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A natureza do nosso objeto de estudo pode ser mais bem compreendida sob os auspícios da tradição qualitativa. Isto porque envolve o homem em interações sociais e possibilita que se estude o fenômeno social com a menor distância do seu ambiente natural (PAIVA et al., 2007; GODOI E BALSINI, 2006).

Assim, cabe elucidar que esta pesquisa adota, como método de pesquisa, o estudo de caso, inspirado na perspectiva não-positivista de Robert Stake (1994), para quem um estudo de caso é, antes de uma metodologia, uma escolha de objeto de estudo. Quem se propõe a fazê-lo está interessado em um caso em específico, que será foco da pesquisa diferentemente da concepção de estudo de caso para Robert Yin (2005), que o concebe sob a ótica mais positivista, encarando-o como uma metodologia em si, e preconizando que cabe em pesquisas cujas questões sejam do tipo “como” e “por que”, e quando o pesquisador não puder controlar os acontecimentos, que são contemporâneos a ele.

No tipo de estudo de caso definido por Stake (1994) o “quê” encontraremos ao final do trabalho pode variar, ou seja, os resultados deste podem se diferenciar se outros pesquisadores percorrerem o mesmo caminho, por não acompanhar a perspectiva positivista, para a qual os resultados seriam os mesmos, nesta situação. Contudo, a teoria que guia o trabalho neste tipo de estudo de caso é invariável, isto é, o resultado do trabalho pode variar, entre os pesquisadores, mas a teoria seguida por eles será a mesma.

Mais especificamente esta pesquisa se guia pelo estudo de caso do tipo Instrumental (STAKE, 1994), no qual o caso é secundário, pois ao que de fato ele serve, após ser contextualizado e aprofundado, é para nos ajudar a compreender um interesse maior.

Portanto, esta pesquisa será um estudo de caso instrumental, de cunho naturalístico – característica que foi nomeada por Stake (1994) “generalização naturalística”, e que serve de substituição à generalização positivista, pois, através da descrição densa e viva – aspecto do estudo de caso etnográfico, explicado a seguir -, permite ao leitor a experiência vicária, na qual, ao ler o caso estudado, ele poderá ser remetido as suas próprias experiências pessoais para compreensão do estudo. (STAKE, 1994).

Por fim, outra característica importante do estudo de caso adotado nesta pesquisa é sua natureza etnográfica. André (2005) classifica um dos mais polêmicos tipos de estudo de caso: o etnográfico. Isto porque há muitas críticas a respeito da etnografia enquanto estudo antropológico e em termos de metodologia organizacional. A autora afirma que para ser reconhecido um estudo de caso etnográfico, este, deve enfatizar o conhecimento do singular e seguir os preceitos da etnografia: relativização a partir do estranhamento e da observação participante. Entendendo-se por relativização a capacidade de se deslocar o eixo da sociedade do pesquisador para a unidade em estudo; este requisito será alcançado por meio do estranhamento, que exige um distanciamento da unidade estudada para melhor apreendê-la.

Juntamente com o estranhamento, a relativização provoca o movimento de ir e vir da cultura estudada, ou unidade de estudo, para melhor concebê-la, tendo como meio para tal recurso a observação participante, que permite o imbricamento do pesquisador na situação estudada, de modo interativo e dialético, em que ambos se afetam, naturalmente, com o intuito do pesquisador de conceber seus códigos e pensamentos.

Diante disto, o método etnográfico se enquadra adequadamente enquanto método de pesquisa, dado que pressupõe a imersão do pesquisador no cotidiano onde se insere o fenômeno social alvo de estudo, a fim de “ver com os olhos do outro”. (ROCHA et al., 2005).

A etnografia é concebida como um método de pesquisa e análise de dados, que se utiliza da descrição densa, significando que o pesquisador conceberá as culturas como teias de significados, frutos da vida em sociedade dos indivíduos, guiadas por seus conjuntos de valores, os quais serão alvo da interpretação do pesquisador, sendo estes conjuntos, mesmo antes, produto das interpretações de sua sociedade. É, também, usada para análise de interações face a face, onde o pesquisador, através da participação ou observação desta, torna- se uma fonte de dados para a pesquisa, materializando o discurso da interação, que será fonte de consulta a qualquer tempo, sendo um modo de conservação daquele momento (BRAGA, 2006; ROCHA et al., 2005).

