que ocorre no processo de interação interfere na continuidade ou alteração das regras e procedimentos institucionais, por isso a importância da encenação dos indivíduos.