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Jornalismo Científico

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O Jornalismo Científico é uma especialidade informativa, que consiste em transmitir ao público o desenvolvimento da Ciência e Tecnologia (C&T). Populariza e valoriza a C&T, democratizando e socializando as pesquisas e os resultados da produção científica e tecnológica geradas em instituições de pesquisas e universidades.

Intensifica-se, cada vez mais, o valor da ciência para a sociedade, que vem se revelando um dos campos de saber e vivência humana de maior crescimento. Jornalismo e ciência vêm promovendo a interação e a necessidade de aplicação do saber, seja para comprovar teorias ou para promover a integração entre as diversas áreas da ciência, agregando o valor do conhecimento ao dia-a-dia da humanidade. Se a ciência passa a fazer, cada vez mais, parte do cotidiano da sociedade, isso se dá por meio do Jornalismo Científico.

Bueno (1985) identifica os termos freqüentemente utilizados quando se refere ao Jornalismo Científico: difusão científica, disseminação científica e divulgação científica:

O conceito de difusão tem limites bastante amplos. Na prática, faz referência a todo e qualquer processo ou recurso utilizado para a veiculação de informações científicas e tecnológicas. A extensão do conceito permite abranger os periódicos especializados, os bancos de dados, os sistemas de informação acoplados aos institutos e centros de pesquisa, os serviços de alerta das biblioteca, as reuniões científicas (congressos, simpósios e seminários, as ações especializadas das publicações de caráter geral, as páginas de ciência e tecnologia dos jornais e revistas, os programas de rádio e televisão dedicados à ciência e à tecnologia, o cinema dito científico e até mesmo os chamados colégios invisíveis”. (...) “O processo de disseminação da ciência e da tecnologia pressupõe a transferência de informações científicas e tecnológicas, transcritas em códigos especializados, a um público seleto, formado por especialistas”. (...) “A divulgação científica compreende a utilização de recursos, técnicas e processos para a veiculação de informações científicas e tecnológicas ao público em geral ( BUENO, 1985, p.1420-1422).

Conforme José Marques de Melo, citado em texto de Bueno (1985, p. 1422), o Jornalismo Científico constitui-se como:

Um processo social que se articula a partir da relação (periódica/oportuna) entre organizações formais (editoras/emissoras) e coletividade (públicos/ receptores) através de canais de difusão (jornal/ revista/ rádio/ televisão/ cinema) que asseguram a transmissão de informações (atuais) de natureza científica e tecnológica em função de interesses e expectativas (universos culturais ou ideológicos..

O que deve ser, então, o Jornalismo Científico? Para este questionamento, Marques de Melo (1982) faz os seguintes apontamentos:

Deve ser uma atividade principalmente educativa. Deve ser dirigido à grande massa da nossa população e não apenas à sua elite. Deve promover a popularização do conhecimento que está sendo produzido nas nossas universidades e centros de pesquisa, de modo a contribuir para a superação dos muitos problemas que o povo enfrenta. Deve utilizar uma linguagem capaz de permitir o entendimento das informações pelo cidadão comum. Deve gerar o desejo do conhecimento permanente, despertando interesse pelos processos científicos e não pelos fatos isolados e seus personagens. Deve discutir a política científica, conscientizando a população que paga impostos para participar das decisões sobre a alocação de recursos que significam o estabelecimento de prioridades na produção do saber. Deve realizar um trabalho de iniciação dos jovens ao mundo do conhecimento e de educação continuada dos adultos ( MARQUES DE MELO, 1982, p. 21).

Calvo Hernando destaca a importância do jornalismo científico:

A importância que atribuímos ao jornalismo científico, essa especialidade informativa de nosso tempo que consiste em transmitir ao público o

desenvolvimento da ciência e a técnica, para que a maioria possa participar dos conhecimentos da minoria, no exercício da mais nobre, difícil e exigente democracia, a da cultura e que trata de evitar que o conhecimento, no mais nobre espirito humano e o que nos distingue basicamente dos outros seres vivos, se converta, uma vez mais, em causa de injustiças, desequilíbrios e desigualdades, como tantas vezes tem sucedido ao longo da história (HERNANDO, 2001).

