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2.4 Resumo

3.1.1 A Linguagem e a Mem´oria

O Homem assimila facilmente a Linguagem, resultado do desenvolvimento social e cultu- ral, e serve-se dela para interagir e para codificar experiˆencias vividas ou ideias n˜ao con- cretizadas. O acto de escutar ou ler uma pergunta e em seguida responder desencadeia-se nas pessoas com grande naturalidade. N˜ao obstante, a compreens˜ao da pergunta, escrita ou falada, constitui um processo neurolingu´ıstico muito complexo. Para um humano, ler uma palavra ou escutar os fonemas que a comp˜oem leva `a activa¸c˜ao de determinados circuitos em redes semˆanticas associativas que existem nosso c´erebro. Estes circuitos estabelecem liga¸c˜ao entre palavras e defini¸c˜oes, conceitos associados e ainda vivˆencias ou acontecimentos relacionados, contribuindo para uma correcta interpreta¸c˜ao das frases [DMP07] [Lam99].

No in´ıcio da d´ecada de 1930, o psic´ologo sovi´etico Alexander Luria levou a cabo um importante estudo sobre a influˆencia s´ocio-cultural no desenvolvimento cognitivo. As experiˆencias realizadas com habitantes da ´Asia Central mostram que o processo cognitivo varia em fun¸c˜ao do modo com que os diversos grupos sociais vivem e experimentam diversas realidades [Lur76]. Uma das tarefas realizadas pelos indiv´ıduos em estudo era a classifica¸c˜ao de objectos, sendo-lhes mostrado um quadro com quatro elementos de onde teriam de excluir um, aquele que n˜ao se enquadraria no grupo dos outros trˆes, e justificar essa op¸c˜ao. Um dos quadros continha um serrote (de metal), um machado, um martelo e madeira (blocos de madeira), como ilustrado na figura 3.1.

Ao avaliar os resultados verificou-se que havia grupos de pessoas que exclu´ıam: • a madeira, por considerarem os restantes como um grupo de ferramentas • o serrote, por n˜ao incluir madeira na sua constitui¸c˜ao

• o martelo, encarando os restantes como madeira e utens´ılios para o respectivo corte Note-se que todas as respostas s˜ao plaus´ıveis. Deste estudo, evidenciam-se duas formas b´asicas de que a mente humana faz uso durante o processamento dos conceitos, nome- adamente numa tarefa de classifica¸c˜ao de objectos. Por um lado, h´a o tratamento por categoria, que tem a ver com a semˆantica do conceito em causa e envolve generaliza¸c˜ao a partir de elementos concretos. Por outro lado, h´a ainda o tratamento pelo contexto em que o objecto se insere, o que depende das experiˆencias quotidianas de cada sujeito. Os dois ´ultimos tipos de resposta s˜ao disso exemplo. Muitas das justifica¸c˜oes eram alusivas a situa¸c˜oes vividas por aquelas pessoas e que envolviam madeira, serra e uma das outras ferramentas.

Observou-se tamb´em que parte significativa destas respostas por agrupamento situacio- nal eram relativas a pessoas sem escolaridade ou com poucos anos de forma¸c˜ao, sendo a resposta por categoria dada por indiv´ıduos com mais anos de estudos, mais habituados a exerc´ıcios que envolvem abstrac¸c˜ao.

Um ser humano possui estruturas cognitivas que associam conceitos a contextos con- cretos ou ao respectivo tipo ou significado geral. Em psicologia e neurociˆencias distingue- se Mem´oria Epis´odica de Mem´oria Semˆantica, duas mem´orias do tipo expl´ıcito que fazem parte da nossa Mem´oria de Longo Prazo. Enquanto a primeira tem a ver com recorda¸c˜oes sobre eventos e vivˆencias onde v´arios conceitos se relacionam em determinado contexto, a segunda tem um car´acter mais geral, associando conceitos aos seus significados [Ing92]. Uma das primeiras teorias sobre a reten¸c˜ao de informa¸c˜ao na Mem´oria de Longo Prazo foi o modelo de Mem´oria Semˆantica Hier´arquica [CQ69], de Collins e Quillian. Neste modelo, o conhecimento organiza-se em unidades de informa¸c˜ao ou conceitos interli- gados de forma hier´arquica, formando uma rede semˆantica. Alguns anos mais tarde, John Anderson apresentou a teoria Adaptive Control of Thought [And83], com a no¸c˜ao de grau de activa¸c˜ao associado a cada unidade cognitiva ou n´o da rede semˆantica. A recupera¸c˜ao de informa¸c˜ao da mem´oria de longo prazo realiza-se por um processo de propaga¸c˜ao de activa¸c˜ao (spreading activation process) iniciado nos n´os de informa¸c˜ao presentes na chamada mem´oria de trabalho. Estes possuem liga¸c˜oes a outros n´os exis- tentes na mem´oria de longo prazo. A for¸ca da liga¸c˜ao ´e medida pelo grau de activa¸c˜ao: quanto maior o grau, maior ser´a a probabilidade de conseguir rapidamente o resultado do processo de pesquisa. O grau de activa¸c˜ao pode aumentar ou diminuir no tempo de- vido a v´arios factores, nomeadamente a frequˆencia de pesquisas ou activa¸c˜oes da liga¸c˜ao. Estabelecendo um paralelo com o campo das neurociˆencias e com os tipos de mem´oria que permitem ao ser humano identificar, contextualizar e relacionar conceitos, este mo- delo recorre tamb´em a reposit´orios de informa¸c˜ao de natureza distinta. Na perspectiva semˆantica, utiliza-se a base de conhecimento inicial do sistema, que constitui uma rede de conceitos e rela¸c˜oes estabelecidas entre eles, incluindo hiper´onimo, mer´onimo, sin´onimo e outras, como se descreve adiante.

Na vertente epis´odica, a associa¸c˜ao contextual entre conceitos e entidades ´e detectada no conte´udo de fontes de informa¸c˜ao n˜ao estruturada. Este g´enero de associa¸c˜oes, que

as vivˆencias de uma pessoa v˜ao acumulando na mem´oria, corresponde neste modelo ao que o sistema capta em narra¸c˜oes de factos, num conjunto de textos em l´ıngua natural, locais ao sistema, ou provenientes da Web.