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O presente estudo foi concebido com o propósito de contribuir para a compreensão do processo de desenvolvimento do município de Peixe através de indicadores disponíveis em fontes de dados secundários e, através do pensamento institucionalista, fazer uma análise que transcenda os aspectos puramente econômicos, assimilando a percepção dos atores envolvidos. No entanto, em razão da complexidade do objeto de estudo por agregar variáveis distintas e algumas até imensuráveis, a pesquisa possui limitações.

As disponibilidades de dados é a primeira delas. As fontes consultadas proporcionaram os dados necessários para o estudo, no entanto, alguns indicadores não estão disponíveis a nível municipal mesmo com a seleção dos anos 2000 e 2010, coincidentes com o censo do IBGE. Outro fator a ser considerado é o lapso temporal existente entre a conclusão das obras da UHE Peixe Angical até a realização da presente pesquisa em três aspectos. Primeiro, em relação aos dados secundários em virtude do encerramento de algumas séries de pesquisas entre o período inicial e final da análise. Segundo, a coleta dos dados por meio de entrevistas desafia a memória dos participantes da pesquisa, mesmo com a criteriosa seleção dos entrevistados. E por último, como a instalação do empreendimento hidrelétrico envolve interesses políticos e econômicos, algumas contribuições dos participantes possuem certa cautela nas declarações dada a formalidade em torno da pesquisa.

Outro fator que influencia diretamente na percepção dos entrevistados é a realidade atual do município que passa por uma profunda crise econômica. Além da crise de ordem nacional, o município passa por um período de redução das receitas em virtude da baixa produção da UHE nos anos anteriores para composição do IPM e a falta de agência bancária com dinheiro afeta o mercado local, pois, obrigam as pessoas a se deslocarem até a cidade de Gurupi para receber proventos e por lá fazem compras configurando uma fuga de renda do município. O Banco do Brasil que possui agência em Peixe está operando sem dinheiro vivo em virtude de recorrentes assaltos sofridos.

4 OS GRANDES EMPREENDIMENTOS HIDRELÉTRICOS NO BRASIL E NO TOCANTINS

O Brasil passou por profundas transformações econômicas e sociais no último século, especialmente na segunda metade. A industrialização e um crescimento exponencial das áreas urbanas elevaram a demanda por energia elétrica. Essa situação aliada ao alto potencial hídrico do país são alguns dos fatores que propiciaram a adoção de políticas de investimentos na hidroeletricidade. Sob a égide de políticas setoriais ou planos de investimentos para implantação da infraestrutura necessária à industrialização foram levados a cabo grandes projetos como as usinas hidrelétricas de grande porte (BORTOLETO, 2001).

Esses empreendimentos passaram a serem priorizados pelo governo federal a partir os Planos Nacionais de Desenvolvimento – PND I (1972-1974) e PND II (1975-1979) - criados no regime militar, tendo como suporte o planejamento estratégico, os PNDs ampliaram as bases de desenvolvimento nacional com investimentos na agricultura, pesquisa e na área monetária, além de obras de infraestrutura física como no setor de transporte, corredores de exportação, obras portuárias, estrutura de telecomunicações, polos petroquímicos, usinas nucleares e usinas hidrelétricas (VIEIRA, 2012).

Baseada no represamento das águas e construção de barragens para obter uma altura considerável de modo a transformar a energia potencial da queda d’água em energia elétrica em suas turbinas, a usina hidrelétrica representa um alto custo ambiental e social ao impactar de forma irreversível o espaço natural onde é instalada e o povo que nele habita. Sob o discurso desenvolvimentista, o governo brasileiro e os consórcios construtores enfrentaram a resistência de populações locais e ambientalistas para implantar os grandes projetos que se intensificam a partir de meados da década de 1950. Antes de avaliar a evolução das hidrelétricas no Brasil é preciso compreender quais os tipos e como distingui-las.

As usinas hidrelétricas podem ser diferenciadas por vários critérios como altura da queda d’água, vazão, capacidade ou potência instalada, tipo de turbina empregada, localização, tipo de barragem e reservatório. Este último pode ser de acumulação, que adota o represamento da água, e fio d’água, que geram energia a partir do fluxo de água do rio. Em se tratando da potência instalada, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) adota três classificações: denomina Centrais Geradoras Hidrelétricas (CGH) aquelas com até 1MW (Megawatt) de potência instalada, Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCH) com potência entre

1,1 MW e 30 MW e Usina Hidrelétricas de Energias (UHE) as que excedem os 30 MW de potência instalada (ANEEL, 2008).

