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Afinal o que significa a internacionalização? Cabe lembrar que as primeiras escolas superiores em administração no país foram criadas a partir de convênios com universidades estrangeiras para consolidar o

ensino. Esse apoio era realizado com o envio de professores para o Brasil e o recebimento de bolsistas para aperfeiçoamento no exterior. A área nasce, portanto, com essa influência direta dos Estados Unidos nas quatro primeiras escolas de administração brasileiras (SERVA, 1990). Ressalta-se, também, ao discutir internacionalização, que Cooke e Faria (2013) questionam essa noção vigente de internacional como colonialista: “deve ser publicado em inglês, nos EUA ou na Europa, e avaliados por instituições de classificação do Atlântico Norte”.

Como foi visto na apresentação do histórico do campo nas primeiras seções, a academia nacional era pouco internacional nos anos 2000, na medida em que apenas se importavam materiais, com atraso, e pouco se “exportava”, artigos, textos e profissionais (ENTREVISTADO 1). Essa “balança comercial científica desfavorável” vai se alterando ao longo dessa década, mas o processo utilizado para chegar a esse aspecto merece ser analisado.

Algumas escolas já tinham essa exposição e essa interação internacionais mais consolidadas, mas isso não fazia parte da realidade dos programas nacionais na área. Alguns poucos professores já dialogavam e participavam de eventos internacionais no cenário nacional, mas essa não era a realidade do campo, que ainda estava se consolidando internamente.

Hoje, como lembram os Entrevistados 5 e 7, está muito mais fácil acessar os ambientes internacionais, os eventos, por exemplo, seja pelo preço de passagens, pela quantidade de eventos ou pelo acesso às informações. Hoje, a interação internacional é maior e virou sinônimo, também, de qualidade. Formação internacional, professor internacional, evento internacional, periódico internacional e selos internacionais são mais disputados e reconhecidos no campo.

Com a expansão das acreditações internacionais pelo mundo, esses “selos” passam a ser sinônimos de qualidade e são um elemento importante para a internacionalização das escolas, ao ponto de alguns pesquisadores em escolas acreditadas afirmarem: “estamos no centro internacional”. Verifica-se que as acreditações atuam no mercado de reputação acadêmica. Isso possibilita, a todos os integrantes da escola, uma exposição internacional.

Uma das metas que consta no plano estratégico de 2011 a 2015 de uma das principais escolas de administração do país, a EBAPE, está relacionada ao início do processo de acreditação pela EFMD e pela AACSB: “aumentar a exposição internacional da FGV/EBAPE, por meio de parcerias com entidades internacionais reconhecidas pela sua excelência acadêmica” (EBAPE, 2013).

A internacionalização dos programas faz parte dos quesitos da CAPES, mas “para realmente ser procurada por alunos internacionais a acreditação é muito importante” (ENTREVISTADO 1). Seja por ser elemento de coroação e reconhecimento da internacionalização da escola ou por ser um elemento de indução à internacionalização, as acreditações internacionais passam a ser um elemento essencial nesse processo. Para se ter reconhecimento internacional, entrar nos rankings, começar a ser disputada nesse mercado de escolas de gestão, a acreditação é considerada importante.

Essa característica de buscar a internacionalização passa pelas acreditações e também passa pela discussão dos rankings internacionais. O ranking nacional da CAPES coloca os programas de acordo com os estratos, mas as escolas também procuram estar nos rankings internacionais. Segundo o Entrevistado 1: “Há uma busca em aparecer nos rankings”. Mas é preciso lembrar que o que se entende por rankings internacionais geralmente avalia muito mais o aspecto profissional do que a pesquisa, como explica o Entrevistado 6:

[...] normalmente são mais direcionados para o ensino profissionalizante. Os rankings que são formados fora do Brasil, por exemplo, e nós pegarmos o Financial Times, ele analisa a questão do salário no início, salário depois de 5 anos, etc. Então não é bem o foco de um doutorado, profissional. Os rankings que tem nos Estados Unidos são feitos pelas revistas de negócio e também tem um olhar mais de negócio do que acadêmico. Então o ranking não é talvez tão adequado quando nós estamos falando de pesquisa acadêmica.

As acreditações e os rankings são, para o Entrevistado 6, um aspecto internacional, mas, para ele, secundários, já que considera o principal aspecto para inserção numa comunidade internacional a capacidade de produção científica qualificada. E nesse sentido, ter o selo é entendido como consequência de publicação. Por conseguinte, interessa questionar: o que está subjacente ao conceito de produção científica qualificada internacionalmente?

