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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ZOOLOGIA DE VERTEBRADOS

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Academic year: 2021

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ZOOLOGIA DE VERTEBRADOS

USO DO HABITAT, PADRÃO DE ATIVIDADES E ORGANIZAÇÃO SOCIAL DO BOTO-CINZA, (Sotalia guianenis VAN BÉNÉDEN, 1864), NA BAÍA DE

SEPETIBA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO

PATRICIA AMARAL FLACH

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JUNHO DE 2004

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ZOOLOGIA DE VERTEBRADOS

USO DO HABITAT, PADRÃO DE ATIVIDADES E ORGANIZAÇÃO SOCIAL DO BOTO-CINZA, (Sotalia guianenis VAN BÉNÉDEN, 1864), NA BAÍA DE

SEPETIBA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO

PATRICIA AMARAL FLACH

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-graduação em Zoologia de Vertebrados da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do título de Mestre em Zoologia de Vertebrados.

Área de concentração: Ecologia e Conservação

Orientador: Prof. Dr. Adriano Garcia Chiarello

Programa de Pós-Graduação em Zoologia de Vertebrados da PUC Minas

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AGRADECIMENTOS

Agradecer é mostrar nossa gratidão para com aqueles que de alguma forma nos ajudam em alguma etapa de nossas vidas. Nesse trabalho, inúmeras foram as pessoas que ao meu lado estiveram para que tudo “desse certo”.

Em primeiro lugar meus pais, Francisco e Maria de Lourdes, pelo amor e dedicação incondicional. Vocês são minha fortaleza. Principalmente meu pai pela saudade que deixou em meu coração ao partir tão prematuramente quando tudo só estava começando. Sinto falta da tua presença, do teu colo e do teu abraço. Infelizmente minha felicidade nesse momento não pode te trazer de volta, mas sei que torce por mim. Te amarei pra sempre....

Aos meus irmãos, Clésio e Marcos, sobrinhos Clesinho, Igor e Arthuzinho, a vó Agostinha e parentes.

A família “Flach”, Cláudio, Celeste, Vó Almerinda, tia Glória, tio Pedro, tia Teresa, tio Achiles, tia Virgínia, tia Márcia, tio Paulo e primos (as), por inúmeras vezes que apossamos de sua acolhida e sempre fomos muito bem recebidos!!

Aos irmãos que escolhemos para caminharmos junto: Bolha, Lobo, Xikuta, Mega, Cris, Bel entre muitos outros; só eu sei o quanto esses ombros me apoiaram e ainda me apoiarão, vocês são os melhores amigos que alguém pode ter.

Aos amigos de longe, do Marine Mammal Research Program, que ensinaram lições valiosas de como ser profissional: Paula Moreno, Leszek Karczmarski e Bernd Wursig. Também não poderia esquecer da Rosinha (Portugal) pelo doce de ser humano

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A minha prima Tânia e agora primo Lucky pela acolhida enquanto esperávamos por boas notícias....ainda bem que elas vieram!!! Felicidades para vocês.

Para que tudo começasse portas tinham de ser abertas e ninguém melhor para fazê-lo que o professor Miguel Ângelo, ser humano cheio de qualidades e extremamente profissional, obrigada por nos guiar.

À empresa Minerações Brasileiras Reunidas (MBR-S/A), parceira e patrocinadora que acreditou em nosso potencial e investiu em nosso talento.

Aos amigos da MBR/Minas: Antônia, Flávia e Cristiano (Comunicação); Leandro Quadros e José Maurício (Meio Ambiente) e Débora (Financeiro); em especial ao Rubinho pelo carinho e atenção que sempre recebemos quando estamos com você, obrigada por ter nos escolhido.

Aos amigos da MBR/TIG: Max, Caio, Valdir, Charles, Unilson, Aeda, Eunice, e a todos os funcionários da Marítima por ter-nos salvo de inúmeras situações sem solução.

Ao Marcelo P. Coellho (ex-MBR/TIG) pela dedicação e empenho para que nosso projeto fosse aprovado, obrigada por nos receber como “reis” a cada visita nossa ao TIG.

Aos colegas do condomínio Porto Real, marinheiros, Beth, Manoel, Silvio Santos e Cláudio.

Aos companheiros que fizemos em nossas coletas: Landini (secretário do meio ambiente de Mangaratiba), Expedito (presidente da colônia Z-16), aos pescadores da colônia Z-16, Badeco (Mayara Mar), Leandro (Encanto de Búzios), Alexandre e Zany (Sahy), aos pescadores de Coroa Grande, Marambaia e do Sahy, aos funcionários do posto Marina Itacuruçá, em especial Cardoso, a secretária de Educação, às escolas e

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alunos que participaram das palestras, a aqueles que ligaram para reportar algum animal morto no mar ou nas praias; todos vocês foram muito importantes em nosso estudo.

Ao amigo Tadeu Guerra, por tomar a frente quando mais precisei, não tenho palavras para te agradecer.

Aos amigos, muito mais que professores, Tudy e Robert Young, por sempre nos estender as mãos quando mais precisamos.

Ao meu orientador Adriano Chiarello pela ajuda e presteza pré e pós-coleta, apenas lamento sua ausência nas coletas de campo, tenho certeza que perdeste o melhor da festa !!!

Aos professores doutores, Artur Andriolo e Emygdio Monteiro-Filho, convidados da banca, meus sinceros agradecimentos, bem como o suplente professor Gilmar.

Aos monitores do laboratório de documentação científica do ICBS/PUC Minas, obrigada por ceder um pouco do tempo de vocês...

Por último, mas não menos importante, meu companheiro de coleta, de Beaufort 4 e de fortes chuvas (quase choramos, lembra??), amigo, confidente e marido Leonardo Flach. Às vezes palavras não bastam para expressar tamanho sentimento, você foi meu “porto seguro” quando em mim se abatia a pior tempestade, você segurou todas as barras. Além disso te admiro como profissional, principalmente como “ser-humano”, sei de sua enorme capacidade e força de vontade, eu e muitos outros sabemos da vitória que te espera. Obrigada por estar na minha vida. Te amo muito, hoje e agora.

