• Nenhum resultado encontrado

Lesões patliologieas internas, deixadas pelas febres puerperal e traumatica

No documento SEGUIDA DE SEIS PROPOSIÇÕES (páginas 34-54)

É este o capitulo que menos abona a essencialidade da febre puerperal.

Desde que a anatomia pathologica entrou como verda- de-principio, verdade-mãe, no corpo das sciencias naturaes, e se tornou a pedra angular do edifício da medicina; des- de que os naturalistas vieram contrastar por ella o valor das moléstias, subio de preço a natureza da febre puer- peral na doutrina da verdadeira localisação.

A anatomia pathologica, tomada pelos localisadores e essencialistas como arbitro na questão da natureza d'esta doença, decidio em favor d'aquelles, baseando o porque da sua sentença em factos terminantes que apresentou, e em tantos, que só um livro de grosso volume seria suf- ficiente para dar conta de todos elles; assim, pois, lum- tar-me-hei a mencionar os que bastam para comprovar a analogia, que ha entre as lesões da febre traumatica c da puerperal.

— 40 —

symptomas, que se dão nos pacientes d'estas duas molés- tias, deduz-se a mesma relação entre as lesões mórbidas de cada uma, porque ellas são o contra-cunho dos phe- nomena observados no vivo, e a analogia dos effeitos é aqui conclusão necessária da analogia das causas ; mas não queiramos só a lógica dos raciocínios, quando tam- bém os factos podem fazer mais palpáveis as verdades, e entremos portanto na sua observação.

Numerosas autopsias, feitas nos cadáveres dos indiví- duos sucumbidos á febre puerperal, teem mostrado pro- vas innegaveis de recente inílammação aguda n'um ou mais órgãos do corpo, taes como as observadas nos mor- tos por febre traumatica; e alguns dados estatísticos, que passo a enumerar, servirão de base á comparação das le- sões inílammatorias achadas na puerpera e no1 operado. A tabeliã immediata é feita por Dugés, segundo o resul- tado que colheu do exame post mortem em 341 casos fa- faes de febre puerperal; e as lesões, que elle achou nos 341 cadáveres de mulheres paridas, foram, nas seguintes proporções, estas:

Péritonite em 266 casos Metrite ou pus nas veias etc 200 » Ovarite 48 » Gastrite e enterite 4 » Pleurite 40 » Pericardite 6 » Arachnite . . . 1 » Pus nos músculos ou articulações . . 8 » As observações de Dugés não foram ainda as mais minu- ciosas, ao menos pelo que respeita aos órgãos uterinos e

— 41 —

abdominaes. Foi mais além Tounellé n'este ponto, como mostra a seguinte tabeliã dos resultados observados por elle em 222 casos de febre puerperal fataes também.

Péritonite em 193 c a s o s

Metrite e ovarite 197 » Pus nas veias uterinas ou lympha­

ticas 1 1 2 »

Gastrite e enterite 6 *

Pleurite 4 3 »

Pneumonia 21 » Pericardite e Hidro­pericardite. . . 1 » Pus no fígado, pancreas, múscu­

los, etc I9 ' »

Pus nas articulações •■ • • • *" * Em quanto aos órgãos internos, que mais frequente­ mente se acham affectados de lesões inflammatorias nos pacientes cirúrgicos, não possuimos realmente muitos de­ talhes, porque o numero das autopsias feitas aos seus ca­ dáveres tem sido também menor; porém Dr. Chevers dá uma interessante nota de 153 casos fataes de febre traumatica, observados no Hospital de Guy, era 134 dos quaes se descobriram as seguintes lesões internas :

Péritonite em 52 casos Enterite (excluindo casos de Hernia) 9 » Pneumonia e seus resultados . . . . 47 »

Pleurite 3 5 »

Bronchite 4 »

Pericardite 14 » Arterite e Aortite 4 »

— 42 —

Meningite 27 , Cerebrite -. 9 » Cystite , 8 » Pus nos músculos e articulações . . 3 » Inflammaação da tunica vaginal. . . 1 » A excepção de 19 casos, todos os 153 mostram vestí- gios de recentes lesões internas inflammatorias ; e com- paradas estas notas com as da anatomia pathologica da febre puerperal, vemos uma variedade de importante evi- dencia, relativa ás acções mórbidas internas, que prece- dem a morte n'esta febre e na traumatica.