O cotidiano do universo é marcado pelos avanços da ciência e tecnologia (C&T). Nesse contexto, entra a máxima representação e responsabilidades assumidas pelo pesquisador e jornalista em mobilizar na população o conhecimento, contribuindo com a disseminação da ciência e com o amplo debate de suas implicações políticas, econômicas e sociais. Mostrar à sociedade o trabalho realizado em C&T é colocar universidades e institutos de pesquisa no caminho da modernidade, é dar uma satisfação pública do dinheiro investido em pesquisas.

Outra necessidade apontada por Caldas (1998) é de “se estabelecer um diálogo amplo entre a comunidade científica e a sociedade para uma reflexão sobre a política científica do país” (CALDAS, 1998, p. 194). Para Oliveira, o acesso às informações de C&T é “fundamental para o exercício pleno da cidadania e, portanto, para o estabelecimento de uma democracia participativa, em que grande parte da população tenha de fato condições de influir com conhecimento em decisões e ações políticas ligadas à C&T” (OLIVEIRA, 2001, p. 205) . Na mesma linha de raciocínio, Fourez (1995) refere que, em uma sociedade fortemente baseada na ciência e na tecnologia, a vulgarização científica tem implicações sociopolíticas bem importantes. “Se o conjunto da população não compreende nada de ciência, ou se permanece muda de admiração diante das maravilhas que podem realizar os cientistas, ela será pouco capaz de participar dos debates relativos às decisões que lhes dizem respeito” (FOUREZ, 1995, p. 221-222).

Vários autores compartilham com a mesma idéia; na avaliação de Forti (1998), por exemplo:

Chegou a hora de reconsiderar o relacionamento entre a ciência e a tecnologia, de um lado, e o poder político e o governo, de outro. Em particular, as políticas científicas governamentais não podem mais ser decididas com base em perícias fornecidas por um pequeno grupo de especialistas, mas devem, pelo contrário, ser o resultado de um longo processo, em que todos os elementos da sociedade afetados pelas decisões devem estar empenhados ( FORTI, 1998, p. 20).

Nota-se que o interesse da mídia pelo saber científico é motivado, em grande parte, por acontecimentos atuais, temas polêmicos que causam impactos. Na observação de Oliveira (2002), os grandes jornais brasileiros têm aumentado a cobertura em Ciência e Tecnologia, criando editorias e seções específicas. Ao se referir aos veículos de médio e de pequeno porte, ela enfatiza que “comumente têm se mantido alheios a pautas científicas, sendo ainda precária a cobertura que dão a C&T. Na maioria das vezes, as matérias limitam-se ao copy and paste de agências noticiosas ou dos próprios grandes veículos” (OLIVEIRA, 2002, p. 51). Para Gleiser (2002), no Brasil:

São poucos os jornais que dedicam um espaço regular à ciência, como faz a Folha de S. Paulo. Mas o maior buraco está na televisão; a televisão brasileira ignora a ciência. O que existe é relegado a um horário destinado a ter pouca audiência. A TV Futura vem tentando mudar isso, mas está nadando contra a corrente. Mas o salmão também nada contra a corrente e é um peixe apreciadíssimo (GLEISER, 2002, P. 10).

Na verdade, a televisão brasileira tem ampliado os espaços para divulgação científica da produção nacional. É cada vez mais freqüente a presença de reportagens relacionadas ao mundo da ciência e tecnologia, que passam a ocupar espaços importantes nos telejornais. Mas, tais informações são ainda superficiais e de impacto pela própria natureza desses programas, que não têm tempo para o aprofundamento necessário da informação científica. Entretanto, no horário nobre, programas específicos sobre ciência e tecnologia praticamente inexistem. O único programa veiculado em horário acessível é o Repórter Eco, que acaba de completar 10 anos, exibido, às 19 horas, na TV Cultura. Os demais tais como Globo Ciência, Globo Rural, Globo Ecologia, Brasil Pensa, entre outros, são ou foram veiculados em horários de difícil audiência: ou muito cedo (seis a sete da manhã) ou muito tarde (depois das 23 horas).