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SUMÁRIO Resumo 1 Abstract 2 1.1 Introdução 3 Material e Métodos 7 Área de Estudo 7 Coleta de Dados 9 Definições e Análises 14 1.2 Resultados 15

Diferença entre as áreas 15

Distribuição das avistagens 18

Padrão de atividades 20

Organização social 24

1.3 Discussão 28

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USO DO HABITAT, PADRÃO DE ATIVIDADES E ORGANIZAÇÃO SOCIAL DO BOTO-CINZA, (Sotalia guianenis VAN BÉNÉDEN, 1864), NA BAÍA DE

SEPETIBA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Palavras-Chave: boto-cinza, padrão de atividades, uso do habitat, organização social RESUMO

Entre Agosto de 2002 a Julho de 2003 foi realizado um estudo para conhecimento do uso do habitat, padrão de atividades e a organização social do boto-cinza, Sotalia guianensis, na baía de Sepetiba, Brasil. Os observadores utilizaram uma embarcação como plataforma de observação, percorrendo mensalmente rotas pré-determinadas que cobriam a entrada e o interior da baía. O esforço resultou em 210 avistagens com 3.640 km de esforço total. Após a amostragem de grupo focal com registro instantâneo, após 5 minutos, para a coleta de atividade comportamental, foram coletados parâmetros ambientais. Os resultados demonstraram que a entrada tem maior influência costeira enquanto que o interior tem maior influência estuarina. Os botos foram avistados com maior freqüência na entrada da baía, tanto no inverno como no verão. A categoria de profundidade mais utilizada pelos animais foi de 6 a 15,9 m. Houve um predomínio da atividade de forrageamento/alimentação sobre todas as outras, sendo esta mais freqüente na primeira classe de horário (06:01-10:00 h). O pico de forrageamento/alimentação ocorreu com maior intensidade nas marés vazantes e enchentes, enquanto que a socialização ocorreu na maré alta. O tamanho médio de grupo foi maior no interior e na atividade de socialização. Associação com aves marinhas foi observada e quando estas estavam presentes os grupos de botos eram maiores do que quando as aves estavam ausentes. Neonatos e filhotes foram mais freqüentes no interior da baía, indicando ser esta uma área de criação. O estudo indica que os botos estão presentes o ano todo na baía e que esta é uma área importante para a conservação da espécie no litoral brasileiro.

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HABITAT USE, ACTIVITY PATTERNS AND SOCIAL ORGANIZATION OF THE ESTUARINE DOLPHIN, (Sotalia guianensis, VAN BÉNÉDEN, 1864), IN SEPETIBA

BAY, RIO DE JANEIRO STATE

Key-Words: estuarine dolphin, activity patterns, habitat use, social organization ABSTRACT

Boat-based surveys were conducted from August 2002 to July 2003 to study the activity patterns, habitat use and social organization of the estuarine dolphin, Sotalia guianensis, in Sepetiba Bay-Brazil. Pre-determinated routes covered the entrance and interior of the bay, resulting in 210 sightings of 3,640 km of total effort. For each sighting behavioral categories were registered through focal group observation and instantaneous recordings (after a 5-minutes observation). Environmental parameters were also collected for each sighting. Results indicate that the bay entrance has higher coastal/oceanic influence while the interior is more estuarine. The estuarine dolphins were sighted more frequently in the entrance of the bay, both during summer and winter. Depths from 6 to 15,9 m were used more frequently. Foraging and feeding were the most frequent activities among all activities recorded, being more intense between 06:01 to 10:00 am. The peak of foraging and feeding occurred during ebbing and flooding tides, while socialization predominated at flood tide. Mean group size was larger in the interior of the bay and during social activities. Interactions with birds were observed and dolphin group size was larger when birds were present. Neonates and calves were more frequent at the interior of the bay, indicating that this area is used for nursing and calving. The study indicates that the dolphins are present year around in Sepetiba bay and therefore this area is important for the species conservation in the Brazilian coast.

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INTRODUÇÃO

Ecologia de pequenos cetáceos

O comportamento de golfinhos pode ser influenciado pela hora do dia, topografia do substrato, marés e atividades humanas (Shane, 1990a). As respostas dadas pelos animais a essas variáveis ecológicas são um tanto imprevisíveis e podem se diferenciar de acordo com o habitat no qual são estudados (Shane, 1990b).

Os padrões de atividade dos animais representam uma adaptação às variações sazonais e diurnas dos fatores ambientais, e são resultado de um ajuste complexo entre alimentação, atividade social e parâmetros ambientais como um todo (Cloudsley-Thompson, 1961; Nielsen, 1983). Muitos desses padrões de atividade e comportamento são estudados em diferentes mamíferos terrestres, mas para cetáceos essas informações ainda são escassas (Klinowska, 1986; Shane et al., 1986).

Os padrões do uso do habitat representam uma função da heterogeneidade dos microhabitats disponíveis, o que representa um requisito básico para a ocorrência de uma determinada espécie (Rosenzweig, 1981). Enquanto alguns fatores, como por exemplo, abundância, distribuição e disponibilidade de recursos satisfazem os requisitos biológicos de uma espécie, o uso variado de determinados microhabitats indica a importância dos mesmos na vida diária destes animais (Brown, 1988).

Distribuição e ecologia do boto-cinza

A espécie Sotalia guianensis, comumente conhecida com boto cinza é um dos menores representantes da Família Delphinidae, podendo alcançar 2,10 m de comprimento. A coloração é cinza no dorso variando a esbranquiçado rosado no ventre Essa variação pode se intensificar ou não, de acordo com a temperatura da água e a

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atividade exercida pelo animal (da Silva & Best, 1994). Registros atuais sugerem que a espécie está distribuída nas costas tropicais e sub-tropicais do Oceano Atlântico, na América Central, desde Honduras à América do Sul, no litoral de Florianópolis, Santa Catarina (Borobia et al., 1991; da Silva & Best, 1996). Apesar de sua distribuição contínua ao longo da costa leste das Américas do Sul e Central, muitos aspectos da história natural desta espécie, como por exemplo, reprodução, comportamento, fidelidade local, entre outros, já foram estudados, mas ainda pouco publicados.

O boto-cinza aparenta ter uma preferência por águas mais rasas como as dos estuários e baías (da Silva & Best, 1996), podendo também ser encontrado em desembocaduras de rios e lagoas costeiras (Bonin et al., 1996; Lodi, 2002).

A dieta da espécie é bastante diversificada, variando entre peixes demersais, pelágicos e cefalópodes (Borobia & Barros, 1989) e até mesmo crustáceos, como na região do Suriname na América Central (Husson, 1978).

O gênero Sotalia possui dois ecótipos, diferenciados através da variação na dimensão do crânio e no tamanho corporal: a forma marinha ou costeira, e a forma fluvial (Borobia & Sergeant,1989). Ambas até então reconhecidas como uma única espécie denominada Sotalia fluviatilis (da Silva & Best, 1994). Embora, recentemente, através de análises morfométricas tridimensionais do tamanho e da forma do crânio, Monteiro-Filho et al., (2002) separaram o gênero Sotalia em duas espécies distintas e válidas: S. guianensis para a forma marinha e S. fluviatilis para a forma fluvial. Estudos do DNA mitocondrial (Furtado-Neto et al., 1998) e pulsos sonoros na ecolocação (Kamminga et al., 1993) também corroboram a separação em duas espécies válidas. Assim sendo, esse trabalho adota a designação Sotalia guianensis para a espécie com

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Nos últimos anos, aspectos relacionados ao boto-cinza têm sido estudados, como por exemplo: o uso do habitat (Geise et al., 1999; Bonin, 2001; Flores, 2003), a estrutura social (Monteiro-Filho, 2000), a fidelidade local e área de vida (Santos et al., 2001; Flores, 2003), a reprodução (Rosas & Monteiro-Filho, 2002), interações interespecíficas (Monteiro-Filho, 1992; Lodi & Hetzel, 2000; Flores, 2003) e o tamanho populacional do boto cinza (Rollo, 2002; Flach, 2004). Estes estudos têm sido realizados nas baías e estuários do Sul e Sudeste do Brasil. Mesmo assim, essas informações ainda são insuficientes para que o real status conservacionista da espécie possa ser definido e um melhor monitoramento possa ser adotado para que a mesma seja preservada em toda sua área de ocorrência no litoral brasileiro.

