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Forr/Alim Deslocando Descansando Socializando Desconhecida

Atividades Porcentagem Alta Vazante Baixa Enchente

Figura 6. Freqüência (%) das atividades avistadas nos diferentes ciclos da maré sizígia.

Organização Social

O tamanho de grupo de botos na baía de Sepetiba variou de 2 a cerca de 280 animais (média=30,2; E.P.=3,43 botos). O tamanho médio de grupo foi significativamente maior no interior do que na entrada da baía (Mann-Whitney; U=2250; P<0,000; Figura

7a). As grandes agregações (grupos > 100 botos, n=16) foram observadas mais

freqüentemente no interior (n=10; 62,5%) do que na entrada da baía (n=6; 37,5%). Analisando as estações, não foram observadas diferenças significativas no tamanho de grupo entre inverno e verão (Mann-Whitney; U=5416; p<0,955; Figura 7b). O tamanho médio de grupo variou significativamente de acordo com a atividade predominante (Teste

deslocando (Figura 8). Esta diferença se torna marginalmente significativa, entretanto, quando a atividade “desconhecida” é removida da análise (Teste de Kruskal-Wallis; KW=7,578; g.l.=3; p=0,056). Não foi verificada diferença significativa na coesão dos indivíduos do grupo (próximo ou afastado) entre as categorias comportamentais analisadas (Chi-quadrado: χ2 =3,312; g.l.=4; p>0,500).

(a)

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 Entrada Interior Área de Estudo

(b)

0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 Inverno Verão Estações do Ano

Tamanho Médio do Grupo/Botos

Figura 7. Tamanho médio de grupo de botos em relação a: a) local (entrada e interior) e b) estações do ano (inverno e verão), com os respectivos erros padrões.

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Forr/Alim Deslocando Descansando Socializando Desconhecida Padrão de Atividades

Tamanho Médio do Grupo/Botos

Figura 8. Tamanho médio de grupo em relação às atividades exercidas pelos botos-cinza na área de estudo, com seus respectivos erros padrões.

Como há somente indícios esporádicos e não foi observada a presença de outras espécies de cetáceos pelos pesquisadores na área de estudo, as relações interespecíficas foram analisadas considerando somente as seguintes espécies de aves marinhas: atobá (Sula leucogaster), trinta-réis (Sterna sp.) e fragata (Fregata magnificens). Os grupos de botos com presença de aves marinhas (n=32) apresentaram um tamanho significativamente maior (média =58,9; E.P.=13,0 botos/grupo) do que os grupos sem presença de aves (n=178; média =25,0; E.P.=3,1 botos/grupo) (Mann-Whitney; U=1570; P<0,000). Entre as aves presentes, houve um maior número de associações com atobás (50,0%), seguida de trinta réis (15,6%), trinta réis/atobás (15,6%), fragatas (9,4%) e atobás/fragatas (9,4%). A

interação entre botos e aves só ocorreu quando os botos estavam exercendo a atividade de forrageamento/alimentação.

Apesar de neonatos terem sido avistados com maior freqüência no verão (n=31) do que no inverno (n=17) esta diferença não foi significativa, pois o número total de avistagens variou entre as estações, sendo maior no verão (n=117) do que no inverno (n=90) (Chi-quadrado: χ2 =1,253; g.1=1; P<0,263). Na comparação entre as áreas, entretanto, a freqüência de avistagens de neonatos foi maior do que o esperado para o interior e menor do que o esperado para a entrada da baía (Chi-quadrado: χ2 =4,257; g.1.=1; P<0,039).

