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m uTAções c romáTicAs

No documento Introdução à teoria da cor (páginas 105-113)

Por mutações cromáticas englobamos todas essas manifestações das cores fisiológicas, que acontecem devido aos contrastes simultâneos, sucessivos ou mistos, ou seja, fenômenos onde fisiologicamente há alterações das cores (induzidas) na presença de outras (indutoras).

Apesar das várias críticas a respeito de seus experimentos ópticos, as conclusões de Newton a respeito das cores não sofreram grandes alterações. A partir dessas conclusões, sabe-se que a reflexão de certos raios luminosos pode atingir o seu máximo, isto é, o objeto colorido pode atingir o seu pico de saturação. Quando isso acontece, a retina também é sensibilizada no seu máximo, exaltando as cores complementares que estavam submersas na periferia do objeto.

Essas cores complementares fazem parte dos fenômenos que são, na sua essência, opostos à cor indutora (cor de contraste, mutação cromática e cor inexistente, chamadas cores induzidas) e aparecem constantemente na natureza. Raramente os percebemos porque nossos olhos estão constantemente submetidos à função reguladora e interpretadora do cérebro.

Por todas essas sutilezas, as cores indutoras são difíceis de se mensurar. Alguns métodos estão sendo elaborados para que se consigam algumas medidas. Um destes métodos é o da comparação óptica da cor induzida com uma cor-pigmento classificada num sólido de cor. Assim que a compara- ção é dada como satisfatória, a cor-pigmento é medida por um colorímetro, que mostra os números que descrevem o matiz, o valor e o croma da cor induzida (parâmetros de Munsell).

As variáveis pelas quais se mantêm certo controle sobre o fenômeno da cor induzida são: a qualidade, a quantidade, a forma e o posicionamento das áreas coloridas (PEDROSA, 1982). A variável qualidade diz respeito às várias combinações possíveis dos parâmetros descritos por Munsell: matiz, valor e croma. Esta variável amplia sensivelmente a possibilidade do aparecimento de milhares de cores induzidas, pois a combinação de todos os matizes, seus valores e a variação de croma chega a um grande número de tons. Das variáveis, a qualidade é a mais importante, por ser a responsável pela fundamentação de todos os acordes harmônicos.

Apesar de secundária, a variável quantidade (ou extensão) também tem sua função no todo da harmonia cromática. Podemos alterar significativamente uma determinada harmonia, alterando o tamanho de um de seus elementos cromáticos, como se pode ver na Figura 3.13.

Figura 3.13 – A dimensão dos círculos brancos e a quantidade de azul que os envolve induzem a diferentes tonalidades.

Por outro lado, a variável forma tem grande importância como recipiente da cor na satu- ração da retina. Nos contrastes sucessivo e misto observamos que as cores induzidas carregam também as suas formas e, além disso, a periferia da forma potencializa as cores de contraste, como mostra a Figura 3.14.

A variável posicionamento altera a estrutura das cores, seja qual for sua escala. Mesmo sendo mantidas as outras variáveis, como a qualidade, por exemplo, modifi cando-se o posicio- namento, sempre haverá alteração na visão cromática da imagem.

Figura 3.14 – Inclusão de nova forma gerando mais cores indutoras.

Na Figura 3.15 vê-se um vermelho que, seccionando uma faixa de azul-violetado situado entre duas faixas de amarelo, transforma-se em laranja e ganha luminosidade. O mesmo verme- lho, portando uma faixa amarela que se situa entre duas faixas azuis-violetadas, transforma-se em magenta, perdendo luminosidade. E assim acontece também com as outras cores que compõem a mesma fi gura.

Para efeitos estéticos das mutações cromáticas com resultados extremamente belos, reco- menda-se pensar na indução de várias cores simultaneamente.

Figura 3.15 – Mutação cromática à pequena distância.

As imagens chamadas “incolores” também podem produzir a mutação cromática a partir do branco, do preto e dos cinzas, através da alteração das mesmas variáveis: qualidade, quantidade, forma e posicionamento, como mostra a Figura 3.16.

Figura 3.16 – Três fai- xas do mesmo cinza produzem diferentes tons dentro de uma escala de valores.

cor inexisTenTe

Apesar de se enquadrar no grupo dos fenômenos manifestados a partir das cores induzidas, a cor inexistente surge nas áreas ainda chamadas “incolores”, ou seja, em anteparos brancos, pretos ou cinzas.

Israel Pedrosa, pesquisador da cor inexistente, cunhou esta denominação ao fenômeno. Ele também afirmou, como parte de suas pesquisas, que a cor inexistente é um fenômeno que pode ser captado por qualquer tipo de máquina fotográfica e ser impresso até em filmes em preto e branco (PEDROSA, 1982).

Apesar de ser classificada dentro das cores fisiológicas ilusórias, a cor inexistente é um fenômeno que se baseia em uma situação objetiva, ou seja, a coloração que surge nos corpos chamados “incolores” (brancos, pretos e cinzas). Esta coloração é o resultado da percepção visual de resíduos de raios luminosos incidentes apenas parcialmente refletidos. Por isso, podem ser captados por uma máquina fotográfica, mesmo em filmes em preto e branco.

