• Nenhum resultado encontrado

Jardins Sagrados e a Demonização da Serpente no Paraíso

No documento Download/Open (páginas 184-200)

CAPÍTULO II: A CONSTRUÇÃO DO COSMO CELESTE: TRANSCENDÊNCIA DA ALMA E A QUEDA NO PODER DA DEUSA

2 O AEDO CANTA O SURGIMENTO DAS MUSAS

2.2 Jardins Sagrados e a Demonização da Serpente no Paraíso

Remanescente de antigos rituais do Período Neolítico, como simbologia de representação da Deusa Mãe, a serpente foi cultuada em muitas civilizações durante o paganismo, sendo uma cerimônia bastante difundida desde a Idade do Bronze. Considerada como símbolo da fertilidade, perenidade ancestral e regeneração, está relacionada a diversos símbolos ritualísticos, conforme afirma Durand (2012, p. 319): “Uma união mística com a serpente ocupava o centro do rito dos mistérios de Elêusis e da Grande Mãe”. Os motivos polissimbólicos da serpente encontram-se nas regiões de antigos santuários, conforme demonstrado no primeiro capítulo.

Os principais achados arqueológicos da serpente, como divindade, encontram-se ao norte da Síria, além dos povos hititas, assírios e sumérios. Deixou, assim, uma memória subterrânea que permeou narrativas sobre os deuses que tinham o poder de cura e de magia, além de ser uma referência como mito da criação de algumas tradições.

Na figura (52) abaixo, encontra-se a deusa da árvore da tradição suméria, possivelmente seja a deusa Gala Bau, uma correspondência de Deméter e anunciadora da Grande Mãe Terra, que se encontra à esquerda da árvore e, por trás dela, está a serpente que representa os poderes da deusa, e não outra versão do jardim bíblico. De acordo com

Campbell (2008, p. 22): “Seu espírito é o do idílio, na visão muito anterior do jardim da inocência da Idade do Bronze, no qual os dois frutos desejados da tamareira mítica estão disponíveis para serem colhidos: o fruto da iluminação e o fruto da vida imortal”. À direita está uma figura masculina com uma coroa de chifres em forma de lua, com certeza esta figura representa Damuzi, seu filho amante, deus da vegetação, que morre e ressuscita eternamente. Essa imagem foi denominada como o “selo da Tentação”, que é explicado por Campbell (2008, p. 22):

Tampouco há nesses selos qualquer sinal de ira divina ou perigo. Não há nenhum tema de culpa relacionado com o jardim. A dádiva do conhecimento da vida está ali, no santuário do mundo para ser usufruída. E ela é concedida prontamente a qualquer mortal, homem ou mulher, que estenda a mão para pegá-la com a devida vontade e disposição de recebê-la.

Figura 52- a: “Selo da Tentação”; Deusa Suméria Gala Bau e Damuzi. b: A serpente enroscada na Árvore do Mundo; prato elamita. (COOK, 1997a, p.113; b, p.114)

Na figura (52b), observa-se o detalhe de uma pintura de um prato elamita do período sassânida tardio (226-641 d.C.) e nele encontra-se a serpente enroscando-se no tronco da Árvore do Mundo, entre dois frutos, sendo apresentada como o antigo guardião, conforme afirma Campbell (2008, p.19): “Nessa forma, o aspecto perigoso e alarmante da presença é aparente. Entretanto, como a serpente do Paraíso, Ningizzida é em geral benévolo para aqueles que se aproximam de seu santuário com o devido respeito”. O correspondente simbólico nos sinais encontrados nessa imagem assim é visto por M-GWosien (2004, p. 24): “De acordo com mitos, a árvore do mundo encontra-se no centro da terra. Em seus galhos, o sol, a lua e todas as estrelas crescem como frutas”. Nessa imagem, encontram-se os símbolos

do sol e da lua, demonstrando que a árvore se encontra no centro do mundo, local onde ‘a lua não fica minguante e o sol não atinge o ocaso’.

A serpente, como símbolo da transformação temporal, representa o fluxo e refluxo da vida, bem como o seu veneno, que pode ser mortal, reconhecido também como o elixir da vida e da juventude. “A serpente é, então, guardiã, ladra e detentora da planta da vida, como nas lendas semíticas, e o simbolismo ofídico vai assim ligar-se ao simbolismo vegetal da farmacopeia” (DURAND, 2012, p. 317). Na mitologia da Babilônia, a serpente rouba a planta da imortalidade; representa também a magia, que se interliga com a maldade e a desobediência na visão de outras tradições.

