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1.5 MÁRIO DE ANDRADE: A BUSCA PELA MÚSICA GENUINAMENTE NACIONAL

IDENTIDADE NACIONAL, REGIÃO E MÚSICA.

1.5 MÁRIO DE ANDRADE: A BUSCA PELA MÚSICA GENUINAMENTE NACIONAL

Fiel aos princípios acima citados, Mario de Andrade empreendeu uma grande “viagem” ao interior do País. Ele desenvolveu uma intensa atividade de pesquisa com o objetivo de estudar os elementos que compõem a cultura brasileira, tornando-se um “turista aprendiz” (Oliven, 1993). Andrade viu na região Nordeste uma rica fonte para a constituição da brasilidade.

Para o representante do movimento modernista, na região nordeste encontravam- se as grandes manifestações culturais do povo. Os habitantes desse espaço são seres telúricos e tradicionais, e, por isso, representam o tipo brasileiro por excelência. (ORTIZ, 1988, p.36-37). O poeta e escritor paulista, entendendo como tarefa do intelectual ocupar-se em pesquisar, descrever, difundir e organizar essas manifestações, dando a elas a legitimidade necessária a elevação da mesma à nível nacional, viu na música a “arte mais totalmente nacional”.

Seu emblemático Ensaio sobre a Música Brasileira é um convite para “se inventar uma música nacional, procurando ouvir as melodias populares” (Pécaut, op. Cit. p. 36). Ele encontrou nos espaços e aspectos rurais, fonte inesgotável de produção da autêntica e tradicional música popular brasileira.

Convicto da importância da elaboração de uma música artística nacional, constituída a partir da catalisação de elementos oriundos da cultura popular, sobretudo, advinda do meio rural como elemento básico na formação da identidade brasileira, Mario de Andrade dedica-se com afinco à pesquisa sobre essa arte. Ele figura como um forte defensor da tese segundo a qual o que se tinha no Brasil até a segunda metade do século XIX não era uma música própria, mas uma música transplantada.

Em suas investigações sobre música, elaboradas sobretudo entre 1920 e 1940, ele procura mostrar que o que se tinha no Brasil de produção musical até então era, na

verdade, manifestações de músicas europeias, africanas e ameríndias que tinham sido transplantadas e enfatiza a importância de se produzir uma música genuinamente nacional. O autor enfatiza as contribuições das etnias formadoras do Brasil no processo de composição de uma música brasileira, destacando os elementos herdados dessas.

Em texto evocativo de 1929, Mário de Andrade apresenta os elementos herdados das culturas europeias, ameríndias e africanas na constituição das manifestações musicais do Brasil, destacando a contribuição de cada uma dessas etnias basilares da nossa formação enquanto nação hibridizada.

A cultura indígena nos deixou como legado musical o uso de instrumentos como o chocalho e a maneira de cantar. Para Mário de Andrade, o brasileiro possuía um modo diferenciado de canto em relação às outras nações europeias. Ele destaca nesse processo, o uso do som anasalado (manifesto, sobretudo, no Nordeste) e a utilização de poucas palavras e um refrão. Isso faz com que o brasileiro se sinta liberto da obrigatoriedade de desenvolver um compasso, minunciosamente organizado.

Da cultura africana, o brasileiro herdou a variedade rítmica, o modo sensual de dançar e uma intensa capacidade de flexões linguísticas. No que se refere à cultura europeia, o autor destaca as influencias portuguesa e espanhola para nossa música. De Portugal o brasileiro recebeu como herança a quadratura estratosférica, as formas lírico- poéticas e o cantochão (canto tradicional da liturgia cristã-católica ocidental, monódico, diatônico e de ritmo livre, composto sobre textos litúrgicos latinos e baseado na acentuação e nas divisões do fraseado; canto gregoriano, canto plano).

O português ainda nos legou algumas maneiras de dançar: A dança de rodas e o fandango (dança popular portuguesa em compasso ternário, cuja modalidade mais típica é a da região ribatejana, dançada normalmente por dois dançarinos).

Quanto à herança Espanhola, o escritor modernista destaca a presença do violão (a guitarra espanhola), do cavaquinho, da flauta além de danças como a Habanera (música cubana em compasso binário, com figuração rítmica característica) e o Tango (dança que teve origem na Espanha, no século XIX, e difundiu-se também em países da América do Sul, especialmente na Argentina).

Conforme Mário de Andrade foram essas as influencias recebidas pelos brasileiros em sua “formação” musical e elas comparecem de maneira substancial nas

manifestações populares. Neste sentido, o autor orienta os compositores a irem buscar nas referidas manifestações os elementos necessários para construção da verdadeira música artística nacional. Assim sendo, Mario de Andrade defende com veemência a necessidade de atualização da música brasileira através da inserção das manifestações populares como ingrediente indispensável à essa atualização.

No já citado Ensaio Sobre a Música Brasileira Mário de Andrade deixa evidente sua posição acerca do considera atualizar a música brasileira bem como acerca dos critérios dessa atualização.

Primeiro o autor vai afirmar que: “O critério de música brasileira para atualidade deve de existir em relação a atualidade. A atualidade se aplica aferradamente a nacionalizar a nossa manifestação” (ANDRADE,1972, p.20.)para, em seguida, destacar e associar a nacionalização da música à raça: “o critério histórico atual da música brasileira é o de manifestação musical que sendo feita por brasileiro ou indivíduo nacionalizado, reflete às características musicais da raça” (ANDRADE ,1972, p.20).

Cabe destacar aqui que os trabalhos desenvolvidos por Mário de Andrade foram fundamentais para a consolidação da Música Popular Brasileira, no século XX e, contribuiu decisivamente para a construção de uma estética nacionalista nas produções desse campo artístico. A ênfase dada pelo pensador modernista na constituição de uma música artística nacional provocou uma importante mudança no modo de ver, ouvir e dizer as manifestações musicais nos mais diversos lugares. A música, que no Brasil até então era pensada como uma extensão da música erudita europeia e cuja concepção estética de produção deveria ser rigidamente seguida, passou a ser desvalorizada.

1.6- GILBERTO FREYRE E A CONSTRUÇÃO DO NOVO