Como já foi visto, as radiações ditas monocromáticas primárias provenientes das cores- -pigmento são compostas pelos três elementos RGB (vermelho, verde e azul). Isto é, o raio de luz oriundo do objeto é sempre composto pelos três elementos e não por apenas um deles.

Na prática, não existem corpos que absorvam ou reflitam a totalidade dos raios luminosos incidentes, ou seja, os brancos e os pretos absolutos só existem na teoria. Realmente as super- fícies brancas refletem quase totalmente os raios luminosos, mas assim como as superfícies vermelhas, verdes ou azuis, elas absorvem também uma pequena quantidade das cores contidas na luz incidente.

A cor inexistente é resultado desta pequena quantidade de raios refletidos a partir de alguns raios absorvidos pela superfície branca. Nas superfícies pretas e cinzas o fenômeno também acon- tece pelo mesmo motivo.

As superfícies pretas não são capazes de absorver, na prática, todos os raios da luz incidente, deixando escapar uma pequena quantidade de raios refletidos, assim como as superfícies cinzas.

A partir dessa base objetiva, podemos ter a presença do fenômeno da cor inexistente nas superfícies brancas, pretas e cinzas em duas situações: considerando-as isoladamente ou em com- posição com outras cores.

Na primeira situação, considerando superfícies brancas, pretas e cinzas sem interferência física de outra cor indutora, temos esta coloração vinda a partir da absorção e reflexão parciais da luz incidente. Extrapolando esta coloração e imaginando haver certa saturação retiniana, podemos concluir que cores complementares surgirão em toda a superfície por contraste simultâneo, sucessivo e misto, formando um caleidoscópio. Exemplos desta situação são as superfícies brancas, pretas ou cinzas. Na Figura 3.17 vemos um desses exemplos.

Também encontramos este fenômeno em telas famosas como “Branco sobre Branco” de Kiev Kasimir Malevich (Suprematist Composition - White on White, óleo sobre tela, 1918), que se encontra hoje no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (MOMA), ou nas fotografias em preto e branco (SILVEIRA, 2002).

Figura 3.19 – Superfície branca e preta.

Já na segunda situação, considerando as superfícies brancas, pretas e cinzas em composição com outras cores (cores indutoras), nos deparamos com a essência do conceito de cor inexistente para Pedrosa (1982). Para ele, o fenômeno não necessita da saturação da retina para se mostrar

plenamente. Por isso mesmo, ela não pode se enquadrar no grupo das imagens posteriores pro- priamente ditas.

Segundo Pedrosa (1982), Chevreul pesquisou a infl uência de fundos brancos em composição com outras cores, chegando à conclusão de que sempre apareciam as cores complementares às cores indutoras nos fundos brancos, como mostra a Figura 3.18.

Figura 3.18 – Sequência de círculos azuis em fundo branco.

Esta conclusão de Chevreul dependia diretamente de duas coisas: a presença de uma cor indutora em um fundo branco e a saturação retiniana.

Pedrosa vai além de Chevreul em suas pesquisas, chegando a refutá-lo nesta questão. Para ele, o que evidencia a cor inexistente é a eliminação da necessidade de saturação retiniana para a percepção do fenômeno (PEDROSA,1982).

Toda esta discussão reforça a ideia de que as cores não aparecem isoladamente, como Edwin Land provou no experimento das transparências com imagens fotográficas, mas sim por compa- ração ou diferença entre elas. Mesmo supondo um caso extremo da observação de uma cor sem aparente interferência de outras cores indutoras, essa comparação existiria no nível psicológico.

Novamente, isso nos leva a crer que qualquer explicação simplista da visão cromática está condenada ao fracasso. A cor depende não só dos comprimentos de onda, de estímulos e das intensidades, mas também de diferenças de intensidade entre regiões e de padrões aceitos como representativos de objetos.

Atualmente, principalmente os físicos estudam as faixas monocromáticas do espectro, com a finalidade de descobrir de onde aparecem as mutações cromáticas, os contrastes simultâneos e a cor inexistente.

Mergulhando dentro de cada cor, a física, utilizando o gráfico triestímulo do CIE, descobriu que as ideias de Newton sobre a unicidade de cada raio monocromático não são tão verdadeiras, mas que existem em todas as faixas do espectro porcentagens diferentes de vermelho, verde e azul, mostrando que a homogeneidade atribuída a uma cor vem da maior quantidade de determinado matiz e não da sua suposta pureza.

Isto nos sugere que, na verdade, o que percebemos de cada cor é uma reunião dos elementos estruturais de todas as demais cores da natureza. Esta descoberta vem reforçar a necessidade dos estudos das leis dos contrastes simultâneos das cores, das mutações cromáticas e da cor inexistente, onde se verificam as ações recíprocas que as cores exercem umas sobre as outras.

As cores estão no mundo não apenas como sustenta a física: um correlato automático do comprimento de onda baseado em um observador padrão. Nem tampouco como sustenta a fisio- logia: apenas a relação olho – cérebro. Elas são construídas em conjunto com a trajetória cultural e simbólica, como veremos a seguir, nos aspectos culturais da percepção cromática.

No documento Introdução à teoria da cor (páginas 105-113)