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Internacionalização dos direitos humanos

A internacionalização dos direitos humanos iniciou-se com o Direito Humanitário, a Liga das Nações Unidas e a Organização Internacional do Trabalho. Partindo de propostas que objetivavam o estabelecimento de respeito mínimo às pessoas nas condições de guerra, a busca da manutenção da paz, a fixação de padrões mínimos de proteção ao trabalhador, entre outros, tais entidades marcaram o início da proteção sistemática dos direitos humanos em esfera internacional, bem como o começo da ruptura da exclusividade dos Estados governamentais como sujeitos de direitos.

Por sua vez, a Declaração Universal dos Direitos Humanos, concebida como interpretação autorizada dos art. 1º e 55 da Carta da ONU, traz à tona direitos civis e políticos e direitos econômicos e sociais, colocando-os como indissociáveis e inerentes a condição de ser humano. Toda via, por ser uma declaração, não um tratado, não tem força de aplicação, o que ensejou a “judicialização” da Declaração, com a elaboração de dois pactos em 1966, quais sejam o Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, que somados a Declaração de 1948 constituíram a Carta Internacional dos Direitos Humanos.

Ratificada pela Declaração de Viena de 1993, a ideia de universalização dos direitos humanos cria consistência no direito internacional, como também resistência dos que defendem o relativismo dos direitos fundamentais, que estariam em função da cultura e das características econômicas e sócio políticas em determinada sociedade, contestando o “mínimo ético irredutível” e os padrões mínimos de segurança da dignidade humana.

Aos que defendem a universalização dos direitos básicos dos seres humanos, o citado contraponto político pode servir de argumento para a manutenção das violações e a conservação irredutível da soberania face a proteção da vida humana.

A concepção universal dos direitos humanos demarcada pela Declaração sofreu e sofre, entretanto, fortes resistências dos adeptos do movimento do relativismo cultural. Para os relativistas, a noção de direitos está estritamente relacionada aos sistemas político, econômico, cultural, social e moral vigentes em determinada sociedade. Por esse prisma, cada cultura possui seu próprio discurso acerca dos direitos fundamentais, relacionado às específicas circunstâncias culturais e históricas de cada sociedade. Em face dessa polêmica, compartilha-se da corrente universalista, acolhida pela Declaração de Viena de 1993, quando consagra que todos os direitos humanos são universais, indivisíveis, interdependentes e inter-relacionados. Compartilha-se, todavia, da defesa de um “universalismo de confluência”, ou seja, um universalismo de ponto de chegada e não de ponto de partida. Acredita-se que a abertura do diálogo entre as culturas, com respeito à diversidade e com base no reconhecimento do outro, como ser pleno de dignidade e direitos, é condição para a celebração de uma cultura dos direitos humanos, inspirada pela observância do “mínimo ético irredutível”, alcançado por um universalismo de confluência. Este universalismo de confluência, fomentado pelo ativo protagonismo da sociedade civil internacional, a partir de suas demandas e reivindicações morais, é que assegurará a legitimidade do processo de construção de parâmetros internacionais mínimos voltados à proteção dos direitos humanos. (PIOVESAN, 2013, p. 481).

Há que ressaltar a permanente resistência de assumir com igualdade e indissociabilidade as proteções consagradas no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, direitos de 1ª geração, e o Pacto Internacional de Direitos Econômicos, direitos de 2ª geração.

Ao primeiro Pacto prevê-se a aplicabilidade imediata, e com o respectivo Protocolo Facultativo é possível a petição individual a ser examinada pelo Comitê de Direitos Humanos. Quanto ao segundo Pacto, a previsão de que sua aplicação é “progressiva” e a demora para a adoção respectivo Protocolo Facultativo demonstram a diferença de patamares em que os dois pactos ainda estão.

Ao se abordar os direitos dos migrantes, percebe-se mais ainda a importância de se equiparar os dois perfis de direitos, haja vista os direitos sociais, uma vez que devem alcançar a todos indistintamente, como do trabalho, da moradia, da saúde e da educação, repercutirem em significativa proteção normativa internacional aos indivíduos e grupos migrantes.

