• Nenhum resultado encontrado

A Junta das Missões do reino e a Junta das Missões de Pernambuco: uma hierarquia em desalinho

Iniciar a abordagem sobre a Junta das Missões que fora instituída em Lisboa revela-se como uma tarefa igualmente árdua e imprescindível para este trabalho. Apontada na carta que determinava a fundação da Junta das Missões de Pernambuco como o organismo da administração central imediatamente superior às Juntas ultramarinas, a abordagem da Junta das Missões do reino tem por desígnio principal dimensionar o real intercâmbio que se verificou entre esta e suas congêneres ultramarinas.284 A principal dificuldade encontrada resume-se a algumas imprecisões nas referências acerca da Instituição em questão. Esta dificuldade aparece acompanhada, na maioria dos casos, de outra controvérsia referente ao tema: o momento no qual, de fato, teria sido criada a Junta das Missões no Estado do Maranhão e Grão-Pará.

São poucos os estudos que tratam diretamente do tema das Juntas de Missões conforme já apontamos na Introdução deste trabalho. A dissertação de Paul David Wojtalewicz intitulada The Junta de Missões - the missions in the Portuguese

Amazon tem como foco a atuação da Junta das Missões que se reunia na capitania do

Pará. O trabalho tem como fonte documental primordial o “Livro dos Termos da Junta de Missões que se teriam nesta Capitania do Pará em que se pulgavam (sic) as Liberdades dos Índios, cujas Juntas foram extintas com a Lei das Liberdades que se publicou nesta Cidade aos 29 de Maio de 1756”.285 O autor muito pouco nos informa

para o Governo de Pernambuco (1654-1713)”, tomo I, p.108, e no Arquivo Nacional - Torre do

Tombo, Fundo Manuscritos do Brasil, livro 43, “Governo e História de Pernambuco”, p.508.

284 Conforme anteriormente apontado, explicitava o texto da carta régia que determinava a criação da

Junta das Missões de Pernambuco: “[...] Fui servido resolver que nessa capitania se erija uma Junta de Missões com subordinação a que há neste Reino [...]”. Cf. “Sobre se erigir a Junta das Missões”, 07 de março de 1681. In: Anais da Biblioteca Nacional, “Informação geral da capitania de Pernambuco”, n.28, 1906, p.379. A mesma carta pode ser encontrada no Arquivo da Universidade de Coimbra, Fundo Conde dos Arcos, livro 33, “Ordens reais para o Governo de Pernambuco (1654-1713)”, tomo I, fl.108, e no Arquivo Nacional - Torre do Tombo, Fundo Manuscritos do Brasil, livro 43, “Governo e História de Pernambuco”, fl.508.

285 O manuscrito em questão encontra-se guardado na James Ford Bell Library da Universidade de

a respeito da Junta das Missões do reino, mencionando ter encontrado “em toda a literatura” apenas um registro do exercício desta Instituição. No ano de 1693, D. Pedro II teria dividido a capitania do Pará em distritos missionários entregues aos cuidados espirituais das ordens religiosas que missionavam naquela capitania. Essa divisão do território teria sido desenhada com a assistência da Junta das Missões do reino e promulgada na capitania do Pará por intermédio da Junta local.286 Esta medida traria grande benefício às atividades da Junta das Missões do Pará pois, através dela, a instituição conseguiria controlar com maior eficiência a atividade missionária das ordens religiosas em seus respectivos distritos, além de ter reduzido a competição que por vezes se manifestava entre o clero regular.287

No que concerne à criação da Junta das Missões no Estado do Maranhão e Grão-Pará – o autor não especifica a capitania em que esta Junta teria funcionado embora a documentação por ele utilizada se refira estritamente às reuniões da Junta das Missões do Pará – é apresentado ao leitor, sem maior detalhamento, o ano de 1655. Segundo David P. Wojtalewicz “A Junta foi criada por decreto real em 1655 por estímulo de Antônio Vieira”.288 O ano de 1655 e, mais particularmente, a já aludida lei de 09 de abril de 1655 é comumente indicada como a responsável por mandar erigir naquele Estado uma Junta de Missões.

