• Nenhum resultado encontrado

4 A LÓGICA NO ENSINO

4.3 Lógica no ensino de Matemática

Ao pensarmos no ensino de Matemática, a Lógica deve ser tratada não de forma conteudista, como um ponto fixo dentro do currículo de Matemática, mas como uma ferramenta de ensino visando uma melhor aprendizagem de um conteúdo. Mesmo trabalhando a Lógica como um meio para que o fim seja a aprendizagem de outro conteúdo, seu ensino e o seu desenvolvimento acabam sendo trabalhados de forma indireta. O ensino de Lógica, assim,

[...] não deve ser um ponto programático localizado em algum momento específico da estrutura curricular, mas sim deve ser uma preocupação metodológica presente sempre que algum ponto do programa permitir ou que o interesse da turma justificar uma exploração mais detalhada. (DRUCK, 1998, p.10)

O seu ensino não deve ser pautado em conteúdo, mas deve ser trabalhado por meio de uma abordagem indireta e metodológica, tornando a aprendizagem mais crítica e não tão mecanizada. Segundo Soares (2004) pautar o ensino de Lógica com o ensino de conectivos, tabelas verdade e diagramas de Venn, acaba sendo uma reprodução de fórmulas e algoritmos, não havendo assim, reflexão sobre os seus aspectos.

Em algumas áreas do programa de Matemática, a Lógica é mais facilmente observada. Em conteúdos ligados a Geometria, por exemplo, o pensamento dedutivo é utilizado de forma constante. Tanto no ensino fundamental quanto no ensino médio, a Geometria é uma das áreas da Matemática na qual o raciocínio dedutivo é visto com mais frequência, principalmente nos textos com orientações curriculares e em livros didáticos.

No ensino fundamental, “[...] os problemas de Geometria vão fazer com que o aluno tenha seus primeiros contatos com a necessidade e as exigências estabelecidas por um raciocínio dedutivo. Isso não significa fazer um estudo absolutamente formal e axiomático da Geometria” (BRASIL, 1998, p. 86). Sendo assim, a Geometria é um campo que favorece o uso da Lógica como auxiliar ao aprendizado. No ensino médio, o ensino de Geometria deve contemplar um maior desenvolvimento do pensamento dedutivo.

Não se trata da memorização de um conjunto de postulados e de demonstrações, mas da oportunidade de perceber como a ciência Matemática valida e apresenta seus conhecimentos, bem como propiciar o desenvolvimento do pensamento lógico dedutivo e dos aspectos mais estruturados da linguagem matemática. Afirmar que algo é “verdade” em Matemática significa, geralmente, ser resultado de uma dedução lógica, ou seja, para se provar uma afirmação (teorema) deve- se mostrar que ela é uma consequência lógica de outras proposições provadas previamente. (BRASIL, 2002, p.124)

Um exemplo de uma possível intervenção para trabalhar a Lógica no ensino de Geometria seria a seguinte. Ao ensinar as propriedades do quadrado, estaremos diante de diversas implicações. Quando dizemos por exemplo que, “Se a é um quadrado então a tem 4 lados iguais” o aluno deve chegar à conclusão de que a implicação está correta, porém, a recíproca não é verdadeira. O mesmo vale para a implicação “Se a é um quadrado, então a tem 4 ângulos iguais”. Dependendo do nível escolar, não será simples fazer a dedução de que a recíproca é falsa a partir desse exemplo. Assim, um recurso didático que pode ser utilizado para bloquear a conversão inválida é a expansão da premissa maior, adicionando um contraexemplo que bloqueie a recíproca da implicação.

Dias e Ruiz32 (1990) demonstraram que a expansão da premissa maior,

adicionando-se uma frase que exemplifique outro fato pertencente a uma mesma categoria(por exemplo: se são cachorros, então são animais; mas gatos também são animais), melhora significativamente o desempenho de crianças de 5 a 8 anos nas formas inválidas (MEIRA; DIAS; SPINILLO; 1993, p. 117).

Neste caso, a implicação “Se a é um quadrado, então a tem 4 lados iguais; mas o losango tem 4 lados iguais” deve bloquear a implicação “Se a tem 4 lados iguais, então a é um quadrado”. A partir disso, o aluno poderá perceber que apenas ter 4 lados iguais não

32 DIAS, M. G. B. B.; RUIZ, E.L. Bloqueando a conversão inválida. Arquivos Brasileiros de Psicologia,

é condição suficiente para ser um quadrado. Podemos generalizar essa ideia para a compreensão de outros polígonos. Esse tipo de exemplo mostra uma possibilidade de se trabalhar a Lógica no ensino e na aprendizagem de Matemática. Aqui, a Lógica funciona como auxiliar para se compreender as necessidades das definições de alguns objetos e não como um conteúdo em si. Não foi preciso introduzir conceitos de Lógica formal e nem trabalhar diretamente os aspectos da Lógica para fazer dela um meio para a compreensão de um objeto. Nesse caso, a Lógica foi vista de forma indireta, utilizada para se desenvolver uma aprendizagem crítica a respeito do conteúdo. Mesmo quando vemos a Lógica de forma indireta, o raciocínio lógico é trabalhado e desenvolvido.

