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6.2 ATIVIDADE DE LEITURA E DISCUSSÃO DO CONTO – 2º MOMENTO

6.2.1 Leitura do primeiro episódio

A leitura do primeiro episódio aconteceu no segundo encontro com os alunos (dia 7 de novembro). No início da aula propus que os alunos formassem um círculo, o que foi aceito, mas a organização nessa disposição ofereceu dificuldades, pois naquela sala são utilizados conjuntos de mesa e cadeira individuais, que ocupam mais espaço e são melhor acomodados em formato de fila. Os membros de cada grupo foram orientados a se posicionarem próximos entre si e foram distribuídas as cópias, uma para cada aluno, apenas do primeiro episódio do conto.

Organizado o círculo e distribuídas as cópias, retomamos e discutimos brevemente alguns temas tratados nas atividades prévias: as palavras do diagrama, e as ideias presentes nos vídeos exibidos na aula anterior e na apresentação oral. Nessa discussão, vários alunos informaram que já participaram do Círio em Belém, outros manifestaram familiaridade com o contexto do Círio. Foi reafirmada aos alunos a necessidade da leitura em voz alta, um parágrafo por aluno que se propusesse a ler.

Com objetivo de diminuir a timidez dos alunos com relação à leitura em voz alta, iniciei lendo os primeiros parágrafos, em que o narrador dá as primeiras pistas sobre si mesmo, explica as circunstâncias de sua promessa e enfatiza a necessidade de colocar o ex-voto no carro em movimento. A leitura foi interrompida brevemente e foram feitos à turma alguns questionamentos e comentários sobre a parte inicial do texto. Os questionamentos objetivavam verificar se os alunos tinham feito uma leitura eficiente do início do texto, pois o entendimento desse trecho era essencial para a continuação da leitura.

Os discentes foram provocados identificar o contexto social e cultural do narrador, a refletir sobre o fato de um devoto fazer uma promessa para ser cumprida

por outra pessoa. Nesse momento, uma aluna afirmou que quando ela era recém nascida sua mãe fizera uma promessa e obteve o milagre (ela não quis revelar qual foi o milagre); e que desde que ele se lembra, todos os anos essa aluna acompanha a procissão do Círio de Nazaré da cidade do Acará em pagamento à promessa feita por sua mãe, embora ela mesma não goste dessa obrigatoriedade anual.

Passado esse primeiro momento de interrupção da leitura, os alunos continuaram a ler os parágrafos seguintes. A leitura fluiu satisfatoriamente, embora eu tenha lido alguns parágrafos em momentos em que nenhum aluno se propunha a ler. Naqueles momentos julguei necessário puxar a leitura para não perder o ritmo da atividade. A partir daí, intercalamos a leitura: eu lia um parágrafo e algum aluno lia outro, outro aluno lia um terceiro e assim por diante. No meio do episódio, fizemos nova interrupção para aprofundar a discussão sobre o que já havia sido mencionado na pausa anterior e comentar outros tópicos surgidos até então, pois haviam surgidos mais elementos, mais detalhes e mais nuances na história. Foi o momento em que nos atentamos mais às características do narrador, sua linguagem, sua cultura, sua visão de mundo.

O efeito do álcool e o adensamento da multidão em volta do romeiro protagonista também foram discutidos com os alunos. Alguns alunos declararam que as dificuldades enfrentadas pelo narrador para depositar o voto no Carro se deviam mais à embriaguez do que ao aperto do povo. Os alunos foram provocados a comparar a forma como o discurso é organizado no conto com as narrativas que os mais velhos costumam contar. O vocabulário, as interrupções e as repetições foram apontados pelos alunos como pontos de contato entre as narrativas orais e o conto lido. Complementei afirmando que esses elementos são responsáveis pelo ritmo particular da narrativa. Nesse momento chamei a atenção para a ―gestualística verbal‖ de que fala Benedicto Nunes na apresentação do livro.

Cinco alunos, sendo 4 meninas e 1 menino, leram com muita desenvoltura o texto, mas em tom baixo. A audição da leitura pelos colegas foi prejudicada ainda mais pela poluição sonora, pois a verbalização da leitura era abafada em alguns momentos pelo alto nível de ruído externo causado pelos veículos que passavam pela rodovia. Apenas três alunas leram com desenvoltura e em tom alto o suficiente para minimizar os efeitos dos ruídos, fazendo com que os colegas ouvissem relativamente bem.

