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3.4 NORMALIZAÇÃO PARA TOLERÂNCIA

3.4.1 A Linguagem GD&T versus GPS

Atualmente as duas linguagens têm princípios 90% a 95% similares corroborando com a tendência de harmonização dos dois sistemas de normalização ASME e ISO. Entretanto, ainda persistem algumas diferenças em aspectos fundamentais que podem levar a uma interpretação equivocada dos desenhos técnicos e procedimentos de medição (WANDECK e SOUSA, 2008, PASIN, 2003).

A filosofia da linguagem ASME/GD&T pode ser resumida pelo princípio do envelope (ou princípio de Taylor), que estabelece uma correlação (dependência) entre a variação de forma e dimensão (KRULIKOWSKI, 1999, WANDECK e SOUSA, 2008). Pela regra #1 da ASME Y14.5 (2009), quando somente a tolerância dimensional é especificada, os limites de tolerância de uma característica individual prescrevem o limite dentro do qual as variações da sua forma geométrica e de sua dimensão são permitidas. Esta regra tem uma relação direta com o limite de forma perfeita na condição de máximo material. Uma forma geométrica perfeita pressupõe que as características planeza, retitude, circularidade e cilindricidade são perfeitas. A condição de máximo material é o limite no qual a peça (furo ou eixo) possui o máximo volume de material, dentro do seu limite de tolerância especificado. Na prática, é a condição na qual a peça apresenta o maior peso, e corresponde à condição mais crítica de montagem.

Por outro lado, a linguagem ISO/GPS, através da norma ISO1101 (2004), tem como filosofia o princípio da independência onde cada requisito dimensional ou geométrico especificado no desenho técnico da peça deve ser controlado individualmente, a não ser que alguma relação entre eles seja especificada. Na prática, isso significa que cada tolerância será verificada separadamente.

Segundo WANDECK e SOUSA (2008), o princípio da independência pode ser aplicado em todas as dimensões lineares (e suas tolerâncias), dimensões angulares (e suas tolerâncias) e tolerâncias geométricas. Cada dimensão linear é verificada com um instrumento de dois contatos. Não existe limite para os desvios de forma ou posição.

Na figura 3.6 consta a ilustração dos dois princípios de cotagem. No exemplo da figura 3.6 (a) há apenas a especificação de tolerância dimensional e pelo princípio da independência (norma ISO 1101/2004), o controle será feito nas seções de interesse com um instrumento de medição de dois contatos como, por exemplo, um micrômetro externo.

Aplicando o princípio de Taylor (norma ASME Y14.5), define-se um envelope na condição de máximo material (diâmetro máximo) que controla a dimensão e a forma do eixo (figura 3.6b). Portanto, para a ASME o princípio do envelope é automático. No caso da ISO é opcional. Logo, quando se deseja controlar tolerância geométrica pela ISO deve- se especificá-la no desenho técnico.

Figura 3.6 - Interpretação dos princípios de Independência e de Taylor (WANDECK e SOUSA, 2008)

Verifica-se no caso da avaliação pelo princípio da independência que não há controle da forma do eixo. Portanto, mesmo que o eixo esteja torto, este será aceito se os seus diâmetros estiverem dentro da tolerância dimensional.

Considerando que nem sempre é possível aplicar o princípio da independência ou do envelope para todos os casos, ambos os sistemas de normalização permitem exceção. No caso da norma ASME Y14.5.(2009), abre-se a possibilidade de uso do princípio da independência desde que venha indicado no desenho o termo “Forma perfeita não

requerida na condição de máximo material” (na norma em inglês, “Perfect Form Not Required at Maximum Material Condition”). A forma geométrica perfeita pressupõe que as características planeza, retitude, circularidade e cilindricidade são perfeitas. Enquanto que a condição de máximo material significa que a característica de tamanho contém a porção máxima de material dentro dos limites estabelecidos.