DISCUSSÃO

Caracterização do ambiente utilizado pelos botos

Os resultados dos parâmetros ambientais coletados durante cada avistagem corroboraram outros estudos já realizados, nos quais a baía de Sepetiba é definida como um ambiente costeiro em sua entrada e estuarino em seu interior (IPT, 1975; Aragon, 1986; Araújo et al., 2002). A salinidade e a profundidade média foram os parâmetros que melhor distinguiram os diferentes habitats. As maiores salinidades na entrada se devem ao contato direto com águas oceânicas, ao contrário do interior, onde há um grande aporte fluvial advindo do continente e uma menor influência do oceano. Em relação às profundidades a entrada possui canais profundos, com lajes, ilhas e costões rochosos, os quais não são

Distribuição das avistagens

Os botos da baía de Sepetiba utilizaram com maior freqüência habitats costeiros, próximos às águas oceânicas, se comparados com outros estudos, onde os botos são observados com mais freqüência em áreas estuarinas (Geise et al., 1999; Bonin, 2001; Santos et al., 2001).

Os cetáceos geralmente apresentam uma distribuição diretamente relacionada com a abundância e disponibilidade espacial e temporal de presas, que, por sua vez, são influenciados pelas características locais do habitat, onde estão geralmente associados a bancos de areia, lajes e canais (Kenney &Winn, 1986; Hooker et al., 1999). Segundo Araújo et al.,(1998; 2002), existe um fluxo constante de cardumes de peixes utilizando a entrada da baía como abrigo e fonte de alimento ao longo do ano, já que as ilhas, lajes e canais proporcionam um habitat ideal, justificando a maior concentração de botos observada na entrada se comparado com o interior, onde os cardumes de peixes são mais abundantes, mas formados por uma menor diversidade de espécies. De acordo com Rollo, (2002) há uma tendência dos grupos de botos em acompanhar a declividade do substrato, relacionando-a com estratégias de forrageamento e alimentação. Outro fator que pode ter contribuído para esta distribuição é que o interior vem sofrendo maior degradação ambiental, caracterizada por derrubada de manguezais, dragagem e ocupação imobiliária desordenada (Menezes et al., 2000). Esta degradação pode contribuir diretamente na estrutura das espécies de peixes, fazendo com que as áreas degradadas sejam menos diversas e dominadas por poucos táxons tolerantes (Scott & Hall, 1997). Assim sendo, o interior rico em nutrientes orgânicos advindos das áreas urbanas enriquece a água, fazendo com que poucas espécies a tolerem, diferentemente de áreas menos degradadas como a entrada da baía (Araújo et al., 2002).

Os botos foram observados com maior freqüência em regiões onde a profundidade se encontrava entre 6 e 15,9 metros, demonstrando uma maior utilização por áreas próximas aos canais, ilhas e lajes existentes na entrada e por um pequeno canal existente no interior da baía. O estudo com botos-cinza na baía de Guanabara/Rio de Janeiro (Geise et al., 1999), também relata o uso de áreas mais profundas (> 6 metros), o mesmo sendo constatado para a região de Cananéia/São Paulo (Rollo, 2002). Entretanto, outros trabalhos com S.guianensis realizados ao longo da costa brasileira apontam uma maior utilização por áreas com profundidades menores que 6 metros (Bonin, 2001; Lodi; 2002; Flores; 2003). Isto pode ser devido à própria constituição destes habitats, que oferecem somente baixas profundidades, ou a uma limitação na amostragem da distribuição dos animais. Em outras palavras, se os pesquisadores visitam apenas áreas mais rasas, os botos serão avistados necessariamente apenas nestas áreas. Estudos com golfinhos corcunda (Souza chinensis) em Hong Kong (Jefferson, 2000), e golfinhos nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus) realizados nos Estados Unidos e Escócia, apontam uma preferência dos animais por áreas profundas, que são reconhecidas por sustentarem grandes concentrações de cardumes e conseqüentemente de golfinhos (Maze & Wursig, 1999; Hastie et al., 2004). Recentes estudos com peixes na baía de Sepetiba, reportam a importância do substrato (sedimento e variação de relevo) para a disponibilização de diferentes habitats, onde estão inseridas as possíveis presas dos botos (Araújo & de Azevedo, 2001; Araújo et al., 2002).