A análise do conteúdo da lei de 09 de abril de 1655 nos permite compreender o motivo pelo qual ela foi por vezes apontada como a lei que teria mandado criar a Junta das Missões naquele Estado. Almejando decisivamente encontrar “resolução sobre os casos em que se pode justamente fazer cativos os Índios do Maranhão e evitar os danos que até agora se tem seguido ao serviço de

Junta das Missões realizadas na capitania do Pará e compreendidas entre setembro de 1737 e agosto de 1758. Ver Paul David Wojtalewicz. The Junta de Missões. The Missions in the Portuguese Amazon. Minnesota: Master Thesis submitted to the Faculty of the Graduate School of the University of Minnesota, 1993, p.1-2.

286No original, temos: “The Junta in Lisbon seems to have met very rarely. In all the literature, I find

only one reference to its meeting. This came in 1693 when the King divided the captaincy of Pará into districts which were assigned to each Missionary Order. The process of delineating these lines of jurisdiction was done with the assistance of the Junta das Missões in Lisbon and was promulgated by the governor through the local Junta”. Ver: Paul David Wojtalewicz. Op. Cit., p.11.

287 Ibidem.

288 Ibidem, p.7. No original: “The Junta was created by royal decree in 1655 at the urging of Antonio

Deus e meu e bem daquele Estado”289, o rei explicita no texto da lei os casos em que os índios seriam considerados escravos legítimos. A primeira condição apresentada refere-se aos índios apreendidos em guerra „justa‟. Nesta matéria, o texto da carta traz uma diferenciação em relação às condições nas quais poderiam ser praticadas guerras ofensivas e defensivas. Aquelas só seriam consideradas „justas‟ mediante aprovação e licença de D. João IV e de seus sucessores, que só expediriam seu parecer mediante prévia avaliação de todas as causas que supostamente motivavam e justificavam a mobilização para uma guerra. As razões que fundamentavam a guerra justa deveriam ser fornecidas pelo “Governador do Estado, Ouvidor geral, Provedor da Fazenda, Prelado que governa o eclesiástico e os das Religiões e pareceres dos meus (Conselheiros), digo, Conselhos Ultramarino e Estado [...]”.290

A guerra defensiva, por sua vez, deveria ter como fim “livrar o Estado de quaisquer inimigos que o vierem acometer”, estando os governadores autorizados a iniciá-las “comunicando-o primeiro com as pessoas que residem naquele Estado acima nomeadas”.291 A lei estabelece igualmente que seriam considerados escravos legítimos os índios cujas ações visarem impedir a pregação do “Santo Evangelho” e “as conversões”, os índios prisioneiros de tribos inimigas que forem resgatados de serem mortos em ritual antropofágico, e ainda índios resgatados que tivessem sido vendidos de uma tribo para outra como escravos legítimos originados de guerras intertribais. Também neste último caso, a justiça destas guerras intertribais deveria ser investigada pelos missionários e cabos das expedições de resgate.292 Contudo, persistindo a dúvida acerca da legitimidade do cativeiro, o caso deveria ser apreciado pelas autoridades do Estado nomeadas anteriormente, ou seja pelo governador, ouvidor geral, provedor da Fazenda, bispo e os representantes das ordens religiosas atuantes na capitania.

Considerando o exposto acima a respeito do conteúdo da lei de 09 de abril de 1655, torna-se compreensível o motivo pelo qual ela é frequentemente apontada como responsável pela criação da Junta das Missões no Estado do

289 “Lei que se passou pelo Secretário de Estado em 9 de Abril de 655 sobre os índios do Maranhão”,

09 de abril de 1655. In: Anais da Biblioteca Nacional, “Livro grosso do Maranhão, 1ª parte”, n.66, 1948, p.25.

290 Ibidem, p.25-26. 291 Ibidem, p.26.

Maranhão e Grão-Pará. As autoridades civis e eclesiásticas indicadas como as responsáveis para instruir D. João IV sobre as razões que justificariam uma guerra „justa‟ ofensiva, bem como para serem consultadas pelo governador antes deste iniciar uma guerra defensiva em determinadas circunstâncias são exatamente as mesmas nomeadas para compor a Junta das Missões, como exceção do secretário das missões que, no caso da Junta das Missões de Pernambuco, era também o secretário do governo daquela capitania. Para além de aconselharem o monarca nos casos de guerra ofensiva e o governador antes deste principiar guerra defensiva, eram as mesmas autoridades acima referidas que deveriam também avaliar a legitimidade das guerras que, até aquele presente momento, tinham determinado o cativeiro legítimo dos índios apreendidos naquele Estado.