Estudos recentes (Bonin, 2001; Lodi, 2002; Flores, 2003) demonstram que cada população responde a diferentes pressões ambientais nos habitats em que vivem, e desenvolvem desse modo diferentes estratégias para sobreviverem nestes ambientes. Diferentes tamanhos de área de vida, freqüência de atividades comportamentais, tamanhos e estrutura de grupo, preferência por determinada presa, entre outros parâmetros são observados para cada população estudada. Assim, cada população tem um importante papel na manutenção da diversidade genética (adaptações locais) e na plasticidade ecológica da espécie, como um todo.

Este estudo faz parte de um projeto maior que teve seu início no final do ano de 2001, e tem como objetivo levantar dados populacionais, ecológicos e comportamentais do boto-cinza na baía de Sepetiba, RJ. Estes dados, permitem que um maior conhecimento da espécie seja transmitido para a comunidade local visando à conservação desta população de botos e do ecossistema em geral.

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Tendo em vista o exposto acima os principais objetivos deste estudo foram: (1) caracterizar o ambiente que uma população de botos cinza utiliza diariamente na Baía de Sepetiba, (2) investigar o padrão de distribuição espacial e temporal da espécie na baía de Sepetiba; (3) verificar quais fatores abióticos e bióticos influenciam nas atividades comportamentais dos botos e, (4) identificar e caracterizar a organização social apresentada pelos animais na área de estudo.

Status da espécie Sotalia guianensis

Por falta de informações, a espécie Sotalia guianensis encontra-se na categoria “Não Avaliado” da Lista Vermelha de Animais Ameaçados da União Internacional para Conservação da Natureza e dos Recursos Naturais (IUCN, 2003) e no Plano de Ação para Mamíferos Aquáticos do Brasil (IBAMA, 1997). Também é considerada “vulnerável” no catálogo de Espécies Ameaçadas de Extinção no Município do Rio de Janeiro: Fauna e Flora (SMMA, 2000); e encontra-se no “Apêndice I” (Espécies Ameaçadas de Extinção) da Convenção sobre o Comércio Internacional das Espécies da Flora e Fauna Selvagens em Perigo de Extinção (CITE) (Schouten, 1992). Entretanto esta espécie não faz parte da Lista Oficial de Espécies da Fauna Brasileira Ameaçadas de Extinção (Brasil, 1989).

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MATERIAL E MÉTODOS

Área de Estudo

A baía de Sepetiba está situada na região Sudeste do Estado do Rio de Janeiro, entre os municípios de Mangaratiba, ao sul e Barra de Guaratiba, ao norte. Situa-se entre as latitudes 22°53’ e 23°04’S e longitudes 43°34’ e 44°00’W (Araújo et al., 1998). O espelho da água da baía calculado através do programa Arc GIS 8.2 (ESRI, 2001) e tendo com base o Mapa Político do Brasil (IBGE, 1998), é de 526 km², no qual a maior distância linear no sentido leste-oeste é de aproximadamente 16,5 km e de 44 km no sentido norte-sul.

A baía é considerada uma região semi-confinada, de águas salgadas, tendo sido formada pela última regressão do nível do mar ocorrida por volta de 3.500 anos atrás, originando assim a Restinga da Marambaia, uma barreira de areia que separa a baía do Oceano Atlântico na sua porção sul (IPT, 1975; Suguio et al., 1979; Guerra, 1980; Coelho & da Fonseca, 1981). A costa norte é limitada pela Serra do Mar e é caracterizada por pequenas praias e estuários. Em seu limite leste é cercada pelos rios que são responsáveis pelo principal aporte de água doce lançado na baía. Já na porção oeste, encontra-se um conjunto de ilhas em contato com o Oceano Atlântico (Figura 1).

O clima enquadra-se no grupo A da Classificação de Köeppen, definido como Clima Tropical, diferenciando-se em função do contraste de topografia entre a área plana da baixada e as encostas que a envolvem. O tipo Aw, caracterizado por verão úmido e inverno seco, predomina na área plana da baixada. As maiores intensidades de chuvas são em dezembro-janeiro, alongando-se por vezes até março. O período seco é de maio a setembro (Barbiére & Kronemberger, 1994).

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O padrão de circulação das águas depende das marés e dos ventos. Águas oceânicas adentram a baía pela porção oeste, depois passam pelas ilhas centrais, e se aquecem, alcançando a superfície das áreas mais interiores. Esse padrão de circulação no sentido horário, faz com que os sedimentos carreados pelos rios sejam lançados para fora da baía. (IPT, 1975). Esse tipo de circulação permite pouco tempo de permanência das águas oceânicas na baía, promovendo uma maior mistura da água e pouca estratificação. A profundidade média da baía é de 8 m, sendo que no canal que se estende até a Ilha da Madeira, a profundidade varia de 20 a 30 m de acordo com a Diretoria de Hidrografia e Navegação, (1998). As maiores profundidades se encontram entre a Ilha Saracura e Jaguanum (45 m, observação pessoal) e entre as Ilhas Furtada e Jaguanum (50 m, BD; comunicação pessoal). A entrada da baía por estar em contato direto com o oceano, possui características de ambientes costeiros, enquanto a porção interior, confinada pela restinga, apresenta extensas áreas de manguezal e ambiente estuarino (IPT, 1975; Aragon, 1986).

A baía, por suas características, pode ser considerada como um dos mais importantes ecossistemas marinhos do Estado do Rio de Janeiro, apresentando grande quantidade de matéria orgânica em suspensão, sais minerais dissolvidos e grande concentração de algas, tornando suas águas bastante tróficas e servindo de criadouro para muitas espécies marinhas (Silva & Araújo, 1999).

Segundo a Base de Dados Tropical, (1999) a região é de extrema importância biológica para espécies de mamíferos aquáticos, por ser área de ocorrência dos maiores grupos de Sotalia guianensis já observados na costa brasileira. Nas últimas três décadas a baía vem, entretanto, sofrendo uma crescente pressão urbano-industrial, fazendo com

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que as águas de Sepetiba recebam grande quantidade de contaminantes e despejos urbanos (Amado-Filho et al., 1999).

Coleta de Dados

Durante os meses de Dezembro de 2001 a Fevereiro de 2002, foi realizado um estudo piloto para avaliar qual método amostral seria utilizado e quais categorias de atividade comportamental seriam adotadas (etograma). Além disso, foi feito nesse período o treinamento dos observadores para melhor categorizar o comportamento exibido pelos animais, no qual foram acumulados 64 h de esforço total sendo 24 h na procura dos animais e 40 h na observação direta dos mesmos.

Após este período, a coleta sistemática de dados teve duração de doze meses, se estendendo entre Agosto de 2002 a Julho de 2003. Neste período, foram realizados 78 cruzeiros (ver abaixo), percorrendo um total acumulado de 3.640 km. Este esforço resultou em 210 avistagens de botos-cinza, onde se obteve 317 h de esforço total assim distribuídos: 224 h de procura (ao longo das transecções pré-estabelecidas) e 93 h de observação direta dos animais.