Segundo os Parâmetros Curriculares Nacionais de Matemática para o ensino fundamental (BRASIL, 1998), o desenvolvimento da capacidade de raciocinar dedutivamente não deve se restringir apenas aos conteúdos de Geometria, mesmo esses propiciando um campo fértil para sua exploração. O pensamento dedutivo, mesmo indireto, é desenvolvido, até mesmo, anteriormente. Assim, devemos trabalhar o pensamento lógico-dedutivo também em outras áreas da Matemática.

Uma outra possibilidade de trabalhar a Lógica em conteúdos matemáticos se dá na da aprendizagem da probabilidade. A Lógica permeia diversas partes deste assunto, podendo assim ser trabalhada como metodologia para a aprendizagem crítica do conteúdo. Conceitos como disjunção e conjunção podem ser trabalhados indiretamente para se entender problemas probabilísticos envolvendo conectivos. Na figura 17 vemos um exemplo de um problema de probabilidade envolvendo o conectivo “ou”, encontrado em um livro didático aprovado pelo Programa Nacional do Livro Didático 2018.

Figura 17 – Exercício de probabilidade Fonte: LEONARDO (2016, p. 36)

Uma inserção lógica atrelada a teoria dos conjuntos é uma opção que pode ser utilizada para uma melhor compreensão de problemas deste tipo.

Ao pensarmos em uma inserção didática utilizando a manipulação de um baralho para melhorar a compreensão de problemas probabilísticos, o uso da Lógica proposicional aparece na escolha de quais cartas seriam consideradas como favoráveis para a contagem probabilística. Por exemplo, na pergunta (a) da figura 17, o estudante deve entender quais cartas fariam parte do conjunto de casos favoráveis. Dessa forma, caso um indivíduo queira saber a probabilidade de retirar uma carta de paus ou uma dama, deve contar como casos favoráveis as cartas de paus e as damas, incluindo a dama de paus. Essa escolha não é aleatória, ela respeita a ideia de que ter apenas uma proposição simples verdadeira é suficiente para a validade do argumento. Assim, retirar apenas uma carta de paus, mesmo não sendo uma dama, é suficiente para atingir o objetivo desejado. Já com o conectivo “e”, somente o caso em que as duas proposições simples sejam verdadeiras, será contado como caso favorável. Caso queiramos retirar uma carta de copas e de número 2, a única carta possível é retirarmos o 2 de copas, pois somente a veracidade de ambas acarreta a validade do argumento.

Uma outra forma de trabalhar a Lógica em um contexto probabilístico a fim de perceber as relações de ordem entre a probabilidade de conjunções, disjunções e proposições simples. Em um certo exemplo, encontrado em Azevedo e Vaz (2018), o

número de entrevistados que marcaram a resposta b no exemplo a seguir foi de 64%, sendo a letra a a resposta correta.

Exemplo:

Lorena é e sempre foi muito talentosa com os números. Em sua opinião, é mais provável que Lorena seja:

a) Professora de Matemática.

b) Professora e pesquisadora de Matemática.

Este resultado mostra que talvez os alunos ingressantes na Licenciatura em Matemática desconheçam o conteúdo necessário para acertar a questão, o que sugere que grande parte dos estudantes que responderam equivocadamente na segunda questão, o fizeram por desconhecimento e não por influência da heurística da representatividade. (AZEVEDO; VAZ, 2018, p. 10)

Esse conteúdo vaga entre a Lógica e a probabilidade, caso queiramos pensar as áreas separadamente. Esse conhecimento, considerado como desconhecido para alguns alunos, representa a ideia de que a probabilidade de um certo conjunto é sempre maior ou igual a probabilidade de sua interseção com outro conjunto. No campo da Lógica, uma conjunção só será verdadeira se ambas as proposições simples forem verdadeiras. Logo, a probabilidade de uma proposição simples ser verdadeira é maior ou igual a probabilidade de duas proposições serem verdadeiras. E mais, caso a conjunção seja verdadeira, então qualquer uma das proposições simples também será. No caso acima, caso a opção b fosse verdadeira, logicamente a opção a também seria. Porém o inverso não é verdadeiro.

Além dos exemplos citados, a Lógica pode ser utilizada em diversos conteúdos tornando-se uma aprendizagem constante ao decorrer da escola básica. Alguns textos como Martins (2015) e Martins Neto e Abar (2008) também trazem propostas para trabalhar a Lógica em sala de aula.

Documentos relacionados