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4. O CAMPO MIDIÁTICO CARIOCA: UM ESTUDO SOBRE AS

4.2 Análise das notícias

4.2.2 Jornal Extra

Inserido dentro desta análise devido sua relevância na composição do campo midiático digital carioca, o jornal Extra apresentou durante o período de pesquisa um total de 18 notícias. Apesar do grande fluxo de informação do veículo, os assuntos ligados ao morador de rua possuem uma recorrência mensal de uma matéria por mês, tendo alguns poucos meses uma quantidade acima do normal, salientando os meses de março e maio, com 4 notícias cada. A cidade do Rio de Janeiro também predomina como a principal região de onde as notícias vêm relatar fatos cotidianos. Outras duas notícias dizem respeito a cidade de Nova Iguaçu.

Na divisão por editorias, 11 das 18 notícias foram encaixadas na editoria Rio, enquanto 6 foram classificadas como Polícia e apenas uma notícia tem sua origem de uma coluna assinada. Da mesma maneira que o jornal O Globo, as matérias divulgadas no Jornal Extra não costumam exibir relatos de moradores de rua em seu texto. Importante salientar que parte desse silenciamento se deve ao fato do morador de rua ser colocado como vítima fatal na matéria, de cunho policial investigativo. Apenas quatro matérias existem moradores de rua entre as fontes entrevistadas. As falas, conforme o que foi exposto na Tabela 1 (pág. tal), denotam situação de passividade do morador, tendo sua voz relacionada a problemas sociais e medidas assistencialistas.

Na análise de conteúdo dos títulos das matérias do jornal, além das palavras de caracterização da população de rua comumente usadas, os demais verbetes apontam para o poder público. A menção à Prefeitura por exemplo, aparece em três dos 18 títulos. A palavra Polícia também possui três menções no que tange a essas chamadas.

Partindo para os dados obtidos a partir do conteúdo escrito das notícias, as menções (Figura 13) à polícia, a prefeitura e a igreja aparecem a frente de expressões de reconhecimento do grupo dos moradores de rua, como pode-se atestar na tabela abaixo:

Figura 13: Número de menções por expressão nas notícias

Expressão Número de menções

Moradores de Rua 23

Polícia 12

8 O jornal EXTRA iniciou sua história em 1998 com uma ação promocional que mobilizou a população do Rio de

Janeiro na escolha do nome do jornal. Reforçando o objetivo de estar próximo de seus leitores e ser um prestador de serviços “essenciais”, o Extra se considera “um produto de preço acessível, linguagem simples, sem desprezar o jornalismo de profundidade” (INFOGLOBO, 2009).

Oferece um noticiário focado em fatos da região do leitor e cadernos temáticos que tratam de assuntos do dia-a- dia. O site do EXTRA está entre os três sites de jornal mais acessados do Brasil, com o número de 5.700.000 visitantes únicos e 21.400.000 páginas visitadas (Idem, 2009).

Prefeitura 11 Igreja 8 População de Rua 8 Abordagem 7 Ataque 7 Copacabana 7 Problema 7 SMDS 6

Partindo para as conclusões qualitativas perceptíveis levando em consideração as informações fornecidas pela pesquisa, conclui-se que, de maneira geral, o jornal Extra adota um posicionamento assistencialista, mas que também busca visibilizar casos violentos relacionados à população de rua, seja enquanto vítima ou enquanto acusado ou suspeito de crime.

Com relação aos meses de março e maio, apontado como período de maior incidência de notícias, cabe discorrermos acerca de alguns aspectos. Durante o mês de março, uma série de crimes contra a população de rua do Rio foram registrados. O Extra abordou a situação ocorrida em Nova Iguaçu, onde moradores de rua estavam sendo assassinados por um grupo de extermínio, financiado por empresários do comércio local (Figura 14).

Figura 14: Jornal Extra, 02 de março de 2017

Fonte: Jornal Extra

A matéria acerca do acontecimento trata este como um elemento banal, que afetou pessoas não identificadas que foram colocadas, do ponto de vista dos comerciantes, um

problema para o comércio local. Uma segunda matéria faz menção a possível suspeito, mas não entra em detalhes.