No caso da ISO abre-se a possibilidade de ser aplicado o princípio de Taylor, através do recurso de envelope que deverá conter o símbolo E Assim, a definição que é automática na norma ASME é opcional na norma ISO.

Na tabela 3.3 consta um resumo das principais diferenças entre os sistemas de normalização no domínio da especificação geométrica de produtos.

Tabela 3.3 – Diferenças fundamentais entre GD&T e GPS (CONCHERI et al., 2001)

A normalização brasileira nesse domínio está restrita à norma NBR 6409 (1997) que estabelece os princípios gerais para indicação das tolerâncias de forma, orientação, posição e batimento e a NBR ISO 10209-2 de 1993 que trata dos termos relativos aos métodos de projeção, com foco na documentação técnica de produtos. A norma 6409 segue o princípio da independência, pois está baseada na ISO 1101 de 1983, e, portanto, está desatualizada.

ASME 14.5 (GD&T) NORMA ISO/GPS

Condição de Máximo Material (método do envelope)

Princípio da independência (método dos mínimos quadrados total) Características associadas ou não com

dimensão

Características associadas com várias geometrias

Macro-geometria

Foco nas características finais do produto considerando a funcionalidade e

verificação dimensional.

Macro e micro-geometria

Foco em todo o processo: função, fabricação e verificação.

Aspectos metrológicos não são considerados

Aspectos metrológicos considerados, inclusive a incerteza da medição.

A linguagem simbólica é semelhante nos sistemas GD&T e GPS. Na tabela 3.4 são apresentados os símbolos agrupados em cinco categorias.

Tabela 3.4 – Símbolos de características geométricas (adaptado NBR 6409, 1997)

As duas linguagens de padronização são aceitas internacionalmente, podendo ser um contrato entre fornecedor e cliente. Um caso usual onde o desenho técnico é parte importante de um contrato ocorre nas relações entre montadoras automotivas e seus fornecedores; onde ambos normalmente possuem um sistema de garantia da qualidade

CATEGORIA CARACTERÍSTICA SÍMBOLO USO DE

REFERÊNCIA FORMA Retitude NÃO Planeza NÃO Circularidade NÃO Cilindricidade NÃO PERFIL

Perfil de uma linha SIM OU NÃO

Perfil de uma superfície SIM OU NÃO

ORIENTAÇÃO

Paralelismo SIM

Perpedicularidade SIM

Angularidade SIM

LOCALIZAÇÃO

Posição SIM OU NÃO

Concentricidade SIM

Simetria SIM

BATIMENTO

Batimento circular SIM

baseado na norma TS 16949 (antiga QS 9000), que é uma norma elaborada pela indústria automotiva (CONCHERI et al., 2001).

As duas linguagens ISO e GD&T possuem modernos recursos de cotagem e expressão das tolerâncias geométricas com um nível de formalismo matemático que contrubui para aplicação dentro da manufatura digital, integrando os conceitos e aplicação nos programas computacionais de auxílio ao projeto e à tolerância.

Com respeito a expressão de tolerâncias geométricas em modelos em três dimensões (3D), a ASME publicou em 2003 a norma ASME Y14.41 – definição de produtos digitais publicada e a ISO em 2006 publicou, baseado na ASME, a sua norma ISO 16792 dentro do comitê que trata de documentação técnica de produto (TPD).

Na figura 3.7 consta um exemplo de aplicação da tolerância geométrica para modelos em três dimensões. Na figura, a tolerância de perfil de superfície é aplicada unilateralmente (símbolo U) com valor de 0,3 mm, que deverá ser controlada para os três planos de referências (datum) denominados de A, B e C.

Figura 3.7 – Tolerância de perfil de superfície para modelo 3D (ASME Y14.5, 2009)

Outra característica da norma ASME Y14.5 (2009) é que a mesma não aborda requisitos de instrumentos de medição, rastreabilidade e aspectos de fabricação.