Uma experiência recente é o programa de divulgação científica batizado de Ponto de Ebulição, lançado pelo Canal Futura, da Fundação Roberto Marinho, em parceria com o Laboratório de Estudos Avançados de Jornalismo (Labjor), da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Ponto de Ebulição, apresentado pelo músico Gabriel, o Pensador, foi exibido no período de 7 de novembro de 2002 a 3 de maio de 2003, em horário também pouco acessível (depois das 23 horas), e em canal a cabo. Tinha, portanto, um público restrito, levando em conta que parcela expressiva da população não tem acesso às emissoras de canal fechado.

Assim, apesar de ter importância vital para a população, na avaliação de Caldas (1998), a Ciência e a Tecnologia não são temas abordados com a necessária competência e perspectiva analítica pelos veículos de comunicação. Para a autora, estes limitam-se “.... à reprodução da fala dos cientistas e a uma divulgação da produção dos resultados das pesquisas sem contextualizá- las com a necessidade e realidade social do país” (CALDAS 1998, p. 197), e acrescenta:

...uma divulgação científica competente e crítica com o jornalista especializado atuando na interface entre a ciência e a sociedade é imprescindível. O conhecimento global do sistema de C&T para uma análise isenta no processo de produção científica, na política de captação e alocação de recursos é essencial no exercício cotidiano do jornalismo científico (CALDAS, 1998, p. 197).

Para muitos, o Jornalismo Científico é algo relacionado apenas às áreas de medicina e saúde. Mas esse é um conceito distorcido, pois praticamente todos os assuntos, de qualquer área do conhecimento humano, podem caracterizar-se como Jornalismo Científico. Oliveira (2002) enfatiza que o Jornalismo Científico não se restringe à cobertura de assuntos específicos de C&T.

... o conhecimento científico pode ser utilizado para melhor compreender qualquer aspecto, fato, ou acontecimento de interesse jornalístico. Assim, a informação científica pode estar presente em qualquer editoria: geral, de política, de economia e até de polícia e de esportes. A ciência ajuda a entender os fenômenos sociais e a interpretar as causas e conseqüências dos fatos de interesse jornalístico (OLIVEIRA, 2002, p. 47).

Em virtude da constante evolução da ciência e tecnologia, centros de pesquisa e universidades no Brasil e no mundo estão sendo obrigados a rever os seus conceitos, meios, e ferramentas usados na sua política de divulgação científica. O jornalismo científico é um dos instrumentos mais poderosos para o aprimoramento da relação entre ciência e sociedade. Ribeiro (2001) recorre à opinião de Calvo Hernando e concorda que o jornalismo científico tem vários objetivos como:

ajudar a criar nas classes dirigentes a consciência da importância da pesquisa científica e tecnológica, dando ênfase ao trabalho que se faz no próprio país; manter o leitor médio (de jornais, revistas, TV, rádio, etc) informado sobre os avanços da ciência e da técnica para impedir a formação de um abismo de incompreensão entre os pesquisadores e a sociedade, e ajudar a despertar e orientar vocação científica nos jovens (RIBEIRO, 2001, P. 13).

São diversas as pesquisas desenvolvidas nas universidades, caracterizadas pelos valores científico, econômico, cultural e social. Por meio de uma cultura comunicacional científica, a universidade, parceira da sociedade, que colabora com a sua manutenção e funcionamento, irá difundir seus conhecimentos e tudo aquilo que nela produz, contribuindo, sobretudo, para a melhoria da qualidade de vida, para a solução de problemas e conflitos sociais.

As diversas conquistas obtidas pela ciênc ia, em todas as áreas da vida, devem ser revertidas para o bem da humanidade. Em entrevista concedida a Oliveira (2002, p. 34), José Reis salienta que

O cientista verdadeiro precisa ter a noção de que a ciência que ele faz, seja a ciência pura, aparentemente desvinculada de qualquer relação, ou a ciência aplicada, que, muitas vezes, nasce da ciência pura e outras a inspira, essa ciência, em última análise, deve ser feita tendo em mente uma função social para atender ao bem-estar da humanidade.

