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Ferraz (2000) classifica a liderança exercida por Brown como simbólica. Seu poder de influência se

liderados se identificam. O foco do seu estudo é “verificar os aspectos da boa liderança e não da boa

administração” (p.57), da liderança não como o “exercício de um controle que objetiva a eficácia

organizacional” (p. 57), como é visto primordialmente pelos Estudos organizacionais.

O processo de liderança é composto pela identificação e construção de identidades (BERGAMINI,

1994 apud FERRAZ, 2000) e pelo exercício do poder – “obrigação ou direitos percebidos por parte de

certos indivíduos em definir a realidade dos demais” (p. 58). Assim, Ferraz analisa e confirma Brown

(e Vovô do Ilê) como líder simbólico na medida em que constrói uma imagem de organização, de

comunidade e de sociedade com os quais os membros desses diversos grupos se identificam,

oferecendo legitimidade para exercitar seu poder de definir-lhes a realidade (construindo um modelo

de Carnaval, de música, de educação, etc). Essa legitimidade é representada tanto pelo grande

espaço (aspecto quantitativo), quanto pela imagem positiva (aspecto qualitativo) que a mídia lhe

confere (FERRAZ, 2000).

Brown tem uma carreira artística que potencializa sua liderança simbólica como nenhum outro líder

citado. Mas ao contrário dos demais líderes, Brown não acumula uma função simbólica e executiva

em suas organizações. Além disso, os gestores de suas organizações tinham uma imagem para os

membros delas que poderiam , a depender da sua personalidade, ajudar ou atrapalhar na

consecução dos objetivos e nem sempre correspondiam aos anseios de Brown.

Todos os líderes de blocos afros eram líderes simbólicos e executores de ações cotidianas em suas

entidades. Assim se já é difícil para um líder equilibrar-se diante do “conflito ‘indissolúvel’ entre as

pressões da dimensão material da existência, que se dirige à satisfação das necessidades, e a

dimensão social, que se refere à coesão dos grupo pelo fortalecimento das relações entre os

homens” (FERRAZ, 2000), mais difícil é compartilhar sua liderança com outros líderes mais próximos

das pressões da dimensão material e com personalidades diferentes para lidar com a dimensão

social.

Brown não foge à tendência dos líderes de blocos afros a fundir gestão e família. Dantas (1996b)

relata que o Apaches é gerido pela família consanguínea de Antônio Belmiro e o Ilê pela família

espiritual, de Candomblé, de Vovô. Ambas organizações se caracterizam pela aceitação da

de alternância de poder, mas ainda prevalece uma relação de família por consideração entre os

membros da direção (DANTAS, 2000).

Nas Organizações Brown, as empresas são geridas por familiares. Gilson Freitas, seu irmão, na

Timbalada, e Helena Buarque, sua esposa, na Nariz de Borracha. Na Pracatum, os diretores

executivos sempre foram profissionais especializados. Não significa concluir que seus familiares

sejam menos profissionais ou menos competentes que os outros, mas alguma dose de ambigüidade

deve existir entre Brown e seus familiares-gestores e precisa ser melhor investigada.

Além dessa possível fonte de conflitos, há os decorrentes do fato de Brown não assumir ele mesmo a

direção executiva de suas organizações, como os outros líderes citados. As relações de identificação

entre os membros da Organização e da comunidade e os diretores executivos não são iguais às que

aqueles têm com Brown. Assim como a maneira como exercem o poder. Dois ou mais líderes a

representam: Brown e outro(s). Um dos efeitos disso é uma relação ambígua da equipe e da

comunidade com a Pracatum; relação de aproximação-afastamento, amor-ódio, prazer-dor. No caso

da Pracatum, Brown representa o projeto, o sonho, a organização-idéia. Vera e Caius representam o

cotidiano, a construção, a organização-realização. Quanto mais próximo estava Brown, como no

início da Pracatum, menores eram os conflitos organizacionais, menos freqüentes as crises. À medida

que ele se afasta por mais tempo, ou mais freqüentemente, do cotidiano da organização, mais

dependente fica Brown da personalidade do líder para o sucesso dos projetos. Para garantir a

autonomia da Pracatum, Brown corre esse risco.

Na gestão de Vera, o vínculo entre ela, a equipe e a comunidade é forte, expresso na maciça

presença às Assembléias Comunitárias, tanto da comunidade quanto da equipe. Na gestão de Caius,

esse vínculo diminui. O episódio do Dia das Crianças32 mostra um distanciamento entre a

comunidade e a Pracatum, representada por Caius, que só é amenizada pela intervenção de Brown.

A equipe e os alunos reclamam a presença de Brown como que chamando o pai protetor diante do

castigo do pai severo.

32

Para dar autonomia para suas organizações, Brown precisa confiar muito nesses gestores executivos

e conseqüentemente estabelecer estreita comunicação com eles. Um problema pode surgir quando

esta ligação fica mais estreita com estes gestores do que com a equipe e a comunidade, inibindo a

comunicação de Brown com os liderados e sujeitando Brown às imagens que estes gestores fazem

destes.

Essa situação sugere que os estudos de liderança simbólica devem estar atentos aos efeitos de uma

liderança dividida entre real e imaginário. Mesmo os líderes simbólicos precisam ter uma função

executora assim como os líderes executores precisam estar atentos à dimensão simbólica de suas

ações. De outra maneira corre-se o risco de recair-se num modelo dicotômico do tipo mente-corpo,

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