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4 Organização e cognição

4.2 Mapas Cognitivos

O conceito de mapa cognitivo surge a partir do momento em que se torna necessário entender as representações físicas utilizadas por atores sociais na medida em que os mesmos interpretam e explicitam sua realidade através da utilização de símbolos que a representam. Trata-se da utilização de símbolos culturais, sociais e lingüísticos que representam o mundo interpretado por cada indivíduo a partir das suas experiências pregressas e das suas expectativas.

A representação da realidade vivenciada a partir da elaboração de um mapa cognitivo jamais será isenta de valores pessoais, uma vez que o processo de interpretação decorre necessariamente da percepção sensorial do ambiente no qual encontra-se o indivíduo. Tal percepção sofre influências de fatores físicos (problemas de formação orgânica ou desvios funcionais dos órgãos responsáveis pelos sentidos humanos) e sociais (estereótipos e preconceitos), quer estejam eles localizados exclusivamente no domínio do indivíduo ou compartilhado no seu ambiente social. O resultado deste processo de percepção cognitiva será um painel interpretativo da realidade, cujas características estarão alinhadas às crenças e valores de quem a interpreta. Como afirma Bastos (2002, 4):

...Neste sentido, como uma representação ou modelo da realidade, os mapas cognitivos envolvem sempre uma simplificação e fornecem uma imagem aproximada da realidade (...) são representações, schemas ou modelos mentais construídos pelos indivíduos a partir das suas interações e aprendizagens em um domínio específico do seu ambiente, e cumprem a função de dar sentido à realidade e permitir- lhe lidar com os problemas e desafios que esta lhe coloca.

No campo da teoria das organizações, o uso de mapas cognitivos pode ter diversas finalidades, uma vez que seu principal objetivo é fornecer a quem o interpreta informações relevantes sobre o processo cognitivo do(s) indivíduo(s) que está(ão) sendo analisado(s). Tais informações podem ser usadas para desenvolver estratégias de melhoria dos processos de relacionamento interno (endomarketing), as tomadas de decisões, as representações de dados, conceitos e percepções e toda e qualquer informação adicional que dependa de interpretações individuais para ser gerenc ialmente desenvolvida. A compreensão dos sentidos das representações de tais informações pode ajudar aos gestores na escolha do direcionamento correto das suas ações organizacionais, o que pode ocasionar melhoria na condução dos processos internos e otimização dos recursos utilizados. Trata-se, portanto, de uma ferramenta de auxílio à

melhoria dos processos de tomada de decisão a partir da interpretação de dados subjetivos e das suas representações.

É difícil estabelecer uma tipologia definitiva de mapas cognitivos, uma vez que podem existir interpretações distintas sobre as formas como estes instrumentos podem ser elaborados. Ainda que todas os tipos possuam objetivos semelhantes, a capacidade de análise de cada pesquisador pode desenvolver tipos e técnicas distintas de mapeamento cognitivo.

Este trabalho utiliza a tipologia desenvolvida por Fiol e Huff (Apud Bastos, 2002,10) em que são destacados três tipos de mapas utilizados nas pesquisas organizacionais: os mapas de identidade, os mapas de categorização e os mapas causais.

Os mapas de identidade são aqueles utilizados em análises de conteúdo, e desenvolvem-se no sentido de entender os conceitos utilizados pelos entrevistados. São mais descritivos, fotográficos, não empreendendo interferências analíticas por parte do pesquisador. Trabalham com a descoberta dos conceitos que formem a base dos processos cognitivos individuais, atuando em processos especificamente analíticos da linguagem humana.

Esses mapas têm o objetivo de entender as ações do indivíduo a partir da análise da sua linguagem, transformando aquilo que é dito em conceitos que possam explicar aquilo que é feito, uma vez que avaliam a atenção, a associação e a importância dos conceitos desenvolvidos ao longo da entrevista. Uma vez que seu objetivo é a descrição do terreno cognitivo onde se encontra o indivíduo, transforma-se em um mapa básico para todos os demais tipos de mapas.

