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Localizando o contexto histórico do ensino como constituidor de sujeitos do ensino de

CAPÍTULO II – Avaliação no ensino superior para a formação do profissional da

2.1. Localizando o contexto histórico do ensino como constituidor de sujeitos do ensino de

A educação formal integra os processos sócio-políticos e culturais da sociedade. Tais processos, ao mesmo tempo em que revelam uma concepção de educação e sociedade, configuram projetos de escola para formar os indivíduos. Dessa forma, não ocorrem ao acaso, fora de um contexto de interesses que os constitui, resultando pois, de embates de forças político-ideológicas e sociais. Esta compreensão permite apreender de modo adequado a problemática da formação no ensino superior, e nesta da avaliação.

Na perspectiva de entender o que se delineia no âmbito da política nacional e internacional das últimas décadas, encontramos nas análises de Chauí (2001) argumentos para justificar o advento da avaliação do ensino superior na atualidade como parte da conjuntura internacional mais ampla das discussões do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) no sentido de determinar diretrizes e meios para a educação. Para tanto, são destinados recursos financeiros aos países partícipes do projeto mundial formulado nesse nível de política educacional.

A avaliação externa no terceiro grau é aí delimitada sob o discurso de que para se investir nas organizações de ensino nacionais, haveria que se propor um método de diagnosticar a situação do ensino superior. A avaliação seria central para o referido diagnóstico, particularmente aludindo que os profissionais egressos estariam sendo mal preparados; por sua vez o corpo docente e a forma de controle de qualidade dessa educação estavam decaindo, entre outras justificativas para tentar regular as dinâmicas deste campo.

Os interesses econômicos do referido órgão e de outros a ele articulados apontam para uma abordagem aos conflitos sociais decorrentes das condições de vida da população, em

especial o empobrecimento econômico mundial. Por meio desta, busca articular as diferenças econômicas entre as camadas da população que alcançaram patamares elevados nos últimos anos do século XX, em contexto do desemprego estrutural. Na perspectiva da referida abordagem, a manutenção da governabilidade do conjunto das forças sociais requer que se proceda de modo a refrear os ânimos e encontrar soluções para amenizar os problemas. No Brasil, seguindo distintos estudos, a matriz orientadora das reformas que acompanhamos com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN 9.394/96) visou desenvolver uma proposta de educação que se solidificasse no âmbito da empregabilidade, estabelecendo competências para entrar e permanecer no trabalho. Com esta orientação, alude a possibilidade de os indivíduos competentes encontrarem emprego e projeta a alternância de momentos de trabalho e de estudos para contínua atualização. Também deve ser empreendedor e ter características que lhe permitam trabalhar em múltiplas funções e cargos. (BRASIL, 1996b).

Os encaminhamentos para realizar as ações educativas destacam a avaliação, como forma de controle ao desempenho das instituições de ensino superior, dos egressos, do grupo de estudantes e do grupo de docentes (OLIVEIRA, 2000; CHAUÍ, 2001; DELORS, 2001).

Para elucidar os interesses de forças econômicas e políticas no embate e na busca pela consolidação da integração do ensino superior, na proposta de avaliação anteriormente referida, buscamos destacar aspectos envolvidos no projeto educativo das políticas públicas do Brasil nas três décadas que encerraram o milênio.

Com o golpe de 1964 o Brasil passou por vinte e um anos sob um regime político de força militar à frente da concepção e administração da ordem pública nacional. Esta forma de direção das políticas teve início em março de 1964 e seu término foi em janeiro de 1985, com a eleição de Tancredo Neves para a condução da administração nacional.

Por ordem dos interesses aí gerados, foram assumindo o governo generais que seguiram a expansão do processo de abertura ao capital internacional. O reflexo desse movimento e da articulação da burguesia financeira com esses dirigentes significou, no campo da educação, momentos de luta entre os grupos organizados por direitos civis e repressão governamental, como resposta a qualquer expressão e, ou fortalecimento de caráter oposicionista.

Temos aí originadas as condições que atingiram estudantes e professores, contendo seus instrumentos de luta e mesmo sua articulação na defesa das classes populares: atos institucionais, a Lei Suplicy e a Reforma Universitária e de Segundo Grau. Os primeiros determinaram a criação do bipartidarismo e o fechamento do Congresso; a segunda extinguindo o órgão nacional do movimento estudantil, a União Nacional dos Estudantes (UNE); e a terceira, estabelecendo a departamentalização nas universidades.

O controle sobre a população, organizações civis e manifestações populares ocorreu a partir de repressões diversas à imprensa, sindicatos e partidos, buscando articular uma versão oficial sobre uma “nova ordem” de progresso e paz. Com isso, os generais e a tecnoburocracia assumem o poder sob protestos permanentemente reprimidos.

Na educação, os resultados desse período se direcionaram para reformas no ensino. Com base em relatórios internacionais e nacionais10 as reformas acabam por estabelecer formas de ensino de segundo grau diferenciadas conforme o projeto de destinação dos diferentes segmentos sociais: ensino profissionalizante para integrar parcelas de indivíduos pobres aos postos de trabalho e propedêutico, com vistas ao ensino superior para aqueles setores destinados às funções dirigentes da produção econômica e da política. Também com essa reforma deu-se o à expansão da privatização do ensino de terceiro grau, possibilitando a criação de cursos e a ampliação da sua oferta (GHIRALDELLI JÚNIOR, 1992).