Outra notícia divulgada pelo jornal Extra abordou o assassinato de um morador de rua no centro da cidade do Rio. O corpo do morador de rua, que foi carbonizado, foi encontrado em uma lixeira (Figura 15).

Figura 15: Jornal Extra, 17 de março de 2017

Fonte: Jornal Extra

A matéria apresenta um teor pouco investigativo com relação à maneira como o crime ocorreu. O texto deixa transparecer certa banalidade e aceitação como se pode constatar na fala de uma das fontes da matéria seguinte trecho da matéria: “Quem estava ali disse tratar de um morador de rua, que teria saído de uma caçamba de lixo pegando fogo, depois ainda teria corrido pra cá, num trecho da rua – relatou.” (EXTRA, 2017)

O exemplo serve para ilustrar o posicionamento editorial do jornal com relação a temática, raso e banal, desconsiderando a importância do morador no meio social, colocando a violência sofrida pelo grupo como uma ação do cotidiano, nada que mereça qualquer tipo de atenção especial.

A outra característica presente no jornal é o seu viés assistencialista. Em algumas das matérias publicadas pode-se identificar o tendenciamento do jornal, logo que apresenta a população de rua como resultado da ausência do estado ou de instituições de caridade – Assistencialistas, como Igrejas e ONGs. Outro viés seria a apresentação do grupo como

indivíduos passivos aguardando para serem tutelados por alguma das instituições citadas. O trecho da notícia abaixo (figura 16) demonstra bem tal situação.

Figura 16: Jornal Extra, 10 de janeiro de 2017

Fonte: jornal Extra

A matéria trata da situação do aumento da população de rua na capital tendo como base – além dos dados sobre o contingente de moradores – as ações de “prevenção” da prefeitura com relação ao problema do aumento.

Apesar de citar o nome de um morador de rua na matéria, o senhor Vanderlei Alves, pode-se perceber que não existe qualquer fala do morador durante todo o texto. A forma como o morador foi colocado expõe a passividade expressa pela temática assistencialista descrita acima. A prefeitura, representada pela secretária de Assistência Social e Direitos Humanos do

município, traz a medida de pagamento de passagens aos moradores como a política pública para resolução da situação dos moradores que ocupam as ruas da capital.

Na mesma matéria, no quinto parágrafo, percebe-se a associação com os programas de recuperação de usuários de drogas. Nesse ponto, apontamos não somente a figura de pastoralidade do Estado sobre o indivíduo, como também a associação construída entre morador de rua e problemas com drogas, no caso específico, o crack.

Com relação ao caráter pastoral do Estado, podemos ter como referência os conceitos desenvolvidos por Foucault acerca da formulação do Estado moderno e da incorporação de atribuições antes ligadas somente à igreja. O ato de governar, neste novo modelo de Estado, traduz-se da seguinte forma:

Problemática do governo das almas e das condutas; tema da pastoral católica e protestante; problema de governo das crianças, problemática central da Pedagogia, que aparece e se desenvolve no século XVI; enfim, problemas do governo dos estados pelos príncipes. Como governar, como ser governado, como fazer para ser o melhor governante possível, etc. (FOUCAULT, 1979, p. 277-278)

Vejamos, na nuvem de palavras a seguir (Figura 17), quais palavras aparecem com maior recorrência nas notícias do jornal, sendo elemento de construção para a representação do morador de rua nos textos.

O Extra, diferente de O Globo, possui um viés mais popular, portanto possui um caráter mais apelativo em suas matérias, colocando o morador de rua também como um problema da sociedade, mas que, no entanto, deve ser resolvido a partir do viés assistencialista, seja ele vindo das instituições públicas ou das instituições religiosas. Denota de tal maneira, o ambiente da rua como um lugar degradado, onde os indivíduos que a fazem de ambiente de morada, estão ali em sua imensa maioria por total falta de condições, desumanizados e entregues à vontade do poder público.

Na realidade construída pelo Jornal Extra, o indivíduo, ao se tornar morador de rua, não possui nenhuma característica que o identifique mais como cidadão mas sim como parte de um grupo de excluídos da sociedade.

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