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ao Conhecimento Tradicional Associado ao Recurso Genético

5 INSTRUÇÃO NORMATIVA FUNAI Nº 01, DE 29 DE NOVEMBRO

1.9 A Exigência Legal de Laudo Antropológico para Contratos com Comunidades Indígenas

1.9.2 O Laudo Antropológico Deverá ser Produzido Durante o Processo de Anuência Prévia

Para o processo de acesso com potencial ou perspectiva de uso comercial de patrimônio genético e/ou conhecimento

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tradicional associado é requerida a assinatura do Termo de Anuência Prévia, com os sujeitos previstos pela Medida Provisória que regula o acesso ao patrimônio genético e ao conhecimento tradicional associado – as comunidades indígenas e locais. A razão da exigência deste documento, que deve ser anterior à realização de um contrato de acesso e repartição de benefícios, está na Convenção sobre Diversidade Biológica, a qual foi incorporada ao direito brasileiro pelo Decreto Presidencial n. 2.519/98.

A Convenção prevê em seu artigo15, 5:

“O acesso aos recursos genéticos deve estar sujeito ao consentimento prévio

fundamentado da Parte Contratante provedora destes recursos, a menos que de outra forma determinado por essa parte”. (BRASIL, 2004, art. 15, 5,

grifos nossos)

No direito brasileiro, o Consentimento Prévio Fundamentado foi traduzido como Anuência Prévia de acesso ao patrimônio genético e ao conhecimento tradicional associado, e sua exigência está prevista no artigo16, § 9 da Medida Provisória n. 2.186-16/2001:

A Autorização de Acesso e de Remessa dar-se-á após anuência prévia: I – da comunidade indígena envolvida [...]

II – do órgão competente, [...] III – do titular da área privada;

IV – do Conselho de Defesa Nacional [...] V – da autoridade Marítima.

Há uma falha na prescrição deste artigo que, diferentemente do disposto para o Contrato de Utilização do Patrimônio Genético e de Repartição de Benefícios (artigo 27), não traz explícita a comunidade local como sujeito anuente. A interpretação da Medida Provisória e da CDB, como já descrito

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acima, impossibilita afirmar que a comunidade tenha sido excluída da exigência de anuência prévia, obrigando-nos a uma interpretação extensiva, que subentenda a comunidade local na previsão do titular da área.

De outro modo, não poderia ser, seja pela ideologia da Medida Provisória, seja pelo texto da CDB, norma interna no direito brasileiro, posto que a comunidade local encontra-se protegida do mesmo modo como a comunidade indígena pela previsão do consentimento prévio fundamentado para permitir o acesso.

Regulando o dispositivo sobre anuência prévia, destacam- se a Resolução n. 06/2003 (para o acesso ao conhecimento tradicional com potencial de uso comercial), a Resolução n. 09/2003 (para acesso ao componente do patrimônio genético para fins de pesquisa científica, sem potencial de uso comercial) e a Resolução n. 12/2004 (para o acesso ao componente do patrimônio genético com finalidade de bioprospecção ou desenvolvimento tecnológico).

As três resoluções trazem as diretrizes de orientação do processo de obtenção de anuência prévia, ressalvando o fato de não serem exaustivas, posto que a legislação poderá prever outras exigências. São elas, de maneira resumida:

I. Esclarecimento aos anuentes, em linguagem acessível, sobre o objetivo da pesquisa, a metodologia, a duração, o orçamento, os possíveis benefícios, fontes de financiamento do projeto, o uso que se pretende dar ao componente do patrimônio genético a ser acessado, a área geográfica abrangida pelo projeto e as comunidades envolvidas.

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II. Esclarecimento sobre os impactos ambientais, sociais e culturais decorrentes do projeto, os direitos e responsabilidades de cada uma das partes.

III. Respeito às formas de organização social.

IV. Estabelecimento sobre as formas de repartição de benefício.

V. Garantia de respeito ao direito da comunidade de recusar o acesso ao conhecimento tradicional associado ao patrimônio genético, durante o processo de obtenção da anuência prévia.