As tabeliãs de Dugés, Tounellé e Chevers, provam bas- tante a analogia das lesões deixadas por ambas as molés- tias, quer na sua sede, quer na sua itensidade e varie- dade ; e fornecem argumentos sufficientes para poder-se refutar á posteriori, como á priori, a essencialidade da fe- bre puerperal.

A mesma falta de lesões apparentes, achada 19 vezes em 153 mortos de febre traumatica, responde aos que fundam a essencialidade da febre puerperal n'essa rasão, quando também as autopsias não descobrem nos cadáve- res das puerperas vestígio algum phlegmasico; e se os essencialistas não querem que a primeira febre seja tão essencial como a segunda, pelo mesmo motivo pôde di- zer-se-lhes que a negativa das autopsias depende n'alguns casos da sua imperfeição.

Algumas vezes as lesões passam desappercebidas, e n'ou- tras são pouco minuciosas as autopsias; e a este respeito citarei o caso, mencionado no « Moniteur des hospitaux »: = Depois de um cuidadoso exame iam alguns ob-

j — 4 3 —

servadores a retirar-se, convencidos de que não existia phlébite, quando de repente Castelnau, e Sappey, acha- ram irrecusáveis signaes d'ella.=

Porém não é virgem este caso. Um outro semelhante aconteceu a M. Beau no Hospital Cochin em 1857. «Uma mulher do meu serviço, conta elle, falleceu dezasete dias depois do parto, fez-se-lhe a autopsia, e nada se achou anormal nas cavidades splanchnicas ; mas, ao sair-mos já da sala do exame, um estudante espetou ao acaso um escalpello na região glútea do cadaver, e fez apparecer uma grande quantidade de pus, proveniente de um abcesso completamente latente na região lombar, que tinha produzido a febre puerperal, e matado a doente. » Sem duvida, deixam de descobrir-se bastantes vezes le- sões no cadaver, por imperfeição das observações ; todavia pôde uma mulher parida sucumbir também a uma affec- ção febril, que não deixe lesão alguma apreciável, sem que por isso se deva olhar essa affecção como uma febre essencialmente puerperal.

Vê-se com effeito n'alguns casos de clinica, posto que raros, homens ou mulheres morrerem depois de oito ou dez dias de uma moléstia revelada por symptomas febris, e terminada eom delirio ou coma, sem se acharem na autopsia rasões sufficientes para explicar a morte, e ape- zar de terem sido diagnosticadas meningites em todos elles; e, diz M. Beau, «estas febres indeterminadas não podem sobrevir nos partos, como outras affecções não es- sencialmente puerperaes, por exemplo, a veriola, a febre typhoide, etc., c serem occasionadas por commoções phi- sicas e moraes da parturição?»

— 44 —

«Tem-se dado pouca importância, continua elle, ás péssimas circumstancias moraes, em que se acham as mulheres depois de um parto illegitimo. No momento em que ellas precisam mais de tranquilidade e carinhos, são quasi sempre abandonadas pelo seu seductor, 5 sepa- das de sua familia, e inquietadas pelo futuro de seu fi- lho, que se acha somente a seu cargo. Tem-se fallado dos perigos da primiparidade, más é preciso acrescentar os da primiparidade illegitima ; o perigo de um primei- ro parto não vem só das difficuldades physicas : as temi- veis complicações moraes, a que estão sujeitas as mulhe- res primipares, dão também um bom contigente para a sua mortalidade.»

E por tanto admissivel que a puerpera succumba a uma affecção pyretica, sem deixar lesões pathologicas sen- siveis ; mas essa affecção não pôde ehamar-se febre puer- peral essencial, porque os mesmos phenomenos e resul- tados mostram-se indistinctamente em qualquer indivi- duo, nem tão pouco pôde Depaul dar esta denominação á doença que se manifesta com os mesmos caracteres n'al- gumas pessoas, fora das condições do estado puerperal, porque o nome deve ser então essencial e especifico como a idéa que exprime. Melhor seria neste caso dizer, como M. Trousseau :— não existe febre puerperal: a febre, de- signada por este nome, é commum para os infantes, para os operados, e t c . =

De toda a forma porém, são aproveitáveis estas decla-

1

Beau refere-se á clinica dos hospitaes ; e nestes., por via de regra, muito poucas mulheres casadas vão parir: quasi to- das as parturientes são obra da seducção.

— 45 —

rações dos essencial istas avec amour pour la localisation. Elles mesmos vem, sem o querer, affirmar a analogia das febres puerperal e traumatica, nos casos em que poderia- mos ter alguma duvida :=cjuando ellas se afastam do seu typo mais geral. =

Querem alguns essencialistas que as commoções mo- raes actuem de um modo especifico sobre a puerpera, para sustentarem ainda a essencialidade da febre puerperal contra esta objecção ; mas figurando ellas da mesma sorte no operado, como pôde conceder-se-lhes uma influencia de tal caracter?