Os mapas de categorização buscam entender como indivíduos organizam e estruturam seu conhecimento, a partir de um processo de vivência cumulativa que os obriga a classificar tais informações em categorias hierarquizadas. Tal hierarquia seguirá diferentes níveis de abstração, visto que os indivíduos utilizam diferentes dimensões cognitivas para criar agrupamentos de elementos, aproximando ou afastando conceitos que gerem maior ou menor grau de conforto e entendimento.

Esses mapas são mais comumente encontrados nos estudos sobre tomadas de decisões, uma vez que esta atividade envolve obrigatoriamente um ambiente no qua l os indivíduos encontram-se submetidos a uma realidade composta de diversas e distintas opções, e onde é necessário que sejam desenvolvidas linhas de hierarquia e categorização entre as opções de escolha existentes.

O último grupo de mapas cognitivos é formado pelos mapas causais, indicados por Bastos (2002, 10) como os mais largamente utilizados e difundidos nos estudos gerenciais. Trata-se da representação física dos fenômenos que influenciam as ações empreendidas pelos indivíduos nos seus ambientes de convivência, e que tenta criar vínculos causais entre conceitos e iniciativas, gerando uma lógica explicativa das ações organizacionais.

As técnicas de mapeamento causal partem da descrição de conceitos para a elaboração de relações causais. Através da descrição de objetivos, estratégias e opções preferenciais, pode-se criar modelos de causalidade entre conceitos descritos através da percepção cognitiva, estabelecendo laços de dependência entre idéias anteriormente apenas descritas e conhecidas.

Dessa forma, verifica-se que os mapas cognitivos são ferramentas de apoio à análise cognitiva de indivíduos e organizações, através do mapeamento dos seus conceitos básicos, da sua categorização e hierarquia de dados ou do estabelecimento de relações de causalidade.

Trata-se de uma estratégia metodológica de análise organizacional que pode levantar de forma mais precisa os conceitos que explicam as ações empreendidas pelos indivíduos a partir do entendimento dos sentidos das suas idéias, “... especialmente voltada para explicitar os processos de construção de sentido e a estruturação de conhecimento (schemas) que os guia, tanto entre indivíduos, como entre grupos e organizações.” (Bastos, 2002, 13-14).

A análise dos mapas cognitivos determina o fim do conjunto de informações que forma a base conceitual utilizada no desenvolvimento deste trabalho. Nos capítulos anteriores foram indicados alguns dos mais importantes componentes da linha histórica das principais teorias organizacionais e os aspectos mais significativos da Teoria da

Cognição Organizacional, principalmente no que se relaciona aos fatores de percepção e organização de informações.

Vale ressaltar que o objetivo desta pesquisa relacionava-se ao esclarecimento de três questões específicas: descrever os motivos que levaram à formação da Rede Bahia, indicar se a denominação rede devia-se a questões de natureza mercadológica ou estrutural (ou seja, se de fato esse conjunto de organizações possuía uma estrutura organizacional típica de organizações em rede) e verificar quais as percepções dos seus principais gestores sobre seu processo de formação, de acordo com o uso da técnica de mapeamento cognitivo.

A principal hipótese é a de que a Rede Bahia não se constituía de fato em uma organização em rede, uma vez que não possuía as características funcionais e estruturais típicas deste tipo de arranjo organizacional. O nome rede advinha do uso de uma nomenclatura tipicamente utilizada por empresas presentes no segmento de telecomunicações, não possuindo vínculos efetivos com o modelo de rede aqui adotado. Essa afirmação é importante, uma vez que as entrevistas realizadas com seus principais dirigentes poderiam indicar a existência de um elevado grau de diversidade e discordância de visões a respeito do conceito do processo de formação e do atual estágio da rede. De fato, a realização das entrevistas iria demonstrar (conforme será indicado posteriormente) divergências de visões e objetivos entre alguns destacados membros da organização, o que demonstra que o seu atual desenho organizacional é fruto de um intenso processo de interação interno que se desenvolveu ao longo dos últimos quatro anos e que se deu a partir da participação de todos os integrantes do grupo, ainda que, em muitos momentos, a rede tenha representado a estratégia e o desenho de grupos mais influentes. Tais informações serão apresentadas com maior grau de profundidade a partir do próximo capítulo, que discutirá a formação da Rede Bahia e as diferenças de visão de alguns dos seus principais dirigentes.