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Esquema 3 Escala de Efetividade do PCPR II fase 2, segundo a visão dos

3 UMA AVALIAÇÃO DA EFETIVIDADE DA POLÍTICA PÚBLICA DE

3.2 AVALIAÇÃO DA EFETIVIDADE DOS PROJETOS DE ECONOMIA

3.2.3 Liberdades Políticas na visão dos agentes participantes

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Historicamente, a elite política nordestina se aproveitou dos sucessivos períodos de seca para reivindicar proteção para empresas, produtos e ajuda federal, sob a forma de obras públicas, alegando o estado de pobreza desta região provocada pelo fenômeno climático da seca, disseminando a imagem do povo necessitado para render recursos e tratamento prioritário (ALBUQUERQUE JR, 2009).

Enquanto Liberdade Política, a gestão do programa avaliou que os subprojetos foram uma iniciativa das comunidades através de suas associações, resultando num amplo exercício de participação. A escolha das associações e dos locais a serem beneficiados partiu de um complexo modelo representativo que se iniciou com a organização dos Conselhos Municipais de Desenvolvimento. Estes Conselhos são a articulação dos representantes da sociedade civil e do poder público municipal para juntos, identificar, elaborar, selecionar e implantar a gestão do PCPR nos municípios.

A função dos gestores, desde a primeira versão do PCPR, foi a de mobilizar a criação desses Conselhos, através de reuniões, encontros e seminários reunindo Sindicatos de Trabalhadores Rurais, Organizações Não Governamentais, Câmaras Municipais e Prefeituras, apresentando e discutindo a importância da sua constituição. Ao mobilizar os municípios na organização desses Conselhos e inserir como uma das condições para o acesso aos recursos, o programa garantiu a ampliação das Liberdades Políticas locais, de extrema importância para o incentivo da participação. Fato visto pelo gestor entrevistado como uma inovação da história da administração pública do estado:

Esse foi o grande legado do PCPR, não foram só as obras em si, ele possibilitou o sentido de organização às pessoas e também demonstrando que elas podem resolver seus próprios problemas indo atrás. Em alguns municípios estes Conselhos evoluíram para Fóruns permanentes (Gestor do PCPR II/fase2, entrevista concedida a autora no dia 29/08/2014).

A afirmação de que a mobilização das pessoas foi um grande legado do programa coloca o indicador das Liberdades Políticas como um dos itens de maior alcance de efetividade. Fazendo um resgate histórico, o gestor entrevistado disse que na comparação dos dez anos anteriores, desde a implantação do PAPP o que se viu foi um grande avanço obtido com a prática dos Conselhos, No início eram os prefeitos os presidentes dos Conselhos que se denominava FUMAC, ao longo do tempo eles foram substituídos pelas lideranças das próprias comunidades, associações e sindicatos de trabalhadores rurais. Isto demonstra como a participação e mobilização foi modificando as bases de poder que, aos poucos retirou das mãos dos agentes públicos o poder de decisão sobre onde e para quem os recursos seriam destinados.

A construção dos Conselhos pode ser interpretada como uma expansão das capacidades (SEN, 1999, 2010). Nesse caso, a mobilização das pessoas na organização do PCPR proporcionou aos beneficiários um aumento considerável sobre as escolhas em relação a quem, como e pra quê esses recursos seriam destinados. O conceito de agentes em Sen (1999) está atrelado ao protagonismo, e ambos são responsáveis pela transformação social. A participação é um dos princípios dessa transformação e precisa ser impulsionada pelos gestores públicos. Assim, ao estimular a criação dos Conselhos Municipais, o PCPR contribuiu para a expansão das capacidades e liberdades dos indivíduos.

Para os assessores técnicos entrevistados, a atuação e maior participação dos integrantes das associações se deram no momento anterior ao programa. Como foi uma das premissas do PCPR que as próprias comunidades se organizassem para decidirem onde e em que investir, a movimentação das pessoas foi maior nesse processo de organização. Depois de tomadas as decisões, os participantes das associações acabaram deixando nas mãos dos seus presidentes e lideranças locais a condução e acompanhamento de todo o resto.