Se bem me recordo, M. Sedillot nos prolegomenos do seu tratado de medicina operatória, fallando das contra- indicações das operações, diz assim: «O moral do doente não demanda menos cuidados que o physico. O medo, os presentimentos funestos, as resoluções desesperadas, exi- gem grande attenção. É preciso reanimar a coragem aba- tida. Sem estas precauções o espirito fica agitado, inquieto, e reage da maneira a mais temivel sobre o estado das constituições e das feridas.»

E esta doutrina professam todos os homens da scien- cia : não é privativa de um só. Durante o triennio de meu tirocinio de clinica cirúrgica, vi eu estabelecel-a, sempre que o caso o pedia, pelo dignissimo lente da cadeira, o dis- tincte operador Almeida.'

— 46 —

Algumas vezes estava já s. s.a com o escalpello na mão, prompto a dar o primeiro golpe, e suspendia-o, para adiar a operação, porque não achava o doente em boas disposições moraes. Eram circumstancias estas a que dava séria importância, pelo conhecimento que tinha do seu mau resultado ; e a propósito contava, entre outros, este caso da sua clinica particular.

«Consultado uma vez por um ourives d'esta cidade, que se queixava de padecimentos de bexiga, verifiquei que elles provinham d'uni calculo vesical, e indiquei a cystotomia. Ao ouvir fallar na operação mostrou o doente um ar de terror que me impressionou seriamente, e, pos- to que elle resolveu prestar-se a ella depois de conven- rido da sua necessidade, fiquei sempre considerando-o pusillanime, e prevenido conseguintemente do quanto havia a receiar das suas más disposições moraes se não fosse prudentemente desviada a sua influencia sobre a ope- cação.

Tratei de amimar o homem para a operação, e desti- nei fazel-a sem que elle soubesse da occasiâo senão no momento destinado, porque tinha experimentado que a noticia antecipada nunca o deixaria esperal-a em boas condições moraes. Na vespora do dia marcado para ella não appareci ao operando, e ordenei á familia que aprom- ptasse o que tinha a arranjar sem elle perceber ; o doen- -te, porém, desconfiou que a familia andava em prepa- rativos para a operação, começou a desanimar, e caiu em seguida n'um tal abatimento, que passou a noute como moribundo, e na manhã do dia seguinte, quando fui para operal-o, achei-o tão desfallecido, que decidi em

— 47 —

conferencia com os collegas presentes para assistir á ope- ração esperar pela tarde, a ver se com o uso d'aigu ns cordiaes elle se reanimava; mas o collapso passouápros- tração gravissima, e na noute desse mesmo dia o indivi- duo succumbiu.»

E que dizer a tudo isto ? Morreu accaso este homem d'alguma febre puerperal essencial, como as suppostas nas parturientes, que fallecem do mesmo modo antes de parir ? Ou podem estas succurabir também a uma igual af- fecção moral? Se o sr. Almeida não respeitasse o estado do seu operando, e um essencialista visse expirar este du- rante ou pouco depois da operação, diria que elle falle- cera como a puerpera, em que se fez o parto sob condic- ções de idêntica gravidade ? Ou viria ainda com a sua especificidade e essencialidade privativa da prenhez ? Eu penso que não, porque negar a evidente analogia d'es- tes factos, e obrigal-os a passar para um campo falso, não é fácil fazer-se depois de madura reflexão, e contra a propria convicção.

Provada, pois, como creio, a igualdade de circums- tancias, e a igualdade de razões que podem dar a falta de lesões orgânicas nos cadáveres das puerperas e opera- dos, e decidido que não pôde chamar-se febre puerperal essencial á moléstia, que não deixa signaes phlegmasicos apreciáveis nos órgãos da mulher parida, voltaremos ás considerações das injurias materiaes, que se observam nos casos fataes das febres puerperal e traumatica, para terminarmos a comparação que toca a este capitulo ; e não farei menção de mais dados estatisticos, porque jul- go sufficientes os já citados.

— 48 —

As tabeliãs de Chevers, Tounellé e Dugés, repito, dão arapja evidencia da analogia, que ha entre as offen- sas pathologicas deixadas por ambas as doenças sobre o corpo dos indivíduos, que succumbem a ellas, e provam cabalmente a aguda e muitas vezes extensa acção in- flammatoria occorrida antes da morte.

