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Invariante topol´ ogico do bulk e a correspondˆ encia bulk-edge

No documento Férmions de Majorana e a cadeia de Kitaev (páginas 34-43)

Agora vamos generalizar o crit´erio discutido anteriormente para a existˆencia de modos de majo- rana, encontrando um invariante topol´ogico para o bulk a ser calculado diretamente de H(k).

25

Figura 4.7: Ilustra¸c˜ao da fun¸c˜ao de onda do modo de Majorana localizado na interface entre dois dom´ınios [23].

Figura 4.8: Ilustra¸c˜ao do Majorana formado na interface entre os dom´ınios topol´ogico e trivial [23].

No que se segue, determinamos o invariante topol´ogico associado `a transi¸c˜ao de fase da Cadeia de Kitaev, utilizaremos o fato de que podemos levar o hamiltoniano da cadeia nos extremos da primeira zona de Brillouin a uma forma antissim´etrica. Para matrizes antissim´etricas, existe uma quantidade, o Paffiano, que definimos a seguir:

Seja A uma matriz antissim´etrica 2n × 2n, o Pfaffiano de A ´e definido por [24]:

pf(A) = 1 2nn! X σ∈S2n sign(σ) n Y i=1 aσ(2i−1),σ(2i), (4.15)

onde S2n ´e o grupo sim´etrico de dimens˜ao 2n e aij representa as entradas da matriz A.

O sinal do Pfaffiano 4.15, muda de sinal sempre que o gap no espectro do hamiltoniano se fecha [23], o que nos indica que o sinal de 4.15 seja um invariante topol´ogico para o nosso sistema. Por outro lado, este ´e exatamente o comportamento do parˆametro de massa m do problema, o que sugere relacionar m com um Pfaffiano.

O Pfaffiano pode mudar apenas quando algum autovalor de H(k) passa por zero. Mas por causa da simetria part´ıcula-buraco, para cada autovalor E(k) existe outro em −E(−k). Portanto, se E(k) passa por zero, seu parceiro tamb´em o faz. Al´em disso, o espectro deve ser peri´odico na zona de Brillouin, o que significa que fechamentos de gap ocorrem em pares, e portanto, n˜ao podem mudar o Pfaffiano. As ´unicas exce¸c˜oes s˜ao os pontos k = 0 e k = π, que s˜ao mapeados em si mesmos pela simetria part´ıcula-buraco. Para esses pontos temos

τxH∗(0)τx= −H(0)

26 Portanto, H(0) e H(π) podem sempre ser postos em forma antissim´etrica individualmente e podemos sempre calcular o Pfaffiano para estas matrizes facilmente. Nota-se, tamb´em, que estes s˜ao exatamente os pontos em que o gap de fecha, em k = 0 para µ = −2t e em k = 0π para µ = −2t. Por estes motivos focaremos apenas em H(0) e H(π),

˜ H(0) =1 2   1 1 i −i     −2t − µ 0 0 2t + µ     1 1 i −i  = −i   0 −2t − µ 2t + µ 0  , (4.16) ˜ H(π) = 1 2   1 1 i −i     2t − µ 0 0 2t + µ     1 1 i −i  = −i   0 2t − µ −2t + µ 0  . (4.17) Obtemos facilmente Pf[iH(0)] = −2t − µ Pf[iH(π)] = 2t − µ.

Observe que o Pfaffiano de H(0) muda de sinal quando µ = −2t e o de H(π) quando µ = 2t, em concordˆancia com a estrutura de bandas.

Cada Pfaffiano calculado acima est´a associado ao fechamento de um gap, de forma que o invariante topol´ogico do bulk como um todo (Q)´e dado pelo produto

Q = sign(Pf[iH(0)]Pf[iH(π)]). (4.18) Se Q = −1 significa que o bulk se encontra na fase topol´ogica, de forma que se cort´assemos o fio em qualquer ponto, ter´ıamos dois modos de Majorana desemparelhados nas bordas. Se Q = +1 significa que o sistema est´a na fase trivial.

Resta agora encontrar o significado f´ısico do invariante Q. Sabemos que o Pfaffiano de um hamil- toniano de Bogoliubov de Gennes est´a associado `a paridade fermiˆonica do estado fundamental do sistema [23]. Ao tomarmos o produto 4.18 estamos de alguma forma comparando as paridades fermiˆonicas dos estados com k = 0 e k = π, e temos que que Q = −1 se e somente se as duas paridades s˜ao diferentes. Isto significa que se deformamos continuamente H(0) em H(π) sem quebrar a simetria el´etron buraco, devemos encontrar um cruzamento do n´ıvel de Fermi no espectro de energia, que corresponde `a mudan¸ca de paridade fermiˆonica (fermion parity switch), ou no nosso caso, `a uma transi¸c˜ao de fase topol´ogica.