É injustificável a distinção, na prática e nos recursos jurídicos internacionais, dos dois grupos, um resguardando direitos do discurso liberal e outro tutelando

direitos do discurso social, como se as demandas por liberdade e por igualdade fossem independentes, quando se sabe serem indivisíveis e interdependentes.

Os direitos enunciados no Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos apresentam aplicabilidade imediata, devendo ser assegurados de plano pelo Estado-parte. Já os direitos enunciados no Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, na linguagem do Pacto, têm aplicação “progressiva”, tendo em vista que estão condicionados à atuação do Estado, que deve adotar medidas, até o máximo de seus recursos disponíveis, com vistas a alcançar progressivamente a completa realização desses direitos. No entanto, esforços têm sido empenhados no sentido de fortalecer a aplicabilidade dos direitos sociais, econômicos e culturais, realçando seu caráter jurídico e acionabilidade. Para este estudo, tais direitos são direitos legais e acionáveis, já que a ideia da não acionabilidade dos direitos sociais é meramente ideológica e não científica. É uma preconcepção que reflete a equivocada noção de que uma classe de direitos (os direitos civis e políticos) merece inteiro reconhecimento e respeito, enquanto outra classe de direitos (os sociais, econômicos e culturais), ao contrário, não merece reconhecimento. Sustenta-se que os direitos fundamentais — sejam civis e políticos, sejam sociais, econômicos e culturais — são acionáveis e demandam séria e responsável observância. O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos apresenta um peculiar mecanismo de implementação e monitoramento, que envolve a sistemática dos relatórios encaminhados pelos Estados-partes e a sistemática, opcional, das comunicações interestatais. O Protocolo Facultativo relativo a esse Pacto vem adicionar a essas sistemáticas um importante mecanismo, que traz significativos avanços no plano internacional, especialmente quanto à international accountability — o mecanismo das petições individuais a serem examinadas pelo Comitê de Direitos Humanos. Essas petições são encaminhadas por indivíduos que denunciam serem vítimas de violação de direitos enunciados pelo Pacto dos Direitos Civis e Políticos. A petição deve respeitar determinados requisitos de admissibilidade, como o esgotamento prévio dos recursos internos e a comprovação de que a mesma questão não está sendo examinada por outra instância internacional. Já o Pacto Internacional dos Direitos Econômicos, Sociais e Culturais apresenta tão somente a sistemática de relatórios a serem encaminhados pelos Estados- partes, evidenciando as medidas adotadas em cumprimento ao Pacto. Em dezembro de 2008, finalmente, foi adotado o Protocolo Facultativo a esse Pacto, estabelecendo o mecanismo da petição individual, das comunicações interestatais e da investigação in loco, na hipótese de grave ou sistemática violação por um Estado-parte de direito econômico, social e cultural enunciado no Pacto. (PIOVESAN, 2013, p. 482).

Outro aperfeiçoamento reivindicado por pensadores do Direito Internacional, de acordo com Piovesan (2013), é o monitoramento da aplicação dos tratados de Direitos Humanos. O Tribunal Penal Internacional, estatuído em 1998 pelo Estatuto de Roma e estabelecido em 2002 em Haia, tem cunho exclusivamente penal e é o único Tribunal permanente de nível global com natureza jurisdicional sobre as violações contra os direitos humanos. Ou seja, não há, em escala mundial, jurisdição para julgar e conter coercitivamente a maior parte dos crimes perpetrados que desrespeitam a dignidade humana.

Destarte, com exceção do Tribunal Penal Internacional, adstrito a previsões penais como genocídio e crimes de guerra, o mecanismo de monitoramento internacional de direitos humanos restringe-se à recomendações e à sanções políticas, daí a proposta de instituir um Tribunal Internacional dos Direitos Humanos.

Ressalta-se, contudo, que enquanto não se configuram órgãos e sistemas mais eficientes no controle do desrespeito às normas internacionais de proteção do ser humano, reconhece-se a importância da possibilidade de pressão política e moral no monitoramento internacional, por vezes último recurso e esperança de comunidades e grupos que demandam proteção de direitos em vários pontos do orbe terrestre, podendo ser útil para coibir as violações contra migrantes e ser encarada como pródromo de um controle verdadeiramente efetivo da dignidade humana no mundo.

