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4. DESENVOLVIMENTO DA ESCALA DE AUTOACEITAÇÃO PARA PESSOAS

4.1 Estudo 1: geração dos itens

4.1.1 Métodos

Esta pesquisa foi do tipo qualitativa e descritiva. Empregou-se a combinação das abordagens dedutiva e indutiva para a criação do conjunto inicial de itens. Isto é, os mesmos foram gerados tanto com base em informações provindas da literatura (dedutiva), quanto com base em depoimentos de pessoas com cegueira congênita ou precoce (indutiva), adquiridos com a técnica de pesquisa denominada grupo focal.

4.1.1.1 Grupo focal7

O grupo focal é uma técnica de pesquisa qualitativa que se caracteriza por diferentes configurações de trabalhos em grupos, nos quais um conjunto de pessoas, de determinados grupos sociais, são selecionadas e reunidas para refletir e discutir um tema a partir de experiências pessoais (MORGAN, 1996). O principal objetivo dessa abordagem é gerar ideias e níveis de interesse, com enfoque em captar, mediante trocas realizadas no grupo, atitudes, conceitos, sentimentos, crenças, experiências e reações a respeito de um determinado tema (COLLIER, SCOTT, 2010).

A técnica do grupo focal tem sido comumente utilizada com a finalidade de desenvolver escalas. Esse fato é atribuído por alguns autores, tais como Gatti (2005), Lervolino e Pelicioni (2001) e Trad (2009), pela capacidade do grupo focal de providenciar um fórum, no qual os participantes podem fornecer informações diferenciadas para a geração de itens de uma escala. Essa técnica pode informar o conteúdo da escala por revelar o significado do constructo de interesse do grupo (ANATCHKOVA, 2010; DETMAR, 2006). Alguns exemplos da utilização

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Nossas experiências resultantes dos grupos focais realizadas nesta pesquisa foram registradas em forma de artigo, publicado na Revista Benjamin Constante no ano de 2012 – MORGADO, F.F.R; CAMPANA, A.N.N.B; TAVARES M.C.G.C.F. Aplicabilidade do grupo focal com pessoas cegas. Revista Benjamin Constant, n. 52, agosto, 2012.

do grupo focal no processo de desenvolvimento de escalas podem ser encontrados nos estudos de Fleck et al. (1999); Detmar, et al. (2006); Herbozo e Thompson (2006) e Gorodzeisky (2010).

4.1.1.2 Participantes

Na etapa do grupo focal, a amostra total foi composta por 11 participantes adultos que se autodeclararam com cegueira congênita ou precoce, cinco homens e seis mulheres, com idades entre 26 e 48 anos (média: 34,8 e desvio padrão: 7,34). Foram consideradas pessoas com cegueira congênita aquelas que nasceram cegas ou manifestaram a cegueira antes de um ano de idade; foram consideradas pessoas com cegueira precoce aquelas que adquiriram a cegueira no período estabelecido entre um ano até antes dos nove anos de idade. A presente definição de cegueira é consistente com um número de estudos prévios (BEDNY, et al., 2010; BEDNY et al., 2012; RUOTOLO, et al., 2012) que comumente utilizam a idade de 9 anos para definir a cegueira adquirida.

Dois grupos focais foram realizados, um feminino com a presença das seis mulheres e outro masculino, com a presença dos cinco homens8. O número de grupos foi definido de acordo com as orientações de Gatti (2005) e Greenbaum (1998), que recomendam o emprego de mais de um grupo focal para ampliar o foco de análise e cobrir variadas condições que possam ser relevantes para o tema. O número de participantes foi definido de acordo com as orientações de Kind (2004), que preconizam a presença entre 5 a 7 participantes em cada grupo como um número adequado para aprofundar questões de interesse.

Todos os participantes eram funcionários do Instituto Benjamin Constant (IBC) – Rio de Janeiro (RJ), sendo oito revisores Braille e três professores. Foram adotados três critérios de inclusão: (1) possuir mais de 18 anos de idade; (2) possuir características homogêneas, como aquelas relativas às condições socioeconômicas, ao tipo de trabalho, ao lugar de residência e à escolaridade; e (3) aceitar participar voluntariamente da pesquisa.

