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3.2 Alterações do intestino delgado

3.2.7 Intussusceção

A ecografia é um método muito específico no diagnóstico de intussusceção (Manczur e Vörös, 2000). A maioria das intussusceções encontrada em animais jovens (Figura 63) ocorre normalmente secundariamente a doença intestinal como enterite bacteriana, vírica ou parasitária (Nyland et al., 2015). Levien e Baines (2011) defendem que a intussusceção em gatos é mais comum em geriátricos em associação a neoplasia. Em gatos jovens é normalmente idiopática (Lunk et al., 2015). A intussusceção pode estar associada a enterite ou gastroenterite aguda e provocar diarreia hemorrágica (Rallis et al.2000). Pode ocorrer também secundariamente a corpos estranhos (Figuras 64 e 65), quistos mesentéricos (Lamb e Mantis, 1998), alterações de dieta (Frame, 2006) administração de fármacos prócinéticos (Lukanc et al., 2015).

Uma vez que o estômago, o duodeno e o intestino grosso conseguem ser identificados, em condições normais, a posição anatómica duma intussusceção pode ser determinada usando estas estruturas como ponto de referência (Frame, 2006). A intussusceção é relativamente comum ao nível da junção ileocecocólica, denominando-se consoante o segmento intestinal envolvido, sendo as mais comuns a enteroentérica (jejunojenunal) e ileocólica (Lamb e Mantis, 1998). A intussusceção gastroduodenal (Allman e Pastori, 2013; Watson, 1997) e pilorogástrica (Applewhite et al., 2001; de Brito Galvao et

al., 2011; Lee, 2005) também estão descritas.

Em secção transversa, uma intussusceção surge como uma lesão circular que lembra um anel e que representa as múltiplas camadas intestinais do intussusceptum no

intussuscipiens. É importante confirmar o aspeto de múltiplas camadas em dois planos para

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edematoso e hipoecóico, enquanto o intussusceptum é frequentemente hiperecóico (Frame, 2006). Os segmentos internos aproximam-se mais do aspeto normal. O intussusceptum é normalmente o segmento proximal e o intussuscepiens o distal, se a intussusceção ocorrer no sentido do normal peristaltismo (Fossum, 2013). O tecido hiperecóico invaginado representa gordura (Gaschen e Rodriguez, 2011). Está também descrito, para a secção longitudinal, que as múltiplas camadas paralelas hipo e hiperecóicas podem mimetizar um tumor, ou adquirem a aparência de “pseudorim” ou de “tridente” (M. Patsikas et al., 2003). Na intussusceção gastroduodenal (Watson, 1997) e pilorogástrica, o estômago pode estar distendido e preenchido de fluido, estando o duodeno proximal e o piloro dentro do antro pilórico e fundo (Lee, 2005).

A ecografia permite determinar o comprimento da intussuscepção, a patência do lúmen intestinal, a presença de peritonite e o envolvimento ganglionar. As secções de intestino afetadas tendem a ser curvas devido à tensão exercida pelo mesentério, o que normalmente restringe o seu comprimento aos 12 cm ou menos. A linfadenomegalia pode estar presente (Frame, 2006).

Se ocorrer necrose da parede intestinal pode observar-se perda da normal estratificação das camadas e líquido abdominal livre, no caso de se ter desenvolvido uma peritonite. Uma vez que imagens de má qualidade podem mimetizar perda das camadas, as alterações ecográficas sugestivas de necrose devem ser interpretadas com cuidado (Frame, 2006). A existência de fluido entre os segmentos envolvidos na intussusceção indica que a mesma é provavelmente recente e que terá um melhor prognóstico (Farrow, 2003).

Um intestino saudável, enterite por corpo estranho e útero pós parto podem produzir uma imagem em alvo em alguns planos, o que pode simular uma intussusceção (Patsikas et

al., 2004). Os corpos estranhos lineares podem, por vezes, mimetizar uma intussusceção se

existir um plissado muito marcado do intestino. No entanto, as camadas na parede não formam um anel concêntrico completo (Nyland et al., 2015). O intestino pregueado após uma cirurgia recente também pode mimetizar uma intussusceção (Farrow, 2003).

Para prevenir diagnósticos errados, o operador deve visualizar a imagem suspeita em múltiplos planos e verificar se os anéis concêntricos são completos, procurando o centro hiperecóico semilunar ou em forma de “G” (Patsikas et al., 2004).

Está descrita a intussusceção dupla em três cães. Em secção transversa observam- -se três anéis concêntricos, ou seja, existe um terceiro segmento intestinal a envolver o

intussuscipiens (Atray et al., 2012).