1980; Brager, 1993; Karczmarski et al., 1999). Uma das razões para isto, é que as categorias de forrageamento e alimentação foram agrupadas em uma só categoria, pois nem sempre é possível diferenciar se os animais estão realmente se alimentando ou se estão à procura do alimento. A outra razão é que os pequenos cetáceos são animais extremamente móveis e necessitam se alimentar eficientemente e freqüentemente (Katona & Whitehead, 1988). Desta forma, o boto-cinza necessita dispender a maior parte do seu tempo na procura do alimento para que sua exigência energética seja suprida (Lodi, 2002).

Os botos da baía de Sepetiba apresentaram um padrão de atividades semelhante entre entrada e interior. Isto também foi observado com golfinhos corcundas (Souza chinensis) em Hong Kong, onde não houve preferência de áreas para exercer atividades específicas. Provavelmente isto se deve ao fato de que a baía de Sepetiba como um todo, proporciona diferentes habitats para as presas de diferentes espécies e abundância, ocasionando disponibilidade de alimento ao longo do ano em várias áreas. De acordo com Araújo & de Azevedo, (2001) o tamanho da área e a abertura da baía parecem estar relacionados com a diversidade de habitats, quanto maior a área e a abertura, maior será a diversidade do local e conseqüentemente maior o número de espécies nele inseridas. Segundo Shane (1990a), animais que vivem em regiões muito diversificadas, são forçados a desenvolver certa plasticidade em suas atividades, pois o ambiente pode ser muito variado e às vezes imprevisível. Vários trabalhos com golfinhos nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus) demonstram, por exemplo, que esses animais com maior freqüência certas áreas para exercerem determinadas atividades. Isto demonstra que os golfinhos conseguem discriminar as diferenças em seus habitats, alterando suas atividades de acordo com elas (Shane, 1977; Shane, 1986; Ballance, 1987; Shane, 1990b). Isto entretanto não foi observado neste estudo talvez porque tenham sido comparadas áreas relativamente grandes

(entrada e interior) sem fazer distinção entre seus diferentes micro e meso habitats disponíveis. Adicionalmente, limitações da amostragem também podem ter contribuído para este resultado pois os botos não foram seguidos ao longo do dia, o que poderia ter possibilitado averiguar possíveis mudanças temporais (diárias) nas atividades entre as duas áreas.

Variação temporal do padrão de atividades

A atividade forrageando/alimentando teve seu pico nas primeiras horas do dia. Provavelmente, a maior freqüência desta atividade neste horário se deve a maior necessidade dos botos em se alimentar ou a maior disponibilidade de presas neste horário.O recurso alimentar pode estar ativo, concentrado ou disponível durante certas horas do dia ou em certos períodos do ciclo das marés (Stevick et al., 2002). Além disso, Manteifel et al., (1978) acreditam que a diminuição gradual da luminosidade ao entardecer, e seu aumento no início da manhã, sinaliza uma mudança na condição do ambiente, refletindo assim diferentes comportamentos dos peixes em relação a diferentes cadeias tróficas. Como exemplo, Hanson & Defran, (1993) sugeriram que muitas das presas do golfinho nariz-de- garrafa (Tursiops truncatus) da Califórnia estão mais acessíveis e susceptíveis à captura durante a transição crepuscular. Isto acarreta um aumento da atividade de forrageamento e alimentação nos golfinhos nas primeiras horas do dia e novamente no fim da tarde. Por outro lado, no presente estudo, a socialização e o descanso ocorreram mais freqüentemente à tarde. Provavelmente os recursos alimentares já não estavam tão disponíveis, ou sua

garrafa (Tursiops truncatus) (Shane; 1990a; Brager, 1993) e golfinhos corcundas (Souza chinensis) na África do Sul (Karczmarski et al., 1999). Entretanto estes autores observaram um aumento da atividade forrageamento/alimentação no final da tarde. Este aumento não foi observado neste estudo, em parte porque o período das 16:01 as 18:00 h foi o menos amostrado. No estudo realizado na baía de Paraty, (Lodi, 2002) os botos-cinza apresentaram o padrão de atividade inverso, ou seja, se alimentaram mais no período da tarde e socializaram mais no período da manhã.

