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Capítulo III

O termo prevenção é utilizado amplamente e desde há bastante tempo em diversas disciplinas científicas. No âmbito da psiquiatria, o conceito de prevenção foi apropriado por Gerard Caplan do campo da Saúde Pública (em que se utilizam procedimentos tais como a vacinação, educação para a saúde, higiene, etc.) para ser aplicado aos problemas psicopatológicos.

A intervenção preventiva comportamental tem como objectivo eliminar ou diminuir o risco de aparecimento de alterações comportamentais ou de saúde para toda a Comunidade, tentando conseguir a máxima integração ecológica entre as pessoas e o seu ambiente, utilizando para este efeito duas estratégias de intervenção. Na primeira, tentando modificar os factores ambientais que dificultam o pleno desenvolvimento do indivíduo; na segunda, tentando promover competências e comportamentos com o objectivo de que a pessoa seja eficaz no seu mundo pessoal, social e físico.

Uma acção preventiva supõe o conhecimento de: a) as variáveis geradoras do problema e a sua possível evolução, b) os comportamentos que se deveriam desenvolver na população a fim de que os danos fossem os menores possíveis, c) os procedimentos ou métodos de modificação desses comportamentos, e d) os procedimentos metodológicos que tornem possível avaliar os efeitos da intervenção.

Se face a qualquer problema se saúde, a atitude preventiva é inteligente e adequada, perante o consumo de substâncias psicoactivas adquire grande relevo, uma vez que estamos perante uma actividade que provoca graves danos pessoais e sociais de difícil resolução, com tratamentos de longa duração e de resultados incertos... O problema do consumo de drogas requer actuações preventivas eficazes que incidam de forma directa sobre os factores precipitantes (ambientais e pessoais) de início e consumo das diferentes substâncias.

~~ " ~ Capítulo III Face ao actual momento em que vivemos, a prevenção primária da toxicodependências supõe, por um lado, por em prática acções que visem a limitação da disponibilidade das drogas {redução da oferta) através, fundamentalmente, de medidas legais; por outro lado, implica a realização de acções encaminhadas à

redução da procura (medidas sociais e educativas) aumentando a resistência colectiva e o autocontrole

individual perante as drogas. As medidas sociais devem ter como objecto o estudo e posterior alteração das condições sociais facilitadoras do consumo.

Juntamente com as medidas sociais e legais, as medidas educativas são a base do trabalho preventivo. As medidas educativas têm como objectivo modificar as atitudes dos indivíduos e da colectividade. As medidas educativas, que vão ser objecto da nossa atenção, foram modificando os seus objectivos e estratégias de actuação em função do modelo teórico de trabalho, modelos teóricos que enfatizam de distinta forma as múltiplas variáveis que influenciam o surgir do problema, estabelecendo, por sua vez, as premissas para as actuações preventivas.

MODELOS EXPLICATIVOS

Historicamente, foram sendo gerados distintos modelos referidos a diversas dimensões do problema, centrando-se cada uma destas focalizações em algum tipo de subconjunto ou aspecto dos fenómenos gerais. Os modelos mais importantes são:

a) Modelo ético-legal. Conceptualização vinculada aos profissionais do direito e da segurança. Segundo os pressupostos teóricos deste modelo, as causas do abuso de drogas residem nas atitudes anti-sociais e/ou imorais de determinados grupos delictivos. O problema é considerado, basicamente, como qualquer acto delictivo que requer uma intervenção baseada na aplicação de procedimentos legais. Este modelo não aprofunda uma análise detalhada da toxicodependência e dos seus processos determinantes, não sendo esta problemática objecto do seu interesse: as drogas e o seu consumo são importantes e reclamam a sua atenção na medida em que se apresentam como causa de graves danos para os indivíduos e para a sociedade. A intervenção preventiva

' Capítulo III baseia-se na aplicação de medidas de caracter repressivo e punitivo, operando através do sistema judicial (Méndez, et ai. 1993).

b) Modelo médico. Conceptualização elaborada por profissionais de saúde ao ter que enfrentar os problemas gerados pelo consumo de drogas. Considera a toxicodependência como uma doença, caracterizada por uma perda de controle perante a substância causadora da dependência. Para esta conceptualização as causas são basicamente pessoais e resultantes também das características farmacológicas dos produtos. Considera o risco de que um consumo, inicialmente ocasional, de drogas que provocam dependência, possa incrementar a sua frequência chegando a produzir uma grave dependência das substâncias. Face à intervenção preventiva, este modelo parte do valor que as pessoas concedem à sua saúde, e considera que a prevenção para a saúde - entendida basicamente como informação objectiva sobre os efeitos nocivos de determinadas drogas sobre o organismo -, deve incidir na modificação de atitudes e na mudança de comportamentos, evitando o seu uso e abuso (Méndez, et ai. 1993).

c) Modelo sociocultural. Os problemas associados a droga devem-se fundamentalmente a condições socio-económicas e culturais precárias. É um modelo fundamentalmente ambientalista, destacando a influência do ambiente no comportamento do indivíduo, influenciado por elementos sociológicos (pertença a um grupo ou subcultura), económicos e culturais (costumes e tradições) de todo tipo. Este modelo considera a existência de uma subcultura específica da droga, conceptualizada em termos da sua separação e isolamento das normas sociais convencionais. Desta forma, o sujeito fica vinculado ao seu ambiente e à realidade social em que vive, definindo-se a partir da sua pertença a um determinado grupo social. Assim, a génese do consumo é remetida para os aspectos funcionais e funcionais da pertença ao dito grupo social ou subcultura com identidade própria. As acções preventivas sustentadas neste modelo perseguem, fundamentalmente, a consecução de mudanças nas condições sociais dos jovens e em actuações gerais dirigidas a essas populações marginais como o objectivo de promover a sua integração social (Méndez, et ai. 1993).

Capítulo III

d) Modelo psicológico ou psicossocial. Considera a toxicodependência como um problema do

comportamento humano num contexto social e cultural complexo e variável. As acções preventivas tentam descobrir factores causais subjacentes de tipo pessoal e factores psicossociais: carência de coesão familiar, pressão do grupo, crise de identidade da adolescência, falta de comunicação, etc. A partir da psicologia foram formuladas muitas teorias e modelos, com distinto ênfase colocado em alguns dos elementos considerados importantes para explicar a origem, o desenvolvimento e a manutenção do comportamento adictivo (Méndez, et ai. 1993). Recentemente, a psicologia tenta superar os modelos sectoriais, formulando uma abordagem mais global do problema a partir de uma perspectiva integradora {modelo bio-psico-social). Assim, juntamente com os componentes cognitivos e afectivos, são considerados os aspectos ambientais que definem a realidade social do indivíduo, incluindo também os seus componentes biológicos. Este sub-modelo comportamental

integrador, pela sua afinidade com o de saúde pública, proporciona a base teórica dos programas de intervenção educativa-comportamental (Santecreu, et ai., 1992).