Está descrita a redução espontânea de intussusceções em cães, pelo que os autores recomendam que após a anestesia, e antes da cirurgia, se reavalie ecograficamente a lesão (Patsikas et al., 2008).

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Figura 64 – Intussusceção. [QVSH] Figura 63 – Intussusceção intestinal. [QVSH]

A figura acima mostra a junção ileocecocólica duma cadela de raça Basset Hound de 5 meses de idade com história de diarreia não responsiva a antibioterapia e alteração da dieta. Entretanto as fezes passaram a conter sangue e muco. No exame físico não aparentava possuir desconforto abdominal. Nesta imagem observa-se em secção transversa (A) e longitudinal (B) a relação entre o intussuscipiens, intussusceptum e estruturas envolventes. Observa-se uma repetição de camadas que não deveria existir, ao nível da junção ileocecocólica. Na imagem longitudinal observa-se o íleo a estender-se para dentro do cólon, que contém gás. A gordura, hiperecóica, está invaginada no segmento juntamente com o intussusceptum, observando-se melhor em secção transversa. A parede do íleo encontra-se ligeiramente espessada e corrugada, mas as camadas mantêm-se normais. Esta era uma intussusceção intermitente/deslizante, em que o íleo entrava e saía do lúmen colónico. Os linfonodos regionais apresentavam-se ligeiramente aumentados. Após investigação foram diagnosticadas giardíase e salmonelose, o que terá estado na origem do aumento da motilidade intestinal e que provavelmente originou a intussusceção.

A figura acima mostra o jejuno, em corte transverso, dum cão de raça Boxer de 4 anos de idade com história de vómito desde há quatro dias, inapetência e letargia. A palpação abdominal levantou a suspeita de corpo estranho, o que foi confirmado radiograficamente, tendo sido identificado um corpo estranho linear desde o duodeno

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proximal até ao jejuno distal, na ecografia. Isto terá provocado a intussusceção que se vê na imagem. Observa-se o lúmen intestinal, ecogénico, as camadas do intussusceptum, que se conseguem delimitar bem. O intussuscipiens apresenta uma ecotextura mais homogénea. É também possível visualizar parte do corpo estranho hiperecogénico no lúmen do

intussusceptum, a provocar sombreamento acústico. Neste animal teve de se proceder a

enterectomia por falta de viabilidade intestinal.

Figura 65 – Intussusceção. [A - CHV; B - HVUTAD]

A Figura 65 (A) corresponde a uma intussusceção associada à ingestão de um corpo estranho (neste caso meias), que o animal defecou. Ainda assim foi realizada enterectomia para resolução da intussusceção, por falta de viabilidade intestinal. É bem visível a gordura hiperecogénica abaixo do intussusceptum, na imagem da esquerda e na da direita, a rodear o intussusceptum. Em (B) observam-se dois círculos anecogénicos, que correspondem aos vasos mesentéricos, e algum líquido abdominal livre à volta do segmento intestinal. Estes casos mostram a importância de pesquisar uma intussuceção em situações de corpos estranhos. Embora possa apresentar resolução espontânea nalguns casos, a intussusceção requer uma resolução cirúrgica, cabendo ao operador identificá-la e classificá-la em termos de redutibilidade e viabilidade (o que será descrito à frente).

A ecografia em modo Doppler pode ser usada para determinar se os vasos mesentéricos na intussusceção apresentam fluxo ou não (Gaschen e Rodriguez, 2011), o que permite predizer a redutibilidade (Dennis et al., 2010).

A hiperplasia crónica da mucosa com protusão luminal pode simular uma intussusceção (Penninck, 2008). Em animais mais velhos é necessária uma avaliação cuidadosa do segmento afetado, devendo pesquisar-se infiltrações nodulares na parede e linfadenopatia, uma vez que um processo neoplásico pode estar na origem da intussusceção (Gaschen e Rodriguez, 2011).

A duplicação intestinal ou divertículo fornece também a imagem de repetição das camadas. É característico ver-se uma camada interior e outra exterior, hiperecóicas, e uma

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intermédia, hipoecóica. O interior contém fluido, que pode ser anecogénico ou ser ecogénico, lembrando um abcesso ou uma piómetra (Farrow, 2003).

Figura 66 – Pseudointussusceção. [HVUTAD]

Na imagem de cima, em (A) observa-se um corte oblíquo de uma junção ileocecocólica, a secção longitudinal (B) e transversa (C) doutra junção ileocecocólica. Existe uma pequena reentrância do íleo no cólon, que não deve ser confundida com uma intussusceção. Trata-se de uma falsa intussusceção e não é patológica.

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