Esses cruzeiros foram feitos com uma embarcação de 7,5 m de comprimento e com motor de popa de 225 hp. As rotas (cada rota era constituída por várias transecções) foram estabelecidas em uma carta náutica digitalizada através do Software de Navegação Nazareh Versão 6.2 (Cash Computadores e Sistemas, 2001), não considerando as avistagens previamente feitas no estudo piloto e assegurando uma cobertura total da área (entrada e interior). Assim sendo, foram traçadas três diferentes rotas na entrada e três no interior, sendo que as transecções norte-sul (7-9 km de extensão) percorriam diferentes gradientes de profundidade e aquelas no sentido

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leste-oeste (2-3 km de extensão) serviam de conecção entre as transecções norte-sul. Duas transecções perpendiculares ao continente foram acrescentadas nas rotas da entrada para que a rota de abastecimento da embarcação não ficasse descoberta (Figura 1).

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Durante as amostragens, o barco percorreu as rotas numa velocidade constante de 12 a 15 km/h, alternando a posição de início das mesmas em diferentes dias, para que a cobertura de toda a área em diferentes horários fosse mantida. Para manter a velocidade e direção da embarcação constantes na rota foi usado um aparelho GPS (Garmim 38).

As coletas foram feitas por dois observadores treinados, localizados na proa da embarcação, posicionados a 1,8 m de altura da superfície da água. Para evitar a fadiga dos observadores, esses alternavam suas posições a cada linha percorrida (norte-sul e leste-oeste) e cobriam um ângulo de 90° de cada lado da embarcação, lembrando entretanto que o observador que estivesse pilotando a embarcação observava sempre o lado direito conforme padrões estabelecidos de segurança de navegação. As observações foram feitas a olho nu ou com o auxílio de binóculos (TASCO 10x50). A procura pelos animais foi feita predominantemente sem o auxílio do binóculos, sendo este usado apenas quando um dos observadores sentia a visão cansada.

Ao se iniciar a rota, o horário era registrado para que fossem contabilizadas as horas de procura e de observação direta dos animais. Ao avistar um grupo de botos, o barco era parado e a posição e hora eram registradas na ficha de campo adaptada de Hill et al., (1999). O termo “avistagem” refere-se aqui a grupos de botos ou indivíduos solitários, detectados durante os cruzeiros na área de estudo (Karczmarski et al., 1999). Após esses registros era realizada uma aproximação do grupo, sendo coletados: horário, posição, direção do movimento do grupo, tamanho do grupo, composição e coesão do grupo, e atividade comportamental predominante. Para quantificação das atividades

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das atividades comportamentais. As categorias de atividade aqui utilizadas (forrageando/alimentando: corpo arqueado, movimentação aleatória e mergulhos longos; deslocando: movimentos em direção definida; socializando: animais na superfície com intenso contato corporal; descansando: baixo nível de atividade e geralmente na superfície; e desconhecida: quando não era possível determinar a categoria) e composição etária do grupo (adulto, juvenil, filhote e neonato) foram adaptados de Shane (1990a). A atividade de socialização incluiu comportamentos de agressão, brincadeiras e atividade sexual.

O termo “grupo” foi aplicado quando os botos estavam em aparente associação, com a maioria dos indivíduos movendo na mesma direção e geralmente, mas nem sempre, engajados na mesma atividade. A coesão dos indivíduos do grupo foi classificada em: próxima (um corpo de distância em média, entre os botos), ou afastada (mais de um corpo de distância). Já os subgrupos aqui se referem a duas ou mais agregações existentes dentro do grupo, numa área aproximadamente circular com raio de 100 m (adaptado de Shane, 1990a). O termo “agregações” foi aplicado pelos observadores, aos grupos compostos por 100 ou mais indivíduos, que se encontravam em pesca cooperativa ou em atividade de socialização (Norris & Dohl, 1980; Norris & Schilt, 1988).

Após a coleta de dados mencionadas acima, as seguintes variáveis ambientais eram medidas em cada ponto de avistagem: transparência da água, utilizando um disco de Secchi com graduação em centímetros; temperatura da superfície da água, medida com um termômetro de coluna de mercúrio com precisão de 0,5°C; salinidade, medida com um refratômetro (VISTA A366ATC) e profundidade, medida através de uma sonda (Eagle Supra Pro I.D). Também foi anotado o tipo de maré (alta, vazante, baixa, enchente), categorizada posteriormente de acordo com a hora da avistagem e verificação da carta de marés do Terminal da Ilha Guaíba/RJ. Para efeito de análise, as marés alta e baixa tiveram

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duração de 1 hora cada (meia hora antes e meia hora depois do horário indicado para o pico da maré na carta de marés) e as horas restantes foram distribuídas entre as marés enchentes e vazantes, perfazendo assim um ciclo de quatro marés em 24h. Marés de sizígia e quadratura foram categorizadas de acordo com as fases da lua (nova/cheia e crescente/minguante, respectivamente). Por fim, a condição do mar (intensidade do vento e altura das ondas) foi medida usando um barômetro de mão (Kestrel 1000, acurácia de ± 3%) e escala Beaufort.

A associação de aves marinhas (fragata, Fregata magnificens, atobá, Sula leucogaster e trinta-réis, Sterna sp) com os botos também foi registrada, quando ocorriam. Após a coleta de todos estes dados, o horário do término da avistagem era anotado e a rota prosseguia a partir do ponto onde havia sido interrompida.

Definições e Análises

Para efeito de análise, a baía de Sepetiba foi dividida em duas áreas, entrada e interior, em função de suas diferentes características físico-ambientais, fazendo da entrada um ambiente predominantemente costeiro e do interior predominantemente estuarino (IPT, 1975; Aragon, 1986; veja Resultados). Foram definidas duas categorias de estações, inverno (maio a outubro) e verão (novembro a abril). Em termos gerais o verão apresenta temperaturas geralmente superiores à média anual (25,6ºC), enquanto que no inverno a temperatura da superfície da água se encontra abaixo desse valor (para mais detalhes ver Flach, 2004).

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teste não paramétrico Mann-Whitney, pois as variáveis não apresentavam distribuição normal (testada através do teste de Kolmogorov-Smirnov; p>0,05). O teste de Mann-Whitney também foi usado para comparar o tamanho médio dos grupos de botos entre áreas e estações do ano. O teste de Kruskal-Wallis foi usado para comparar diferenças nas médias das variáveis abióticas entre cada categoria comportamental (forrageando/alimentando, deslocando, descansando, socializando e desconhecida). Nas comparações envolvendo freqüências de avistagens entre estações do ano, áreas, horários, marés e atividades comportamentais, foi usado o teste do Chi-quadrado (χ2) de acordo com Zar (1999). Todas as análises foram feitas no programa Statistical Package for The Social Sciences (SPSS), Versão 8.0.

