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Livros de autores portugueses no Brasil

3. O LIVRO E AS RELAÇÕES LUSO-BRASILEIRAS

3.2. A RECETIVIDADE DO LIVRO PORTUGUÊS NO B RASIL

3.2.1. Representação editorial portuguesa no Brasil

3.2.1.2. Livros de autores portugueses no Brasil

Pode-se dizer que nos últimos tempos, os brasileiros estão a conviver com livros de autores portugueses contemporâneos “Os portugueses chegaram e se instalaram nas estantes das livrarias” (Ferraz apud Ferreira, 2007:251), o que é bom para o leitor brasileiro e fundamental para os escritores portugueses. Segundo António Mega Ferreira, coordenador do estudo sobre O Livro Português nos PALOP e no Brasil (2007)146, esse “interesse renovado é reconhecido por meios jornalísticos e académicos. Alguns falam do ‘efeito Saramago’ como indutor deste (re)conhecimento da literatura portuguesa no Brasil” (2007:251). O novo interesse pela literatura portuguesa contemporânea poderá augurar tempos auspiciosos para o comércio do livro editado em Portugal no Brasil:

Os autores portugueses vivem um tempo favorável no Brasil, com boa recetividade do público e da crítica, o que não significa que circulem livros portugueses no Brasil. O livro português move-se em circuitos restritos, sobretudo no universitário, e em quantidade diminutas. O elevado preço, associado a uma fraca distribuição são os principais entraves a uma circulação mais generalizada. A diferenciação ortográfica parece ser também um elemento a ter em conta, embora se esbata à medida que subimos na escala sociocultural (Ferreira,2007: 13).

O tempo até pode ser favorável, mas ainda há entraves a superar: espaço restrito, publicações limitadas, preço elevado da produção, fraca distribuição e a barreira da língua são elementos que, na visão de Ferreira, dificultam a comercialização do livro português no mercado brasileiro. Mas, mesmo assim, há autores portugueses que estão sendo editados no Brasil como se pode observar na listagem de autores portugueses publicados no Brasil na contemporaneidade (vd. Anexo III).

146 Este estudo sobre a Produção, Edição, circulação e Consumo do livro Português nos PALOP e no Brasil, foi executado em 2004-2006, quando ainda não estava em vigor o Acordo Ortográfico. Por isso as referências de “adaptação ortográfica de obra portuguesa no Brasil”.

Nesta listagem de autores portugueses publicados no Brasil na contemporaneidade (vd. Anexo III), percebe-se que há um número considerável de escritores portugueses que têm obras publicadas no Brasil, desde os clássicos aos contemporâneos, como afirma Leodegário Fialho: “entre nós, há público imenso para a literatura dos livros portugueses, como há considerável público em Portugal (continental e ultramarino) para a leitura de livros brasileiros” (1973: 287), porém nem todos tinham o privilégio de editar seus livros no português europeu – antes do Acordo Ortográfico –, porque eram sujeitos a normas estabelecidas nos contratos de edição.

Antes de entrar em vigor do Acordo Ortográfico no Brasil (1º de Janeiro de 2009) e, em Portugal (no início do ano letivo de 2011/2012), alguns escritores aceitavam adaptar seus livros a ortografia brasileira. A esse respeito Agualusa147 diz o seguinte: “Parece-me um total absurdo.” (apud Ferreira, 2007: 272). A escritora portuguesa Inês Pedrosa148 afirma:

Penso que representa um empobrecimento; temos uma língua comum, com variadas possibilidades plásticas e melódicas, que devemos explorar e ampliar. Também não gosto de ler autores brasileiros em “adaptação” portuguesa (apud Ferreira, 2007: 269).

Já o escritorJosé Luís Peixoto149acredita que a manutenção da língua europeia nos livros de autores portugueses editados no Brasil é uma forma de promoção do conhecimento de Portugal no Brasil:

Creio que a manutenção da ortografia portuguesa poderá ser uma forma de promover um melhor conhecimento de Portugal no Brasil. O pequeno esforço que se pede ao leitor brasileiro para obter a total compreensão é largamente compensado pelo prazer de fruir de um texto inalterado, escrito numa língua que, afinal, também é sua. São incomparavelmente maiores as proximidades do

147 José Eduardo Agualusa (45anos), com sete livros publicados no Brasil, com sete livros publicados no Brasil, sendo o primeiro, Nação Crioula (2001) e o último, Manual Prático de Levitação (2005).

