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1 INTRODUÇÃO

1.8 Método interfacial

O método interfacial consiste na formação de um filme na interface de um sistema bifásico, constituído por um líquido polar e um apolar, seguido da deposição do filme na superfície de um substrato planar por meio da elevação deste substrato em direção ao filme (DE SOUZA; OLIVEIRA; ZARBIN, 2014; MEHL; OLIVEIRA; ZARBIN, 2015; NOSSOL;

SOUZA; ZARBIN, 2016; RODRIGUES et al., 2013; SALVATIERRA et al., 2013; SOUZA et al., 2016). A Figura 13 representa o preparo de um filme e deposição no substrato a partir do método interfacial.

Figura 13 - Esquema de representação de síntese e deposição de filme obtido pelo método interfacial em substrato planar.

Fonte: Adaptado de Salvatierra et. al (2010).

O método consiste em uma alternativa simples, de fácil execução, baixo custo, alta reprodutibilidade, com realização do procedimento em apenas uma única etapa, além de permitir a deposição em qualquer tipo de substrato planar, como exemplo BDD, óxido de índio dopado com estanho, folha de grafite, papel pirolisado, vidro ou PET e não necessitar de condições experimentais extremas, como elevada temperatura ou pressão (SOUZA et al., 2016). Como principais características do filme obtido, tem-se a transparência, homogeneidade e possibilidade de controle da espessura através da manipulação das quantidades dos precursores (SALVATIERRA; OLIVEIRA; ZARBIN, 2010; SOUZA et al., 2016).

Para melhor compreensão da formação do filme na interface líquido/líquido, é importante compreender o comportamento das espécies nesta região. Na interface de um sistema água/solvente orgânico as moléculas de água estão altamente orientadas, de modo que um átomo de hidrogênio “aponte” na direção das moléculas hidrofóbicas do solvente, enquanto o dipolo permanente da água seja direcionado para o sentido oposto à interface (MOORE; RICHMOND, 2008). Além disso, nesta interface, ocorre a presença de OH “livre”, ou seja, quando a ligação de uma molécula de água se orienta para a fase hidrofóbica. Assim, as moléculas de água interagem fracamente com as moléculas orgânicas e também com o OH “livre” (MOORE; RICHMOND, 2008; SALVATIERRA; OLIVEIRA; ZARBIN, 2010).

Na interface desse sistema bifásico, é comum a formação de emulsões. Todavia, estas gotículas de emulsões são instáveis termodinamicamente e tendem a se separar. Contudo, uma forma comum de estabilização das emulsões ocorre através da adição de partículas sólidas que

aderem à interface e interagem com as duas fases do sistema, configurando as chamadas emulsões de Pickering (VILELA, 2016). Este fenômeno explica a tendência dos materiais adicionados para formação dos filmes em realizar a migração para a interface da solução bifásica (SALVATIERRA; OLIVEIRA; ZARBIN, 2010).

O potencial deste método foi demonstrado na inédita síntese em uma única etapa do filme compósito entre polianilina e CNTs na interface de uma solução água/tolueno e deposição em substrato ITO (SALVATIERRA; OLIVEIRA; ZARBIN, 2010). Após este estudo, o método também foi explorado na formação de um filme de grafeno enriquecido em três camadas (SALVATIERRA et al., 2013), formação de compósito polianilina-SWCNTs e aplicação como supercapacitor (DE SOUZA; OLIVEIRA; ZARBIN, 2014), associação de grafeno com nanopartículas de prata para aplicações como substrato para Espectroscopia Raman (MEHL; OLIVEIRA; ZARBIN, 2015), formação de nanocompósito CNTs-azul da prússia como cátodos para baterias (NOSSOL; SOUZA; ZARBIN, 2016) e avaliação do potencial de aplicação de filmes de nanomateriais de carbono (MWCNT, SWCNT, rGO) obtidos pelo método interfacial em eletroanálise (SOUZA et al., 2016).

