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3. DIVERSIFICAÇÃO INSTITUCIONAL DA EDUCAÇÃO SUPERIOR NO

3.1. Lógica Organizacional do Produto Educação

Charles Perrow (1976) discute as vantagens e desvantagens da burocracia nas organizações complexas. Segundo o autor, é fundamental na análise das organizações burocráticas entender como são distribuídas as formas de poder nestas organizações, e, se o poder se concentra em algumas pessoas, como elas utilizam os instrumentos para os objetivos da instituição, que podem ser de natureza não oficializada ou legitimada pela organização. Desse modo, Perrow discute problemas como a moralidade das organizações, a relativização da autoridade do empregador, racionalidade, coerência das estruturas organizacionais. As organizações passam a ser vista como locais de negociação e definição de situação, controlando as ações de indivíduos com “racionalidade limitada” por meio de propagandas, socialização, treinamento, criação e exaltação de características específicas de determinada organização.

Critica-se desta forma as teorias que concebiam as organizações voltadas para um fim específico, com objetivos e preferências ordenados e definidos claramente. Para o autor, as organizações são essencialmente um espaço de negociações. Portanto, é importante considerar as situações, processos históricos em que foram concebidas negociações anteriores e que formaram e consolidaram as organizações.

Perrow (1976) concebe a tecnologia, entendida como um processo de transformação de matérias primas em produtos comercializáveis, como um determinante das estruturas organizacionais. Uma estrutura organizacional tende a ser mais ou menos burocratizada na medida em que a matéria prima utilizada para a concepção do produto envolve mais ou menos complexidade, seja pela própria natureza da matéria prima ou pelas situações variadas no processo de transformação. Quanto mais complexo for o processamento da matéria prima, isto é, quanto menos conhecida for a matéria prima ou mais ambigüidade, incerteza estiver associada a sua produção, menos a organização estabelece uma estrutura bem definida, conseqüentemente, menos burocratizada tende a ser.

Philip Selznick (1968) analisa as organizações mais do ponto de vista estrutural- funcionalista, enfatizando as estruturas subjacentes ao processo produtivo, como os conflitos entre grupos, a estrutura de poder, as disputas por poder e prestígios, os valores comunitários presentes. Tais características conduzem organizações a terem uma lógica própria de funcionamento que vai além da própria lógica de eficiência, ou seja, as organizações se institucionalizam, consolidam uma imagem. A abordagem funcionalista tende a entender o poder como legitimação de uma função.

March e Simon (1959) discutem o aspecto da racionalidade nas organizações como um componente importante de análise. Os autores conceituam o comportamento racional como “a substituição da realidade complexa por um modelo de realidade suficientemente simples para poder ser tratado mediante processos de solução de problemas”. (MARCH e SIMON, 1959, p. 212). Eles destacam que a determinação da situação pelo agente envolve uma complexidade de processos afetivos e cognitivos. March e Simon atentam para o fato de que a cognição não só entra na definição da situação do ponto de vista da realização de objetivos, mas também na formação desses objetivos, que são efetivamente utilizados como critérios de escolhas, porém quase nunca apresentam valores definitivos.

Eles enfatizam que a definição de uma situação tem que ser o mais simples possível para ser incorporada pela mente humana. Os limites da racionalidade sugeridos por March e Simon (1959) partem da premissa das propriedades dos seres humanos de realizar programas bem definidos, porém de complexidade limitada.

Baseadas na teoria de March e Simon (1959), de colocar em questão a idéia de racionalidade das organizações tida como um pressuposto, surgem novas teorias organizacionais. Um dos expoentes do chamado “neo-institucionalismo” é Weick (1976). Ele caracteriza as “organizações complexas” como um conjunto de atividades frouxamente articuladas (“Loosely Coupled Systems”). Nesse sentido, é importante essa idéia da articulação frouxa para por em questão elementos “tomados como pressuposto” anteriormente pelo pesquisador (como preocupação com estruturas racionalizadas, eficientes, coordenadas). Especialmente, organizações complexas, como as organizações educacionais, tendem a produzir atividades de caráter mais frouxo, menos enquadradas através de um modelo burocrático, mais rígido.