E dentre as UHEs ainda há outra subdivisão como apresentado por Moretto et al (2012) em suas análises, chamado de UHE de pequeno, médio e grande porte, as com potência instaladas nas respectivas faixas de valores, de 30MW a 100 MW, de 100 MW a 1000 MW e acima de 1000 MW, respectivamente.

A partir do início do século XX, o governo brasileiro passa a experimentar a criação de algumas usinas hidrelétricas de médio e pequeno porte, aproveitando cerca de 1% do potencial hidrelétrico brasileiro na primeira metade do século (SOUZA, 2000). A Tabela 01 apresenta algumas usinas instaladas no período, o ano de instalação e sua potencia.

Tabela 01 – Usinas hidrelétricas instaladas no Brasil na primeira metade do século XX.

Usina Rio Estado Potência Instalada

(MW)

Ano

Fontes Lages Rio de Janeiro 130 1908

Itapuranga Sorocaba São Paulo 56 1912

Ilha dos Pombos Paraíba do Sul Divisa RJ-MG 187 1924

Henry Borden Rio das Pedras São Paulo 889 1926

Americana Atibaia São Paulo 30 1949

Fonte: Informações extraídas de Moretto et al. (2012).

Todas essas usinas foram instaladas na região sudeste, conforme a ordem de industrialização e desenvolvimento do país. Esse potencial é muito pequeno quando analisamos todo o potencial hidrelétrico brasileiro, conforme estimado pela Eletrobrás (1994) em 260 mil MW e o aproveitamento, nas condições atuais, teria chegado a 28,6%, conforme a Empresa de Pesquisa Energética (2011), o que sugere ainda uma capacidade de expansão do número de hidrelétricas pelo território nacional.

A distribuição desse potencial nas bacias hidrográficas brasileiras é distribuída conforme apresentado na Tabela 02. A região amazônica, que compreende as bacias Amazonas e Tocantins, representa a maior parte desse potencial e é a área mais explorada nos projetos recentes.

Tabela 02 – Potencial hidrelétrico estimado por região hidrográfica brasileira. Região hidrográfica Potencial hidrelétrico estimado

Total por região (MW) Percentual (%)

Amazonas 105.410 40,5 Paraná 60.378 23,2 Tocantins 27.540 10,6 São Francisco 26.319 10,1 Atlântico Leste 14.092 5,4 Uruguai 13.337 5,1 Atlântico Sudeste 9.617 3,7 Atlântico Nordeste 3.402 1,3 Total 260.095 100 Fonte: Eletrobrás (1994).

A evolução histórica da implantação das usinas hidrelétricas no Brasil pode ser compreendida pelo potencial hidrelétrico disponível que conduz ao benefício do aproveitamento e pelo grau de disciplina e rigor do uso e ocupação do espaço que exige maior complexidade de planejamento. Essa análise feita por Moretto et al. (2012) divide o histórico brasileiro de planejamento espacial de usinas hidrelétricas em quatro grandes períodos:

– de 1950 a 1979: administração dos recursos naturais por meio de códigos que disciplinavam os usos das águas, florestas, minas, pesca etc., dos primeiros planos de uso do solo e de legislações de controle da poluição industrial;

– de 1980 a 1999: criação e regulamentação de instrumentos da Política Nacional do Meio Ambiente, como o licenciamento ambiental, avaliação de impacto ambiental, áreas especialmente protegidas, zoneamentos, planos de gerenciamento costeiro e marinho etc.;

– de 2000 a 2010: fortalecimento do zoneamento ecológico-econômico, criação e regulamentação do Estatuto das Cidades e do Sistema Nacional de Unidades de Conservação;

– de 2011 a 2020: período recém iniciado que acumula o histórico anterior de disciplinamento do uso e ocupação do espaço.