1.9 2,4,6-Trinitrotolueno (TNT)

Explosivos são substâncias ou misturas de substâncias suscetíveis decomposição química brusca e violenta na presença de estímulos térmicos, elétricos ou mecânicos, liberando grande quantidade de gases sob alta temperatura e pressão (FARIAS, 2010), sendo utilizados em ataques terroristas, combates militares e implosões de edifícios. São constituídos de uma mistura de nitroaromáticos, nitraminas e ésteres de nitratos, sendo o TNT o nitrocomposto mais comumente utilizado em explosivos comerciais (O’MAHONY; WANG, 2013). A Figura 14 representa a estrutura da molécula de TNT.

Figura 14 - Fórmula estrutural do 2,4,6-trinitrotolueno (TNT).

Além das preocupações com a segurança, a detecção de explosivos também envolve a problemática ambiental. Recentemente, o Instituto Fraunhofer de Tecnologia Química desenvolveu estudos que demonstravam o potencial tóxico dos resíduos de TNT na contaminação de solos (RABENECKER; PINKWART, 2009). A partir disso, vários estudos vêm sendo conduzidos buscando a determinação de TNT, inclusive em amostras de água e solo. As técnicas geralmente utilizadas na detecção de TNT são a Espectrometria de Massas, Espectrometria de Mobilidade Iônica, Espectroscopia de Infravermelho, Espectroscopia Raman, Cromatografia Gasosa e as técnicas eletroanalíticas (CAYGILL; DAVIS; HIGSON, 2012; WANG, 2007). Dentro destas, destaca-se o campo da eletroanálise, uma vez que permite a realização de análises de forma rápida, sensível, com baixo custo de instrumentação e possibilidade de portabilidade, o que permite a realização de análises no local de interesse (WANG, 2007).

A principal característica da molécula de TNT que permite a sua determinação por meio das técnicas eletroanalíticas é a presença do grupo nitro. Devido à deficiência de elétrons no nitrogênio, este grupo se torna um excelente receptor de elétrons, sendo, então, suscetível à ocorrência de reações de oxirredução (WANG, 2007). O mecanismo no qual esta reação ocorre consiste na redução dos grupos nitro a grupos amino, com a formação de hidroxilamina como intermediário. Em função dos três grupos nitro presentes em sua estrutura, um voltamograma típico para a redução eletroquímica do TNT apresenta três picos voltamétricos (O’MAHONY; WANG, 2013; YU et al., 2017). O mecanismo proposto para a redução de cada grupo nitro de TNT está representado na Figura 15. Este processo se repete por mais duas vezes até redução dos três grupos nitro a grupos amina. Na Figura 16, tem-se um voltamograma característico de TNT em meio aquoso.

Figura 15 - Mecanismo proposto para a redução eletroquímica de cada grupo nitro da molécula de TNT em meio aquoso.

Figura 16 – Voltamograma cíclico para 88,1 µmol L-1 de TNT em GCE em solução tampão fosfato (pH 8) 0,05 mol L-1. Velocidade de varredura: 100 mV s-1.

Fonte: Adaptado de Chua, Pumera e Rulíšek (2012).

Na determinação de TNT por meio de técnicas eletroanalíticas, a utilização de CMEs como eletrodos de trabalho se mostra uma excelente alternativa, especialmente quando são utilizados nanomateriais de carbono, como o grafeno, fulereno e os nanotubos de carbono. O composto nitroaromático deficiente de elétrons interage com a rede sp2 dos nanomateriais por meio das interações π-π, favorecendo o processo de transferência de carga e, consequentemente, a ocorrência da reação eletroquímica (YEW; AMBROSI; PUMERA, 2016).

Analisando as vantagens de utilização de nanomateriais de carbono, Zhang, Y. et al. (2013) desenvolveram um sensor para a detecção de TNT a partir de um compósito contendo fulereno e carbono macroporoso. O filme foi preparado pela dispersão dos materiais em tolueno e depositado em substrato de GCE por drop casting, seguido da redução eletroquímica em solução 1 mol L-1 de KOH. Os parâmetros analíticos foram determinados através da voltametria de varredura linear (LSV), com limite de detecção estimado em 0,17 µmol L-1 e intervalo linear entre 0,5 a 240 µmol L-1.