No Egito, a serpente, além de força política e coroar a cabeça dos faraós, simboliza sabedoria e divindade. Nas cidades pré-israelitas de Canaã, como divindade, a serpente representa a potência da fertilidade. A serpente é símbolo da religião da Cananeia e seus cultos de fertilidade foram avaliados como ritos de idolatria, nos quais a serpente era considerada sagrada. A serpente era uma divindade que possuía grande devoção e culto dentro e fora da cultura hebraica, no tempo dos reis; sua predominância é encontrada nos anéis e selos desses povos. No entanto, ao associar a serpente com as elites, a divindade da fertilidade e da sabedoria foi demonizada.

Em antigo gênero literário da religião grega, ela se apresenta como um importante símbolo do imaginário cretense, no qual a serpente, ou Deusa Serpente, é a representação da Deusa Mãe Minoica, como fertilidade potente do Sagrado Feminino, conforme apresentada no primeiro capítulo. A serpente foi venerada por um longo período como emanação da Deusa Mãe e da Terra viva, na qual a mulher era reverenciada e apreciada como sagrada a sua função de maternidade, assim como participava de todos os eventos, tanto na corte quanto na vida cotidiana. Posteriormente, na cultura patriarcal, ela perde seu poder hegemônico e se camufla nas artes, dentre elas, a dança tradicional grega, de acordo com estudos e pesquisas de Bernhard Wosien (2000) e Maria-Gabriele Wosien (1997; 2002; 2004).

De certa forma, pode-se afirmar que o mito da serpente, como símbolo de poder da Deusa, era muito importante e disseminado para ser ignorado. Este símbolo era visto como a fertilidade potente da Deusa Mãe e distribuidora do mistério da vida e da morte, o que lhe conferia muito poder. A necessidade de remodelar a mentalidade do mundo antigo levou a um conflito em relação à apropriação da serpente: seria um emblema da classe dominante, ou seria banida e demonizada? Ela foi apropriada por alguns deuses e deusas do Olimpo, como

também foi utilizada para legitimar alguns propósitos políticos das classes dominantes. Foi, ainda, um exemplo de uma deusa derrotada e desacreditada.

Encontra-se na antiga literatura referências sobre as impressões e os traços mais expressivos relacionados à serpente e à árvore da vida, bem como as tendências mais significativas e as implicações da responsabilidade sociorreligiosa em relação à cultura que foi influenciada, assim como as suas crenças e mitologias entremeadas de características similares. Em algumas, ela é a sabedoria, a prudência e a possibilidade de transcendência, em outras ela representa o mal, a traição e o pecado e, neste caso, muitas vezes se reportando à mulher como a sua legítima representante.

Realizando uma releitura da polissemia da serpente na Literatura Sagrada, Reimer (2006; 2009), em diálogo com os sinais e traços mais expressivos encontrados na arqueomitologia (GIMBUTAS, 2008), revolucionou as prospectivas sobre as origens das culturas europeias em que nesta a serpente é reproduzida na arte como signos dos antigos mistérios. Essa arte é encontrada nas joias, como também nos menires, nas rochas, nos túmulos e em suas imagens, concebidos como regeneração representativa de uma vida nova, de uma vida além da morte ou mesmo de uma vida duradoura.

Enrolada ao redor da árvore, a serpente é ambígua, uma vez que ela pode ser a representação da tentação, da elevação ou da queda. Também se encontra a serpente na Árvore da Vida como metáfora na tradução artística e celebrativa de diversos povos. Nessa visão, analisando a natureza misteriosa dessa árvore sagrada, Neumann (1998, p. 222) diz que:

O mesmo é válido para a árvore do conhecimento, no mito cristão, em que é identificada como a árvore da vida e da morte que é a cruz. De acordo com este mito cristão, a cruz foi erguida no local onde existiria a árvore do conhecimento; e Cristo, como “fruto místico” da árvore redentora da vida, substituiu a árvore do conhecimento, através da qual o pecado teve acesso ao mundo.

Na figura (53) abaixo, encontra-se a tradução medieval das duas tentações entre as quais o homem se debate constantemente, a Árvore da Vida e a Árvore da Ciência do Bem e do Mal, representadas como uma só, a árvore onde crescem os frutos da vida e da morte (COOK, 1997, p.76).