RESULTADOS

Diferenças entre as áreas utilizadas pelos botos

Como foram verificadas diferenças significativas entre as estações , a comparação das variáveis abióticas (temperatura, profundidade, transparência e salinidade) entre as duas áreas amostradas (entrada e interior) foi feita para cada estação separadamente. No inverno, a entrada apresentou águas com maior salinidade e profundidade do que o interior. De maneira semelhante, no verão profundidade e salinidade foram significativamente mais elevados na entrada que no interior, entretanto, nesta estação, a entrada ainda apresentou maior transparência e menor temperatura da água do que o interior (Tabela 1).

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Tabela 1- Comparação entre as áreas (entrada e interior) das variáveis ambientais medidas durante as avistagens na baía de Sepetiba. As comparações são mostradas separadamente para o inverno e verão. As estatísticas do teste de Mann-Whitney (U e p) são também indicadas. Resultados significativos (p<0,05) são marcados em negrito, EP=Erro padrão.

INVERNO

Entrada Interior Mann-Whitney

Variável n média (EP) n média (EP) U p

Profundidade (m) 72 12,39 (0,67) 20 7,69 (0,56) 297 0,000 Salinidade (‰) 72 31,73 (0,15) 20 29,65 (0,64) 319 0,000 Transparência (m) 44 3,51 (0,20) 16 3,06 (0,26) 298 0,360 T. da água (ºC) 71 23,96 (0,19) 18 23,58 (0,30) 547 0,340 VERÃO

Entrada Interior Mann-Whitney

Variável n média (EP) n média (EP) U p

Profundidade (m) 96 11,95 (0,62) 21 8,86 (0,36) 694 0,020 Salinidade (‰) 95 31,06 (0,08) 21 29,71 (0,49) 563 0,001 Transparência (m) 78 3,17 (0,13) 19 2,57 (0,18) 517 0,040 T. da água (ºC) 96 26,57 (0,14) 21 27,30 (0,22) 723 0,030

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Diferenças entre as estações do ano utilizadas pelos botos

Comparando agora as estações, dentro de cada um dos ambientes amostrados (entrada e interior), constatou-se que, a temperatura da água foi significativamente menor no inverno do que no verão, tanto na entrada como no interior da baía. Além disso, a salinidade foi maior no inverno, mas apenas na entrada da baía e a profundidade foi maior no verão apenas no interior. Os outros parâmetros não variaram significativamente entres as duas estações do ano (Tabela 2).

Tabela 2- Comparação entre as estações do ano (inverno e verão) das variáveis ambientais medidas durante as avistagens na baía de Sepetiba. As comparações são mostradas separadamente para o entrada e o interior. As estatísticas do teste de Mann-Whitney (U e p) são também indicadas. Resultados significativos (p<0,05) são marcados em negrito, EP=Erro padrão.

ENTRADA

Inverno Verão Mann-Whitney

Variável n média (EP) n média (EP) U p

Profundidade (m) 72 12,39 (0,67) 96 11,95 (0,62) 3153 0,330 Salinidade (‰) 72 31,73 (0,15) 95 31,06 (0,08) 2478 0,001 Transparência (m) 44 3,51 (0,20) 78 3,17 (0,13) 1487 0,210 T. da água (ºC) 71 23,96 (0,19) 96 26,57 (0,14) 771 0,000 INTERIOR

Inverno Verão Mann-Whitney

Variável n média (EP) n média (EP) U p

Profundidade (m) 20 7,69 (0,56) 21 8,86 (0,36) 114 0,013 Salinidade (‰) 20 29,65 (0,64) 21 29,71 (0,49) 201 0,800 Transparência (m) 16 3,06 (0,26) 19 2,57 (0,18) 108 0,130 T. da água (ºC) 18 23,58 (0,30) 21 27,30 (0,22) 3 0,000

(25)

Distribuição das Avistagens

Entre as 210 avistagens consideradas na análise, 169 foram obtidas na entrada (80,5%) e 41 no interior (19,5%), demonstrando uma diferença significativa na distribuição dos botos entre as áreas (Chi-quadrado: χ2 =78,019; g.l.=1; p<0,000). Analisando a distribuição dos animais em relação às estações do ano, no inverno foram obtidas 93 avistagens (44,3%), enquanto que 117 (55,7%) foram obtidas no verão, diferença esta não significativa (Chi-quadrado: χ2 =2,743; g.1.=1; p<0,09) (Figura 2).

(26)
(27)

Durante os cruzeiros, os animais foram avistados um maior número de vezes nas categorias de profundidades de 6 a 10,9 m e de 11 a 15,9 m na entrada baía e na categoria de 6 a 10,9 m de profundidade no interior, uma diferença significativa (Chi-quadrado: χ2 =22,585; g.l.=3; p<0,000). No interior, por ser mais raso, não foram observados botos em profundidades superiores a 16 m (Figura 3).

0 10 20 30 40 50 60 70 80 < 6 6 a < 11 11 a < 16 > 16 Profundidade (m) Número de Avistagen s Entrada Interior

Figura 3. Distribuição do número de avistagens de botos-cinza em quatro categorias de profundidade na entrada e no interior da baía de Sepetiba.

Padrão de Atividades

As atividades comportamentais observadas não foram igualmente freqüentes, já que houve um acentuado predomínio da atividade forrageando/alimentando (62,9 % das

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socializando (7,6%) e descansando (5,2%) foram observadas com menor freqüência (Chi-quadrado: χ2 =245,095; g.l.=4; p<0,001) (Figura 4). Padrão de Atividades 62,9 13,3 11 7,6 5,2 Forr/alim Desconhecido Deslocando Socializando Descansando

Figura 4. Freqüência de observação (%) das cinco categorias de atividades do boto-cinza na área de estudo.

Não foram verificadas diferenças significativas entre as duas áreas nas freqüências das atividades registradas (Chi-quadrado: χ2 =3,036; g.l.=4; p<0,500), ou seja, tanto na entrada como no interior houve um forte predomínio da atividade forrageando/alimentando, seguida por deslocamento e socialização. A atividade de descanso só foi, entretanto, observada na entrada. Padrão semelhante de atividades também foi observado entre as duas estações do ano, com forte predomínio da atividade de forrageamento/alimentação. As diferenças nas freqüências das atividades entre as duas estações também não foram significativas (Chi-quadrado χ2 =4,445; g.l.=4; p<0,349).

(29)

A freqüência das atividades comportamentais variou significativamente de acordo com a hora do dia (Chi-quadrado: χ2 =19,752; g.l.=8; p<0,01). A categoria forrageamento/alimentação apresentou um pico na primeira classe de horário (06:01-10:00 h) e um decréscimo a partir de então; as categorias descansando e socializando, ao contrário, foram mais freqüentes ao entardecer, ou seja, na terceira classe de horário (Figura 5). Entretanto, como este teste do Chi-quadrado apresentou 40% de suas células com freqüência esperada menor ou igual a 5, optou-se por fazer uma análise adicional utilizando apenas duas categorias de horários (6:01-12:00h /12:01-18:00h), eliminando, assim o problema de células com pequeno número de avistagens (10 % das células com n ≤ 5 nesta segunda análise). Neste segundo teste também foi observado uma diferença significativa (Chi-quadrado: χ2 =13,619; g.l.=4; p<0,009) mostrando um padrão semelhante ao anterior, qual seja, uma diminuição da alimentação e aumento da atividade de socialização no segundo período do dia.