Enquanto algumas escolas já tinham convênios internacionais, mesmo antes do fenômeno das acreditações, que tem sua expansão mais forte nos anos 2000, outras, para participar mais ativamente do cenário internacional, contrataram profissionais com esse perfil. O Entrevistado

1 explica como uma instituição brasileira fez para atender aos critérios de publicação internacional:

[...] contratou professores com esse perfil que vieram com treinamento internacional forte, ao mesmo tempo em que deram condições para também se fazer não só essa qualidade, mas se fazer também volume. Só que você não tem tanto volume assim, você priorizou qualidade, em detrimento um pouco. Eles acharam uma equação interessante, em função das regras de remuneração que eles colocaram lá.

Mais uma vez, constata-se que as regras de remuneração servem como um incentivo para a manutenção de uma posição no campo para a instituição. Outro aspecto que merece destaque é a contratação de profissionais com “esse perfil”. Isso porque um dos aspectos da internacionalização implica em atrair professores-pesquisadores e alunos estrangeiros. Esse é um dos processos para se chegar à internacionalização, mas, no Brasil, poucas escolas têm essa característica. A Escola de Administração do Estado de São Paulo (EAESP-FGV) recebe diversos professores visitantes e alunos todos os anos, no entanto, em função da maior parte das aulas serem lecionadas em português, atrai poucos alunos regulares do exterior (FLEURY; WOOD JR, 2011). Essa é uma das dificuldades dos programas nacionais.

A contratação de um tipo de profissional faz com que as próprias habilidades do pesquisador sejam moldadas para atender aos critérios de internacionalização, algumas vezes compreendidas como a imposição de um idioma. Esse perfil em questão se refere a um perfil de pesquisador que publique internacionalmente, que tenha habilidade com línguas e que compreenda bem o cenário internacional de pesquisa, tanto as linhas editoriais de periódicos e sua classificação quanto temas com apelo internacional. Para essa inserção internacional, o pesquisador 6 mostra a experiência de algumas escolas de gestão no exterior.

Fora do Brasil, como tem sido feito? Via contratação de pesquisadores. Qual é a nossa dificuldade? Estamos abaixo do Equador. Nós temos bastante consciência disso. Ou seja, é muito mais fácil para um programa como o Erasmus contratar um norte-americano, um inglês, ou enfim, alguém que tenha feito um doutorado em uma universidade qualificada e ir pra lá mesmo

não sendo holandês do que trazer um estrangeiro para viver no Brasil ou até mesmo no Chile.

Algumas das saídas possíveis para essa dificuldade em contratar estrangeiros no país é a contratação por meio do double apointment, no qual um pesquisador de renome de uma universidade estrangeira terá uma segunda vinculação no programa brasileiro, lecionando, orientando, recebendo alunos em suas escolas. Essa estratégia é uma estratégia para “acelerar o processo”, na medida em que você “internaliza no teu programa esse olhar mais internacional via contratação” (ENTREVISTADO 6).

Assim sendo, figurar no cenário internacional significa, na maioria das vezes, publicar internacionalmente e atrair pesquisadores para intercâmbios, enviando e recebendo alunos e professores. Significa, também, conceber parcerias e convênios e participar de redes internacionais. Até mesmo para se conseguir os selos ou entrar nos rankings, é necessário o primeiro passo: publicação internacional.

As instituições que estabelecem de longa data as parcerias e convênios acabam se integrando mais facilmente no cenário internacional. O Entrevistado 5 destaca uma instituição que já estabelecia relações internacionais antes de isso ser um aspecto importante para as avaliações da CAPES. Para o entrevistado: “um monte de parceiras, eu acho que isso, esse olhar internacional, por exemplo comecei a participar de congressos internacionais antes de ser importante para a CAPES, porque a escola tinha este olhar que permitia isso, que inclusive dava suporte aos seus professores. E para esse pesquisador, ser internacional hoje em um contexto que tudo favorece não é nada excepcional” (ENTREVISTADO 5). Nesse aspecto, portanto, a internacionalização começa a ser institucionalizada, e, hoje, essa atuação internacional em eventos e periódicos, incentivado pela regulação e pelas acreditações, foi facilitada por alguns aspectos: acesso a informação, comunicação mais ágil com a internet, além de questões financeiras.

Atualmente, para tentar um retrato mais amplo sobre o contexto nacional, o Entrevistado 6 sintetiza que:

O que se percebe são ainda pesquisadores isolados em programas que tem chegado a esse patamar de inserção internacional, mas ainda estamos assim numa situação que são pesquisadores isolados, ou ainda é uma situação rara. Eu acho que o nosso desafio é ter grupos maiores ligados a esses

programas líderes, ativamente participando dos principais periódicos da área.

Aqui, encontra-se um vestígio do que é considerado produção científica internacional de qualidade hoje: participar dos principais periódicos da área. É possível extrair dessa perspectiva duas estratégias para internacionalização, ainda que interligadas, uma se concentra mais nas parcerias e a outra nas publicações. Esses dois aspectos sintetizam a compreensão da internacionalização, em linhas gerais, para a academia nacional.