A idéia de “loosely coupled systems”, portanto, está ligada a co-presença de diversas atividades independentes numa organização como a educacional, com objetivos variados, onde se observa a diversidade de trabalhos e seu caráter multi-facetado, como ressalta Reponem (1999). Este também enfatiza que o produto oferecido pela organização educacional tem sua especificidade, ao invés de bens ou serviços concretos, esta organização oferece como produto “knowledge services”, relacionados, portanto, ao conhecimento, sendo grande a incerteza, ou ambigüidade associada a sua produção, nos termos de Perrow (1976).

Prates (2001) ressalta que as instituições escolares têm grande especificidade. Estas organizações constituem um tipo singular de organização. Há grande dificuldade em definir sem ambigüidade quais são seus objetivos, seus resultados esperados, isto é, se a finalidade de sua atuação está em formar profissionais competentes, produzir conhecimentos relevantes e originais, novas tecnologias, etc., e, mesmo que se defina está associada a esta atividade alto grau de incerteza, próprio de organizações complexas, como na literatura organizacional ressaltam Perrow (1976), Weick (1976), March e Simon (1959), Reponem (1999). A organização universitária requer um modelo decisório que prime pela negociação política e por uma estrutura flexível que possibilite o trânsito de pessoas em programas de ensino, projetos de pesquisa e extensão, etc. Um exemplo da ambigüidade associada aos objetivos, produtos de uma organização educacional pode ser visto na própria legislação brasileira, ao tratar sobre as finalidades do ensino superior (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional nº 9.394/96 – LDB, art. 43):

I. estimular a criação cultural e o desenvolvimento do espírito científico e do pensamento reflexivo;

II. formar diplomados nas diferentes áreas de conhecimento, aptos para a inserção em setores profissionais e para a participação no desenvolvimento da sociedade brasileira, e colaborar na sua formação contínua;

III. incentivar o trabalho de pesquisa e investigação científica, visando ao desenvolvimento da ciência e da tecnologia e da criação e difusão da cultura e, desse modo, desenvolver o entendimento do homem e do meio em que vive;

IV. promover a divulgação de conhecimentos culturais, científicos e técnicos que constituem patrimônio da humanidade e comunicar o saber através do ensino, de publicações ou de outras formas de comunicação;

V. suscitar o desejo permanente de aperfeiçoamento cultural e profissional e possibilitar a correspondente concretização, integrando os conhecimentos que vão sendo adquiridos numa estrutura intelectual sistematizadora do conhecimento de cada geração;

VI. estimular o conhecimento dos problemas do mundo presente, em particular os nacionais e regionais, prestar serviços especializados à comunidade e estabelecer com esta uma relação de reciprocidade; VII. promover a extensão, aberta à participação da população, visando à

difusão das conquistas e benefícios resultantes da criação cultural e da pesquisa científica e tecnológica geradas na instituição.

Prates (2001) enfatiza que a lógica institucional que privilegia a convergência de interesses e identidades é mais adequada a esse tipo de organização do que uma lógica de administração baseada numa racionalidade estritamente econômica. O autor indica que um sistema de “quase mercado”, onde fosse valorizada uma competitividade acadêmica entre grupos e fosse privilegiada uma estrutura decisória baseada no acesso de lideranças acadêmicas dentro da instituição, com menores controles burocráticos sobre aqueles que captassem recursos, prestígios ou influência diversa para a instituição, poderia trazer maiores êxitos e diminuir os dilemas institucionais enfrentados por essas instituições de ensino superior. Quando se opta por estabelecer como parâmetro um modelo organizacional como o do mundo empresarial, corre-se grande risco de ineficiência, ineficácia, do ponto de vista administrativo, como observa Dill (1997) em seu estudo.