De fato, há grande proximidade entre o exposto acima e a Junta das Missões propriamente dita, não apenas em relação às autoridades civis e eclesiásticas que futuramente comporiam o Tribunal mas, inclusive, das matérias – guerra „justa‟ e legitimidade do cativeiro dos índios – que deveriam ser analisadas nos dois casos. Contudo, conforme observamos no caso de Pernambuco, o rol de questões que passavam pelo crivo da Junta das Missões era muito mais amplo. É preciso acrescentar ainda que as situações retratadas na lei de 09 de abril de 1655 que deveriam ser solucionadas pelas autoridades locais tinham caráter esporádico, ou seja, as autoridades mencionadas apenas se reuniam diante da real existência das condições apontadas na referida lei. Não encontramos nesta lei qualquer normatização institucional de como deveriam funcionar suas reuniões. Elas não possuíam uma periodicidade mínima e suas decisões não deveriam ser registradas em um livro de assentos.

O que nos parece é que as matérias identificadas na lei de 1655 e o encaminhamento apontado para solucioná-las se aproximam muito das condições de funcionamento da Junta extraordinária concebida na lei de 10 de setembro de 1611 para se reunir na Bahia. Conforme exposto anteriormente, essa Junta deveria se reunir unicamente para julgar a „justiça‟ ou não de possíveis guerras contra o „gentio‟, devendo encaminhar os pareceres ao reino e aguardar o aval régio para efetivamente iniciar a guerra, salvo em situações de eminente perigo.293 De fato, ao

293 “Carta de lei – declara a liberdade dos gentios do Brasil, excetuando os tomados em guerra justa”,

10 de setembro de 1611. In: José Oscar Beozzo. Leis e Regimentos das Missões – política indigenista

analisarmos o conteúdo da lei de 09 de abril de 1655 não parecemos estar diante de um documento legal que prescrevia as componentes mínimas de uma nova Instituição a se arraigar em um espaço definido do ultramar português.

O trabalho de Tereza Cristina Ribeiro intitulado O Tribunal da Junta

das Missões, ecos da relação jesuítas-índios no Pará colonial igualmente não avança

muito no que tange a compreensão das circunstâncias que envolveram a criação da Junta das Missões que atuou no reino.294 A autora aponta a provisão régia de 17 de outubro de 1653 como tendo sido a responsável pela determinação de criar uma Junta das Missões no Estado do Maranhão e Grão-Pará. Neste processo, a figura do padre Antônio Vieira é ressaltada como um de seus principais articuladores em decorrência de sua proximidade com D. João IV. Em seguida, Tereza Cristina Ribeiro menciona a transferência da Junta das Missões de Lisboa para o espaço americano. Em suas palavras: “Tornou-se necessário que a Junta se transferisse para o espaço que mais precisava de suas determinações: o espaço da desordem, da barbárie, da ausência de regras”.295 De fato, parece que a autora ignora a existência da Junta das Missões que passou a vigorar em Lisboa a partir de 1655. Mais adiante, a autora afirma não ser possível identificar a data em que teria ocorrido a aludida transferência da instituição de Portugal para a “Amazônia colonial” assinalando ainda que a partir da criação desta Junta das Missões que foi deslocada para o Estado do Maranhão e Grão-Pará, “todas as capitanias juridicamente estabelecidas, deveriam ter sua Junta de Missões”.296

Há uma série de imperfeições em tais informações. Primeiramente, a provisão régia de 17 de outubro de 1653 não determinava a criação de uma Junta de Missões para funcionar em Lisboa, e tampouco uma que atuaria no Estado do Maranhão e Grão-Pará. Na verdade, a referida provisão elenca um conjunto de situações nas quais o cativeiro dos índios seria considerado „justo‟, e solicita que os oficiais das câmaras do Maranhão e do Pará, na presença do desembargador

294 Tereza Cristina Ribeiro. O Tribunal da Junta das Missões. Ecos da relação jesuítas-índios no Pará colonial. São Paulo: dissertação de mestrado em História / PUC-SP, 2000. O principal conjunto

documental utilizado pela autora neste trabalho consiste em alguns termos da “Junta de Missões” compreendidos entre os anos de 1719 e 1740, guardados no Arquivo Público do Estado do Pará (APEP).