Horário 0 10 20 30 40 50 60 70 80

Forr/Alim Deslocando Descansando Socializando Desconhecida

Porcentagem

06:01-10:00 10:01-14:00 14:01-18:00

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Influência das variáveis abióticas no padrão de atividade

Uma análise de variância não paramétrica (Teste de Kruslkal-Wallis) foi feita para testar se as médias das variáveis abióticas (temperatura da superfície da água, salinidade, transparência da água, e profundidade) foram significativamente diferentes entre as quatro principais atividades registradas durante as avistagens (alimentação, deslocamento, descansando e socializando). Os resultados desta análise não foram, porém, significativos (Kruskal-Wallis, p>0,100 em todos os quatro casos). Ao comparar a influência do tipo de maré (alta, vazante, baixa e enchente) na freqüência de atividades, observou-se um resultado significativo apenas para os dias de maré de sizígia (lua cheia ou nova) (Chi-quadrado: χ2 =21,438; g.1.=3; p<0,040). Nos dias de marés de quadratura (lua minguante ou crescente) as freqüências das atividades não variaram significativamente em relação aos quatro tipos de marés (Chi-quadrado; p>0,500 em todos os casos). Para a maré de sizígia a atividade de forrageamento/alimentação foi a mais freqüente nas marés vazantes e enchentes, diferentemente do observado com relação à atividade de socialização, que foi realizada com maior freqüência na maré alta (Figura 6). O resultado deste teste deve porém ser tomado com cuidado, pois um número expressivo de células do Chi-quadrado (n=10 ou 50% das células) apresentou valor menor ou igual a 5, que alguns autores consideram como número mínimo para um resultado estatisticamente robusto (Zar, 1999).

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Maré Sizígia

0 10 20 30 40 50 60 70

Forr/Alim Deslocando Descansando Socializando Desconhecida

Atividades Porcentagem Alta Vazante Baixa Enchente

Figura 6. Freqüência (%) das atividades avistadas nos diferentes ciclos da maré sizígia.

Organização Social

O tamanho de grupo de botos na baía de Sepetiba variou de 2 a cerca de 280 animais (média=30,2; E.P.=3,43 botos). O tamanho médio de grupo foi significativamente maior no interior do que na entrada da baía (Mann-Whitney; U=2250; P<0,000; Figura

7a). As grandes agregações (grupos > 100 botos, n=16) foram observadas mais

freqüentemente no interior (n=10; 62,5%) do que na entrada da baía (n=6; 37,5%). Analisando as estações, não foram observadas diferenças significativas no tamanho de grupo entre inverno e verão (Mann-Whitney; U=5416; p<0,955; Figura 7b). O tamanho médio de grupo variou significativamente de acordo com a atividade predominante (Teste

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deslocando (Figura 8). Esta diferença se torna marginalmente significativa, entretanto, quando a atividade “desconhecida” é removida da análise (Teste de Kruskal-Wallis; KW=7,578; g.l.=3; p=0,056). Não foi verificada diferença significativa na coesão dos indivíduos do grupo (próximo ou afastado) entre as categorias comportamentais analisadas (Chi-quadrado: χ2 =3,312; g.l.=4; p>0,500).

(a)

0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 Entrada Interior Área de Estudo

(33)

(b)

0 5 10 15 20 25 30 35 40 45 Inverno Verão Estações do Ano

Tamanho Médio do Grupo/Botos

Figura 7. Tamanho médio de grupo de botos em relação a: a) local (entrada e interior) e b) estações do ano (inverno e verão), com os respectivos erros padrões.

(34)

0 10 20 30 40 50 60 70

Forr/Alim Deslocando Descansando Socializando Desconhecida Padrão de Atividades

Tamanho Médio do Grupo/Botos

Figura 8. Tamanho médio de grupo em relação às atividades exercidas pelos botos-cinza na área de estudo, com seus respectivos erros padrões.

Como há somente indícios esporádicos e não foi observada a presença de outras espécies de cetáceos pelos pesquisadores na área de estudo, as relações interespecíficas foram analisadas considerando somente as seguintes espécies de aves marinhas: atobá (Sula leucogaster), trinta-réis (Sterna sp.) e fragata (Fregata magnificens). Os grupos de botos com presença de aves marinhas (n=32) apresentaram um tamanho significativamente maior (média =58,9; E.P.=13,0 botos/grupo) do que os grupos sem presença de aves (n=178; média =25,0; E.P.=3,1 botos/grupo) (Mann-Whitney; U=1570; P<0,000). Entre as aves presentes, houve um maior número de associações com atobás (50,0%), seguida de trinta réis (15,6%), trinta réis/atobás (15,6%), fragatas (9,4%) e atobás/fragatas (9,4%). A

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interação entre botos e aves só ocorreu quando os botos estavam exercendo a atividade de forrageamento/alimentação.

Apesar de neonatos terem sido avistados com maior freqüência no verão (n=31) do que no inverno (n=17) esta diferença não foi significativa, pois o número total de avistagens variou entre as estações, sendo maior no verão (n=117) do que no inverno (n=90) (Chi-quadrado: χ2 =1,253; g.1=1; P<0,263). Na comparação entre as áreas, entretanto, a freqüência de avistagens de neonatos foi maior do que o esperado para o interior e menor do que o esperado para a entrada da baía (Chi-quadrado: χ2 =4,257; g.1.=1; P<0,039).

DISCUSSÃO

Caracterização do ambiente utilizado pelos botos

Os resultados dos parâmetros ambientais coletados durante cada avistagem corroboraram outros estudos já realizados, nos quais a baía de Sepetiba é definida como um ambiente costeiro em sua entrada e estuarino em seu interior (IPT, 1975; Aragon, 1986; Araújo et al., 2002). A salinidade e a profundidade média foram os parâmetros que melhor distinguiram os diferentes habitats. As maiores salinidades na entrada se devem ao contato direto com águas oceânicas, ao contrário do interior, onde há um grande aporte fluvial advindo do continente e uma menor influência do oceano. Em relação às profundidades a entrada possui canais profundos, com lajes, ilhas e costões rochosos, os quais não são

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Distribuição das avistagens

Os botos da baía de Sepetiba utilizaram com maior freqüência habitats costeiros, próximos às águas oceânicas, se comparados com outros estudos, onde os botos são observados com mais freqüência em áreas estuarinas (Geise et al., 1999; Bonin, 2001; Santos et al., 2001).