Influência dos fatores abióticos

Das variáveis ambientais amostradas e testadas, a única que apresentou influência significativa em relação às atividades comportamentais foi à variação da maré de maior intensidade (de sizígia). Apesar de trabalhos com peixes na região não mencionarem a influência do fator maré, muitos pescadores locais relataram a entrada de cardumes em relação à maré enchente e vazante, concordando com os picos de forrageamento/alimentação observados para os botos nestes tipos de marés (Figura 5). Assim sendo, estes animais podem ter desenvolvido estratégias para tirar vantagem deste tipo de variação no recurso alimentar, onde o gasto de energia é minimizado. Segundo Karczmarski et al., (1999), a influência das marés parece ser bem maior em baías fechadas e passa a diminuir em habitats abertos. A atividade de forrageamento/alimentação foi afetada positivamente pelas marés vazante e baixa no estado do Ceará, vazante em Paranaguá/PR e enchente em Paraty/RJ (Oliveira et al., 1995; Bonin, 1996; Lodi, 2002). A atividade de socialização foi mais freqüente no presente estudo na maré alta. Como mencionado anteriormente, os animais socializavam logo após se alimentarem, o que

ocorre com maior freqüência nas marés vazante e enchente, conseqüentemente a socialização ocorreria na maré alta, seguindo o ciclo de marés (Figura 5).

Para os outros fatores que não apresentaram diferenças significativas, tais como, temperatura da superfície da água, transparência, salinidade e profundidade, talvez estes fatores estejam influenciando mais diretamente as presas que fazem parte da dieta dos botos do que diretamente os botos. Atualmente, foi observado que fatores abióticos, tais como profundidade, transparência da água e salinidade, influenciam diretamente a abundância e os padrões espaciais e temporais das espécies de peixes mais representativas na baía de Sepetiba (da Costa & Araújo, 2002; Araújo et al., 2002; Pessanha & Araújo, 2003; Pessanha et al., 2003).

Segundo Bearzi et al., (1999), a grande amplitude térmica da superfície da água no Mar Adriático não foi suficiente para ocasionar uma diferença significativa no pico de forrageamento/alimentação de golfinhos nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus), como ocorreu para estes animais no Texas e na Flórida (Shane, 1990b; Brager, 1993), onde os mesmos se alimentavam intensamente no outono, possivelmente, para armazenar grandes quantidades de gordura para a época de baixas temperaturas.

Organização Social

O tamanho médio de grupo encontrado na baía de Sepetiba, juntamente com a baía de Paraty (Lodi, 2002) é o maior já observado para a espécie em sua área de distribuição. Isto provavelmente está relacionado com a disponibilidade e abundância do recurso

Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná foram agrupadas separadamente (Araújo & de Azevedo, 2001), onde as espécies de peixes mais representativas nestas áreas foram aquelas que costumam formar grandes cardumes. Conseqüentemente, a semelhança entre as duas áreas faz com que estas sustentem grandes grupos de botos-cinza nesta região.

Os grupos de botos foram significativamente maiores no interior se comparados com a entrada da baía. É provável que isto se deva a uma maior proporção de tempo alocado para a atividade de socialização, já que foi esta a atividade que apresentou o maior tamanho médio de grupo entre as atividades amostradas (45,9 botos/grupo). Entretanto, não foram observadas diferenças significativas nas freqüências de atividades entre entrada e interior, o que seria esperado para justificar a afirmação acima.

