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3. DA CONSTITUIÇÃO DO CORPUS

3.3. Jornal Igreja Nova – sua estrutura

O Jornal Igreja Nova, assim como seus próprios idealizadores afirmaram, nasceu para dar “vez e voz” a todos os cristãos, em especial aos leigos e leigas católicos. Como nasceu num momento de conflito em que seu antecessor – o jornal “A Pracinha” – estava com os seus dias contados, vemos que a tônica do Jornal é a denúncia dos “desmandos” do Bispo D. José Cardoso Sobrinho. Afirma-se, na primeira edição do Igreja Nova que seu objetivo é entregar à comunidade “GRITOS DE EVANGELIZAÇÃO para que possamos assumir os verdadeiros compromissos com a Igreja de Jesus Cristo junto aos mais necessitados: nas creches, nas favelas, na família, no trabalho, enfim, na sociedade.”, mostrando, assim, que a preocupação do periódico não é apenas religiosa e, sim, também social, ou ainda que a preocupação social é inerente às causas religiosas.

A estrutura do Jornal é muito simples. Consiste basicamente de:

Editorial: Que costuma apresentar ou um texto bíblico ou uma canção popular engajada e, a partir desses elementos, proceder às reflexões, fazendo uma ponte entre esses e a vida dos fiéis. Não por acaso, o texto bíblico escolhido para compor a primeira edição do Jornal foi um texto de apocalipse (3, 15-16): “CONHEÇO TUAS OBRAS, NÃO É FRIO NEM QUENTE, OXALÁ FOSSES FRIO OU QUENTE! MAS, PORQUE ÉS MORNO, ESTOU PARA VOMITAR-TE DA MINHA BOCA! Não é espantoso o uso desses dois versículos para a edição inicial, pois contempla exatamente um dos objetivos do jornal: Conclamar os paroquianos a refletir sobre sua prática religiosa. Evidenciam a importância da tomada de posição dos fiéis/leitores: ou eles se posicionam ou serão afastados de Deus – vomitados da boca de Deus. (lembrar que essas são palavras frequentes de DOM HÉLDER)

Três ou quatro artigos, nos quais o que mais se evidencia é a denúncia e a revolta pela “injustiça” contra o clero alinhado com a TL nas comunidades. Tomemos como exemplo as seis primeiras edições do jornal – em todas elas há artigos que protestam por causa da saída do Pe. Luiz Antônio de Oliveira que acompanhou a Paróquia de Boa Viagem.

Em seguida, há a seção entrevista, na qual o entrevistador sempre se intitula IGREJA NOVA. Este orienta a interação, sempre transitando pela denúncia do que considera o “desmonte” promovido pelo então Bispo, afinal de contas, o denuncismo é a tônica das manifestações discursivas naquele primeiro momento – o que se evidencia, aproximadamente, nas quinze primeiras edições do Jornal. Quando pensamos em entrevistas, imaginamos que vamos encontrar uma pluralidade de vozes, já que se traz para o suporte a opinião abalizada de especialistas em diversos assuntos. No entanto as informações às quais o leitor será exposto – no Igreja Nova – sempre se alinham com a filosofia do grupo; quando não é o próprio grupo de leigos o entrevistado pelo IGREJA NOVA. Pois no número 03/1991 há o par: IGREJA NOVA/GRUPO DE LEIGOS como entrevistador e entrevistado.

Mesmo que essas entrevistas sejam tomadas oralmente, para depois serem transcritas, elas não trazem traços da oralidade, o que sugere que sejam editadas antes de serem transcritas. Todavia o par pergunta e resposta é mantido a fim de que seja preservada a troca de turno entre os interlocutores.

Na seção História – que fez parte do jornal de agosto de 1991 a dezembro de 1992 – é traçado um histórico da caminhada da Igreja desde o século X até o século XXI. Entre fantasias e informações obtidas em livros sobre a história da Igreja, são criados pequenos textos que ressaltam características institucionais negativas (“no poço escuro da História, devemos beber dessa bebida amarga para que, digerindo o passado, possamos lançar luzes no futuro do caminho de nossa mãe, a Igreja. É procurando entender seu passado, por mais doloroso e repugnante que seja, que podemos compreendê-la, amá-la e, através dela, mesmo assim, encontrar seu esposo Jesus” – Assuero Gomes, agosto de 1991), que são expostas como etapas a serem seguidas para que haja o reencontro do caminho “verdadeiramente” cristão. A prosopopeia é o recurso de estilo mais utilizado nesses textos: Há a personificação da Igreja como sendo “a mãe”; de Jesus, como o “esposo dela”. E, dessa união, é gerado o povo de Deus.

