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CAPÍTULO 2- CONCEITOS E METODOLOGIAS DE ANÁLISE

1. M OVIMENTOS DE VERTENTE

Os movimentos de massa em vertentes são processos naturais que ocorrem com alguma frequência em Portugal, cujos danos materiais em infra-estruturas e edificações são normalmente avultados. Por serem fenómenos muitas vezes rápidos e inesperados, surpreendem as populações e os danos vão para além dos custos materiais, podendo causar também vítimas mortais.

Um dos objectivos desta dissertação é a aplicação de uma metodologia para a identificação dos locais de maior susceptibilidade física à ocorrência de movimentos de massa em vertentes, que garanta um conhecimento mais aprofundado destes perigos e que sirva de suporte às decisões no âmbito do ordenamento do território ao nível da minimização dos seus impactos no futuro, evitando o aumento da pressão sobre vertentes já de si instabilizadas ou pré-dispostas à instabilidade.

Os movimentos de vertente têm sido largamente estudados ao nível nacional e internacional. Varnes (1978) é uma referência na literatura pela tentativa de definir os movimentos de massa e diferenciar as suas tipologias, começando desde logo por questionar a utilização algo redutora do termo anglo-saxónico landslide que na literatura produzida na Grã-Bretanha não inclui movimentos de massa em vertentes que não ocorrem por deslizamento, preferindo por isso o termo slope movement. Cruden (1991) e a Working Party on World Landslide Inventory (1993) apresentam as definições dos conceitos internacionalmente aceites na actualidade. O termo landslide (movimento de vertente) foi definido por Cruden (1991) como “o movimento de descida numa vertente de uma massa de rocha, terra ou detritos”.

1.1. T

IPOLOGIA DOS MOVIMENTOS

A classificação dos movimentos de vertente mais utilizada no mundo é atribuída a Varnes (1978) e foi mais tarde adaptada pelo Working Party on World Landslide

Inventory (1993). Cruden e Varnes (1996) apresentaram a sistematização desta

classificação. Os movimentos são então classificados em 5 grupos, definidos de acordo com os mecanismos envolvidos: desabamento, balançamento, deslizamento, expansão lateral e escoada.

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30 Na área em estudo, foram apenas identificados deslizamentos, por isso será importante esclarecer o seu mecanismo. O deslizamento é um movimento de solo ou rocha que ocorre dominantemente ao longo de planos de ruptura ou de zonas relativamente estreitas, alvo de intensa deformação tangencial (WP/WLI, 1993). A massa deslocada durante o movimento permanece em contacto com o material subjacente, não afectado. De acordo com o mecanismo do plano de rotura, os deslizamentos são divididos em rotacionais e translacionais.

Os deslizamentos rotacionais resultam do movimento ao longo de superfícies curvas ou côncavas (Varnes, 1978; Cruden e Varnes, 1996). A superfície de rotura é circular e envolve uma rotação, de que resulta um abatimento no sector montante do deslizamento e um levantamento do sector frontal (Figura 2.1), ocorrendo a acumulação de água e um aumento da vegetação invasora na área deprimida. O material no interior do deslizamento pode sofrer deformações limitadas, havendo uma cicatriz na parte superior do movimento.

Nos deslizamentos translacionais (Figura 2.1), o material desloca-se ao longo de uma superfície de rotura planar ou compósita (curva-planar ou planar-planar) (Varnes, 1978; Cruden e Varnes, 1996). Enquanto a rotação de uma massa num deslizamento rotacional tende a recuperar o equilíbrio, num deslizamento translacional, o movimento tende a continuar. Os deslizamentos translacionais ocorrem frequentemente ao longo de superfícies de fraqueza como falhas, planos de estratificação, diaclases ou no contacto entre uma cobertura detrítica e o substrato rochoso (Varnes, 1978; Cruden e Varnes, 1996; Zêzere, 2005).

Deslizamento rotacional Deslizamento translacional

1.2. F

ACTORES CONDICIONANTES E FACTORES DESENCADEANTES DA INSTABILIDADE

Os movimentos de vertente estão normalmente associados a regiões montanhosas e vertentes com fortes declives, no entanto, a sua análise mais profunda revela normalmente uma frequência de ocorrências assinalável em declives mais suaves. Os movimentos resultam de uma rotura provocada pela alteração do equilíbrio entre as forças de resistência e as forças tangenciais (Zêzere, 2005); a estabilidade da vertente mantém-se enquanto as forças de resistência forem superiores às forças tangenciais e o início do movimento ocorre quando as forças tangenciais se tornam equivalentes ou superiores às forças de resistência.

Os processos que originam os movimentos de vertente foram divididos por Popescu (1994) em factores preparatórios e factores desencadeantes. Adaptando a ideia anterior, Glade e Crozier (2005), propuseram uma nova divisão em factores preparatórios, de predisposição e desencadeantes (Figura 2.2). Normalmente, o factor final não é mais do que um mecanismo desencadeante (triggering factor) que coloca em movimento uma massa que já se encontrava no limiar de rotura (Zêzere, 2005).

Figura 2.2 - Os factores que dão origem aos movimentos de vertente (extraído de Zêzere, 2005)

Os factores de predisposição são estáticos e inerentes ao terreno; são os factores que determinam a maior ou menor susceptibilidade de uma vertente à ocorrência de movimentos de massa (Zêzere, 2005). Os factores de predisposição mais importantes são a litologia, a estrutura geológica, a morfologia e morfometria das vertentes e o coberto vegetal. Os factores de predisposição são dinâmicos, promovem o decréscimo da margem de estabilidade, sem no entanto iniciarem o movimento (Zêzere, 2005). A precipitação continuada pode levar ao aumento do peso tangencial, podendo provocar

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32 o movimento apenas ao fim de várias semanas ou meses. A escavação de um talude pode instabilizar a vertente, reduzindo as forças de resistência, sem no entanto provocar o movimento de massa no imediato. Finalmente, os factores desencadeantes são a causa imediata da instabilidade e provocam a ocorrência do movimento (Zêzere, 2005); a precipitação, a fusão da neve e gelo, a variação da posição das toalhas freáticas, as erupções vulcânicas e os sismos são os factores desencadeantes de movimentos de massa, mais habituais.

A precipitação pode ser simultaneamente um factor de preparação e um factor desencadeante, no entanto é difícil determinar de forma exacta qual a precipitação que causou o movimento. As vertentes estão preparadas para resistir ao aumento da água no interior do solo, até certo ponto, a partir do qual se dá a rotura. Uma precipitação intensa e concentrada pode desencadear no imediato uma rotura no estado de estabilidade da vertente e precipitações continuadas e prolongadas podem conduzir a vertente a uma estabilidade marginal, entrando em rotura apenas ao final de semanas ou meses.

Zêzere et al (1999) destacam 3 tipos de eventos com diferentes consequências no desencadear da instabilidade na Região de Lisboa: os episódios de intensidade moderada que provocam pequenos movimentos relacionados com a erosão das margens dos rios e com a instabilidade de taludes artificiais; episódios de elevada intensidade que provocam grande número de deslizamentos de terras, geralmente superficiais e os episódios longos de precipitação abundante que provocam os movimentos de vertente mais profundos (deslizamentos translacionais, rotacionais e complexos).

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