Constata-se que, no sistema normativo global de proteção, seja de alcance geral, seja de alcance específico, até o advento do Estatuto do Tribunal Penal Internacional, em 1998, não era previsto um órgão jurisdicional com competência para julgar casos de violação de direitos internacionalmente assegurados. Com exceção dessa jurisdição de natureza estritamente penal, no âmbito global a sistemática de monitoramento internacional continua a se restringir ao mecanismo de relatórios, a serem elaborados pelos Estados-partes, e, por vezes, ao mecanismo das comunicações interestatais e petições individuais, a serem consideradas pelos Comitês internacionais, que, todavia, não apresentam caráter jurisdicional. Isto é, as decisões desses Comitês são de cunho recomendatório e não têm natureza jurídica sancionatória, de modo que se aplicam ao Estado violador sanções de caráter moral e político, mas não jurídico, no enfoque estrito. Impõe-se, assim, no âmbito global, a instituição de um Tribunal Internacional de Direitos Humanos, como órgão jurisdicional competente para tutelar os direitos humanos no sistema global, tendo o poder de proferir decisões com força jurídica vinculante e obrigatória aos Estados perpetradores de violações. Faz-se também necessária a adoção do mecanismo de petição individual por todos os tratados internacionais de proteção de direitos humanos, já que esse mecanismo permite o acesso direto de indivíduos aos órgãos internacionais de monitoramento. (PIOVESAN, 2013, p. 484).

Vale lembrar o monitoramento regional da Convenção Americana de Direitos Humanos, que se vale da Comissão Americana de Direitos Humanos e da Corte Interamericana, os quais vêm desempenhando importantes conquistas em precedentes de afirmação dos direitos humanos, como leciona Piovesan.

Quanto à Corte Interamericana, é o órgão jurisdicional do sistema regional interamericano, que apresenta competência consultiva e contenciosa. No plano contencioso, a competência da Corte para o julgamento de casos é, por sua vez, limitada aos Estados-partes da Convenção que reconheçam expressamente tal jurisdição. Atente-se que apenas a Comissão

Interamericana e os Estados-partes podem submeter um caso à Corte Interamericana, não estando prevista a legitimação do indivíduo — nesse sentido, mais uma vez se enfatiza a necessidade premente de democratização dos procedimentos internacionais, com a garantia de acesso direto de indivíduos e entidades não governamentais à Corte. A Corte Interamericana possui jurisdição para examinar casos que envolvam a denúncia de que um Estado-parte violou direito protegido pela convenção. Se reconhecer que efetivamente ocorreu a violação, a Corte determinará a adoção de medidas que se façam necessárias à restauração do direito. A Corte poderá ainda condenar o Estado a pagar uma justa compensação à vítima, tendo sua decisão força jurídica vinculante e obrigatória. Se a Corte fixar uma compensação à vítima, a decisão valerá como título executivo, em conformidade com os procedimentos internos relativos à execução de sentença desfavorável ao Estado. Ainda que recente seja a jurisprudência da Corte, o sistema interamericano se consolida como relevante e eficaz estratégia de proteção dos direitos humanos quando as instituições nacionais se mostram omissas ou falhas.(PIOVESAN, 2013, p. 486).

O acionamento direto pelos indivíduos dos órgãos de proteção internacional dos direitos humanos significa um relevante mecanismo para o amparo da dignidade humana, na medida em que isso se efetive com qualidade e como resposta às violações perpetradas sem fronteiras na humanidade.

Os Estados seguem sobremaneira os interesses da elite que os governa, e o quadro de ineficientes democracias nos Estados de Direito demonstra a preponderância dos interesses econômicos e políticos não afinados com gestões que priorizem a dignidade humana.

Tal realidade, o pouco controle frente aos que buscam concretizar incessantemente interesses econômicos em detrimento do respeito ao ser humano, está no âmbito das relações internacionais e no âmbito interno dos países, contudo o passo a frente de permitir, com mínima eficiência, aos indivíduos e grupos de indivíduos demandarem diretamente a proteção dos direitos humanos demonstra progresso no caminho para uma efetiva proteção global dos seres humanos, ponto ainda distante na contemporaneidade.

Efetivando-se tal progresso, imigrantes do mundo passam a ter melhores recursos e possibilidades perante os órgãos internacionais de Direitos Humanos.