Figura 53 - Árvore das tentações, retirada do missal do arcebispo de Salzburg, 1481. Miniatura realizada por Berthold Furtmeyer. (COOK, 1997, p.76)

Várias pesquisas e estudos (Reimer, 2006, 2009; Eisler, 2007; Campbell, 2008; 2010; Wilber, 2010; Faur, 2011), com dimensões diferentes, explicam as relações entre o mito da serpente, o processo de fragmentação do Sagrado Feminino e a consequente demonização da mulher a partir de pressupostos tendenciosos que atendiam aos interesses da política patriarcal. Nesse sentido, reporta-se a Reimer68, que afirma: “O aproveitamento da serpente como simbologia do mal pode ser uma influência do zoroastrismo persa do período, no qual a serpente é entendida como um elemento telúrico, ligado à terra, e, como tal, tão abaixo dos astros celestiais, remete para dimensões obscuras da existência”. O tema da serpente e a sua associação com o sagrado feminino é tão ambíguo quanto a própria serpente.

O empenho em agregar a serpente como símbolo demoníaco a distintas tradições, que são estrangeiras em relação a Israel, deixa implícito que o mal vem de uma cultura estranha, e

68

REIMER, Haroldo. A serpente e o monoteísmo. Disponível em:

que o demônio é o outro, o que separa; ao demonizar o outro, a mulher tornou-se a extensão da serpente na cultura patriarcal.

Esse mito, considerado sagrado para muitas culturas, foi constitutivo na política patriarcal, tornando-se um símbolo demonizante e atuando em detrimento do Sagrado Feminino. A serpente é um mito polissêmico, uma vez que possui conotações qualitativas e plurais e assume o que o imaginário da sociedade projetou em linguagem de estrutura mítica. Questionado sobre o porquê de a serpente ser considerada um símbolo do mal, Reimer (2006, p.119) afirma que:

No mundo natural, que é o primeiro nível do elemento simbolizado, a serpente tem várias facetas. Isso se traduz para o nível simbólico-religioso, com o dado de que o elemento serpente pode comportar várias simbolizações, evidenciando uma polissemia simbólica.

A legitimação da serpente, como uma simbologia negativa e demonizada, foi intermediada entre os sacerdotes e a comunidade, na qual os sentidos do mito da serpente foram operados e narrados de acordo com interesses da dinâmica obstinada da política patriarcal e o entrevero ambíguo da serpente, permitindo, ao devoto, uma imaginação configurada para construir seu próprio sentido.

Com um olhar ampliado sobre essa questão, encontram-se teóricos das Ciências da Religião que se destacam por sua imparcialidade e sabedoria ao interpretar os antigos textos sapienciais, dentre eles destaca-se Reimer (2009f, p. 30) que afirma:

Pretende-se a validação do domínio do masculino sobre o feminino e a canalização do desejo da mulher para seu marido. Por trás disso está a concepção da estrutura familiar patriarcal típica para a sociedade do antigo Israel. Nesta projeção de relação binária entre masculino e feminino estão, em si, excluídas as formas de relação entre pessoas que transcendem tal binariedade. Neste sentido, o texto projeta como ideal- e-castigo a ordem patriarcal dominante no mundo vétero-oriental.

Ao ser construído o Período Homérico e o Cosmo Olímpico, assim como as tradições posteriores que vão se desenvolver com a ética Judaico/Cristã, ocorre a demonização da Serpente banindo-a para o mundo do mal. Há controvérsias sobre esse período de construção, sendo que as fontes nas teorias clássicas situam sua origem em Gênesis 3 (Gn 3), no século X a.C.; porém, outras fontes e estudos apareceram, principalmente a partir de 1970, já em pleno século XX.

chegando à conclusão de que o período em que envolve o final do século VIII a.C. até o final do século VII a.C. foram momentos importantes da afirmação do monoteísmo hebraico e de registros e consolidação de Leis e Códigos que operavam na centralidade de um único Deus, Yahveh. A diversidade religiosa oportunizou ações de perseguição a quem se desviava do credo oficial, e as expressões religiosas do feminino são desqualificadas por textos proféticos e funcionais para este propósito (REIMER, 2006).

