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CAPÍTULO 2- CONCEITOS E METODOLOGIAS DE ANÁLISE

3. M ODELO CONCEPTUAL DE RISCO

3.1. S USCEPTIBILIDADE

A susceptibilidade é a probabilidade espacial de ocorrência de um determinado fenómeno danoso sujeito a determinadas condicionantes do território e independentemente do seu período de retorno (Garcia e Zêzere, 2003). Adaptado o termo ao presente trabalho, poderá dizer-se que a susceptibilidade permite avaliar a probabilidade de cada unidade de terreno sofrer um movimento de vertente ou de cada unidade de terreno ser submerso por uma cheia, sem precisar a frequência desse fenómeno.

3.1.1. Métodos de análise da susceptibilidade geomorfológica

A avaliação da susceptibilidade geomorfológica assenta em quatro princípios fundamentais, enumerados por Varnes e IAEG (1984) e adaptados por Carrara et al (1991), Guzzetti et al (1999) e Zêzere (2005):

a) O passado e o presente são as chaves para o futuro (Uniformitarismo).

Este princípio básico da geologia está directamente subjacente à análise da susceptibilidade à ocorrência de movimentos de vertente, na medida em que se

assume que existe uma maior probabilidade de ocorrência de movimentos no futuro, nas áreas que apresentam as mesmas características geológicas, geomorfológicas e hidrológicas das vertentes anteriormente instabilizadas (Varnes e IAEG, 1984).

b) As condições que causam os movimentos de vertente podem ser identificadas.

Os movimentos são controlados por factores físicos possíveis de identificar que podem ser classificados e cruzados para elaborar modelos de previsão de ocorrências no futuro (Varnes e IAEG, 1984; Zêzere, 2005).

c) O grau de perigo pode ser apurado.

Através do cruzamento dos factores que desencadeiam movimentos é possível efectuar um zonamento do território em classes de susceptibilidade ou perigosidade (Varnes e IAEG, 1984; Zêzere, 2005).

d) Todos os tipos de movimentos podem ser reconhecidos, classificados e cartografados.

As roturas nas vertentes provocadas pela ocorrência de um movimento de massa deixam marcas (e.g. cicatrizes, topografia ondulada) que podem ser reconhecidas no campo ou através da observação de fotografias aéreas (Guzzetti et al, 1999; Zêzere, 2005).

O zonamento da susceptibilidade segue a aplicação destes quatro princípios e assenta no desenvolvimento do trabalho em 3 etapas:

1ª etapa - elaboração de um inventário dos processos de instabilidade já verificados, ou seja, o levantamento cartográfico dos movimentos existentes no território; este inventário será a base para aplicação das técnicas de avaliação da susceptibilidade (Soeters e Van Westen, 1996).

2ª etapa - identificação dos factores de predisposição responsáveis pelo aparecimento e aceleração dos movimentos (Zêzere, 2005).

3ª etapa - interpretação da importância de cada um dos factores com recurso a modelos de relação espacial, directa e indirecta (Zêzere, 2005).

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38 Soeters e Van Westen (1996) diferenciam duas metodologias para a avaliação da susceptibilidade: os métodos directos e os métodos indirectos. A cartografia directa baseia-se no princípio da observação e da comparação entre as ocorrências e os factores de predisposição através de cartografia de apoio. É uma metodologia que assenta no conhecimento e experiência do geomorfólogo e, por isso, fortemente subjectiva. Os métodos indirectos pressupõem a cartografia de várias variáveis que potencialmente condicionam os movimentos de vertente e a análise do seu contributo para o desenvolvimento dos processos de instabilidade. Os métodos indirectos podem usar técnicas heurísticas, determinísticas e estatísticas (Soeters e Van Westen, 1996; Guzzetti et al, 1999; Zêzere, 2005).

O método indirecto heurístico consiste na atribuição de pesos (scores) a cada variável tida como condicionante da instabilidade em vertentes e resulta na soma ou multiplicação das variáveis com recurso à álgebra matricial, com a posterior divisão em classes. A atribuição de pesos depende directamente da experiência e conhecimento do geomorfólogo (Soeters e Van Westen, 1996).

O método indirecto determinístico apenas pode ser aplicado em áreas geológica e geomorfologicamente homogéneas e com movimentos de vertente simples. Estes métodos baseiam-se em leis físicas e mecânicas, como a conservação da massa e energia ou o equilíbrio das forças (Zêzere, 2005).

