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O LEVANTE DOS SARGENTOS EM BRASÍLIA VISTO PELA IMPRENSA E PELOS

Como dito anteriormente, além do IAPC, outro fato complicou ainda mais a situação da já deflagrada crise militar. Foi o episódio conhecido como levante dos sargentos em Brasília41 que por ocasião da negativa do STF em dar posse aos sargentos que concorriam a cargos do poder Legislativo, promoveram uma insurreição na capital do país. O jornal Folha

de São Paulo42 com o título “Rebelião em Brasília – Sublevação de sargentos dominada pelo Exército – Reunida a Câmara – Prontidão nos quatro Exércitos” fez o seguinte registro do evento.

BRASÍLIA, 12 (FOLHA) - Às 9 horas de hoje, os sargentos dominavam ainda os pontos estratégicos da cidade e controlavam a situação. Carros de combate ocuparam a Esplanada dos Ministérios e o trânsito civil foi interrompido. Nesse local, ocorreu o primeiro choque entre as forças lideradas pelos sargentos e a oficialidade, morrendo o soldado Divino Alves dos Anjos e ficando feridos José Boldão Lessa e Marcelo Martins Morais, todos do Corpo de Fuzileiros Navais. [...].Rebelando-se contra a decisão do Supremo Tribunal Federal, que confirmou a inelegibilidade dos sargentos, os graduados aquartelados em Brasília, principalmente da Marinha e da Aeronáutica, começaram na madrugada de hoje a atacar e ocupar pontos importantes da cidade, tais como os Ministérios da Marinha, da Guerra, da Justiça e outros locais. [...] Até agora, houve pelo menos um morto e dois feridos. Em todo o resto do país, a situação é da mais completa normalidade, tendo o ministro da Guerra ordenado a todos os Exércitos que se mantenham de prontidão.

Segundo a Folha de São Paulo o líder do movimento era o primeiro sargento Antônio Prestes de Paula, da Aeronáutica. O levante não contou com a participação dos praças do Exército sendo logo debelado. O jornal registrou também que os rebeldes conseguiram

41 Para um relato completo do episódio ver Parucker (2009). 42 Jornal Folha de São Paulo (SP), 12 set. 1963.

prender um grande número de oficiais incluindo o coronel Carlos Cairoli que era o comandante do Departamento Federal de Segurança Publica.

Os rebelados foram aos poucos desalojados, por oficiais das três armas e tropas do Exército, dos locais que haviam ocupado. A Folha de São Paulo relatou ainda que ocorreram vários combates entre as forças comandadas pelos oficiais e os sargentos. Os tiros de fuzil e as manobras dos tanques e carros de combate dominaram o cenário de Brasília naquela manhã

Este episódio mostra como ficou delicada ainda mais a situação do ambiente político nas forças armadas. O levante contou, porém, com o apoio de movimentos sociais que pressionavam João Goulart para a realização das reformas de base.

Além do registro jornalístico é importante verificar também como alguns dos participantes da mobilização dos praças interpretaram o levante de setembro de 1963. Suas opiniões foram registradas através da pergunta

“O que foi o episódio de setembro de 1963 quando sargentos da Aeronáutica e da Marinha, sob a liderança de Antônio Prestes de Paula, se sublevaram e ocuparam posições chaves em Brasília? Como foi a reação da opinião pública e dos comandantes das Forças Armadas? A postura do Sr. João Goulart foi de neutralidade no episódio?”

D’Ornellas

Olha, não acredito que a posição do presidente João Goulart tenha sido de neutralidade, ele não demonstrou isso. (...) Tratou de superá-lo e realmente acabou superando. (...) não era correto fazer um levante no DF, sem discutir com os demais companheiros das outras unidades da Federação. Nós não tivemos conhecimento antecipado do levante. (...). Esse fato causou, com certeza, um desgaste no Movimento dos Sargentos e, se houvesse uma discussão prévia com os demais companheiros, possivelmente, o levante poderia não ter acontecido. (...) o problema não era só a elegibilidade dos sargentos, esse era um dos problemas da nossa pauta, porém havia os problemas da sustentação das liberdades democráticas no Brasil, da realização das Reformas de Base e do controle das remessas de lucros para o exterior. Então, não era justo causar dano ao governo que promovia as Reformas de Base que lutávamos para realizar. (...) a opinião pública da direita comemorou o levante: “esse governo subversivo fica estimulando a desagregação das Forças Armadas etc. etc.”. Então, para a direita golpista e entreguista o levante foi um inesperado presente como propaganda política contra o governo de Jango e as Reformas de Base.

Jorge Silva

(...) Em 1963, o companheiro Prestes de Paula liderou uma rebelião lá em Brasília. (...) ele chegou à conclusão que seria um momento para a gente agir dentro do nosso contexto, dentro do nosso campo de vida que seria militar, ou seja, nós lançarmos nossa indignação, nosso protesto contra a inelegibilidade do sargento Aimoré Zoch e outros. Esse foi um episódio que foi muito comentado, da inelegibilidade dos praças (...). O Prestes de Paula tinha uma grande correlação de forças e ele conseguiu uma repercussão muito grande tentando os objetivos políticos. (...) naquela época você se encontrava com o jovem e ele falava sobre política, grande parcela dos jovens daquela época se encontrava pra falar sobre política, ao invés de falar sobre futebol. Então nós tínhamos o apoio da sociedade brasileira. (...) Pode-se dizer que nessa rebelião de Brasília houvera uma parceria com uma parcela ponderável da sociedade civil. João Goulart queria as reformas de base, (...) e naquela época (...) a politização dos quartéis seria um meio pra se conseguir essas reformas de base. E os inimigos da pátria, do outro lado, viam como uma questão do comunismo. (...)

Jelcy Correia

Meu caro, eu não posso te dizer com muita certeza isso e eu vou te dizer por quê. Com o fato da assembléia dos sargentos ocorrida em 1963 no mês de maio, 11 de maio, onde eu li o manifesto dos sargentos, onde nós dizíamos, denunciávamos a organização do golpe, nós denunciávamos que eles estavam conspirando para dar o golpe e prometíamos prendê-los (...) Como a visão que nós temos de que aquilo foi uma provocação, não por culpa dos sargentos, porque o De Paula é um cara fantástico, mas como alguns sargentos, eram pouco politizados pra enxergar a coisa pelo lado maior. (...). Eu acho isso, não valia a pena politicamente, o desgaste era muito maior do que se defendia aquele mandato. Na minha concepção teríamos de trabalhar para não terem cassado o outro, mas não de ter aquele desgaste de ter assumido aquilo. (...) aquele movimento de Brasília foi um equívoco, levado por alguns interesses, falta de visão política e alguns interesses de vaidade. Essa é a minha visão, não que eu queira desmerecer os sargentos, muito pelo contrário: eles foram muito corajosos, mas as consequências políticas não foram medidas corretamente, foram graves. (...).

Como podemos observar os impactos do levante foram negativos e explorados pela oposição de Jango, tanto no meio civil como no militar. Entretanto, para alguns de seus atores,

serviu como forma de pressão política embora seus custos tenham sido altos. O levante foi lembrado por aqueles que depuseram João Goulart em 1964, sob o pretexto da quebra da

hierarquia e disciplina.