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A interculturalidade é uma temática que começou a ganhar destaque nos estudos organizacionais desde que o impacto das culturas nacionais passou a assumir uma posição cada vez mais importante nos estudos de cultura organizacional (BARBOSA, 2003; BUENO, 2010; FREITAS, 2009; CRAIDE, 2011). Freitas (2010) afirma que esse tema foi incorporado nos estudos organizacionais quando o ambiente e as organizações sofreram mudanças - políticas, econômicas, culturais e tecnológicas – que contribuíram e serviram de base para a aceleração do processo de globalização.

A vivência intercultural passou a ser uma realidade organizacional constante quando as empresas de diferentes nacionalidades começaram a interagir através de fusões, alianças, aquisições, consórcios e joint venture no intuito de aumentar as possibilidades de crescimento e expansão em um mercado ainda mais competitivo devido ao processo de globalização (FREITAS, 2010). Assim, o cenário organizacional passou a ser um cenário de convivência de equipes e leis multiculturais cada vez mais complexas, diversas e mutáveis (FREITAS, 2009).

Os estudos interculturais se ocupam de pesquisas que se concentram na análise e compreensão da interação entre pessoas de diferentes culturas a

fim de que elas se adaptem melhor uma às outras, buscando integração entre elas sem anular a diversidade (FREITAS, 2010; BUENO, 2010); e tratam de questões de diálogo, de estabelecimento de entendimentos para ação, com vistas à situação dos negócios em um mundo globalizado (BARBOSA; VELOSO, 2009).

Considerando que os estudos interculturais tratam da integração sem anular, neutralizar ou dissolver a diversidade, faz-se necessário afirmar que a interculturalidade não é a mesma coisa que o multiculturalismo. Este último defende políticas de reconhecimento dos direitos, das identidades culturais das minorias e do valor da diversidade cultural sem se preocupar em propor uma política de convivência como defende a interculturalidade (BARBOSA; VELOSO, 2009).

O multiculturalismo surgiu na década de setenta, no Canadá e na Austrália, como uma forma de pressionar os governos desses países a desenvolverem estratégias e adotarem políticas mais adequadas às minorias culturais e a fim de administrar problemas de diversidade e multiplicidade gerados pelas sociedades multiculturais (BARBOSA; VELOSO, 2009; JAIME, 2009);

A interculturalidade, por sua vez, surgiu devido à preocupação de governos europeus em resolver problemas oriundos de processos migratórios, pois esses problemas dificultavam os serviços de assistência social europeia (FREITAS, 2009). Ou seja, a interculturalidade surgiu da necessidade de resolver das diferenças culturais e da integração entre culturas no âmbito social e organizacional (BARBOSA; VELOSO, 2009).

Dada à necessidade de resolver problemas relacionados a questões de vivências de diferentes culturas em uma mesma sociedade, surgiram os estudos interculturais. Estes surgiram em paralelo aos estudos Cross Cultural (BUENO, 2010). A corrente Cross Cultural tem sua ênfase nas pesquisas comparativas e culturalistas a partir das diferenças culturais nacionais e internacionais; a corrente intercultural se preocupa em estudar as consequências das vivências e interações entre indivíduos de diferentes culturas nos espaços sociais (FREITAS, 2009).

Freitas (2009) afirma que os estudos interculturais e Cross Cultural são recentes e de natureza predominantemente empírica. E que apesar de surgirem em um movimento paralelo, eles podem ser considerados como complementares (FREITAS, 2010). Contudo, a autora argumenta que existe uma tendência de substituição da denominação ‘Cross Cultural’ pela ‘Intercultural’ devido à significação mais ampla da segunda denominação e também pelas maiores possibilidades de análise.

A convivência intercultural está cada vez mais comum na vida em sociedade e no âmbito organizacional. Por isso, cada vez mais é necessário reconhecer o outro como diferente para que haja melhoria da convivência de pessoas, sociedades e organizações (BUENO, 2010; FREITAS, 2008). Esse reconhecimento favorece o respeito mútuo, a diminuição de estereótipos, incompreensões e dificuldades de interação (FREITAS, 2008). Além de aumentar a qualidade das decisões tomadas no ambiente de trabalho, aumentar também a capacidade para lidar com situações diversas e diminuir os efeitos negativos de determinados traços (BUENO, 2010; FREITAS, 2008).