Os cetáceos geralmente apresentam uma distribuição diretamente relacionada com a abundância e disponibilidade espacial e temporal de presas, que, por sua vez, são influenciados pelas características locais do habitat, onde estão geralmente associados a bancos de areia, lajes e canais (Kenney &Winn, 1986; Hooker et al., 1999). Segundo Araújo et al.,(1998; 2002), existe um fluxo constante de cardumes de peixes utilizando a entrada da baía como abrigo e fonte de alimento ao longo do ano, já que as ilhas, lajes e canais proporcionam um habitat ideal, justificando a maior concentração de botos observada na entrada se comparado com o interior, onde os cardumes de peixes são mais abundantes, mas formados por uma menor diversidade de espécies. De acordo com Rollo, (2002) há uma tendência dos grupos de botos em acompanhar a declividade do substrato, relacionando-a com estratégias de forrageamento e alimentação. Outro fator que pode ter contribuído para esta distribuição é que o interior vem sofrendo maior degradação ambiental, caracterizada por derrubada de manguezais, dragagem e ocupação imobiliária desordenada (Menezes et al., 2000). Esta degradação pode contribuir diretamente na estrutura das espécies de peixes, fazendo com que as áreas degradadas sejam menos diversas e dominadas por poucos táxons tolerantes (Scott & Hall, 1997). Assim sendo, o interior rico em nutrientes orgânicos advindos das áreas urbanas enriquece a água, fazendo com que poucas espécies a tolerem, diferentemente de áreas menos degradadas como a entrada da baía (Araújo et al., 2002).

(37)

Os botos foram observados com maior freqüência em regiões onde a profundidade se encontrava entre 6 e 15,9 metros, demonstrando uma maior utilização por áreas próximas aos canais, ilhas e lajes existentes na entrada e por um pequeno canal existente no interior da baía. O estudo com botos-cinza na baía de Guanabara/Rio de Janeiro (Geise et al., 1999), também relata o uso de áreas mais profundas (> 6 metros), o mesmo sendo constatado para a região de Cananéia/São Paulo (Rollo, 2002). Entretanto, outros trabalhos com S.guianensis realizados ao longo da costa brasileira apontam uma maior utilização por áreas com profundidades menores que 6 metros (Bonin, 2001; Lodi; 2002; Flores; 2003). Isto pode ser devido à própria constituição destes habitats, que oferecem somente baixas profundidades, ou a uma limitação na amostragem da distribuição dos animais. Em outras palavras, se os pesquisadores visitam apenas áreas mais rasas, os botos serão avistados necessariamente apenas nestas áreas. Estudos com golfinhos corcunda (Souza chinensis) em Hong Kong (Jefferson, 2000), e golfinhos nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus) realizados nos Estados Unidos e Escócia, apontam uma preferência dos animais por áreas profundas, que são reconhecidas por sustentarem grandes concentrações de cardumes e conseqüentemente de golfinhos (Maze & Wursig, 1999; Hastie et al., 2004). Recentes estudos com peixes na baía de Sepetiba, reportam a importância do substrato (sedimento e variação de relevo) para a disponibilização de diferentes habitats, onde estão inseridas as possíveis presas dos botos (Araújo & de Azevedo, 2001; Araújo et al., 2002).

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1980; Brager, 1993; Karczmarski et al., 1999). Uma das razões para isto, é que as categorias de forrageamento e alimentação foram agrupadas em uma só categoria, pois nem sempre é possível diferenciar se os animais estão realmente se alimentando ou se estão à procura do alimento. A outra razão é que os pequenos cetáceos são animais extremamente móveis e necessitam se alimentar eficientemente e freqüentemente (Katona & Whitehead, 1988). Desta forma, o boto-cinza necessita dispender a maior parte do seu tempo na procura do alimento para que sua exigência energética seja suprida (Lodi, 2002).

Os botos da baía de Sepetiba apresentaram um padrão de atividades semelhante entre entrada e interior. Isto também foi observado com golfinhos corcundas (Souza chinensis) em Hong Kong, onde não houve preferência de áreas para exercer atividades específicas. Provavelmente isto se deve ao fato de que a baía de Sepetiba como um todo, proporciona diferentes habitats para as presas de diferentes espécies e abundância, ocasionando disponibilidade de alimento ao longo do ano em várias áreas. De acordo com Araújo & de Azevedo, (2001) o tamanho da área e a abertura da baía parecem estar relacionados com a diversidade de habitats, quanto maior a área e a abertura, maior será a diversidade do local e conseqüentemente maior o número de espécies nele inseridas. Segundo Shane (1990a), animais que vivem em regiões muito diversificadas, são forçados a desenvolver certa plasticidade em suas atividades, pois o ambiente pode ser muito variado e às vezes imprevisível. Vários trabalhos com golfinhos nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus) demonstram, por exemplo, que esses animais com maior freqüência certas áreas para exercerem determinadas atividades. Isto demonstra que os golfinhos conseguem discriminar as diferenças em seus habitats, alterando suas atividades de acordo com elas (Shane, 1977; Shane, 1986; Ballance, 1987; Shane, 1990b). Isto entretanto não foi observado neste estudo talvez porque tenham sido comparadas áreas relativamente grandes

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(entrada e interior) sem fazer distinção entre seus diferentes micro e meso habitats disponíveis. Adicionalmente, limitações da amostragem também podem ter contribuído para este resultado pois os botos não foram seguidos ao longo do dia, o que poderia ter possibilitado averiguar possíveis mudanças temporais (diárias) nas atividades entre as duas áreas.

Variação temporal do padrão de atividades

A atividade forrageando/alimentando teve seu pico nas primeiras horas do dia. Provavelmente, a maior freqüência desta atividade neste horário se deve a maior necessidade dos botos em se alimentar ou a maior disponibilidade de presas neste horário.O recurso alimentar pode estar ativo, concentrado ou disponível durante certas horas do dia ou em certos períodos do ciclo das marés (Stevick et al., 2002). Além disso, Manteifel et al., (1978) acreditam que a diminuição gradual da luminosidade ao entardecer, e seu aumento no início da manhã, sinaliza uma mudança na condição do ambiente, refletindo assim diferentes comportamentos dos peixes em relação a diferentes cadeias tróficas. Como exemplo, Hanson & Defran, (1993) sugeriram que muitas das presas do golfinho nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus) da Califórnia estão mais acessíveis e susceptíveis à captura durante a transição crepuscular. Isto acarreta um aumento da atividade de forrageamento e alimentação nos golfinhos nas primeiras horas do dia e novamente no fim da tarde. Por outro lado, no presente estudo, a socialização e o descanso ocorreram mais freqüentemente à tarde. Provavelmente os recursos alimentares já não estavam tão disponíveis, ou sua

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garrafa (Tursiops truncatus) (Shane; 1990a; Brager, 1993) e golfinhos corcundas (Souza chinensis) na África do Sul (Karczmarski et al., 1999). Entretanto estes autores observaram um aumento da atividade forrageamento/alimentação no final da tarde. Este aumento não foi observado neste estudo, em parte porque o período das 16:01 as 18:00 h foi o menos amostrado. No estudo realizado na baía de Paraty, (Lodi, 2002) os botos-cinza apresentaram o padrão de atividade inverso, ou seja, se alimentaram mais no período da tarde e socializaram mais no período da manhã.