Os indivíduos convertem-se em sujeitos de Direito Internacional — tradicionalmente, uma arena em que só os Estados podiam participar. Com efeito, na medida em que guardam relação direta com os instrumentos internacionais de direitos humanos — que lhes atribuem direitos fundamentais imediatamente aplicáveis —, os indivíduos passam a ser concebidos como sujeitos de Direito Internacional. Nessa condição, cabe aos indivíduos o acionamento direto de mecanismos internacionais. É o caso das petições ou comunicações, mediante as quais um indivíduo, grupos de indivíduos ou, por vezes, entidades não governamentais podem

submeter aos órgãos internacionais competentes denúncias de violação de direito enunciado em tratados internacionais. É correto afirmar, no entanto, que ainda se faz necessário democratizar determinados instrumentos e instituições internacionais, de modo que possam prover um espaço participativo mais eficaz, que permita maior atuação de indivíduos e de entidades não governamentais, mediante legitimação ampliada nos procedimentos e instâncias internacionais. (PIOVESAN, 2013, p. 462).

A dignidade é demandada pelos violentados e excluídos do mundo, ensejando lutas por novas positivações a respeito da definição de cidadania. Tal aperfeiçoamento compõe o fomento do progresso social dos países juridicamente alicerçados sobre direitos humanos, como ordena o fulcro da Carta Magna do Brasil, tendo em vista que a Democracia da Dignidade Humana deve ter como princípio a proteção sem carimbos de fronteiras, e como prática a coerência de ações entre políticas internas e externas.

Seja em face da sistemática de monitoramento internacional que proporciona, seja em face do extenso universo de direitos que assegura, o Direito Internacional dos Direitos Humanos vem a instaurar o processo de redefinição do próprio conceito de cidadania no âmbito brasileiro. O conceito de cidadania se vê, assim, alargado e ampliado, na medida em que passa a incluir não apenas direitos previstos no plano nacional, mas também direitos internacionalmente enunciados. A sistemática internacional de accountability vem ainda a integrar esse conceito renovado de cidadania tendo em vista que às garantias nacionais são adicionadas garantias de natureza internacional. Consequentemente, o desconhecimento dos direitos e garantias internacionais importa no desconhecimento de parte substancial dos direitos da cidadania, por significar a privação do exercício de direitos acionáveis e defensáveis na arena internacional. Hoje se pode afirmar que a realização plena e não apenas parcial dos direitos da cidadania envolve o exercício efetivo e amplo dos direitos humanos, nacional e internacionalmente assegurados. (PIOVESAN, 2013, p. 467).

A prevalência dos direitos humanos nas relações internacionais do Brasil está prevista na Constituição Federal, nos seguintes termos:

Art. 4º A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios:

II - prevalência dos direitos humanos; (Grifo nosso)

III - autodeterminação dos povos; VII - solução pacífica dos conflitos; VIII - repúdio ao terrorismo e ao racismo;

IX - cooperação entre os povos para o progresso da humanidade; X - concessão de asilo político.

A Constituição de 1988 inovou o regimento jurídico brasileiro positivando direitos fundamentais de modo nunca antes feito na história de nossas constituições,

estabelecendo tutelas almejadas por séculos de lutas e prevendo um sistema aberto ao progresso, nunca ao regresso, de futuras proteções dos direitos humanos consolidadas pelo direito internacional. Fruto dessa inovação é a consideração de limites da soberania Estatal ante a proteção jurídica dos direitos fundamentais estabelecida internacionalmente.

A partir do momento em que o Brasil se propõe a fundamentar suas relações internacionais com base na prevalência dos direitos humanos, está ao mesmo tempo reconhecendo a existência de limites e condicionamentos à noção de soberania estatal, do modo pelo qual tem sido tradicionalmente concebida. Isto é, a soberania do Estado brasileiro fica submetida a regras jurídicas, tendo como parâmetro obrigatório a prevalência dos direitos humanos. Surge, pois, a necessidade de interpretar os antigos conceitos de soberania nacional e não intervenção à luz de princípios inovadores da ordem constitucional; dentre eles, destaque-se o princípio da prevalência dos direitos humanos. Esses são os novos valores incorporados pelo Texto de 1988 e que compõem a tônica do constitucionalismo contemporâneo. (PIOVESAN, 2013, p. 474).