295 Ibidem, p.27. 296 Ibidem, p.28.

sindicante João Cabral de Barros e, em sua ausência, dos ouvidores das duas capitanias, analisassem as causas do cativeiro de todos os índios escravizados naquele Estado à luz das condições que presentemente se expunham na provisão, para que dessa forma “possa dar e dê por livres os [índios] que o forem, e por cativos, os que legitimamente o foram”.297

Eram muitas as condições que na provisão de 1653 legalizavam a escravidão indígena e algumas delas, consideravelmente imprecisas, facilmente poderiam ser dribladas e alegadas com o intuito de se conseguir permissão para cativar os índios. A guerra „justa‟, que automaticamente fazia dos índios apreendidos escravos legítimos, poderia ser executada em diversos casos, dentre eles, quando os índios impedissem a pregação do “sagrado evangelho”, quando firmassem alianças com os “inimigos” de Portugal, quando “exercitassem latrocínios por mar ou por terra, infestando os caminhos, salteando ou impedindo o comércio e trato dos homens para suas fazendas e lavouras”, quando verificada a prática antropofágica e, por fim, quando os índios se furtassem às “obrigações que lhe foram impostas e aceitadas no princípio de suas conquistas”.298 Conforme se verifica, esta última motivação era extremamente genérica. A provisão explicita como exemplos de não cumprimento às suas obrigações a resistência em prestar serviços para os quais eram chamados e em guerrear contra os inimigos de Portugal quando convocados.299 Todavia, praticamente todas as causas mencionadas acima, como a prática antropofágica e os furtos cometidos contra colonos, por exemplo, poderiam facilmente serem vistas como deveres estabelecidos desde os primeiros tempos da conquista que não estavam sendo observados.

Os índios prisioneiros de guerra de outras tribos indígenas que seriam sacrificados em rituais antropofágicos e que fossem salvos pelos portugueses passavam para a condição de escravos legítimos. Para esse fim, deveriam ser organizadas “entradas pelo Sertão com religiosos”, estes devendo zelar especificamente pela “conversão do gentio”. Para conduzir as entradas era preciso ter aprovação por maioria de votos de uma comissão formada “pelos Capitães Mores das

297“Provisão sobre a liberdade e Cativeiro do gentio do Maranhão”, 17 de outubro de 1653. In: Anais da Biblioteca Nacional, “Livro grosso do Maranhão, 1ª parte”, n.66, 1948, p.20.

298 Ibidem. 299 Ibidem.

ditas capitanias do Maranhão e Pará cada um na sua, pelos Oficiais das Câmaras delas, pelos Prelados das Religiões e Vigário geral onde o houver”.300

A partir deste breve enfoque acerca do conteúdo da provisão de 17 de outubro de 1653, a única resolução disposta no texto que, em nosso entendimento, poderia ser confundida com a criação de uma Junta de Missões, seria estritamente esta Comissão formada por autoridades civis e eclesiásticas das duas capitanias, inclusive pelos prelados das ordens religiosas, cuja incumbência era a de julgar os indivíduos aptos a conduzirem as “entradas” pelos territórios que formavam o Estado do Maranhão e Grão-Pará. Contudo, ainda esta explicação não se mostra plausível uma vez que, segundo a concepção de Tereza Cristina Ribeiro, essa Junta de Missões teria sido inicialmente criada em Lisboa, sendo posteriormente transferida para aquele Estado. Note-se também que o texto da provisão em questão claramente apresentava medidas a serem aplicadas e desenvolvidas no Estado do Maranhão e Grão-Pará e não no reino.

