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2.6. TEORIAS DO RESTAURO: UMA BREVE REVISÃO

2.6.5. Intervenções na atualidade

As reflexões atuais no campo da conservação trazem novas contribuições à questão ora abordada. Arquitetos restauradores em atividade, cujo trabalho no campo do restauro é conhecido e respeitado, reconhecem, em seu discurso, a necessidade de adequação dos espaços às questões de acessibilidade. Incluem em seus projetos, a exemplo do arquiteto italiano Marco Dezzi Bardeschi, a introdução de novos elementos que atendam a essa necessidade e exigência da vida contemporânea. Em visita à Universidade Federal da Bahia, no ano de 2014, ao participar de Seminário promovido pelo Programa de Pós-graduação em Arquitetura e Urbanismo (PPGAU), Bardeschi, professor catedrático de Restauração Arquitetônica do Politécnico de Milão, deixa claro, em seu discurso e nos exemplos por ele apresentados, que a introdução de novos elementos aos edifícios históricos é uma necessidade. Cita projetos desenvolvidos por seu escritório em que criou elementos contemporâneos integrados à arquitetura histórica, a exemplo do Palazzo della Ragione em Milão.

Bardeschi (2014) observa que o patrimônio é coletivo, que deve ser tutelado e transmitido em sua plena riqueza, ou seja, na sua autenticidade. Destaca que, para o arquiteto, a obra é aberta, ou seja, outros arquitetos no futuro também farão intervenções. No seu processo projetual ele “ouve” a arquitetura, tenta entender elementos não perceptíveis. Em sua metodologia de projeto, tem particular atenção, respeito e cuidado com o documento (monumento, edifício, obra) como chegou até os dias atuais. Completa, dizendo que arquitetura é, sobretudo, comunicação e que é necessário decodificar os sinais que a arquitetura representa.

Bardeschi considera que o projeto de conservação é também acompanhado dos aditamentos necessários a permitir a continuidade de utilização do edifício. O novo deve denunciar-se como tal, mover-se em um diálogo positivo com o velho (BARDESCHI, 2014). O novo uso dos monumentos deve ser compatível e complementar para a conservação e implica na inclusão de novos elementos.

Na ocasião desse Seminário em Salvador, Bardeschi comenta sobre a já citada Carta de Veneza e refere-se brevemente à Carta Italiana de Restauro de 1972. Assim, entende-se que é relevante apresentar nesse trabalho dissertativo o que a Carta Italiana de Restauro defende sobre novos usos e acréscimos ao patrimônio.

A Carta de Restauração de 1972 defende o conceito de restauração como sendo toda e qualquer intervenção voltada a manter em eficiência, a facilitar a leitura e a

transmitir integralmente ao futuro as obras e os objetos definidos na própria Carta (dentre eles os monumentos arquitetônicos).

O artigo 7º apresenta, em seu texto, que se admitem operações tais como acréscimos ou reintegrações da seguinte forma:

Acréscimos de partes acessórias com função estática e reintegrações de pequenas partes historicamente confirmadas, executadas, segundo o caso, seja determinado de modo claro o perímetro das integrações, seja adotando material diferenciado, embora harmônico, claramente distinguível a olho nu, em particular nos pontos de ligação com as partes antigas, ademais com siglas e datas sempre que possível. (BRANDI, 2004, p. 230).

Os acréscimos são permitidos desde que comprovadamente necessários e realizados com material que se possa distinguir e esteja em harmonia com o antigo, evitando o falso histórico.

A mesma Carta alerta para a possibilidade de novas utilizações para os edifícios monumentais, caso não sejam incompatíveis com os interesses histórico-artísticos e sempre com o objetivo de assegurar a sobrevivência dos monumentos.

As obras de adaptação deverão ser limitadas ao mínimo, conservando escrupulosamente as formas externas e evitando alterações sensíveis das características tipológicas, do organismo construtivo e da sequência dos percursos internos. (BRANDI, 2004, p. 242).

Nota-se a necessidade de renovação funcional nos casos em que é indispensável aos fins de manutenção do edifício. Porém, funções que deformem excessivamente o equilíbrio tipológico-construtivo do edifício não deverão ser permitidas.

A partir dessas considerações, elaborou-se um quadro resumo das teorias apresentadas anteriormente (Quadro 1). Esse quadro resumo foi complementado com as recomendações para as intervenções na atualidade definidas pela autora dessa pesquisa.

Quadro 1: Quadro Resumo – Teóricos do Restauro – séculos XIX ao XXI

TEÓRICO PENSAMENTO

Viollet-le-Duc (1814-1879)

Defende:

 a necessidade de uso das edificações;  a intervenção em lacunas;

 o restauro no estilo pré-existente na aparência e na estrutura;

 o uso de novos materiais;

 ceder às necessidades presentes;  não dissimular o novo elemento. Ruskin

(1819-1900)

Critica intervenções de restauro.

Defende não negligenciar o monumento para evitar a necessidade de restauro

Boito (1836-1914)

Longa vida ao monumento com o apoio da Ciência Novo x velho: diferença de estilos e de materiais

Registro de datas, fotografias e outros documentos informativos. Riegl (1858-1905) Valores em equilíbrio:  Valor histórico  Valor artístico  Valor de antiguidade  Valor de memória  Valor de contemporaneidade Defende:  integridade do monumento;  apenas a preservação;  intervenção moderada.

Sinais novos, numa obra antiga, são perturbadores. Brandi

(1906-1988)

Restauro crítico

O restabelecimento da funcionalidade da obra representará, no restauro, um lado secundário.

A intervenção de restauro depende de que ocorra o reconhecimento ou não da obra de arte como obra de arte.

As duas instâncias, a histórica e a estética deverão nortear o restabelecimento da unidade potencial da obra de arte, sem criar um falso histórico ou uma ofensa estética.

Intervenções na atualidade de acordo com a análise da autora

Necessidade de obedecer à legislação.

Aditamentos para permitir a continuidade do uso. Inclusão ou acréscimo de novos elementos. O novo em diálogo com o velho.

Novo uso compatível com a preservação.

Material diferenciado, mas em harmonia com os antigos. Renovação funcional para a manutenção do edifício. Fonte: elaborado pela autora, 2015.

Após essas reflexões, será tratado o tema acessibilidade a edifícios históricos, com uma anterior apresentação acerca de rotas acessíveis, notadamente aquelas implantadas em cidades e sítios históricos.