Ao contemplar o processo quando tenta situar a origem do texto no século VIII a.C., no contexto das polêmicas proféticas contra a idolatria, Reimer (2006, p. 118) explica que: “A serpente seria símbolo do estado opressor, catalisando diversas experiências opressoras, inclusive o Egito. O Deus Yahveh, através de seus porta-vozes, os profetas, seria a expressão da verdadeira fé”. Esse é, pois, o momento em que as divindades telúricas estavam em transição/transcendência para o cosmos celeste e “é nesse contexto que buscamos situar a narrativa de Gênesis 3 que trata do conflito entre Yahveh e a serpente” (REIMER, 2006, p. 117). A Serpente é conhecida no imaginário judaico-cristão e, nessa ótica, em Gênesis 3, ela é considerada como símbolo do mal, da traição e da transgressão da mulher.

Nesse sentido, Reimer (2009, p. 104) estabelece uma conexão do simbolismo da serpente e a relação com o monoteísmo no antigo Israel, no qual ele assim se reporta:

A hipótese básica é a seguinte: a serpente, como elemento catalisador simbólico do mal, é uma construção relativamente tardia na história da religião de Israel. No meu entender, a serpente como símbolo do mal pode ser bem alocada no período pós- exílio, isto é, no decorrer do século V a.C.

Sobre a carga interpretativa que onera o texto de Gênesis 3, bem como o uso do texto como fundamento para determinadas ênfases teológicas dentro do cristianismo, afirma Reimer (2009f, p. 27) que: “Gênesis 3 trata, pois, de um conflito religioso. O texto, porém, não opera no nível de conflitos ‘históricos’ contra outras divindades específicas [...]”. A narrativa bíblica, nesse texto, se utiliza de estrutura mitológica, e não em verdades históricas, como afirma; e assim Reimer (2009f, p. 27) conclui que: “Em Gênesis 3 se trata de um conflito situado fora da temporalidade histórica. Os eventos narrados se passam em outra dimensão, no nível do mito”. A intenção de harmonizar a serpente com o mal e com o que é diabólico impede de reconhecer que a serpente era uma representação divina.

Ao longo da história, a ideia concebida sobre o mito da serpente e o tratamento bíblico que foi dado a ela, assim é revisitado por Eisler (2007, p. 141): “De fato, a parte desempenhada pela serpente na dramática expulsão do Jardim do Éden só começa a fazer

sentido no contexto da realidade antiga, uma realidade na qual a serpente era um dos principais símbolos da Deusa”. Todos os temas ligados à serpente e suas abstrações são temas recorrentes nos relatos das pesquisas arqueológicas na Europa Antiga; a serpente era o poder da Deusa, do Sagrado Feminino, em que a política patriarcal baniu para o ostracismo e a vivificou como símbolo do mal.

Partindo de uma narrativa alegórica para que o povo incluísse uma assimilação do que deveria ser compreendido como um mito da criação no monoteísmo hebraico, Gênesis 3 aparece como uma construção simbólica de uma história que se fortalece para ilustrar uma ficção que tenta explicá-la como um fato real; e que a mesma aconteceu num tempo distante, cujas consequências reverberam como verídica por todo o sempre no imaginário cristão. Por que foi considerado crime inafiançável buscar outro nível de consciência? E seria esse castigo proporcional ao ato cometido, ocasionando a expulsão do casal do seu próprio espaço sagrado delimitado por Yahveh? Compreendendo que essa queda, advinda de um ato pecaminoso, teve drásticas consequências para a humanidade, e que a mesma não consegue se livrar de tal denúncia, levantam-se, na atualidade e nesta tese, questionamentos sobre esse relato.

A leitura do mito na perspectiva judaico-cristã, pela ênfase dada ao tratamento bíblico demonizante que foi imputado à serpente, retira da mulher o potencial de construir sua identidade com o que anteriormente era considerado sagrado e respeitado como um poder da Deusa, restando-lhe a possibilidade de construí-la com a ideologia patriarcal oficialmente sancionada como instrumento de socialização, o que representa, para a mulher, um enfraquecimento em seu potencial para enfrentar os desafios do cotidiano na atualidade.

Entretanto, percebe-se que essa narrativa contém problemas dogmáticos, com um conteúdo imaginário que incorpora um dualismo e, no presente mito, Yahveh venceu a luta ideológica contra a serpente, que foi banida da natureza sagrada, passando a ser vista como o símbolo do mal. Na opinião de Reimer (2006, p. 119), há uma indagação:

Mas por que a serpente como o símbolo do mal? No mundo natural, que é o primeiro nível do elemento simbolizado, a serpente tem várias facetas. Isso se traduz para o nível simbólico-religioso, com o dado de que o elemento serpente pode comportar várias simbolizações, evidenciando uma polissemia simbólica. No relato de Gn 3, a serpente, enquanto símbolo, perdeu a sua polissemia e opera na isotopia do negativo.