Com a análise acima esmiuçada e a verificação de que os documentos régios corriqueiramente mencionados como os responsáveis pela instituição de uma Junta de Missões no Estado do Maranhão e Grão-Pará não apresentam verdadeiramente tal conteúdo, vemos reforçada a idéia de que a carta régia que mandava instituir uma Junta das Missões naquele Estado também data, com efeito, de 07 de março de 1681.301

Acerca da Junta das Missões do reino encontramos importantes considerações na tese de Márcia Eliane Alves de Sousa e Mello.302 Em 1655 uma Junta transitória teria sido constituída em Lisboa com o propósito de discutir as condições da liberdade dos índios do Brasil. As conclusões alcançadas a partir dos

300 “Provisão sobre a liberdade e Cativeiro do gentio do Maranhão”, 17 de outubro de 1653. In: Anais da Biblioteca Nacional, “Livro grosso do Maranhão, 1ª parte”, n.66, 1948, p.21.

301 Conforme o exposto anteriormente, D. Pedro II, na carta em que determina a criação da uma Junta

de Missões no Estado da Índia datada de 26 de fevereiro de 1681, pede ao Conselho Ultramarino despachar cópias da mesma carta para as capitanias de “Pernambuco, Angola, Rio de Janeiro, Maranhão, [e] Cabo Verde” aonde também deveriam ser instituídas Juntas de Missões atentando apenas para as substituições das autoridades nomeadas para participarem das reuniões de acordo com a hierarquia dos cargos atuantes em cada uma destas capitanias. Cf. “Sobre o bem espiritual das missões da Índia”, 26 de fevereiro de 1681. Arquivo Nacional - Torre do Tombo, Fundo Manuscritos do Brasil, livro 33, “Decretos, 1663 / 1702”, cota atual “Conselho Ultramarino, livro 01 de decretos”, fl.68v.

302 Márcia Eliane Alves de Souza e Mello. Pela propagação da fé e conservação das conquistas portuguesas. As Juntas das Missões – século XVII-XVIII. Tese de Doutorado. Porto: Universidade do

debates travados nas sessões dessa Junta extraordinária foram condensadas e apresentadas na lei de 09 de abril de 1655.303 Com efeito, o texto dest, anteriormente abordado, deixa transparecer que as novas deliberações a partir de então vigentes eram o resultado das discussões a respeito das leis de 1570, 1587, 1595, 1652 e 1653 feitas por “teólogos e juristas dos de maiores letras e virtudes de meus reinos e mais versados nos negócios desta qualidade” visando o êxito das “conversões daquela gente” e a “conservação espiritual e corporal daquele Estado”.304 Concluídos seus trabalhos, a Junta extraordinária que concebeu a lei de 09 de abril de 1655 e da qual teria participado o padre Antônio Vieira encerrou suas atividades.305 No entanto, em virtude da importância da propagação da fé para a conservação dos territórios portugueses, ainda no ano de 1655, foi criada uma “Junta privativa” para cuidar das missões do ultramar português, denominada Junta Geral das Missões, Junta da Propagação da Fé, ou ainda Junta dos Missionários.306

Restam dúvidas em relação à autoria da idéia de constituir em Lisboa um Tribunal especializado nos assuntos das missões. Márcia Eliane nos mostra que dentre os escritos dos padres jesuítas Antônio Franco (1662-1732) e André de Barros (1677-1754) a autoria da idéia é atribuída a pessoas diferentes. Aquele, no seu Ano

Santo da Companhia de Jesus em Portugal atribui a idéia ao padre André Fernandes,

confessor de D. João IV. Já o padre André de Barros em sua obra A vida do Padre

303 Márcia Eliane Alves de Souza e Mello. Pela propagação da fé e conservação das conquistas portuguesas. As Juntas das Missões – século XVII-XVIII. Tese de Doutorado. Porto: Universidade do

Porto, Faculdade de Letras, 2002, p.55.

304 “Lei que se passou pelo Secretário de Estado em 9 de Abril de 655 sobre os índios do Maranhão”,

09 de abril de 1655. In: Anais da Biblioteca Nacional, “Livro grosso do Maranhão, 1ª parte”, n.66, 1948, p.25.

305 Fortunato de Almeida escreve que esta Junta extraordinária fora presidida pelo Arcebispo de Braga

e dela participaram os prelados das ordens religiosas que possuíam estabelecimentos no “Pará- Maranhão”. O padre Antônio Vieira, como é de se supor, participou desta reunião como representante da Companhia de Jesus. O autor afirma ainda ter sido esta Junta a responsável pela “lei dos cativeiros”