A determinação de TNT utilizando GCE modificado com nanofolhas e nanofitas de grafeno também foi estudada por Tan, Chua e Pumera (2013). Cada nanomaterial foi dispersado em DMF e depositado na superfície de GCE por drop casting. A técnica utilizada para análise

foi a DPV. Os resultados demonstram melhores características analíticas para as nanofitas de grafeno, com limite de detecção de 0,6 µmol L-1, inferior ao limite de 2,25 µmol L-1 encontrado para as nanofolhas de grafeno.

Um eletrodo impresso de nanotubos de carbono e nanopartículas de ouro também foi avaliado por Riedel, Berthold e Guth (2014) na determinação de TNT. A técnica de DPV foi utilizada para quantificação e os resultados demonstraram que a associação dos nanomateriais resultou em um limite de detecção de 0,006 µmol L-1 e faixa linear de 0,006 a 6,6 µmol L-1.

O estudo realizado por Zhang, R. et al. (2015) avaliou o filme formado através da ancoragem de nanocubos côncavos de PtPd em nanofitas de óxido de grafeno reduzido para a detecção de TNT. Os materiais foram dispersados em uma solução contendo água, álcool isopropílico e Nafion (4:1:0,025 v/v), seguidos da deposição em GCE por drop casting. A determinação foi realizada através de voltametria de redissolução anódica com varredura linear (ASV-LSV) com pré-concentração de TNT na superfície do eletrodo por 150 s e aplicação de um potencial de -0,33 V, estimando um intervalo linear entre 0,04 e 13,3 µmol L-1 e limite de detecção de 0,004 µmol L-1.

A exfoliação eletroquímica de grafeno em diferentes eletrólitos também foi estudada por Yew, Ambrosi e Pumera (2016) na determinação de TNT. Os eletrólitos avaliados foram Na2SO4 e LiClO4. O preparo do filme foi realizado através da dispersão do grafeno exfoliado em DMF, seguido da deposição em GCE por drop casting. A técnica utilizada para análise foi a DPV e os resultados obtidos demonstraram que o grafeno exfoliado em LiClO4 possui maior quantidade de grupos funcionais oxigenados, fornecendo maior sinal eletroquímico para o analito e limite de detecção de 8,9 µmol L-1.

A determinação de TNT também foi estudada por Trammell et al. (2016) utilizando grafeno modificado por plasma produzido em mistura O2/Ar atmosférico e depositado em superfície de carbeto de silício 6H (SiC 6H) por deposição química de vapor. A resposta eletroquímica do sensor foi avaliada utilizando SWV, obtendo um limite de detecção de 0,09 µmol L-1.

No trabalho de Seah et al. (2014), a detecção de TNT foi estudada utilizando óxido de grafeno reduzido preparado em atmosfera de argônio e hidrogênio. O filme foi preparado dispersando os nanomateriais em DMF e depositado em GCE por drop casting. Os experimentos foram conduzidos utilizando DPV e os resultados demonstraram maior sensibilidade na determinação de TNT para o grafeno preparado em argônio, obtendo um limite de detecção de 1,8 µmol L-1.

Nanofitas de grafeno co-dopadas com nitrogênio e enxofre foram avaliadas na determinação de TNT por Zhang et al. (2018). Para o preparo do filme e deposição no substrato, o mesmo foi dispersado em água deionizada, seguido da deposição em GCE por drop casting. O analito foi pré-concentrado na superfície do eletrodo por meio da aplicação de um potencial de 0 V por 120 s, com os parâmetros analíticos sendo avaliados por DPV. Um intervalo linear entre 0,0035 – 22,5 µmol L-1 foi obtido, com limite de detecção de 0,0004 µmol L-1.