As principais questões levantadas sobre este tema na contemporaneidade partem da culpa imputada à mulher (Eva) por ter sido ela a dialogar com a serpente, sendo a mesma a

figura principal que se apresenta no drama narrado. Este levou à queda do paraíso, tirando do homem (Adão) a responsabilidade por sua escolha, uma vez que Yahveh vetou, de maneira autoritária, que os dois provassem do fruto proibido, sem dar-lhes explicação alguma.

Quando o mal e a tentação são inseridos, a Gênesis 3 demonstra como se deu a entrada do pecado para os humanos, bem como a gravidade e as consequências da desobediência da mulher, o que a restringe, posteriormente, de ocupar cargo de confiança e liderança na Igreja, pois o ato é um desafio a considerar a mulher como confiável, uma vez que ela foi a responsável pela queda do casal. Ilustrando este fato, bem como a arte pictórica, reporta-se a Reimer69, que diz: “Com isso, o universo feminino, com a aproximação à simbólica do mal, operada pelos autores de Gênesis 3, fica interditada para o livre exercício de atividades sacerdotais junto a Yahveh, deixando o espaço livre para a exclusividade do sacerdócio masculino”. Nesse sentido, observa-se que a associação da mulher com a serpente tornou-se um simbolismo maléfico, representando as forças ctônias do feminino obscuro, as quais as remetem para dimensões da escuridão, e não da luz.

Figura 54 - A tentação de Adão no Jardim do Éden, detalhe da Frisa. Catedral de Notre Dame, Paris, França.

(Fonte: www.wikipédia\Igreja Notre- Dame La Grande de Poitiers. Acesso: 13 de março de 2013)

69

REIMER, Haroldo. A serpente e o monoteísmo. Disponível em:

<http://www.haroldoreimer.pro.br/exegese/serpente_mon.htm>. Acesso em: 17 abr. 2013.

Nesse sentido, observa-se que Yahweh é o Deus ciumento da Gênese bíblica dos cristãos. Ele tenta impedir que Sua criação participe da ‘Árvore do Conhecimento’, menos ainda permite que os Seus filhos adquiram consciência, tentando frustrar e deter a evolução e desenvolvimento dos mesmos, ameaçando-os com punições e instilando o senso do pecado. Tampouco Eisler (2007, p. 143) concorda com esta postura de Yaweh, que servia a propósitos políticos pragmáticos, expondo, neste caso, a sua interpretação da narrativa mítica em Gênesis 3:

Do ponto de vista daquela realidade antiga, as ordens desse poderoso e emergente Deus Jeová, no sentido de que Eva não podia comer da árvore sagrada (seja do conhecimento, da sabedoria divina ou da vida), soariam não apenas estranhas, mas sacrílegas. Bosques de árvores sagradas eram parte integrante da antiga religião, como também dos ritos concebidos para propiciar nos fiéis uma consciência receptiva às revelações de verdades divinas ou místicas - ritos nos quais as mulheres oficiavam como sacerdotisas da Deusa.

Esse pecado levou a criação de Deus a situações desfavoráveis, cujo castigo teve drásticas e destrutivas consequências. Vistas na narrativa de maneira significativa, essa desobediência da mulher, que expressou as raízes do pecado, assim como o fruto proibido o seu símbolo que, ao ser partilhado pelo casal, denota um ato grave e denso, explicitando a rebeldia da mulher, bem como a sua incredulidade ao não acatar uma instrução de Yahveh.

Nessa linha de raciocínio, ficam dúvidas a ser questionadas, uma vez que o casal vivia em estado de inocência, como poderia discernir o bem e o mal? Se tudo que existia no paraíso era uma criação de Deus, como acreditar que a serpente se inseriu na ‘Árvore do Conhecimento’ para fazer algo contrário às ordens divinas? Se o Deus era amoroso, como creditar a Ele algo que colocasse o mal entre o casal? E mais, para a mulher, a serpente era a manifestação da Deusa Mãe e não era considerada maléfica; portanto, era normal a mulher obedecer e acreditar na serpente, ao invés de acreditar em um Deus masculino e que era

No documento Download/Open (páginas 184-200)

Documentos relacionados