VI. Provisão de apoio científico, lingüístico, técnico e/ou jurídico independente à comunidade, durante todo o processo de consulta, sempre que solicitado.

1.9.2.1 Orientação Internacional para Anuência Prévia

A CDB identificou três princípios orientadores na elaboração de políticas adequadas e efetivas de consentimento prévio informado para comunidades locais e tradicionais.

Os detentores de conhecimento tradicional devem (1) sentir-se seguros em acordos envolvendo direitos de posse relativos às terras, florestas e águas marinhas /internas de sua propriedade; (2) sentir- se seguros de que foi conferida a eles a mesma situação dos demais membros da parceria; e (3) estar convencidos da existência de um objetivo comum, compatível com seus valores culturais e ecológicos. (LIMA; BENSUSAN, 2003, p. 28)

No âmbito internacional, a decisão VII/16 da Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica, a qual o Brasil está vinculado, ocorrida em Kuala Lampur, Malásia em fevereiro de 2004, traz decisões para implementação do artigo 8 (j) da CDB. Nesse documento, existem elementos de um plano de ação para retenção do conhecimento tradicional, inovações

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e práticas de comunidades indígenas e locais para incorporação

(embodying) do modo de vida tradicional relevante para a

conservação e uso sustentável da diversidade biológica. São eles: I - Processo de monitoramento e acompanhamento;

II - Desenvolvimento de indicadores para avaliar o sucesso ou fracasso das medidas para promover ou preservar o conhecimento tradicional; III - Pesquisa ética para desenvolver código de ética ou conduta para orientar relações. Partes, Governos, organizações internacionais, instituições de pesquisa e negócios devem respeitar e promover os códigos de ética existentes e facilitarem o desenvolvimento de outros códigos pelas comunidades indígenas e locais onde não existir. IV - Pesquisa e implementação de mecanismos e medidas destinadas a sublinhar causas do declínio do conhecimento tradicional, práticas e inovações.

V - A legislação de proteção e promoção do uso do conhecimento tradicional inovações e práticas deve ser consistente com as necessidades e objetivos das comunidades indígenas e locais, inclusiva e efetiva.

VI - As partes devem desenvolver medidas e mecanismos para mitigar as conseqüências das ações que diminuam o conhecimento tradicional fortalecendo modos de vida tradicionais relevantes para a conservação e o uso sustentável da diversidade biológica.

VII - As partes e os governos e organizações relevantes devem facilitar a atuação das estruturas organizacionais indígenas e de representação das comunidades locais existentes.

VIII - As partes, governos e os relevantes stakehonders devem ser

encorajados a aprender sobre conhecimento, inovações e práticas das comunidades indígenas e locais fortalecendo os modos de vida relevantes para a conservação e o uso sustentável da diversidade biológica e incorpora-lo no processo de tomada de decisão. (BRASIL, 1992)

Além disso, essa decisão contém o imperativo de “[...] integração das avaliações de impacto cultural, ambiental e social, como um único processo [...]”, trazendo os elementos de sua elaboração.

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No que concerne à avaliação dos impactos culturais, o escopo passa pela análise dos seguintes elementos:

• impactos possíveis sobre a continuação do uso costumeiro dos recursos biológicos;

• impactos possíveis sobre o respeito, preservação, proteção e manutenção do conhecimento tradicional, práticas e inovações;

• protocolos;

• impactos possíveis sobre sítios sagrados e sobre atividades rituais associadas;

• respeito pela necessidade da privacidade cultural; e

• possíveis impactos sobre o exercício das normas costumeiras.

Para finalizar, essa decisão vincula todos os procedimentos para a obtenção do Consentimento Prévio Fundamentado.

É relevante a explanação dessa decisão, uma vez que dela devem derivar as normas de direito interno. Assim, os passos a serem seguidos no processo interno de Anuência Prévia, estão detalhados nos tópicos da decisão acima descrita. Dessa exigência complexa e detalhada sobreveio a imposição do acompanhamento do laudo antropológico, uma vez que somente um especialista poderia com segurança orientar a identificação dos sujeitos assim como os passos que são requeridos no Consentimento Prévio ou Anuência Prévia.