Um sensor para detecção de TNT foi também desenvolvido por Ran et al. (2018), a partir da funcionalização de pillar[6]arene (molécula macrocíclica composta por 6 unidades de hidroquinona ligadas na posição para) solúvel em água com pontos quânticos de carbono dopados com nitrogênio. O material foi dispersado em água deionizada e depositado em GCE por drop casting. Os experimentos foram conduzidos utilizando DPV, com pré-concentração de TNT na superfície do eletrodo por 200 s, sob um potencial de -0,4 V. Os resultados demonstraram um primeiro intervalo linear entre 0,001 e 1 µmol L-1 e um segundo entre 1 e 20 µmol L-1, com limite de detecção estimado em 0,00095 µmol L-1.

2 OBJETIVOS 2.1 Objetivo geral

Investigar o nanocompósito formado entre óxido de grafeno reduzido e nanotubos de carbono (rGO-MWCNT) depositado em eletrodo de diamante dopado com boro (BDD) pelo método interfacial para a determinação de TNT, utilizando como técnica eletroquímica a voltametria de onda quadrada.

2.2 Objetivos específicos

➢ Formar os filmes rGO, MWCNT e rGO-MWCNT na interface de uma solução água/ciclohexano;

➢ Caracterizar os diferentes filmes pela técnica de espectroscopia de impedância eletroquímica;

➢ Avaliar a ativação catódica e anódica de BDD para se obter a melhor resposta analítica de TNT e também como tratamento prévio para deposição do filme;

➢ Investigar o comportamento eletroquímico do TNT frente às três modificações;

➢ Determinar e comparar os parâmetros analíticos na determinação de TNT em BDD não modificado e modificado com rGO, MWCNT e nanocompósito rGO-MWCNT;

➢ Avaliar a reprodutibilidade inter-filmes e inter-dias para o nanocompósito;

➢ Avaliar a seletividade de TNT em filme nanocompósito frente a outros nitrocompostos;

➢ Comparar os resultados obtidos com outros trabalhos relatados na literatura que utilizam sensores baseados em nanomateriais de carbono para a detecção de TNT.

3 PROCEDIMENTO EXPERIMENTAL 3.1 Reagentes e soluções

Todas as soluções foram preparadas com água deionizada de alta pureza e resistividade ≥ 18 MΩ cm, obtida de um Sistema de Purificação Milli-Q (Millipore Direct-Q3, Bedford, MA, USA). A Tabela 1 apresenta todos os reagentes utilizados no desenvolvimento deste trabalho, bem como informações referentes ao teor e procedência.

Tabela 1 - Lista de reagentes utilizados.

Reagente Teor Empresa Origem

MWCNT - Aldrich Milwaukee, USA

Grafite 99,8% (m/m) Alfa Aesar Lancaster

(Reino Unido) TNT RDX PETN > 96% Polícia militar de MG Uberlândia e Belo Horizonte

Acetonitrila 99,8% (v/v) Vetec Rio de Janeiro

(Brasil)

Ácido Acético 99,7% (m/v) Vetec Rio de Janeiro

(Brasil) Ácido Bórico 99,5% (m/m) Sigma - Aldrich St. Louis (USA) Ácido Clorídrico 37% (m/v) Synth Diadema (Brasil)

Ácido Fosfórico 85% (m/v) Synth Diadema (Brasil)

Ácido Perclórico 70% (m/v) Vetec Rio de Janeiro

(Brasil)

Ácido Sulfúrico 97% (m/v) Vetec Rio de Janeiro

(Brasil) Cloreto de Potássio 99% (m/m) Synth Diadema (Brasil) Hidróxido de Sódio 97% (m/m) Synth Diadema (Brasil)

Para o estudo de eletrólitos, foram preparadas soluções aquosas de HCl 0,1 mol L-1, HClO4 0,1 mol L-1, tampão Britton-Robinson (BR) 0,1 mol L-1, na faixa de pH de 2 a 10 e KCl 0,1 mol L-1. Todas as soluções tampão foram ajustadas com adições de solução diluída de hidróxido de sódio. Como todos os reagentes apresentam grau analítico, nenhuma etapa de purificação se mostrou necessária.

Solução estoque de TNT na concentração de 10 mmol L-1 foi preparada através da dissolução em acetonitrila e conservada em refrigerador para realização das análises.

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