No final do Jornal, registram-se as notícias: nos primeiros exemplares, as notícias se restringiam aos eventos próprios da paróquia de Boa Viagem. À medida que as desavenças com o Bispo foram se espalhando por outras comunidades não compreendidas nessa paróquia, o Igreja Nova aumentou sua área de alcance e passou a noticiar ocorrências de toda a Arquidiocese.

A partir de janeiro de 1992, surge uma nova seção chamada “Centelhas Proféticas”. É a menor parte do jornal, compostas por um conjunto de frases curtas com teor profético ou divinatório, muitas vezes estruturada como um oráculo (“▪Antes que o Nisan

passe duas vezes, uma luz brilhará na noite de Olinda e Recife! ▪Onde havia 3, houve 2 e agora 1 só há. Pode haver salvação sozinho?” - Janeiro e Fevereiro de 1992). A palavra centelha é bastante sugestiva para o que estas frases curtas – muitas vezes interrogativas (“▪DESMONTE NA PARÓQUIA DE BOA VIAGEM? ▪NUVENS ESCURAS RUMO A PEIXINHOS?”) – pretendem significar. Centelhas são partículas que, quando incandescidas, projetam-se ao longe. E é este efeito que se deseja alcançar ao usá-las: incita-se a reflexão sobre o que ocorre no presente a fim de transformar o futuro. Vê-se, então, a partir desses dizeres, dessas centelhas, uma previsão para o futuro; a expressão da esperança em dias melhores.

Em novembro de 1992, passa a fazer parte, como uma extensão do Igreja Nova, a “Folha da Palavra”. Essa parceria dura um ano. Tal anexo é de total responsabilidade do CENDHEC, que é uma entidade não-governamental, constituída em dezembro de 1989, sem fins lucrativos, para defender e promover os direitos humanos. São especializados em atender juridicamente crianças e adolescentes vítimas de violência ou ato infracional, articulando-se com outros centros de defesa no Brasil e no mundo. Constituído por remanescentes da Comissão de Justiça e Paz, de Olinda e Recife, e do ITER, o CENDHEC prioriza em suas atividades: o direitoà vida; o direito à cidadania e a reflexão e comunicação teológica. Contribui efetivamente para o Jornal, enviando, normalmente, cinco artigos que têm conexão com o nome que adota: “Folha da Palavra”. Estimula os leitores a fazer reflexões/conexões entre os textos bíblicos (Palavra de Deus) e a realidade aqui na terra: “Além de nos preocuparmos com a vida para depois da morte, ocupemo-nos em construir uma vida digna para todos antes da morte, conforme o exemplo de Moisés e o testemunho de Jesus. O resto virá por acréscimo.” (Folha da Palavra, in. Igreja nova, dezembro de 1992).

Na edição de novembro/dezembro de 1993 e janeiro de 1994, o Igreja Nova inicia a publicação de uma seção intitulada “memória da Igreja”, na qual propõe acompanhar a caminhada do “Povo de Deus”. Possui uma estrutura que parece uma agenda que registra as conquistas dos católicos contra o poderio hierárquico, assim como as derrotas. Para estas, enunciam o título: “A Igreja sofre”; para aquelas, “A Igreja caminha”.

Por fim, aparece com frequência a seção “reflexão”, que possui um caráter injuntivo. Semelhantemente ao que ocorre no editorial e também na Folha da Palavra do CENDHEC, busca fazer uma relação entre textos bíblicos e a realidade do cristão. Mas com algumas diferenças: tendo em vista que o público-alvo desse jornal é, inicialmente, a comunidade cristã de Boa Viagem, sempre se sucitam as contradições entre a riqueza material inerente àquela comunidade e a opção privilegiada pelo menos favorecido. Os textos postos

para incitar a reflexão buscam ressaltar a importância das atitudes fraternas e solidárias como características do verdadeiro cristão. E é, curiosamente, nessa última parte do Jornal que conhecemos melhor o público-alvo dele e como esse se modifica no decorrer da análise dos exemplares.