148

Inês Pedrosa (43 anos) com dois livros publicados no Brasil: Fazes-me Falta (2003) e Nas Tuas Mãos (2005).

que as distâncias entre o português de Portugal e o do Brasil. É também esta a minha opinião em relação à utilização de ortografia portuguesa em livros de autores brasileiros que sejam editados em Portugal. No domínio da literatura sou contrário a essa “adaptação”. Uma das mais-valias da edição de autores portugueses no Brasil é justamente a informação sobre um contexto cultural que, para muitos brasileiros, está ligado a uma série de mitos que a atualidade portuguesa desmente. No que diz respeito a outro tipo de livros – nomeadamente no que toca aos chamados “livros técnicos” – essa “adaptação” não me choca muito (Peixoto apud Ferreira, 2007: 273s).

Jacinto Lucas Pires150 também ele, escritor português com livros no Brasil, discorda plenamente das “adaptações” feitas, uma vez que a língua é a mesma.

Francamente, acho que não faz sentido. Como não me parece fazer sentido passar para a ortografia portuguesa, livros brasileiros editados cá. Pelo contrário, acho que esse “sotaque” da escrita faz parte do que certo livro é. Essas “adaptações ortográficas” (para não falar de outras mais graves) correm o risco de deixar os textos afundados a meio do Atlântico (Pires apud Ferreira, 2007: 276).

Rui Zink151 quando questionado sobre as dificuldades de compreensão do português europeu por parte dos leitores brasileiros faz a seguinte ressalva:

Depende. Dou dois exemplos pessoais: suplente e camisola existem no Brasil, mas com sentido diferente do de Portugal. Dado que mudar as palavras não afetava a ordem estética do livro, concordei com a adaptação. Havia ainda um outro motivo: se o leitor ficasse na dúvida ali, em palavras sem importância para o que eu queria verdadeiramente dizer, isso sim, destruiria a leitura desejada (Zink apud Ferreira, 2007: 278).

A razão dessa “pretensa adaptação” parece lógica quando se depare com argumentos como o de Reis que diz que “a língua falada pelos brasileiros tem-se de facto, de há muito,

150 Jacinto Lucas Pires (31anos), com dois livros publicados no Brasil: Azul-Turquesa e Livro Usado ambos em (2005). 151

consideravelmente diferenciado da língua que falam os portugueses” (1988:69). Mas será que essas diferenças seriam amenizadas se o Acordo Ortográfico em vigor fosse respeitado de ambos os lados? Ou ainda as “pretensas adaptações” podem fundamentar o que diz Eduardo Lourenço? “No Brasil, Portugal está em todo lado e em lado nenhum” (Lourenço, 2004:157).

Quando António Mega Ferreira (2007); os editores entrevistados; os depoimentos dos escritores citados por Ferreira (2007: 69-78); fazem referência as “adaptações” do português europeu para o português do Brasil e Noll (2008) na sua obra O português brasileiro: formação e contrastes, e outros autores citados neste estudo exploratório, ressaltam as diferenças entre a língua portuguesa do Brasil com a língua portuguesa europeia, alguma consistência poderá existir nas “supostas adaptações”. É sabido que as adaptações ortográficas são necessárias quando a obra está desatualizada e, que, os vários Acordos Ortográficos que foram elaborados para unificação da grafia portuguesa não foi aplicado e aceito pelo Brasil e Portugal como deveriam ser (vd. Tabela 3.1.2. cronologia das reformas ortográficas p. 100), daí surge as referidas “adaptações” porque cada país escreve dentro das normas da sua variante linguística. Para uma maior assertividade sobre a questão de adaptação do livro de autor português no Brasil, seria apropriado uma análise mais profunda de livros portugueses editados no Brasil em todos os aspetos, mas isso seria outro estudo exploratório.

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