8 É preconizado na literatura que os participantes do grupo focal devem ter características homogêneas, entre elas,

aquelas relativas ao gênero (CUMBIE, SANKAR, 2010; GREENBAUM, 1998). Ademais, a separação dos grupos pelo gênero teve como objetivo deixar os participantes confortáveis para falar de temas específicos que englobam sua relação com o próprio corpo.

4.1.1.3 Procedimentos de coleta de dados

O convite para cada participante foi feito pessoalmente. Foram convidados 12 participantes, sendo seis homens e seis mulheres. Todos aceitaram o convite, entretanto, um participante do sexo masculino não pôde comparecer no dia da reunião. Em conjunto com os participantes, definimos data e horário para realização dos grupos. Os dois grupos focais foram realizados em dias distintos. Cada sessão teve duração aproximada de 110 minutos. As sessões foram realizadas em uma sala silenciosa e suficientemente larga para locomoção dos participantes, o que possibilitou maior atenção e conforto dos mesmos.

Além dos participantes, as reuniões tiveram a presença de quatro pesquisadores: a) dois moderadores, sendo um deles a moderadora principal e autora desta tese e o outro a colaboradora desta pesquisa; b) uma observadora, que é a orientadora desta pesquisa e c) um auxiliar da pesquisa.

Antes do início de cada sessão, a moderadora principal entregou o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) – (Apêndice A), em Braille, aos participantes, com sua assinatura em tinta em todos os exemplares. Em seguida, esse termo foi lido e a pesquisadora esclareceu aos participantes os procedimentos que seriam realizados durante a pesquisa. Todos participantes assinaram uma cópia do TCLE impressa em tinta, a qual ficou de posse do pesquisador.

Em seguida, ambos os moderadores deram início à reunião, lançando questões geradoras relacionadas à imagem corporal de pessoas com cegueira congênita ou precoce. Essas questões foram previamente planejadas e estavam descritas no “guia do moderador” – uma orientação escrita, elaborada para orientar e estimular a discussão, que deve ter uso flexível, de modo que o pesquisador possa fazer abordagem de tópicos não previstos no guia (GATTI, 2005; GREENBAUM, 1998).

Os moderadores procuraram ouvir como se nada soubessem, fazendo mínimas interrupções, com o máximo de atenção e envolvimento. Ao mesmo tempo, preocuparam-se em proporcionar intervenções que facilitassem as trocas de opiniões, tendo sempre como foco o encaminhamento do tema de acordo com o objetivo da pesquisa (O’DAY, KILLEEN, IEZZONI, 2004).

Os participantes de ambos os grupos discutiram, concordaram, discordaram e colocaram seus pensamentos, sentimentos e opiniões em diferentes caminhos. O observador registrou diferentes comportamentos de interação e atitudes dos participantes. Essas informações foram utilizadas para posterior análise.

4.1.1.4 Análise dos resultados

Na análise do grupo focal, o pesquisador deve traçar inferências, novas ideias, pontos convergentes e divergentes da discussão (LONG, 1995). Neste estudo, as gravações de áudio e vídeo referentes aos dois grupos focais realizados foram transcritas na íntegra e essa transcrição, junto com os apontamentos realizados pelo observador, foram utilizadas para análise.

A técnica de Análise de Conteúdo proposta por Bardin (1977) foi utilizada para analisar os dados dos grupos focais. Todas as três etapas da análise proposta pela autora, que constam de a) pré-análise, b) exploração do material, e c) tratamento dos resultados, inferência e interpretação, foram rigorosamente seguidas. O material da transcrição foi lido exaustivamente dando origem a categorias, configurando, portanto, a análise de conteúdo categórica. As categorias foram agrupadas conforme temas que guardavam semelhança entre si, configurando, desse modo, a técnica de análise de conteúdo temática.

Há de se destacar que a técnica de análise de conteúdo tem sido comumente utilizada para analisar dados de grupos focais por diferentes autores, tais como: Lervolino e Pelicioni (2001), Coyne et al. (2004), Detmar, et al. (2006), Carignan et al. (2008) e Collier e Scott (2010).

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