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1.6 Bem-Estar no Trabalho (BET) e Mal-Estar no Trabalho (MET) definições e abordagens

1.6.5 Mal-Estar no Trabalho

Este é o último construto apresentado nesta pesquisa, porém, é um dos mais importantes de serem pesquisados, e sua importância reside na escassez de literatura sobre o tema, havendo poucas pesquisas com arcabouço teórico, o que aumenta a responsabilidade de aprofundar os conceitos encontrados até o momento.

A princípio, poderia se imaginar que o construto Mal-Estar no Trabalho seria somente a ausência de Bem-Estar no Trabalho, não havendo necessidade de abordar uma base teórica ou mesmo desenvolver o assunto. Se assim fosse, MET seria simplesmente a ausência de BET, mas, da mesma forma como vimos em Bradburn (1969) sobre afeto positivo e afeto negativo não serem polos opostos de um mesmo contínuo, o que faz com que seja necessário pesquisar os dois construtos separadamente com escalas desenvolvidas para cada um especificamente. O mesmo ocorre com BET e MET, pois é perfeitamente possível um trabalhador encontrar fontes de BET em seu trabalho, como bons relacionamentos, autorrealização, reconhecimento social, oportunidade de desenvolvimento pessoal e profissional e fazer o que gosta e, ao mesmo tempo, o mesmo trabalhador vivenciar no mesmo emprego, fontes de mal-estar como sobrecarga de trabalho, assédio moral ou desconforto físico.

Portanto, Mal-Estar no Trabalho deve ser pesquisado tanto quanto Bem-Estar no Trabalho. Relembrando a introdução e o título da dissertação, em uma mesma organização um trabalhador pode experimentar “céu”, “inferno” ou purgatório, havendo desta forma uma zona

de transição entre BET e MET, ou mesmo a concomitância dos dois construtos para um único indivíduo.

Esta afirmação, aparentemente difere da apresentada por Ferreira e Seidl (2009), que apontava BET e MET como “faces da mesma moeda”, mas não há discordância, pelo contrário, é necessário reconhecer que são assuntos ligados intimamente, mas que, ainda assim devem ser mensurados em separado.

Fato é que na literatura acadêmica há uma profusão de pesquisas e linhas teóricas sobre BET, mas quando se trata de MET, a produção teórica é residual, conforme se verificou no levantamento bibliográfico apresentado nesta dissertação em tópicos anteriores, e também conforme relata Ferreira e Seidl (2009); Diniz (2002) e Veras (2006). Logo, a opção restante é procurar compreender MET com base, principalmente, na produção bibliográfica sobre bem- estar que, com certos riscos interpretativos, se torna possível delinear as características do mal- estar no trabalho, concordando assim com Ferreira e Seidl (2009).

A definição adotada nesta pesquisa, portanto, será a de Ferreira (2016):

Mal-estar no trabalho é um sentimento desagradável que se origina das situações vivenciadas pelos indivíduos na execução das tarefas. A manifestação individual ou coletiva do mal-estar no trabalho se caracteriza pela vivência de sentimentos isolados ou associados, que ocorrem, com maior frequência nas seguintes modalidades: aborrecimento, antipatia, aversão, constrangimento, contrariedade, decepção, desânimo, desconforto, descontentamento, desrespeito, embaraço, incômodo, indisposição, menosprezo, ofensa, perturbação, repulsa e tédio. A vivência duradoura deste sentimento pelos trabalhadores constitui um fator de risco para a saúde nas situações de trabalho e indica a ausência de QVT. Ferreira, (2016, p.178).

Tabela 1.10 Elementos Constitutivos do Construto “Mal-Estar no Trabalho”

O que é Origem Manifestação Característica Modalidades mais comuns (n=13)

Emoções, humores Situações de trabalho Individual ou Coletiva Presença de emoções / humores isolados ou associados de ... Irritado Deprimido Entediado Chateado Impaciente Preocupado Ansioso Preocupado Ansioso Frustrado Incomodado Nervoso Tenso Com raiva Com medo Fonte: Ferreira, 2016.

Para expor de forma mais clara e didática, a Tabela 1.10 apresenta um resumo sobre o construto MET.

Com o fim de prevenir o mal-uso do conceito aqui apresentado na abordagem EAA_QVT, se faz prudente ressaltar certos aspectos que delimitam o conceito de mal-estar no trabalho, conforme o próprio autor alerta em Ferreira (2016), quando aponta 6 aspectos marcantes deste construto na abordagem de QVT:

a) Mal-Estar no trabalho sofre influências de fatores individuais (como o estado de saúde, características pessoais e profissionais), organizacionais (cultura organizacional, modelo de gestão organizacional e do trabalho, condições, organização e relações socioprofissionais de trabalho) e situacionais (variabilidade, diversidade, dinâmica, imprevisibilidade de eventos que interferem na atividade de trabalho).

b) Mal-estar no trabalho é um objeto de natureza eminentemente humana, que se origina das contradições vivenciadas pelos indivíduos nas situações de trabalho; portanto, não tem sentido, nesta abordagem, falar em “mal-estar organizacional” ou “mal-estar das organizações” e outras variantes.

c) Mal-estar no trabalho não é uma doença, ou enfermidade ocupacional que acomete os indivíduos, mas é um risco ou uma possibilidade inerente ao processo adaptativo que caracteriza as interações dos indivíduos vis-à-vis dos ambientes de trabalho.

d) A manifestação duradoura de mal-estar delineia um cenário resultante de ausência de QVT e, desta forma, aumenta o risco de ocorrência de diversos indicadores críticos que repercutem negativamente sobre os indivíduos, o funcionamento das organizações e a sociedade.

e) O diagnóstico aprofundado de mal-estar no trabalho deve combinar tanto a análise macro-organizacional (normalmente utilizando instrumentos de pesquisa quantitativos) quanto micro-organizacional (normalmente utilizando instrumentos de pesquisa qualitativos), sendo que, neste caso, a avaliação das atividades dos sujeitos em situações de trabalho ocupa lugar central na análise. f) As manifestações verbais e escritas dos indivíduos e / ou do coletivo são duas das principais formas pelas quais se pode obter acesso aos dados empíricos do mal-estar no trabalho.

Não se pode deixar de considerar ainda certas características sobre as representações escritas que foram obtidas na pesquisa quando da aplicação do Inventário de Avaliação de QVT (IA_QVT). O conteúdo das representações de bem-estar e mal-estar no trabalho que integram o modelo, referem-se às consequências individuais e coletivas do Custo Humano do Trabalho (CHT), isto é, como os indivíduos e a organização têm conseguido lidar com o desafio de administrar o custo cognitivo, o custo físico e o custo afetivo (quem compõem o CHT), por meio de estratégias de mediação (por exemplo, macetes de cada operador para realizar uma tarefa). Caso estas estratégias sejam bem-sucedidas, os trabalhadores experimentam superação adequada do CHT e alcançam bem-estar no trabalho, porém, caso

estas estratégias falhem em superar os desafios do dia a dia e não deem conta do CHT, os trabalhadores experimentam mal-estar no trabalho. Tudo ocorre de forma muito dinâmica, posto que inúmeras variáveis influenciam o contexto de trabalho.