Em resumo, descobrimos que a cadeia de Kitev ´e capaz de comportar modos de Majorana de- sacoplados tanto como estados de borda, quanto em pontos de transi¸c˜oes de dom´ınio entre fases triviais e topol´ogicas. A existˆencia destes modos ´e protegida pela simetria el´etron buraco e est´a associada ao invariante topol´ogico 4.18, cuja interpreta¸c˜ao f´ısica ´e diferen¸ca entre as paridades fermiˆonicas dos estados dos extremos da zona de Brillouin (k = 0 e k = π).

Cap´ıtulo 5

A cadeia de Kitaev no mundo real

Neste cap´ıtulo, discutimos como construir a cadeia de Kitaev utilizando materiais e m´etodos dispon´ıveis em laborat´orio.

5.1

Desenvolvendo o modelo

Conforme visto no cap´ıtulo 4, a cadeia de Kitaev ´e um modelo bastante simples, por´em, a neces- sidade que os f´ermions de Majorana imp˜oe sobre o acoplamento de spins ´e experimentalmente bastante desafiadora. Tentaremos contornar cada um dos problemas discutidos na se¸c˜ao anterior, equipando o modelo com elementos externos at´e torn´a-lo fisicamente realiz´avel. Come¸camos com a cadeia de Kitaev pura e simples, cujo hamiltoneno no espa¸co de momentos se escreve

HKitaev= (−2t cos k − µ)τz+ 2∆τysin k. (5.1)

Primeiramente, queremos um sistema com parˆametros control´aveis, o que nos leva a utilizar um semicondutor. Nestes sistemas o valor do potencial qu´ımico pode ser variado por meio de dopagem ou variando voltagens adequadamente. Mas ainda precisamos da supercondutividade, podemos contornar este problema aproximando um supercondutor do sistema, formando uma estrutura h´ıbrida. Desta forma, por efeito de proximidade, ´e poss´ıvel fazer com que a supercondutividade seja induzida no semicondutor. Chamamos de efeito de proximidade, o fenˆomeno que ocorre quando colocamos um supercondutor em contato com um material comum (que n˜ao ´e um supercondutor). Em sistemas como este ´e poss´ıvel observar uma supercondutividade fraca no material comum ao longo de uma certa espessura [25].

A pr´oxima coisa que podemos considerar ´e que µ permanecer´a pequeno comparado `a largura de banda (µ  2t). O mesmo vale para o pareamento supercondutor (∆  t), pois a supercondutividade ´e um efeito fraco comparado com a energia cin´etica dos el´etrons. Podemos, ent˜ao, expandir o termo em cos k e trabalhar no limite cont´ınuo da modelo de Kitaev

H = k

2

2m− µ 

τz+ 2∆τyk. (5.2)

28 Spin eletrˆonico

Algo de que precisamos tratar em nosso modelo 5.2 ´e o spin eletrˆonico. O modelo precisa de uma cadeia de f´ermions onde apenas uma proje¸c˜ao ´e permitida. Uma maneira de incorporar o spin eletrˆonico ´e expandir o espa¸co de Hilbert tomando o produto tensorial entre o espa¸co de momentos e o espa¸co de spins. O problema com este procedimento ´e ele daria origem a uma degenerescˆencia dupla, que faria com que dois modos de Majorana pudessem ocupar as bordas da cadeia, em outras palavras, um f´ermion comum ocuparia os estados de borda.

A solu¸c˜ao consiste em tornar a cadeia de Kitaev para uma proje¸c˜ao de spin topologicamente trivial e para a outra, n˜ao trivial. Como µ ´e o parˆametro que controla o regime do sistema, digamos que a proje¸c˜ao de spin ↑ corresponda a µ > 0 e spin ↓ corresponda a µ < 0. Isto pode ser feito adicionando um acoplamento Zeeman entre o spin e um campo magn´etico externo

H = k

2

2m− µ − Bσz 

τz+ 2∆τyk. (5.3)

Um campo magn´etico B forte o suficiente ´e capaz de separar os spins, tornando poss´ıvel fazer com que uma proje¸c˜ao corresponda a µ > 0 e a outra a µ < 0 (ver figura 5.1)

(a) (b) (c)

Figura 5.1: Em 5.1a temos o sistema no regime topol´ogico em ausˆencia de campo magn´etico. Conforme B aumenta, vemos a separa¸c˜ao dos n´ıveis de energia devida ao efeito Zeeman (5.1b e 5.1c) [23].