No âmbito organizacional, a interculturalidade vem sendo transformada em uma vantagem a ser explorada no mundo dos negócios, conforme afirma Freitas (2008). O cenário organizacional está cada vez mais plural e mutante e a convivência intercultural pode ajudar a compreender o outro e suas potencialidades bem como buscar melhoria da eficiência de processos, estruturas e decisões organizacionais a fim de reduzir os riscos de investimentos feitos (FREITAS, 2008).

A questão intercultural precisa de atenção e cuidado, no âmbito organizacional, como afirma Freitas (2008), pode tanto possibilitar o aumento da eficiência organizacional, quanto, como também, causar sérios problemas quando ignorada ou negligenciada. Assim Bueno (2010) alerta para a necessidade de mais trabalhos brasileiros sobre a administração intercultural e seus efeitos para as organizações e para os indivíduos.

O interesse pelos estudos sobre interculturalidade no Brasil tem aumentado nos últimos anos. A partir de um levantamento feito no site da ANPAD, no mês de Julho de 2014, constatou-se que essa temática começou a ser publicada a partir de 2007. Por exemplo, Ribeiro (2007) trabalhou os

conceitos de marketing de relacionamento e interculturalidade em Business to Business (B2B) em um estudo de caso da Cia. Vale do Rio Doce no mercado Japonês e constatou que a empresa conseguiu, por meio de inserção de produtos de qualidade elevada, investimento no relacionamento de longo prazo e respeito às diferentes culturas, fazer a diferença em um mercado caracterizado por acentuada competição entre mineradoras de todos os continentes.

O trabalho de Rodrigues et. al. (2007) contribuiu para a análise intercultural ao desenvolver um estudo qualitativo sobre a ocorrência e desenvolvimento do processo de instalação da fábrica de Calçados Azaléia S.A., com tradição no trabalho industrial e de origem gaúcha em uma cidade da região sudoeste da Bahia, cuja cultura de trabalho é tradicionalmente rural. Os autores constataram que as principais dificuldades durante o processo de instalação estavam relacionadas com questões de mobilidade, expatriação, hibridismo cultural e a relação homogeneidade versus heterogeneidade cultural. Além de afirmarem que a gestão da interculturalidade contribui tanto com as questões de respeito à diversidade quanto com as questões operacionais e de legitimidade social.

Craide et. al. (2010) analisaram como profissionais que assumiram a intramobilidade em suas carreiras percebiam o desenvolvimento de estratégias de Gestão de Pessoas direcionadas à interculturalidade. Os autores constataram que no caso estudado, o polo industrial ignorava os aspectos interculturais, refletindo em uma lacuna de estratégias de Gestão de Pessoas, pois fora evidenciado entre os profissionais entrevistados um desconhecimento prévio acerca do novo local, a falta de suporte inicial aos recém-chegados e os subsídios financeiros insuficientes.

O trabalho de Craide et.al. (2011) apresenta a intramobilidade e interculturalidade intranacional como desafios contemporâneos de profissionais brasileiros. Com base nesse trabalho, Craide (2011) apresenta outro trabalho sobre a adoção da história de vida em pesquisas sobre a interculturalidade como uma possibilidade de aplicação no campo da administração, pois de acordo com a autora, entender a interculturalidade a partir da perspectiva de sujeitos que vivenciam este processo pode ser uma maneira bastante eficiente

de identificar e compreender as facilidades e desafios inerentes ao encontro entre culturais regionais dentro e fora do ambiente organizacional.

Além dos trabalhos de Craide (2010, 2011) sobre interculturalidade e intramobilidade, Cruz et. al. (2013) estudou a interculturalidade e intramobilidade de profissionais da indústria do couro na região do Submédio do São Francisco analisando fatores socioculturais que influenciam a não permanência dos profissionais de química nos curtumes da região estudada. Eles constataram que na experiência da intramobilidade e interculturalidade as esposas desempenharam um papel fundamental e que os profissionais se deslocaram em busca de oportunidades ligadas à carreira profissional. Além de destacar que a falta de estratégias de gestão de pessoas dos curtumes da região para auxiliar na adaptação desses profissionais e a minimização de choques culturais. Esses trabalhos corroboram com a afirmação de Freitas (2008) de que a interculturalidade tem duas possíveis consequências para o âmbito organizacional, tanto pode aumentar a eficiência organizacional, como pode causar sérios problemas quando ignorada ou negligenciada.