Com a maior integração entre o pesquisador e o jornalista, poderão ser levados ao público além das descobertas científicas, informações sobre as transformações e resultados que essas inovações trarão à vida das pessoas. Num esforço conjunto, poderão desenvolver a consciência pública sobre o valor que a ciência traz ao progresso intelectual e material da população.

O compromisso da universidade é com o Ensino, a Pesquisa e a Extensão de Serviços; o da imprensa é de estimular o jornalismo interpretativo e contextualizar acontecimentos referentes aos avanços da ciência, colaborando com a democratização do conhecimento. Dessa forma, o mesmo esforço dedicado pelo jornalista em oferecer ao cidadão a informação certa e sugestiva sobre Ciência e Tecnologia, os pesquisadores também devem dedicar uma parte de seu trabalho e tempo para se relacionarem com o público através dos meios de comunicação. Em uma mesma trajetória, poderão cumprir uma de suas missões: transmitir o desenvolvimento da ciência para que a maioria das pessoas possa participar dos progressos do conhecimento.

É de fundamental importância um trabalho conjunto de jornalistas e pesquisadores, no sentido de tornar públicos os impactos dos acontecimentos relacionados à ciência.

O impacto da ciência e da tecnologia na sociedade é fato inconteste. Entretanto, por ausência de uma divulgação científica que aproxime a ciência e a tecnologia do cidadão comum e o transforme num agente participante das decisões dos investimentos e dos rumos da Ciência e Tecnologia, as pessoas vão aos poucos afastando-se do pensamento

científico, na medida em que não encontram respostas para suas perguntas (CALDAS, 1998, p. 199).

O Jornalismo Científico desempenha um papel fundamental de educar cientificamente a população, levando à sociedade os progressos do conhecimento

.

Targino e Barros (1996), salientam que o Jornalismo Científico tem um objetivo educativo acentuado pela sua função social, que é a de contribuir para a difusão e a popularização do conhecimento científico e tecnológico.

A democracia requer que o conhecimento seja uma atividade social que tenha não só a participação da comunidade científica, mas também de toda a sociedade. Na observação de Caldas,

O compromisso do jornalista científico com a democratização do conhecimento coloca-o na posição de intérprete do mundo e, como tal, historiador do cotidiano. O desenvolvimento de novos hábitos, novas atitudes, de uma nova cultura informativa depende da forma como divulga e interpreta o mundo da ciência e da tecnologia (CALDAS, 2003, p. 76).

Instigar as relações entre conhecimento e sociedade é contribuir para o resgate da cidadania e o aperfeiçoamento democrático. Calvo Hernando esclarece que, em matéria de conhecimento,

a sociedade deve exercer a máxima representação na tomada de decisões relacionadas com atividades científicas e tecnológicas. Para isso, precisa conhecer a menor linha de trabalho e as grandes disciplinas científicas de nosso tempo e sua incidência prevista no indivíduo e na sociedade (HERNANDO, 2001).

Para que a população tenha condições de participar do desenvolvimento e rumos tomados pela Ciência e Tecnologia, é preciso que a divulgação científica não fique restrita a veículos de comunicação especializados e a espaços que dão acesso somente à comunidade cie ntífica. Pode e deve multiplicar-se nas escolas, nos museus, em centros de ciência, dentre outros espaços, criando uma cultura científica no país e reduzindo, assim, o já conhecido analfabetismo científico.

O desenvolvimento da Ciência e Tecnologia deve ser direcionado aos interesses sociais e estar em sintonia com a sociedade. Medeiros (2001) expõe que “a mesma sociedade que financia as pesquisas realizadas em instituições públicas e elege governos que

administram estes recursos precisa saber que a Ciência e Tecnologia está muito mais presente no dia-a-dia de cada um do que se imagina” (MEDEIROS, 2001, p. 226).

É por meio da divulgação dos resultados das pesquisas que a sociedade terá as respostas de como elas podem melhorar a qualidade de vida dos cidadãos, revelar as contribuições que trazem para o país, além de compreender melhor os fenômenos naturais e sociais.

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