No primeiro período (de 1950 a 1979) com um alto potencial disponível, tem-se a instalação das primeiras grandes usinas localizadas em sua maioria na região sudeste, especialmente as bacias do rio Paraíba do Sul, rio Grande, rio Pardo e rio Paranapanema. Com o destaque para a primeira usina que foi a de Paulo Afonso no rio São Francisco, com 4.113 MW, no ano de 1955. No total, foram instalados cinquenta e sete empreendimentos hidrelétricos no período, somando um total de 26 mil MW, das quais apenas duas usinas foram instaladas na região Amazônica.

O segundo período (de 1980 a 1999) é marcado por incertezas com a evolução da legislação ambiental e houve uma redução no número de hidrelétricas. Com apenas 28 usinas instaladas que somadas possui uma potencia de 14,6 mil MW, sendo apenas três na região

Amazônica. No período priorizou-se a criação de UHE de pequeno e médio porte em virtude dos avanços na política ambiental.

Esse segundo período compreende duas décadas de situação econômica distinta. Enquanto nos anos 80 a economia brasileira pouco avançou, a estabilidade advinda do plano Real, a partir de 1994, conduziu a crescimento econômico considerável e um consequente aumento da demanda energética na década seguinte. E como a oferta de energia elétrica cresceu pouco no período, foi desencadeada a crise do setor energético no fim dos anos 1990. Essa realidade fez com que no terceiro período (de 2000 a 2010) o governo avançasse na capacidade de planejamento hidrelétrico e, mesmo sendo um período de apenas uma década, foram instalados 31 empreendimentos hidrelétricos, com 11,9 mil MW de potência instalada. Dentre os projetos, dez foram na região Amazônica. Em que vale destacar, como contribuição a essa dinâmica, o Projeto Grande Carajás (PGC), que compreende o segundo e o terceiro período.

Por meio da disponibilidade de um elevado volume de recursos, oriundo de empréstimos em instituições financeiras nacionais e internacionais, o PGC foi um mega empreendimento econômico, político e social iniciado na década de 1980. Inicialmente direcionado a infraestrutura básica com a construção rodovias e ferrovias, reforma de portos e aeroportos, o objetivo foi a extração do minério, que seria transportado do sudeste do Pará até o litoral e de lá seguir para outros países. Outra parte do projeto consistia em trabalhar o ferro gusas em empresas no próprio país, por isso foi necessária a construção da UHE de Tucuruí, no Pará, inaugurada em 1984, com o propósito de fornecer energia elétrica a essas siderúrgicas nacionais (SANTOS, 2009).

No último período (de 2011 a 2020) é planejada a intensificação da exploração do potencial disponível na região Amazônica. Dos trinta novos projetos planejados para serem inaugurados no período, dezoito hidrelétricas estão localizadas na região Amazônica.

A Figura 02 apresenta a quantidade de empreendimentos hidrelétricos instalados no Brasil em cada um dos períodos mencionados.

Figura 02 – Quantidades de empreendimentos hidrelétricos por período.

Fonte: Elaborado a partir dos dados de Bortoleto (2001).

Guardada as devidas proporções entre cada período por compreender lapsos temporais diferentes e considerando que o último período envolve as usinas instaladas e planejadas é possível verificar um número expressivo no primeiro período e uma redução significativa no segundo. E quando avaliamos o local desses empreendimentos fica evidente o sentido do sudeste, no primeiro momento, para a região Amazônica em virtude da alta disponibilidade de potencial hidrelétrico, como mostra a Figura 03.

Figura 03 – Tendências e soluções históricas para o planejamento espacial de usinas hidrelétricas brasileiras.

Fonte: Moretto et al. (2012). 57 28 31 30 0 10 20 30 40 50 60 1º Período (de 1950 a 1979) 2º Período (de 1980 a 1999) 3º Período (de 2000 a 2010) 4º Período (de 2011 a 2020) Quantidade de emprendimentos hidrelétricos

Esse avanço histórico da hidroeletricidade no Brasil levou o setor a ser a principal fonte de obtenção de energia elétrica no país. Conforme dados do Banco de Informações de Geração (BIG) da Aneel, existem, em maio de 2018, em operação, 673 CGHs com potência total de 641,527 MW; 427 PCHs com 5039,283 MW de potência instalada; e 220 UHE com uma capacidade total instalada de 95794,468 mil MW. As usinas hidrelétricas, independentemente de seu porte, respondem por 60,27% da potência total instalada no país em relação a todos os meios de geração de energia elétrica.