Finalizada a leitura, selecionamos alguns aspectos relevantes no episódio lido e distribuímos aos grupos, entre esses aspectos estavam aqueles já mencionados nas interrupções durante a leitura. Os alunos comentar sobre o aspecto que lhe cabia e poderiam exemplificar um trecho em que cada aspecto é perceptível de forma explícita ou implícita. Anotamos vários aspectos no quadro e cada grupo escolhia um para comentar. Esses aspectos já haviam sido identificados previamente, durante a fase de planejamento da atividade, com base numa leitura atenta do texto. Esse direcionamento teve o objetivo de direcionar a discussão para aquilo que o texto apresenta de essencial, otimizando o tempo da aula.

Os aspectos escolhidos pelos grupos foram: a linguagem, a figura da mãe do narrador, os espaços, o efeito da embriaguez na mente do narrador, o narrador e as imagens construídas no texto. Alguns desses tópicos já tinham sido contemplados nas intervenções feitas durante a leitura, mas apareciam em várias passagens do texto. Nesse ponto, fomos a cada grupo verificar as eventuais dúvidas, em seguida foram feitos os comentários, alguns complementados por trechos exemplificadores.

Quanto à linguagem, aspecto escolhido pelo grupo 2, direcionamos a discussão para as características da oralidade regional, os alunos identificaram e leram trechos que continham as palavras ―japá‖, ―sumano‖; e tiveram sua atenção chamada para as interrupções comuns no discurso falado. A respeito da imagem da mãe do narrador (grupo 3) que é construída nesse episódio, os alunos foram perguntados se a ―velha mãe‖ era apresentada de forma realista ou fantástica, ao que responderam que era descrita como uma heroína.

Sobre os espaços urbanos que apareciam no texto os alunos do grupo 1 citaram as ruas, o cais, as calçadas. Quanto aos espaços naturais, esses mesmos alunos leram trechos em que apareciam a mata fechada, o mar, o mangue, o igarapé, a lama, além das estrelas e das árvores pelas quais o narrador se orientava em sua aventuras ou no seu dia a dia. O desconforto do narrador nos espaços urbanos e a familiaridade com a natureza foram destacados pelos alunos do grupo. O efeito da embriaguez, que coube ao grupo 4, foi demonstrado pelos alunos num trecho em que o narrador perde o barquinho, complementando que as sensações que atormentavam o romeiro eram devidas mais à bebida que ao calor e aperto dos devotos.

O narrador foi o aspecto escolhido pelo grupo 5. Os alunos comentaram a formação cultural do personagem, que indica ser ele caboclo amazônico, acostumado à vida dura do trabalho ao sol, à noite, na água etc. O grupo 6 escolheu comentar as imagens presentes no texto. Os alunos identificaram imagens em trechos nos quais as repetições (―gente, muita gente‖) ou as gradações contribuem para a beleza estética do texto e comentaram timidamente esse elemento importantíssimo na narrativa de Monteiro. Chamamos a atenção dos alunos da turma para as imagens suscitadas pelas construções ―a água não tem cabelo‖ e ―igarapé lambendo a ribanceira‖, perguntando o que cada construção traz à mente do leitor. Sobre a primeira ninguém arriscou comentar, mas sobre a segunda os alunos foram quase unânimes em apontar que a construção resulta na imagem de ―a maré alta‖, ―maré grande‖, ―água vivas‖, ―rio cheio‖, ―a margem alagada‖ etc.

Todos os grupos comentaram com relativa facilidade o elemento que lhe cabia e complementaram apontando vários trechos do texto, mas a leitura em voz alta do trecho escolhido apresentou problemas e eu tive que ler os fragmentos escolhidos por alguns grupos. Também os comentários foram na maioria tímidos e superficiais. Houve casos em que os alunos fizeram comentários muito pertinentes, mas tão baixo que apenas eu e os colegas mais próximos ouvimos. Após a fala de cada grupo, foi franqueada a palavra aos outros grupos para que apresentassem contribuições sobre determinado aspecto em questão, mas poucas e breves contribuições surgiram.

Houve diferença notável no nível de participação entre os grupos tanto na leitura quanto nos comentários. Os grupos 1, 2 e 4 manifestaram maior empenho durante a leitura em voz alta, lendo com desenvoltura e se esforçando para superar os ruídos externos. Entretanto, na discussão apenas os grupos 2 e 4 comentaram com mais consistência, demonstrando melhor apropriação do texto. Os grupos 3, 5 e 6 foram menos participativos, apenas um ou dois alunos de cada grupo leram e contribuíram com comentários, enquanto os outros não se manifestaram.