Para melhor compreensão da etnografia, devemos olhar para um breve histórico seu. A etnografia tem sua sistematização devida a Bronislaw Malinovisk, antropólogo que, em 1922, com a publicação de sua obra “Os Argonautas do Pacífico Ocidental”, de onde emergiram os preceitos de que a etnografia seria um estudo realizado a partir da visão de dentro da cultura, ou seja, pressupõe imersão do pesquisador na cultura pesquisada, e, com o convívio íntimo e próximo, tentar enxergar com os olhos do pesquisado. Para tanto, a etnografia demanda a adoção da observação participante, que, como o próprio nome enuncia, permitirá que o pesquisador acesse os valores sociais cotidianos (ROCHA,BARROS E PEREIRA, 2005). Com o

passar do tempo, diante das lacunas produzidas por outros métodos e abordagens, a etnografia foi importada para outros campos além da Antropologia, como para a Administração, a Sociologia, a Medicina e outras, para acessar mais profundamente o objeto de pesquisa.

A metodologia utilizada no estudo etnográfico pressupõe a inserção do pesquisador dentro do universo microscópico estudado, partindo da visão de dentro da vida do grupo por meio de seus indivíduos, revelando, assim, a constituição do pensamento e dos valores daquele grupo estudado. Para tanto, faz-se imprescindível a relativização nos estudos destes pequenos grupos, contextualizando-se a visão do outro para compreender sua realidade (ROCHA, 2007).

Em se tratando de um estudo de comunidades virtuais, a etnografia se enquadra perfeitamente como método para tal, uma vez que, de acordo com os princípios herdados desta pela Antropologia, utiliza metodologias que possibilitem conhecer a vida coletiva através de estudos microscópicos dela (GEERTZ, 1978).

Ademais, no caso de uma investigação que acessa interações sociais, um tipo específico de etnografia se faz mais adequado: a etnografia da comunicação, cuja busca pelo conhecimento se dá através do estudo das interações interpessoais (LEÃO E MELLO, 2007). Portanto, salientamos a importância da etnografia da comunicação, ainda, uma vez que este trabalho se baseia na teoria da elaboração da face, explanada anteriormente, analisando a comunicação nas comunidades virtuais (lócus). Daí, a etnografia se configura uma alternativa à necessidade de métodos que acessem objetos de estudo inseridos em interações sociais. A etnografia da comunicação se caracteriza pela sua base lingüística e antropológica, concebendo o mundo a partir da comunicação, enquanto parte da cultura, que, por sua vez, estabelece uma relação dialética com aquele, ambas se constrangendo e se moldando perante a outra (LEÃO E MELLO, 2007).

Diante do exposto, há a necessidade, neste trabalho, de um método relacionado à etnografia da comunicação, que se encaixe nos estudos de comunidades virtuais e que atenda o requisito comunicacional já mencionado. Encontramos na netnografia este arcabouço. Este método foi fundado pelo antropólogo e administrador Robert V. Kozinets, como uma derivação da etnografia tradicional, porém adequada às características do ambiente das comunidades virtuais, de modo que possibilita a contextualização do comportamento do consumidor inserido numa comunidade virtual, uma vez que seu comportamento dentro desta não se faz isolado, mas como derivação da vida real, e vice-versa. Neste sentido, recomenda- se o uso da netnografia como método de estudo tanto de comunidades virtuais puras como das derivadas, sendo aquelas referentes às ciberculturas resumidas apenas à CMC (comunicação mediada por computador), e estas a um mesclado de CMC e vida real, que, neste caso, demandaria outros tipos de métodos complementares à netnografia (KOZINETS, 1998; ROCHA et al., 2005).

Um dos problemas da netnografia, segundo Kozinets (1998), seria a questão da ética exigida na etnografia tradicional, já que esta é reafirmada pelo autor como critério de rigor científico, cujos princípios éticos compreendem o respeito aos limites entre o público e o privado, e a permissão do informante para divulgação de conteúdo que lhe diga respeito, aspectos nem sempre possíveis de serem relevados ou cumpridos na netnografia.

Comungando com Clifford Geertz, Kozinets (1998) reitera o aspecto da etnografia no que tange à imersão do pesquisador no contexto estudado, a ponto de ser reconhecido como membro da comunidade, a fim de acessar seus símbolos e linguagem para uma interpretação subjetiva do pesquisador sobre esta realidade.

Por fim, dado o fato de que esta pesquisa aborda, de forma específica, um fenômeno ocorrente nas comunidades virtuais, cujo acesso demanda um método eficaz que ainda não se apresentou, esta pesquisa se constitui como propositora do que estamos chamando de

“netnografia da comunicação”. A proposta é de fundação de um tipo de método que capte, além das pistas concedidas pelos conteúdos das comunidades virtuais, a linguagem não-verbal e os signos utilizados pelas pessoas para se comunicarem virtualmente e se estabelecerem faces nesta interação. Para tanto, iniciamos a coleta de dados a partir de um estudo-piloto, baseado em um guia proposto por Leão e Mello (2007), como recurso de adequação deste à limitação da linguagem não-verbal nas comunidades virtuais, exposto em seção mais adiante.

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