Pareamento supercondutor

Precisamos encontrar uma maneira de produzir um pareamento tipo p efetivo utilizando super- condutores tipo s, dos quais dispomos. Supercondutores tipo s acoplam singletos

Hpar= ∆(c↑c↓− c↓c↑) + h.c. (5.4)

O que significa que precisamos mudar o pareamento. Come¸caremos com um mudan¸ca de base em HBdG : seja T = U K um operador de simetria de revers˜ao temporal, podemos aplicar a transforma¸c˜ao

unit´aria U aos buracos, de forma que na nova base, o hamiltoneno de Bogoliubov de Gennes fica

HBdG=   H ∆0 −∆∗ −H∗  , (5.5)

onde ∆0 = ∆U†. Com esta base ´e f´acil calcular o hailtoneano dos buracos, basta trocar os sinais de todos os termos que respeitam a simetria de revers˜ao temporal, deixando os termos que quebram a simetria

29 intactos, por exemplo, termos contendo B. Resumidamente, se o el´etrons possuem hamiltoniano H(B), ent˜ao o dos buracos ser´a −H(−B). Finalmente, a simetria el´etron-buraco se escreve P = σyτyK.

Como os termos em B trocam de sinal frente `a simetria de revers˜ao temporal, temos que o campo Zeeman tem a mesma forma para el´etrons e buracos na nova base, assim, o hamiltoniano fica

HBdG=

 k2

2m− µ 

τz+ Bσz+ ∆τx. (5.6)

Diagonalizando 5.6 para k = 0 obtemos quatro n´ıveis de energia

E = ±B ±pµ2+ ∆2. (5.7)

Sabemos que B=0 corresponde `a fase trivial, devido `a degenerescˆencia de spin. Assim, esperamos que o sistema estar´a na fase topol´ogica quando B2> ∆2+ µ2.

Intera¸c˜ao spin-´orbita

Vejamos o espectro de 5.6 para diferentes valores de k (figura 5.2a, 5.2b e 5.2c).

(a) (b) (c)

Figura 5.2: Comportmento da estrutura de bandas com B. Note a degenerescˆencia quando B = 0 (figura 5.2a). `A medida que B aumenta 5.2b e 5.2c o gap do bulk se fecha, mostrando que n˜ao ´e poss´ıvel o aparecimento dos modos de Majorana [23].

Note que o gap do sistema se fecha, o que pro´ıbe a existˆencia dos modos de Majorana. Se quisermos obtˆe-los precisamos encontra uma maneira de abrir o gap. Para este fim, podemos adicionar um acoplamento spin-´orbita da forma

HSO= ασyk, (5.8)

que atua como um campo de Zeeman apontando na dire¸c˜ao y com intensidade proporcional ao momento da part´ıcula. Este termo ´e invariante por revers˜ao temporal, pois tanto σy quanto k trocam de sinal. O

hamiltoniano final fica

Hf io=

 k2

2m+ ασyk − µ 

τz+ Bσz+ ∆τx. (5.9)

Quando k = 0 o termo de acoplamento spin-´orbita ´e nulo, portanto n˜ao influencia a fase do sistema (trivial ou topol´ogica). Veja agora a estrutura de bandas (figura 5.3)

30

(a) (b) (c)

Figura 5.3: Comportmento da estrutura de bandas com α. `A medida que α aumenta, o gap do bulk se abre [23].

Temos e presen¸ca de um gap, o que significa que os modos de majorana podem ser obtidos no sistema. Conclu´ımos que ´e poss´ıvel realizar a Cadeia de Kitaev utilizando elementos existentes no laborat´orio, incluindo um supercondutor de onda s no lugar de um supercondutor ex´otico que o modelo exigia, se adicionarmos elementos externos ao modelo, como campo magn´etico externo e acoplamento spin-´orbita.

Contudo, umas das principais dificuldades experimentais vem do fato de que o sistema exige pelo menos quatro parˆametros control´aveis [23]: o potencial qu´ımico µ, que determina a densidade eletrˆonica no fio; o gap supercondutor ∆, que ´e respons´avel pela forma particular assumida pelo emparelhamento supercondutor; a constante de acoplamento spin-´orbita α, respons´avel por quebrar a conserva¸c˜ao de spin e o campo magn´etico externo B, respons´avel por quebrar a degenerescˆencia de Kramers.

Cap´ıtulo 6

Conclus˜oes

Neste trabalho estudamos duas teorias de campo importantes no desenvolvimento da Mecˆanica Quˆantica Relativ´ıstica, exploramos os problemas com a equa¸c˜ao de Klein-Gordon e de que maneira Dirac os resolveu. Discutimos a ideia da existˆencia de antimat´eria e mostramos como os f´ermions de Majorana surgem neste contexto.

Nos cap´ıtulos 4 e 5 tratamos da realiza¸c˜ao dos modos de Majorana em sistemas de mat´eria condensada, foi feita uma apresenta¸c˜ao da Cadeia de Kitaev, onde mostramos que os f´ermions de Majorana surgem tanto como estados de borda da cadeia quanto como pontos de transi¸c˜ao entre dom´ınios.

Por fim, analisamos como realizar a Cadeia de Kitaev utilizando elementos dos quais disp˜oe-se em laborat´orio, vimos que ´e poss´ıvel, sobretudo, eliminar a necessidade de um supercondutor de onda p em favor de um supercondutor de onda s, que ´e o mais comum.

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