Assim sendo, é provável que o aumento do tamanho de grupo no interior esteja relacionado a outros fatores, como por exemplo uma maior oferta de alimento ou maior facilidade na sua captura. Estudos realizados com peixes demersais na baía de Sepetiba (Araújo et al., 2002) concluíram que existe diferenças na abundância e na distribuição das espécies. Segundo esses autores a entrada da baía possui uma grande diversidade e riqueza de espécies, mas pouco abundantes (pescadas, manjubas, corcorocas, entre outras); já o interior apresenta baixa diversidade e riqueza de espécies, porém com maior abundância (carapebas, bagres, corvinas, entre outras). Todas as espécies acima citadas são conhecidas como itens alimentares reportados na literatura e que compõe a dieta alimentar do boto- cinza ao longo da costa brasileira (Lodi, 2002). Isto leva a crer que a alta abundância de peixes no interior proporcionaria uma oportunidade para os botos se agregarem, minimizando o custo de procura por pequenos cardumes e otimizando a captura das presas.

Na região chinesa da Baía de Lingding, os golfinhos corcundas (Souza chinensis) apresentaram diferenças no tamanho de grupo em diferentes áreas, o que não foi observado

na região adjacente a Hong Kong; entretanto, o autor não faz menção se isto estaria ligado com a disponibilidade de presas (Jefferson, 2000).

Os botos-cinza tiveram um tamanho de grupo maior durante a atividade de socialização e menor no deslocamento. Isto não ocorreu na baía de Paranaguá/Paraná e na baía de Paraty/Rio de Janeiro, onde os grupos maiores foram aqueles que estavam alimentando e os menores deslocando (Bonin et al.,2001; Lodi, 2002). Em Cananéia/São Paulo, a alimentação foi mais freqüente em grupos menores (Geise et al., 1999). Entretanto, golfinhos nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus) seguiram os mesmos padrões de tamanhos de grupo apresentados neste trabalho (Shane, 1977; Shane, 1990a; Brager et al., 1994).

A ausência de mudança sazonal no tamanho do grupo de botos também foi observada para o golfinho nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus) na Flórida (Irvine et al., 1981) e para o golfinho corcunda (Sousa chinensis) em Hong Kong (Jefferson, 2000). Entretanto, grupos maiores de botos-cinza foram encontrados no verão na baía de Paraty (Lodi, 2002). Já em outros estudos, os animais apresentaram diferentes tamanhos de grupo, em diferentes estações do ano (Shane, 1977; Würsig 1978; Karczmarski et al., 1999). Isto demonstra que variações sazonais no tamanho de grupo estão diretamente relacionadas às pressões exercidas pelas particularidades de cada habitat.

A observação de um padrão quase constante de coesão (próxima), possivelmente estaria ligada a uma forte habituação social ou familiar (Norris & Dohl, 1980), o que sustentaria laços estreitos entre os botos. Isto auxiliaria em atividades que exigem a cooperação entre os indivíduos do grupo, como é o caso, na captura de grandes cardumes

padrão foi também observado para a espécie de “dusk dolphins” (Lagenorhynchus obscurus) na Argentina (Würsig et al., 1989). Segundo Würsig et al., (1989), animais que vivem em grupos necessitam conhecer uns aos outros, e este tipo de atividade ajuda a estabelecer e manter relações sociais entre os golfinhos.

Da mesma forma, o padrão encontrado no mergulho dos animais na Nova Zelândia (Würsig et al., 1989), foi verificado nas agregações, onde durante a atividade de forrageamento/alimentação todos os animais do grupo submergiam, “desaparecendo” por mais de 2 minutos e emergiam juntos. Estes mergulhos sincronizados, provavelmente, seriam estratégias desenvolvidas na captura do alimento, e também foram observados em golfinhos do gênero Stenella e Delphinus (Norris & Dohl, 1980).