Aqui, percebe-se que a participação se dá nas ocasiões de maior importância, demonstrando que as pessoas envolvidas estão conscientes do seu papel político nas decisões, mas com a morosidade dos processos e as dificuldades burocráticas elas acabam transferindo a sua participação para um dos integrantes na certeza que será representada. Esse integrante, dotado do poder de representatividade que lhe foi conferido acaba como o único em evidencia, como demonstrado na fala a seguir:

O presidente tem uma carga de responsabilidade muito grande, eles deixam as providências nas mãos do presidente. (Agricultor beneficiário do PCPR II/fase2 – Angicos, entrevista concedida a autora no dia 17/05/2014).

Para justificar esse comportamento, são apresentadas as explicações de Carvalho (2007) sobre a cidadania brasileira. Historicamente, a cidadania, fruto da lógica dos países ocidentais se consolidou sobre as conquistas dos direitos civis, políticos e sociais. No Brasil, os acontecimentos históricos nos levaram a construir uma noção de cidadania ainda frágil, pela forma como os direitos foram conquistados. Santos (2011) ao falar de cidadania alerta que o brasileiro não sabe que é ser cidadão. A cidadania vista como a conquista dos direitos, aqui, foi por muitas vezes proclamada, porém também menosprezada. Nos países

subdesenvolvidos a cidadania possui várias facetas, em que uns podem ser mais cidadãos que outros. Isto acontece no Brasil pelos processos históricos de migrações, desruralização, urbanização galopante, concentração de renda, expansão do consumo de massa. No lugar do cidadão, formaram-se consumidores. Para Santos (2011), não basta ela ser uma declaração de intenções, ela precisa acontecer de fato porque deve ser aprendida.

A conquista dos direitos tem sido uma espécie de concessão ou instrumento de cooptação dos detentores do poder e não o resultado efetivo de uma participação política dos diversos segmentos sociais. Desta forma, acostumados a receber mais do que conquistar, a acomodação é uma consequência, adotando uma atitude de cliente e não de cidadão. A postura cidadã é passiva (CARVALHO, 2007), transferindo a atuação para outras pessoas que demonstram ser mais ativas, seja pela desenvoltura oral, seja pela demonstração de vontade, seja pelas características de liderança, seja pela influência e exercício do poder ou a mescla de todos esses fatores.

Como uma das liberdades instrumentais de Sen (2010), a Liberdade Política, vista aqui como um dos indicadores dessa tese, é um dos principais elementos do

desenvolvimento. Essa passividade dos beneficiados do PCPR II já era esperada, o

que importa aqui é perceber se o programa deu oportunidades para que estes fizessem suas escolhas sobre os recursos.

Na visão dos assessores técnicos, pode-se dizer que houve um alto grau de

efetividade na obtenção das Liberdades Políticas porque os agricultores puderam

escolher sobre onde e em quê investir. Sen (2010) aponta que as conquistas são singelas, se mostram nas pequenas ações e é fato que se precisa de um maior envolvimento e o caminho é a garantia desses espaços.

Mesmo com uma participação considerada pequena pelos assessores técnicos, ficou evidente que houve um entendimento, por parte dos beneficiados, que a ação do poder público se dá quando eles, de modo organizado e coletivo, buscam seus próprios interesses. Amartya Sen nos diz que o uso das liberdades depende em grande medida “(...) da formação interativa de percepções do público e da compreensão cooperativa de problemas e soluções (2010, p.46)”, então se os agentes tiverem esse entendimento, eles saberão utilizar os mecanismos criados pelas políticas públicas.

Percebe-se que essa mobilização e participação tiveram flutuações de intensidade, com momentos de maior e menor interesse por parte dos beneficiários. Isso é explicado pelo histórico sentido de cidadania que deixou como herança uma atitude passiva, em que acaba por deixar nas mãos dos outros a conquistas de nossos interesses. Mas, outro fator preponderante que dificultou a participação de modo mais constante foi a organização burocrática do Programa. As prestações de conta, o envio de documentação, a escrita de relatórios, são processos que dependem de conhecimento específico voltados para a gestão, afastando o produtor rural que acaba confiando esse tipo de atividade para as suas lideranças.

Já avaliamos pela fala dos gestores e assessores técnicos que o PCPR II teve efetividade porque incentivou a participação nas decisões de forma democrática. Na visão dos agricultores entrevistados, depois da renda, a participação foi um dos itens melhor avaliados. Todos concordaram que tiveram oportunidades para participar das decisões sobre o destino do programa em seus municípios por meio de reuniões e assembleias: “A diretoria leva as propostas e a comunidade vota. Não são todos que estão em acordo, mas a maioria é a que vence (Agricultor beneficiário do PCPR II/fase2 – Lages, entrevista concedida a autora no dia 31/05/2014)”.