No âmbito da prática pedagógica, predominou nos anos 1970, no país, a pedagogia tecnicista11, cujo foco central para o trabalho do aluno é o aprender a fazer, trazendo para a escola a forma de funcionamento do sistema fabril, segundo a qual o trabalhador deveria adaptar-se ao trabalho objetivado e organizado de maneira fragmentada.

Concomitante ao tecnicismo pedagógico, como pedagogia oficial nos anos de 1960 e 1970, o não-diretivismo, cujas bases teóricas eram o escolanovismo piagetiano, também foi

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A Reforma Universitária de 1968 teve base nos Relatórios Atacon (1966), que a dimensiona como fenômeno quantitativo no qual é preciso investir com o máximo rendimento e a mínima inversão, e o Relatório Meira Mattos (1968), o qual apontava a falta de disciplina e de autoridade no campo escolar. Tal modelo encaminha o ensino baseado em modelos administrativos de grandes empresas. Com isso, requerendo a recondução do ensino nas escolas superiores para atender a nova ordem econômica e política. O resultado desse relatório foi a aceleração do desenvolvimento vinculando a educação à condição de progresso econômico e social do país (Marilena CHAUÍ, Escritos sobre a universidade, 2001).

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A pedagogia tecnicista tinha por base os pressupostos da neutralidade científica e inspirava-se na racionalidade, eficiência e produtividade. Sob o discurso de tornar objetivo o processo educativo conferindo-lhe operacionalidade. A educação sendo tratada de forma racional e objetiva, minimiza o subjetivismo e, portanto, a eficiência do processo. Preconiza-se, a partir daí, a existência de planejamentos prévios que buscam a adaptação e o ajuste das disciplinas. (Dermeval SAVIANI, Escola e democracia, 1983).

uma concepção pedagógica desse período. Os seus defensores12 argumentavam que os conhecimentos ensinados no âmbito escolar cairiam em desuso em dez anos. Ao final dos anos de 1970 e início de 1980, o escolanovismo espiritualista13 teve destaque, especialmente com as obras de Rubem Alves. De 1960 a 1980 o movimento do escolanovismo popular também se fez presente. Nesse sentido, a Pedagogia de Freinet e a Pedagogia Libertadora tiveram divulgação e aceitação na educação pré-escolar dos anos 1970. Entretanto, a primeira teve destaque e divulgação do MEC por adotar, como princípio fundamental, o trabalho. Já a Pedagogia Libertadora, por sua ideologia de conscientização, foi apontada como subversiva após 1964. Essa pedagogia voltou a ter divulgação em meados de 1970, com o início do enfraquecimento da estrutura militar de governo. Somaram-se a essas pedagogias teorias críticas à educação institucionalizada.14

A reestruturação e a concretização para a globalização econômica no país ocorreram durante o período dos governos de Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso (anos 1990), que se comprometeram em garantir educação básica de qualidade para crianças e adultos frente a reuniões e assinatura de acordos internacionais, que serviram de base para a reforma do ensino.15 No sentido de atender a essa necessidade, foram desencadeadas ações como a aprovação da Lei Darcy Ribeiro (LDBEN 9.394), alheia aos debates que vinham sendo promovidos por educadores e organizações profissionais para a construção de uma lei que correspondesse às aspirações para a educação nacional. Projeto esse que se voltaria à melhoria da qualidade da educação e à permanência do estudante na instituição educativa, à valorização e qualificação dos profissionais da educação, à democratização da gestão e ao financiamento, por meio de verbas públicas, exclusivamente para a educação pública (SHIROMA; MORAES e EVANGELISTA, 2002).

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Carl Rogers, um dos pais do não-diretivismo, argumentava, com base em Kilpatrick, ser a evolução da tecnologia uma das causas do conhecimento ensinado na escola ficar obsoleto. O não-diretivismo foi entendido como oposição ao tecnicismo. Apregoavam que a preocupação da escola deveria ser mais voltada às relações interpessoais. (Paulo GHIRALDELLI JÚNIOR, História da educação, 1992).

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O escolanovismo espiritualista fazia oposição ao mundo cientificizado e racionalizado, mas não superou o tecnicismo nem propôs uma pedagogia de crítica. Promovia a crítica passadista pelo cultivo de um passado bom que deveria estar presente, ainda que subjetivamente, no cotidiano das pessoas. (Ibid., p. 199).

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A exemplo, a teoria de Louis Althusser, sobre a escola como aparelho ideológico do estado, a escola capitalista de Christian Baudelot e Roger Establet e a teoria da reprodução de Jean Claude Passeron e Pierre Bourdieu, teorias de desescolarização, de Ivan Illich, teorias antiburocráticas e a concepção histórico-crítica com aprofundamento no pensamento marxista (Ibid.).

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Os documentos que foram base para a reforma promovida por Fernando Henrique Cardoso procederam da Conferência Mundial de Jomtien (Tailândia), em 1990, e da Conferência Mundial de Educação para Todos (Eneida Oto SHIROMA; Maria Célia M. de MORAES; Olinda EVANGELISTA, Política educacional, 2002).