O método indirecto estatístico baseia-se no pressuposto que os factores que desencadearam a instabilidade no passado são os mesmos que irão desencadear a instabilidade no futuro. Estes factores são relacionados com o mapa de inventário das ocorrências através de uma função paramétrica empírica, que possibilita a previsão da susceptibilidade das áreas ainda não instabilizadas. Os métodos estatísticos podem utilizar análises bivariadas ou multivariadas. A grande vantagem destes métodos é a não subjectividade do modelo e a possibilidade de relacionar de forma matemática o inventário de ocorrências e os factores de instabilidade. Um dos métodos estatísticos com melhores resultados comprovados é o Método do Valor Informativo aplicado, por exemplo, por Yin e Yan, 1988 e Zêzere, 2002

3.1.2. Métodos de análise da susceptibilidade hidrográfica

A análise das cheias e das suas consequências, requer a utilização de mapas de susceptibilidade, conforme identificado por Martini e Loat (2007) no Handbook on good

2007/60/CE, cujo artigo 6º refere que os Estados-Membros devem elaborar cartas de zonas inundáveis (i.e. mapas de susceptibilidade) e cartas de risco de inundação. Conforme referido por Martini e Loat (2007) os mapas de susceptibilidade à ocorrência de cheias são a base das políticas de ordenamento e protecção civil, tendo em conta os seguintes princípios:

− Prevenção de futuras construções em áreas susceptíveis, procurando áreas seguras e novas formas de construção;

− Redução dos riscos existentes através de medidas preventivas (construção de diques ou implementação de sistemas de alerta);

− Adaptação às mudanças que poderão advir das alterações climáticas.

A análise da susceptibilidade à ocorrência de cheias e mais concretamente a delimitação de zonas inundáveis deve ter por base três técnicas apontadas por Diez- Herrero et al (2008) e adaptadas também por Rodrigues (2010) e que podem ser resumidas da seguinte forma:

− Observação de registos históricos e paleohidrológicos; − Critérios geológicos, geomorfológicos e pedológicos; − Modelação hidrológica e hidráulica.

A observação de registos históricos e paleohidrológicos pressupõe a identificação nas planícies aluviais de níveis atingidos por cheias no passado (ICOLD, 1992), o que requer o contacto com as populações residentes e um estudo sobre as marcas deixadas pela subida da água dos rios ou ainda marcas em pontes e edifícios. Este método pode recorrer também a registos fotográficos ou notícias de jornais, sempre que esta informação se encontre disponível.

A utilização de critérios geológicos e pedológicos sustenta-se na utilização de cartografia de base que permita identificar o tipo de terreno existente nas áreas adjacentes aos cursos de água, como por exemplo, a existência de aluviões ou a existência de aluviossolos modernos (referentes à Carta de Solos) transportados e depositados pelo escoamento fluvial. Estes critérios devem ser conjugados com a análise geomorfológica do vale fluvial, nomeadamente no que se refere às variações do declive, já que as áreas mais planas e deprimidas são mais facilmente inundáveis, à identificação de pequenos taludes deixados pela erosão provocada pelo rio nas margens do seu leito de inundação, ou ainda a existência de terraços fluviais (ICOLD,

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40 1992). As variações na ocupação do solo são também importantes indícios na delimitação de áreas inundáveis, já que existem espécies que não suportam ambientes encharcados, como por exemplo os pinheiros e eucaliptos.

Os métodos hidrológicos e hidráulicos baseiam-se em modelos estatísticos de cálculo de parâmetros de caudal, níveis hidrométricos e precipitação, simulando a propagação da onda de cheia através de river flood routing, ou seja, através de um modelo matemático unidimensional (1D) ou, com melhores resultados ainda, a simulação num modelo bidimensional (2D) através de ferramentas como o Mike1, Telemac, HEC-RAS e FLO-2D (Martini e Loat, 2007). Este tipo de metodologia permite determinar o nível da inundação, a sua extensão, a altura da coluna de água, a sua duração e a distribuição da sua velocidade (Martini e Loat, 2007). Os níveis de caudal e de altura de água são normalmente cruzados com um Modelo Digital do Terreno, que permite a transposição para 3D das áreas inundáveis.

No âmbito da avaliação da susceptibilidade à ocorrência de cheias, Reis (2009, não publicado) desenvolveu um modelo baseado nos principais factores geomorfológicos que condicionam a ocorrência de cheias e que permite a sua aplicação a pequenas bacias hidrográficas que não dispõem de dados hidrométricos consistentes como é o caso da área abrangida pelo concelho da Batalha, sendo por isso um modelo válido a adoptar no presente trabalho e que será complementado com observação de registos históricos e critérios geológicos, geomorfológicos, pedológicos e de ocupação do solo.

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