A interação entre aves e o boto cinza é conhecida de longa data em algumas regiões brasileiras (Monteiro-Filho, 1992; Monteiro-Filho et al., 1999; Lodi & Hetzel, 2000). A atividade forrageando/alimentando foi observada para todas as avistagens com presença de aves, onde o atobá (Sula leucogaster) foi a espécie mais freqüente em associação com os botos, corroborando outros trabalhos (Monteiro-Filho, 1992; Monteiro-Filho et al., 1999; Lodi, 2002), provavelmente devido à sua estratégia de caça mais eficiente na interação, em relação às outras aves marinhas. O maior tamanho de grupo foi observado em interação com aves, provavelmente pelo fato de cardumes maiores atraírem mais botos e conseqüentemente mais aves marinhas. Esta interação é considerada por alguns autores como comensalismo, onde somente as aves se beneficiariam (Martin, 1986; Monteiro-Filho et al., 1999). Já as interações observadas neste estudo, como também por Würsig & Würsig (1979), indicam que inicialmente as aves se beneficiariam de um cardume localizado pelos botos, mas depois os botos se beneficiariam da intensa atividade das aves durante a pesca, o que poderia auxiliar no atordoamento do cardume. Para confirmar este tipo de associação

mutualística, faz-se necessário um maior acompanhamento das interações entre botos e aves.

Ao se comparar à existência de neonatos para as diferentes estações do ano, foi constatado que apesar da maior ocorrência desses indivíduos no verão, não houve um pico sazonal de nascimento. Isto, provavelmente, se deve à pequena amplitude na variação da temperatura da superfície da água nas estações e à grande disponibilidade de recursos ao longo do ano, que são fatores fundamentais para restringir o nascimento em certas épocas do ano. No Brasil, a maioria dos trabalhos reporta a inexistência de um pico reprodutivo bem definido para a espécie estuarina (Geise et al., 1999; Santos et al., 2001; Rosas & Monteiro-Filho, 2002), embora outros trabalhos tenham encontrado diferentes picos, em diferentes épocas do ano (Ramos et al., 2000; Bonin, 2001; Lodi, 2002).

A maior presença observada de filhotes e neonatos foi obtida no interior da baía, o que poderia estar diretamente ligado a uma área de criação e ensinamento de estratégias de captura de alimento. Sendo o interior um local de baixas profundidades e possuidor de cardumes mais abundantes, isso facilitaria o aprendizado e o ensinamento. No estuário de Cananéia/São Paulo, Monteiro-Filho, (2000) e Santos et al., (2001) também consideram a área como sendo de extrema importância para a reprodução e criação da espécie. Um outro fator poderia ser evitar predadores, já que durante o estudo, oito orcas (Orcinus orca) foram observadas pela comunidade local na baía de Sepetiba, predando raias ticonha (Rhinoptera bonasus). As orcas também foram vistas deslocando no canal da entrada até a divisão entre a entrada e interior da baía, mas não chegaram a adentrar nas águas rasas do interior.

Ameaças antrópicas e implicações conservacionistas

Para que estratégias de conservação sejam estabelecidas para qualquer espécie, faz- se necessário o conhecimento biológico, ecológico e populacional da mesma (Karczmarski et al., 1998). Assim sendo, Flach (2004) iniciou o estudo sobre estimativa populacional do boto-cinza na baía de Sepetiba, onde o número estimado foi de 415-886 animais, sendo este número extremamente expressivo para a região Sudeste. Isto é um indicativo de que a baía de Sepetiba supre as necessidades de uma população relevante da espécie, com diversidade de habitats para que os mesmos possam desempenhar suas atividades, reproduzirem e se abrigarem contra predadores. Além disso, a área de estudo disponibiliza importantes regiões de criação para neonatos e filhotes, tendo em vista que os mesmos foram avistados ao longo de todo o ano.

Mas é necessário frisar que a baía vem sofrendo forte pressão antrópica ao longo das ultimas décadas. Por apresentarem hábitos costeiros, Sotalia guianensis é uma das espécies que mais sofre com esse tipo de degradação (Barros & Teixeira, 1994; IBAMA, 1997). As áreas de mangue estão sendo substituídas por habitações e acúmulos de lixo urbano, fazendo com que as espécies de peixes e crustáceos percam suas áreas de reprodução (Menezes et al., 2000). As dragagens no interior da baía, para ampliação e manutenção do canal do porto de Sepetiba são constantes, disponibilizando poluentes na cadeia trófica

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