A Constitucionalização dos Tratados Internacionais que versam sobre direitos humanos está expressa na Carta Magna e repercute em todo o corpo jurídico que deve se harmonizar com o teor e o direcionamento constitucional vigente.

CF ART 5º § 2º - Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) (Atos aprovados na forma deste parágrafo)”

Passa-se, assim, a concatenar normas internacionais e nacionais no fortalecimento dos direitos humanos. Segundo a interpretação de notórios juristas, como Flávia Piovesan, os parágrafos 2º e 3º são interpretados como a configuração de materialidade constitucional de todos os tratados de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte, e de formalidade constitucional dos tratados equiparados a Emendas Constitucionais depois de aprovados por três quintos dos votos, em dois turnos, em cada casa do Congresso Nacional.

Por força do art. 5º, § 2º, da Constituição Federal de 1988, todos os tratados de direitos humanos, independentemente do quorum de aprovação, são materialmente constitucionais, compondo o bloco de constitucionalidade. O

quorum qualificado introduzido pelo § 3º do mesmo artigo (fruto da Emenda Constitucional n. 45/2004), ao reforçar a natureza constitucional dos tratados de direitos humanos, vem a adicionar um lastro formalmente constitucional aos tratados ratificados, propiciando a “constitucionalização formal” dos tratados de direitos humanos no âmbito jurídico interno. Nessa hipótese, os tratados de direitos humanos formalmente constitucionais são equiparados às emendas à Constituição, isto é, passam a integrar formalmente o Texto. Com o advento do § 3º do art. 5º surgem, assim, duas categorias de tratados internacionais de proteção de direitos humanos: a) os materialmente constitucionais; e b) os material e formalmente constitucionais. Frise-se: todos os tratados internacionais de direitos humanos são materialmente constitucionais, por força do § 2º do art. 5º. Para além de serem materialmente constitucionais, poderão, a partir do § 3º do mesmo dispositivo, acrescer a qualidade de formalmente constitucionais, equiparando-se às emendas à Constituição, no âmbito formal. (PIOVESAN, 2013, p. 475).

Ademais, os direitos humanos nascidos nos tratados internacionais de que o Brasil seja parte têm aplicação imediata, conforme o § 1° do art.5 da CF “As normas

definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata”, possibilitando juridicamente maior proteção de direitos e legitimidade de cobrança nas situações cujo tempo de resposta é imprescindível para combate da violação ou ameaça de violação de direito fundamental, e afastando o entendimento de que os direitos internacionais são imprecisos, indefinidos ou tão somente fontes de interpretação da norma.

Há que ser também afastada a frágil argumentação de que os direitos internacionais integrariam o universo impreciso e indefinido dos direitos implícitos, decorrentes do regime ou dos princípios adotados pela Constituição. Ainda que não explícitos no Texto Constitucional, os direitos internacionais são expressos, bastando para tanto a menção aos dispositivos dos tratados internacionais de proteção dos direitos humanos, que demarcam um catálogo claro, preciso e definido de direitos. (PIOVESAN, 2013, p. 466).

A redemocratização brasileira, com o progresso jurídico da carta Magna de 1988, alimentou as esperanças de avanço na efetivação dos direitos humanos. Porém, a “constituição cidadã” não penetrou no âmago das estruturas estatais, tampouco transformou substancialmente dilemas dolorosos arrastados por séculos por sobre o dorso da camada mais frágil da estratificação social, em contraste com a exacerbada riqueza sempre evidenciada nas classes dominantes.

Atualmente, migrantes mal inseridos na sociedade brasileira engrossam o grupo de trabalhadores escravos e de marginalizados, alertando para um preparo, pautado nos direitos humanos consolidados universalmente, para lidar com uma

problemática que provavelmente se agravará no contexto do aprofundamento das desigualdades do globo, da divisão internacional do trabalho e da expansão pareada da globalização consumista com a carência de recursos básicos de vida.

As opções políticas que repercutem na positivação e na aplicação de leis melhores dependem da mobilização social consciente, baseada no direito dos seres

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