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A interpretação sobre o mecanismo do dividendo mínimo obrigatório: companhia aberta x

Não há na Lei das Sociedades por Ações ou na Exposição dos Motivos do texto normativo citado qualquer distinção relacionada à aplicação do dividendo mínimo obrigatório nas companhias abertas176 ou nas companhias fechadas.

Note-se que o propósito da Lei das Sociedades por Ações ao instituir esse mecanismo foi o de retirar da maioria dos acionistas presentes em assembleia geral ordinária a competência discricionária sobre a deliberação sobre parte do lucro líquido do exercício177, independente da qualificação jurídica da companhia: aberta ou fechada. Não há, na opinião do autor deste trabalho, portanto, qualquer distinção sobre a aplicação do dividendo mínimo obrigatório nesse sentido.

Ressalte-se, conforme já antecipado neste trabalho, que em nenhuma hipótese poderão os acionistas controladores (de uma companhia aberta ou fechada) estabelecer no estatuto social dividendo mínimo obrigatório correspondente a zero com o propósito único de afastar dos acionistas não controladores o direito à participação do lucro social e do recebimento de dividendos. Nesse aspecto, o autor deste trabalho enxerga uma maior probabilidade de configuração desta hipótese em uma companhia fechada do que em uma companhia aberta.

Entende-se assim, vez que, nas companhias abertas, os acionistas poderão, via de regra, ao menos alienar suas ações na bolsa de valores materializando, assim, a participação no lucro social no caso de verificação de ganho de capital do bem alienado.

Em sendo mais restritas as formas de participação no lucro social nas companhias fechadas, naturalmente, os acionistas controladores deverão tomar todas as cautelas para que a opção societária pela instituição de dividendo mínimo obrigatório correspondente a zero não seja tida pelos demais acionistas como uma forma de afastá-los da participação no lucro social.

176 O conceito de companhia aberta é definido no art. 4º da Lei das Sociedades por Ações e no art. 22 da Lei do Mercado de Capitais. Sobre o tema, v. PEREIRA, Evaristo Dumont de Lucena. Conceito de companhia aberta:

uma análise diante da oferta pública de valores mobiliários com esforços restritos de distribuição. 52 f.

Dissertação (graduação) – Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2013:

“Como se vê, trata-se de um conceito claro e objetivo, que subordina a classificação de companhia aberta a uma situação de fato, qual seja a possibilidade de emitir valores mobiliários que sejam admitidos à negociação em mercado de valores mobiliários, como, por exemplo, bolsa de valores, mercados de balcão organizados ou não organizados, ou qualquer outro tipo de mercado em que se negociem valores mobiliários. (...) Notamos aqui que o legislador quis, ao inserir o vocábulo ‘admitidos’, deixar claro que não é necessário que a sociedade tenha valores mobiliários emitidos e negociados efetivamente no mercado, mas apenas que tal companhia esteja autorizada a negociar os valores mobiliários que tenha emitido ou venha a emitir no futuro”.

177 Ou seja, a parcela correspondente ao dividendo mínimo obrigatório.

No mesmo sentido, o estatuto social deverá ser claro quanto às alternativas de participação no lucro pelos acionistas.

Se é verdade que as formas de participação no lucro social das companhias fechadas são mais restritas, também é que existem mecanismos aptos a garantir aos acionistas não controladores a participação no lucro social. Esses acionistas podem negociar contratualmente (notadamente no âmbito de acordo de acionistas), dentre outras, disposições que assegurem: (i) a distribuição de dividendos pela sociedade após determinado período; (ii) o direito de vender suas ações aos acionistas controladores, tendo como base métrica atrelada ao lucro social da companhia, após determinado período; (iii) o direito de realizar uma oferta pública secundária de ações de emissão da companhia e de titularidade dos acionistas não controladores após determinado período.

Adicionalmente, é importante destacar que, salvo disposição diversa178 no estatuto social ou em acordo de acionistas, as ações de sociedades anônimas são plenamente negociáveis. Dessa forma, nessa hipótese, ainda que não haja liquidez em bolsa, o acionista de companhia fechada poderá alienar suas ações privadamente. Ainda, registra-se que no caso de redução do dividendo mínimo obrigatório (mesmo no caso das companhias fechadas), os acionistas dissidentes terão direito de retirada nos termos do art. 136, inciso III c/c art. 137 da Lei das Sociedades por Ações.

Vale ainda mencionar que uma resposta negativa à pergunta central deste item levaria a uma questão de difícil (quiçá impossível) resolução. Se no âmbito de uma companhia fechada o dividendo mínimo obrigatório estatutário não pode ser correspondente a zero, qual seria então seu limite mínimo? 1%? 0,1%? 0,01%? Por qual razão?

A ausência de resposta a essas perguntas reforça o já exposto neste trabalho: o que limita a discricionariedade na definição do dividendo mínimo obrigatório é a não sujeição dos acionistas ao arbítrio da maioria quando da deliberação sobre a destinação do resultado do exercício. Essa obrigatoriedade aliada à clareza do quantum a ser definido a título de dividendo mínimo obrigatório estatutário179 são os únicos comandos legais que restringem a vontade dos acionistas neste assunto, não havendo quaisquer limites mínimos objetivos previstos em lei. O limite mínimo do dividendo mínimo obrigatório é, portanto, aquele que os próprios acionistas, com base no conhecimento da atividade realizada pela sociedade, convencionaram ser.

178 Observado ainda o disposto no artigo 36 da Lei das Sociedades por Ações que dispõe que “O estatuto da companhia fechada pode impor limitações à circulação das ações nominativas, contanto que regule minuciosamente tais limitações e não impeça a negociação, nem sujeite o acionista ao arbítrio dos órgãos de administração da companhia ou da maioria dos acionistas”.

179 Ou a clareza de que o dividendo mínimo obrigatório estatutário é correspondente a zero, nessas hipóteses.

Ressalte-se ainda que a privação da participação do lucro social por qualquer acionista pode ocorrer independentemente no quantum estatutário definido a título de dividendo mínimo obrigatório. Em outras palavras, sendo o dividendo mínimo obrigatório correspondente a zero, 1%, 5%, 15%, 25%, ou qualquer outro percentual que não 100%, pode ainda haver privação do direito do acionista de participação no lucro social.

A resposta objetiva à questão proposta neste item é a seguinte:

(i) a interpretação sobre o mecanismo do dividendo mínimo obrigatório é aplicável da mesma forma tanto para as companhias fechadas, quanto para as companhias abertas? Sim; o que pode variar são as alternativas disponíveis de participação do lucro social nas companhias abertas e nas companhias fechadas. Nesse sentido, em sendo mais restritas as formas de participação no lucro social nas companhias fechadas, naturalmente, os acionistas controladores deverão tomar todas as cautelas para que a opção societária pela instituição de dividendo mínimo obrigatório correspondente a zero não seja tida pelos demais acionistas como uma forma de afastá-los da participação no lucro social.

Salienta-se, por fim, que a discussão acerca da última pergunta proposta neste trabalho, qual seja “qual seria a melhor estrutura jurídica capaz de conciliar os anseios de alguns acionistas à percepção do dividendo com a preocupação da administração e de acionistas controladores com a sobrevivência da sociedade no médio e longo prazo?”, será abordada no capítulo 7 A proposta de instituição do Direito de Escolha como alternativa ao dividendo mínimo obrigatório deste trabalho.

7 A PROPOSTA DE INSTITUIÇÃO DO DIREITO DE ESCOLHA COMO