Os agricultores percebem os processos democráticos, isso é, exposto neste depoimento, indicando que há um processo de negociação, de convencimento, obrigando-os a participarem e aceitarem as decisões de forma democrática. O próximo depoimento é mais um exemplo dessa aceitação:

Aconteceu assim: houve uma reunião e falaram que tinha um valor pra Jardim de Angicos, ai a gente discutiu junto e dividiu os valores. Inclusive o meu projeto ficou com menos recurso pra poder completar os outros (Agricultor beneficiário do PCPR II/fase2 – Angicos, entrevista concedida a autora no dia 17/05/2014).

Assim, houve participação dos agricultores nas decisões porque eles puderam definir o que era importante, decidindo o que fazer com os recursos e como implantar os projetos:

A gente se reuniu e junto à comunidade com o técnico decidiu o que queria. A gente não pode fazer só. Desse trabalho temos a ata, pauta, tudo registrado o que foi combinado (Agricultor beneficiário do PCPR II/fase2 – Fernando Pedrosa, entrevista concedida a autora no dia 02/06/2014).

Aqui, o depoimento demonstra a organização e o registro dessa participação. Como analisado anteriormente, a participação dos agricultores se dá de forma mais intensa nos momentos que são convocados para as decisões sobre o destino dos recursos. Depois, no transcorrer do processo, essa participação diminui. Isso é explicado pela atitude passiva dos associados que transferem a maior parte da gestão para as mãos das lideranças. Visto como uma dificuldade, essa atitude passiva expressa um limite da condição do agente capaz de inserir-se em ações que envolvam conhecimento em gestão na condução de projetos coletivos. Isso é provocado, em parte, pela dificuldade em entender os processos burocráticos, vistos pelos gestores e pelos assessores técnicos como uma das falhas do Programa e um dos motivos desse distanciamento.

Mas, enquanto participação nas assembleias e reuniões organizativas dos subprojetos, pode-se considerá-la como um ganho importante para a ampliação das capacidades e liberdades. Há aqui um exercício contínuo de envolvimento e participação, levando-os a ampliarem suas liberdades políticas. Porém, a participação efetiva se dá através da ação ativa dos sujeitos, isso é chamado de protagonismo, a ação de contribuir para a transformação social.

Amartya Sen (2010) vê essa participação como ativismo das pessoas e deve ser incentivado pelos gestores públicos, impulsionando o desenvolvimento. O PCPR II incentivou a participação, mas não deu estrutura para que ela se perpetuasse de forma ativa, a exemplo da forma como foi pensada a assistência técnica do Programa.

O gestor do PCPR II vê a participação como o maior legado conquistado, pois conseguiram fomentar a mobilização da sociedade civil, permitindo um empoderamento dos trabalhadores rurais, incluindo-os nas decisões locais em conjunto com o poder público. Na visão dos assessores técnicos e dos beneficiados o PCPR II favoreceu a participação, principalmente no período inicial, sendo eles, os principais responsáveis pelas escolhas dos investimentos.

De posse destes depoimentos pode-se afirmar que o indicador das

Liberdades Políticas é um dos mais importantes elementos para o desenvolvimento

como liberdade e apesar dos últimos apontamentos, constata-se que houve um alto grau de efetividade neste quesito porque o programa foi o responsável pela criação de um espaço de participação que, utilizado ou não, permanecerá institucionalizado nos Conselhos Municipais. Sen (2010) diz que o importante é a garantia desse

espaço, pois é através dele que as capacidades de liberdades de escolha poderão se concretizar.

Desta forma, o segundo indicador com um grau de avaliação de efetividade considerado alto, na percepção dos agentes entrevistados, foi o de Liberdades

Políticas. Com a mesma importância do indicador de renda, ele mediu as

oportunidades de participação promovidas com a implantação do Programa em questão.

As liberdades se inter-relacionam, num processo encadeado de expansões, contribuindo para a liberdade de uma forma geral (SEN, 2010). A constatação de que houve um processo democrático possibilitando a participação dos agricultores nas decisões sobre os recursos ainda não foi suficiente para lhes retirar da passividade, uma vez que ela foi citada pelas lideranças e pelos assessores técnicos. Esse intitulamento (meios de desenvolvimento) da capacidade de participação ativa é conquistado por meio das oportunidades sociais e garantias de transparências foco dos próximos itens.