Ellas mostram que as. lesões inílammatorias internas raras vezes se limitam a um só órgão, em qualquer dos casos ; que dous ou mais tecidos são ordinariamente se- des simultâneas ou successivas da acção phlegmasia ; que as différentes partes assim atacadas são algumas ve- zes mui distinctas e distantes umas das outras, e que nos casos obstétricos o utero, appendices uterinos, e pe- ritonéo, são a sede mais commum da acção inflammatoria interna, ainda que os órgãos thoraxicos, ou outros, sejam frequentes vezes também affectãdos ; porém não permit- tem que as causas d'esta localisação especial possam con- siderar-se essenciaes do puerperio, ou da febre puerpe- ral, porque affirmam ao mesmo tempo que todas as'feri- das dos órgãos pélvicos e geradores, quando dão origem á febre traumatica, podem igualmente ser acompanhados da inflammaçâo do perilonéo, como o próprio órgão lesado.

Chevers encontrou a péritonite nos casos fataes de fe- bre traumatica em mais de 30 por cento das suas dis- secções, e se no acto da parturição o utero é a sede da lesão original, que ha de produzir a inflamação, e esta acção mórbida promptamente se estende pela lei de con- tinuidade do tecido aos seus apêndices e peritonéo, dete ella com muito maior rasão localisar-se n'esses órgãos, maximé não havendo na economia da^paciente outra par-

— 49 —

le mais fraca, mais combalida ou predisposta, para a qual uma métastase a faça transportar.

Desde Valsalva e Morgagni para cá teem-se observado injurias da cabeça, seguidas muitas vazes de inflamma- ção e effusão de pus no fígado, pulmões, pleuras, perito- néo, etc; Dupuytrin, Charles Bell, Guthrie, e outros, no- taram que, depois da amputação das extremidades, a in- flammação dos pulmões ou pleura era uma consequên- cia muito commum e muito fatal ; Velpau achou tantas vezes a pleuresia depois d'estas operações, que propoz dar á doença o nome de pleuresia purulenta dos operados; e Rokytansky, Routh, Kiwisch, e o dr. Simpson, fallando a par d'isto nas lesões inflammatorias do peito, como muito communs na febre puerperal, levam-nos mais uma vez a concluir que varias inflammações podem sobrevir á puerpera e ao operado, sobre regiões distantes da sua le- são, embora sejam pouco marcados esses phenomenos'du- rante a vida de/ qualquer dos indivíduos.

Acham-se effectivamente muitas vezes separadas da ferida original as vísceras, ou tecidos internos, que são as principaes sedes da inílammação : todavia estes casos pa- recem excepcionaes, e dependentes d'uma susceptibilida- de occasional, porque, em regra geral, o órgão lesado, ou seu visinho immédiate, é o primeiro na manifestação mór- bida, e mais depressa ainda se havia em qualquer d'elles uma predisposição para ella.

Relatarei a propósito um facto de que também tomei conhecimento por uma lição do digno lente de clinica cirúrgica. «Servi-me uma vez do lithotridor de Heur- teloup para calcular o volume e dureza de um calculo

.— 80 —

vesical, fiz a observação, e quando quiz fechar o ins­ trumento para extrahil­o, a pedra não se desprendeu d'el­ le, e obrigou­me a fazer algumas manobras com bastante attrito sobre a superfície interna da bexiga.

Eu tinha­ resolvido fazer a cystotomia hypogaslrica em dons tempos, e praticar o primeiro n'esse mesmo dia; mas, em virtude d'aquelle acontecimento, suspendi a opera­ ção, porque suppuz logo consequência infallivel d'elle a cystite. Com effeito ■ ella declarou­se, apesar dos meios preventivos, e se bem que ao oitavo dia estava debelada por um tratamento conveniente, achava eu ainda muito cedo para operar ; porém o doente, que todos os dias teimava pela operação, disse­me que nunca mais se su­ jeitaria a ella, se lh'a não fizesse n'aquelle dia, e forçou­ me, por assim dizer, a pratical­a. Executei conseguinte­ inente o primeiro tempo quasi violentado, e receioso d'um mau resultado, o que se verificou reapparecendo a cys­ tite com tal força, que communicou repentinamente a inflammação ao pirotonéo, aos intestinos, a todos os ór­ gãos abdominaes emfim, e fez suecumbir o doente ao terceiro dia, e antes do segundo tempo.»

