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1.3 OS INTELECTUAIS BRASILEIROS E A BUSCA PELA CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE NACIONAL

IDENTIDADE NACIONAL, REGIÃO E MÚSICA.

1.3 OS INTELECTUAIS BRASILEIROS E A BUSCA PELA CONSTRUÇÃO DA IDENTIDADE NACIONAL

As manifestações acima aludidas eram marcadas pelos ideais de independência cultural e “redescoberta do Brasil” pelos brasileiros. Elas são exemplos do modernismo e frutos de uma época de radicalização ideológica e política vivenciada a partir da aceleração do processo urbano industrial, do surgimento de um Estado moderno e da emergência de uma cultura popular de massa. (Ortiz, 1988, p.39). Nesse contexto, a semana de arte moderna ocorrida em São Paulo em 1922 pode ser tomada como marco desse nosso modernismo e da consolidação de uma tradição de militância da

intelligentsia brasileira em torno do nacionalismo.

Na verdade, a intelectualidade brasileira já se ocupara em responder questões sobre a identidade nacional do país, ligando-a ao problema da cultura popular e do

Estado desde meio século antes da semana de arte moderna de 1922. Um grupo de intelectuais conhecidos como a “geração de 1870”, cujos lídimos representantes são Tobias Barreto, Sílvio Romero, Graça Aranha, Capistrano de Abreu e Euclides da Cunha, debruçam-se sobre a problemática de buscar meios para a integração do Brasil na cultura ocidental. Para resolução desse desafio e consolidação de tal propósito “tentou definir a nacionalidade através da elaboração de uma crítica literária que tomava como ponto de partida indagações de caráter crucial: Quais os elementos que definem o Brasil? No contexto internacional, o que configura, enfim, a especificidade de ser brasileiro? (VELLOSO, 2008, p.354.).

Nesse período predominava uma visão pessimista da nacionalidade, caracterizada pelo atraso e pela inferioridade étnica. O Brasil era lido através da cartilha do Darwinismo social. Conforme essa corrente do pensamento intelectual ocidental, existiriam civilizações superiores e inferiores, a que corresponderiam respectivamente etnias. Nesse sentido, “os intelectuais brasileiros de 1870, definiam o pais como resultado do meio físico e geográfico, da raça e do momento e concluíam que era o estilo tropical e a mistura étnico-cultural que fundamentavam a nossa literatura. O escritor brasileiro caracteriza-se pela falta de disciplina e de unidade, mas era repleto de emoção, de imaginação e de sensualismo. A essa imagem do intelectual corresponderia à do nacional, definido como metafísico, dionisíaco, primitivo e mestiço (VELLOSO, op. Cit. pp.355- 356).

Assim sendo, tomando como modelo o paradigma cientifico para elaboração de suas interpretações sobre o Brasil, esses intelectuais reconhecem, mesmo que de forma “envergonhada” a nossa identidade mestiça e buscam a compreensão da identidade múltipla da nacionalidade embora predominasse, entre eles, a idéia de segmentação entre o superior (europeu) e o inferior (brasileiro) sendo reservada a cada uma das etnias o seu espaço.

Entendendo que era necessário acelerar a macha evolutiva para ultrapassar o quadro de atraso e integrar o Brasil no contexto internacional, os intelectuais destacavam que a nacionalidade brasileira era uma matéria-prima a ser trabalhada, moldada, esculpida pelo saber cientifico das elites intelectuais. Neste sentido, eles como portadores que eram da identidade nacional latente e dotados do saber superior, o saber cientifico, tinham a missão de revelar e organizar a nacionalidade e conduzir o

processo das mudanças sociais.

Dessa forma os intelectuais reivindicam para si à condição de interpretes das massas populares. Na condição de quem tem o monopólio real da palavra (Bourdieu, 1978) esses intelectuais tomaram-na em situação de autoridade, em situação autorizada para falar em nome do povo, definindo seus costumes, classificando-os e selecionando aqueles que deveriam perpetuar-se e aqueles que deveriam ser colocados no limbo do esquecimento.

Considerando-se porta-vozes do povo, esses intelectuais passam a desenvolver uma série de estudos sobre nosso folclore. Nesta perspectiva Silvio Romero faz um verdadeiro “recenseamento da cultura brasileira”, criando instrumentos de pesquisa para estudá-la. É trilhando esse viés analítico que, posteriormente, Mario de Andrade vai desenvolver a sua pesquisa etnográfica da nossa música e das mais diversas tradições culturais.

Desse modo, depreende-se que os estudos etnográficos da geração de 1870 contribuíram significativamente para a eclosão do movimento modernista, que dará continuidade a construção da identidade nacional, como veremos posteriormente. (VELLOSO, op. Cit. P. 357, grifos nosso).

É, entretanto, a partir de 1915 que será definitivamente instaurado uma militância intelectual em torno das idéias nacionalistas. Neste ano, Olavo Bilac, inspirando-se confessadamente na obra os Sertões, que Euclides da Cunha publicara em 1902,elegendo o sertanejo como símbolo da nacionalidade e destacando a raça e a terra como fator da originalidade cultural, irá desencadear uma campanha nacionalista e criar a liga nacionalista e a liga de defesa nacional na Academia do Largo do São Francisco.

Nesse período, o processo de construção da nação sofre uma profunda inflexão em virtude da eclosão do primeiro grande conflito mundial. Esse provoca uma mudança significativa nos modos de se ver, ouvir e dizer estas espacialidades, dando assim, novos rumos às práticas sociais que tinham a nação e a integração do povo à nacionalidade como objetos centrais e privilegiados. (Albuquerque Jr, 2010).

Nos finais da década de 1920, a identidade brasileira passou a ser vista de outra forma. Essa nacionalidade agora é vista como alteridade em relação à Europa. O olhar volta-se para o interior do Brasil, para o povo brasileiro e sua riqueza cultural. Foi

dentro desse contexto que se desenvolveram um conjunto de práticas sociais que deu origem ao que convencionou-se chamar de formação discursiva nacional-popular.

Do ponto de vista político a história do Brasil sofreu significativas mudanças a partir de 1930. A chegada de um novo grupo ao poder, tendo à frente o gaúcho Getúlio Vargas, representava um novo projeto de nação. As bases desse projeto assentavam-se numa ideologia política de viés autoritário, crescimento e modernização da máquina do Estado, repúdio ao liberalismo, formação de uma burocracia estatal técnica, industrialização e legislação social protetora do trabalhador. No plano cultural, tem-se a valorização de uma estética nacional e novas estratégias de relacionamento desse grupo que chega ao poder com os populares foram adotadas23.