• Nenhum resultado encontrado

IX OS MODOS DE ATUAÇÃO DO PSICÓLOGO ESCOLAR NA REDE PARTICULAR DE ENSINO

3- Intervenção junto aos pais

Chamamos de “intervenção junto aos pais” as atividades realizadas pelo psicólogo que se relacionam diretamente ao contato com os pais de alunos, sejam elas em forma de atendimentos, reuniões, palestras etc. Pelo relato dos psicólogos deste estudo, percebemos que há muitas variações desta modalidade de atuação no que tange aos seus objetivos e finalidades. A psicóloga Iracema, por exemplo, desenvolve um trabalho de acolhimento aos pais e orientação sobre aspectos psicológicos e pedagógicos dos alunos:

A gente, durante o ano, entra em contato com os pais, mas daí depende muito do por quê. Pode ser um aluno que dá muito trabalho, ou aquele que está muito quieto, nota baixa, mas o principal é em relação à parte pedagógica mesmo (Iracema).

A maioria dos psicólogos que atua junto aos pais realiza entrevistas individuais com estes para orientação e encaminhamento dos estudantes a especialistas como médicos e psicoterapeutas. Assim, muitas vezes, o contato com os pais sucede ao atendimento do aluno, sobretudo quando o psicólogo identifica a necessidade de direcioná-lo para a avaliação de um especialista, como podemos observar nos seguintes excertos:

Eu sempre tenho atendimento com o aluno, depois atendimento com os pais, aí só depois eu encaminho para algum profissional fora (Iracema).

Acontece de ter um aluno com deficiência de aprendizagem, algum déficit de atenção, alguma coisa. O professor observou isto, traz, a gente senta, conversa, chama os pais, orienta para uma possível avaliação médica (Vanusa).

Os atendimentos são realizados por meio de convocação do psicólogo ou procura espontânea dos pais por orientação, como percebemos no seguinte relato:

Às vezes, é aquele pai que chega aqui perdido sem saber o que faz. Ele fala assim: “oh, me ajuda, eu preciso ajudar meu filho”. Às vezes ele está por um caminho totalmente equivocado e a gente tem a obrigação de mostrar, não é nem um melhor caminho, mas os caminhos que ele tem (Iracema).

Encontramos também no relato de atendimento de um dos psicólogos entrevistados a predominância de uma postura clínica tradicional sobre os problemas escolares:

Eu trabalho com os pais e com os alunos. Tudo em atendimento de uma vez por semana. Com os pais eu faço algumas entrevistas, tem famílias que eu acho preferível trabalhar com orientação de pais e não pegar a criança. Tem famílias que eu fico com a criança depois de falar com os pais. Vai muito do que eu percebo. E, às vezes, encontro resistência. Às vezes, eles acham que vão falar, depois resolvem que não vão mais mexer com isso não (Camila).

Além dos trabalhos de atendimento e orientação, os psicólogos João e Marisa realizam uma atividade com os pais uma vez ao ano, destinada a esclarecê-los sobre aspectos que envolvem o vestibular, como a influência dos pais na escolha profissional dos filhos. As reuniões coletivas em que os pais são convidados a participar da vida escolar de seus filhos também são citadas por um dos psicólogos que, por sua vez, queixa-se da falta de envolvimento familiar nestes espaços:

Infelizmente, na reunião de pais só vêm os pais dos alunos que estão em boa situação. Então vem o pai para ouvir o elogio sobre o filho dele, porque ele não está com nenhum problema de desempenho. O pai que precisava vir aqui ouvir que ele precisava cuidar mais do filho dele, ele não vem (João).

Já a psicóloga Jussara realiza intervenção junto aos pais por meio de um espaço para o qual são convidados profissionais para conversar com estes sobre temas de interesses deles:

(...) são palestras informativas e ao mesmo tempo é um momento de acolhimento das dúvidas, dos anseios maiores deles em relação à educação dos filhos, então a gente chama psicólogo, psiquiatra, nutricionista para estar atendendo a demanda deles mesmos.

A psicóloga Helena também organiza encontros que contam com a presença de profissionais especializados em determinadas temáticas, a fim de exporem o assunto e refletirem, junto aos pais, acerca das questões educacionais relacionadas ao assunto em pauta. Contudo, assim como João, ela também ressalta que a participação dos pais é mínima e considera que as maiores dificuldades de seu trabalho encontram-se neste segmento, devido a pouca adesão e participação da família dos alunos nos projetos que ela elabora. Helena acredita ser muito importante insistir neste trabalho, ainda que apresente dificuldades: “quando eu comecei esse projeto, eu ficava angustiada, triste, mas hoje eu penso: você tem

que atingir alguém, um fala para o outro (...)”.

A família, entendida como uma instituição social histórico-culturalmente produzida possui um caráter educativo, sendo considerada um contexto de desenvolvimento fundamental no processo ensino-aprendizagem do ser humano (Szymanski, 2009). Assim, acreditamos que o psicólogo escolar deve investir seus esforços na realização de projetos junto a este segmento. Dessen e Polônia (2007) apontam que escola e família são microssistemas que podem colaborar entre si como propulsores do desenvolvimento e da aprendizagem humana. Como redes de apoio, são constituídas por interações entre as pessoas que auxiliam na construção de repertórios para o enfrentamento dos desafios cotidianos. Contudo, as autoras admitem a existência de barreiras entre as duas instâncias que, para serem minimizadas, exigiria uma transformação da cultura escolar, refletindo na construção de

novas formas de conceber o processo ensino-aprendizagem. Neste sentido, afirmam que é preciso que se estabeleça um maior estreitamento entre família e escola, de modo que os valores e as práticas educativas adotadas pela família sejam conhecidos pela escola, pois a aproximação e a parceria entre ambas favorecem, sobretudo, ao aluno. Assim, apontam para a continuidade do processo educativo via fortalecimento das associações de pais e mestres e a adoção de outras estratégias que promovam maior integração família-escola

Contudo, o que observamos na maioria dos relatos dos profissionais que participaram deste estudo, é que as intervenções junto à família são muito restritas e, geralmente, limitadas a contatos de maior urgência (como para encaminhar os filhos a outros profissionais especializados, sobretudo para psicoterapeutas), corroborando a assertiva de Patto (1992) segundo a qual a convocação de pais à escola para ouvirem queixas dos seus filhos e serem orientados para encaminhá-los aos serviços médicos e psicológicos consiste na principal forma de relação da escola com as famílias.

Deste modo, percebemos que o psicólogo tem atuado, junto aos pais, numa perspectiva mais remediativa, tendo em vista que o atendimento individual de pais nos moldes tradicionais é a estratégia mais comumente utilizada pelos profissionais, embora existam algumas iniciativas voltadas para uma prática diferenciada, como o desenvolvimento de encontros nos quais os pais discutem temas educacionais envolvendo a participação de especialistas nos assuntos relacionados. Assim, torna-se urgente que os psicólogos escolares reflitam sobre as razões que dificultam um trabalho mais abrangente junto às famílias e, a partir desta compreensão, busquem formas de interação com características mais promotoras e que considerem o papel social da escola e da família na Educação.