Não foi n'este caso que a péritonite representou o 'pri­ meiro papel, como ordinariamente acontece : pertenceu á bexiga, pela circumstancia de ter ella um prévio estado mórbido, além da influencia da relação immediata em que estava também com a ferida da operação ; e tira­se d'aqui a razão porque no puerperio o peritonéo se inflam­ ma primeiro que o utero, e dá rapidamente origem á febre puerperal, quando do mesmo modo algum accidente o haja predisposto para isso.

— 5 1 —

Muitos mais factos d'esta ordem, fornecidos pela ana- logia pathologica das doenças em questão, me davam argumentos para reforçar o vinculo que as prende por este lado ; mas são elles tantos, e tão manifestos os já apresentados, que me parece prolixidade passar d'qui, e não rematar já assim este capitulo.—Pôde nos casos das febres puerperal e traumatica limitar-se a inflammação ao tecido lesado, ou estender-se a órgãos estranhos mais ou menos distantes, e pôde succumbir o operado como a puerpera sem mostrar lesões palhologicas, mas não po- dem estes vários phenomenos na puerpera depender só da alteração pimitiva do sangue, como alguns julgam, nem dar-se á febre puerperal uma essencialidade par- ticular.

A N A L O G I A

DA

Natureza pathologica das febres puerperal e traumatica

É esta a ultima parte da minha dissertação, e a con- clusão final da proposição que estabeleci.

Depois dos argumentos, que deixo expostos, some resta fazer a somma total d'elles, e por ella determinar a na- tureza pathologica da febre puerperal, para concluir o quadro comparativo que tenho esboçado. Mas o que é natureza pathologica de uma doença? Por natureza pa- thologica de uma doença, diz Cruveilhier, deve enten- tender-se, não a essência d'esta doença (porque não co- nhecemos a essência de nada), mas as relações que exis- tem entre uma doença que se quer determinar, e uma outra conhecida : assim, a natureza de uma moléstia é inflammatoria, quando apresenta os caracteres essenciaes da inflammação.; é cancerosa quando apresenta os cara- cteres essenciaes do cancro, etc. Da mesma forma consi- dero eu este theorema, e é debaixo dos seus princípios, que eu proseguirci na minha derrota, passando antes de

— 84-—

mais nadaá definição de febre, e ao modo como a patho- logia se occupa d'ella.

Febre (na accepção a mais geral) é um phenomeno pathologico que revela a reacção da economia viva con- tra o elemento mórbido, que lhe perturba a sua norma- lidade funccional, caracterisado por acceleração do pul- so e augmento de calor animal.

Pelas leis estabelecidas em pathologia fazem-se duas distincções capitães de febre — a essencial ou idiopathica = a symptomatica ou inflammatoria = , segundo ella se considera phenomeno primitivo ou secundário da doença. Estas duas divisões subdividem-se ainda em muitas ou- tras, que tomam différentes nomes e alcunhas, conforme a natureza do elemento que as produz, e as formas, graus, caracteres, circumstancias, condições, estados, etc., em que se manifestam. D'esté modo chama-se symptomatica á febre que se julga dependente de lesões orgânicas; essen- cial a que se mostra sem ellas serem percebidas, ou que procede, como querem alguns, de uma alteração dos líqui- dos desconhecida ; traumatica a que provém das feridas ; puerperal a que sobrevem á mulher puerpera, etc. etc.

No caso presente tratamos da febre na puerpera, para decidirmos a qual das divisões capitães pertence ; e para isso' seguimos a doutrina de Cruveilhier, procurando vér se ha entre ella e a febre que acommette o ferido, co- nhecida como symptomatica, relações que lhe determinem a mesma natureza.

Pelo que diz respeito aos predicados mais extrinsecos das doenças, temos nós já todos os dados a favor das suas relações ; e agora só falta entrarmos com elles no

— 35 —

intimo da febre era questão, para examinarmos as suas propriedade* intrinsecas, e concluirmos que cilas não são como as attribuidas ás febres essenciaes.

Diz Boerhave: (depois de Hipocrates) = Febris inflam- mationi individims comes=; mas não poderá dizer-se fanar hem = indhiduus comes febri inflammatio? Inflammação t

febre, phlegmasia e pyrexia, são dous grandes factos pa- thologicos, como quer Cruveilhier, que marcbam quasi sempre simultaneamente, e entre os quaes a questão de prioridade e de preeminência é muitas vezes difficil de

No documento SEGUIDA DE SEIS PROPOSIÇÕES (páginas 34-54)

Documentos relacionados