Influência dos fatores abióticos

Das variáveis ambientais amostradas e testadas, a única que apresentou influência significativa em relação às atividades comportamentais foi à variação da maré de maior intensidade (de sizígia). Apesar de trabalhos com peixes na região não mencionarem a influência do fator maré, muitos pescadores locais relataram a entrada de cardumes em relação à maré enchente e vazante, concordando com os picos de forrageamento/alimentação observados para os botos nestes tipos de marés (Figura 5). Assim sendo, estes animais podem ter desenvolvido estratégias para tirar vantagem deste tipo de variação no recurso alimentar, onde o gasto de energia é minimizado. Segundo Karczmarski et al., (1999), a influência das marés parece ser bem maior em baías fechadas e passa a diminuir em habitats abertos. A atividade de forrageamento/alimentação foi afetada positivamente pelas marés vazante e baixa no estado do Ceará, vazante em Paranaguá/PR e enchente em Paraty/RJ (Oliveira et al., 1995; Bonin, 1996; Lodi, 2002). A atividade de socialização foi mais freqüente no presente estudo na maré alta. Como mencionado anteriormente, os animais socializavam logo após se alimentarem, o que

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ocorre com maior freqüência nas marés vazante e enchente, conseqüentemente a socialização ocorreria na maré alta, seguindo o ciclo de marés (Figura 5).

Para os outros fatores que não apresentaram diferenças significativas, tais como, temperatura da superfície da água, transparência, salinidade e profundidade, talvez estes fatores estejam influenciando mais diretamente as presas que fazem parte da dieta dos botos do que diretamente os botos. Atualmente, foi observado que fatores abióticos, tais como profundidade, transparência da água e salinidade, influenciam diretamente a abundância e os padrões espaciais e temporais das espécies de peixes mais representativas na baía de Sepetiba (da Costa & Araújo, 2002; Araújo et al., 2002; Pessanha & Araújo, 2003; Pessanha et al., 2003).

Segundo Bearzi et al., (1999), a grande amplitude térmica da superfície da água no Mar Adriático não foi suficiente para ocasionar uma diferença significativa no pico de forrageamento/alimentação de golfinhos nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus), como ocorreu para estes animais no Texas e na Flórida (Shane, 1990b; Brager, 1993), onde os mesmos se alimentavam intensamente no outono, possivelmente, para armazenar grandes quantidades de gordura para a época de baixas temperaturas.

Organização Social

O tamanho médio de grupo encontrado na baía de Sepetiba, juntamente com a baía de Paraty (Lodi, 2002) é o maior já observado para a espécie em sua área de distribuição. Isto provavelmente está relacionado com a disponibilidade e abundância do recurso

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Rio de Janeiro, São Paulo e Paraná foram agrupadas separadamente (Araújo & de Azevedo, 2001), onde as espécies de peixes mais representativas nestas áreas foram aquelas que costumam formar grandes cardumes. Conseqüentemente, a semelhança entre as duas áreas faz com que estas sustentem grandes grupos de botos-cinza nesta região.

Os grupos de botos foram significativamente maiores no interior se comparados com a entrada da baía. É provável que isto se deva a uma maior proporção de tempo alocado para a atividade de socialização, já que foi esta a atividade que apresentou o maior tamanho médio de grupo entre as atividades amostradas (45,9 botos/grupo). Entretanto, não foram observadas diferenças significativas nas freqüências de atividades entre entrada e interior, o que seria esperado para justificar a afirmação acima.

Assim sendo, é provável que o aumento do tamanho de grupo no interior esteja relacionado a outros fatores, como por exemplo uma maior oferta de alimento ou maior facilidade na sua captura. Estudos realizados com peixes demersais na baía de Sepetiba (Araújo et al., 2002) concluíram que existe diferenças na abundância e na distribuição das espécies. Segundo esses autores a entrada da baía possui uma grande diversidade e riqueza de espécies, mas pouco abundantes (pescadas, manjubas, corcorocas, entre outras); já o interior apresenta baixa diversidade e riqueza de espécies, porém com maior abundância (carapebas, bagres, corvinas, entre outras). Todas as espécies acima citadas são conhecidas como itens alimentares reportados na literatura e que compõe a dieta alimentar do boto-cinza ao longo da costa brasileira (Lodi, 2002). Isto leva a crer que a alta abundância de peixes no interior proporcionaria uma oportunidade para os botos se agregarem, minimizando o custo de procura por pequenos cardumes e otimizando a captura das presas.

Na região chinesa da Baía de Lingding, os golfinhos corcundas (Souza chinensis) apresentaram diferenças no tamanho de grupo em diferentes áreas, o que não foi observado

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na região adjacente a Hong Kong; entretanto, o autor não faz menção se isto estaria ligado com a disponibilidade de presas (Jefferson, 2000).

Os botos-cinza tiveram um tamanho de grupo maior durante a atividade de socialização e menor no deslocamento. Isto não ocorreu na baía de Paranaguá/Paraná e na baía de Paraty/Rio de Janeiro, onde os grupos maiores foram aqueles que estavam alimentando e os menores deslocando (Bonin et al.,2001; Lodi, 2002). Em Cananéia/São Paulo, a alimentação foi mais freqüente em grupos menores (Geise et al., 1999). Entretanto, golfinhos nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus) seguiram os mesmos padrões de tamanhos de grupo apresentados neste trabalho (Shane, 1977; Shane, 1990a; Brager et al., 1994).

A ausência de mudança sazonal no tamanho do grupo de botos também foi observada para o golfinho nariz-de-garrafa (Tursiops truncatus) na Flórida (Irvine et al., 1981) e para o golfinho corcunda (Sousa chinensis) em Hong Kong (Jefferson, 2000). Entretanto, grupos maiores de botos-cinza foram encontrados no verão na baía de Paraty (Lodi, 2002). Já em outros estudos, os animais apresentaram diferentes tamanhos de grupo, em diferentes estações do ano (Shane, 1977; Würsig 1978; Karczmarski et al., 1999). Isto demonstra que variações sazonais no tamanho de grupo estão diretamente relacionadas às pressões exercidas pelas particularidades de cada habitat.

A observação de um padrão quase constante de coesão (próxima), possivelmente estaria ligada a uma forte habituação social ou familiar (Norris & Dohl, 1980), o que sustentaria laços estreitos entre os botos. Isto auxiliaria em atividades que exigem a cooperação entre os indivíduos do grupo, como é o caso, na captura de grandes cardumes

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padrão foi também observado para a espécie de “dusk dolphins” (Lagenorhynchus obscurus) na Argentina (Würsig et al., 1989). Segundo Würsig et al., (1989), animais que vivem em grupos necessitam conhecer uns aos outros, e este tipo de atividade ajuda a estabelecer e manter relações sociais entre os golfinhos.

Da mesma forma, o padrão encontrado no mergulho dos animais na Nova Zelândia (Würsig et al., 1989), foi verificado nas agregações, onde durante a atividade de forrageamento/alimentação todos os animais do grupo submergiam, “desaparecendo” por mais de 2 minutos e emergiam juntos. Estes mergulhos sincronizados, provavelmente, seriam estratégias desenvolvidas na captura do alimento, e também foram observados em golfinhos do gênero Stenella e Delphinus (Norris & Dohl, 1980).

A interação entre aves e o boto cinza é conhecida de longa data em algumas regiões brasileiras (Monteiro-Filho, 1992; Monteiro-Filho et al., 1999; Lodi & Hetzel, 2000). A atividade forrageando/alimentando foi observada para todas as avistagens com presença de aves, onde o atobá (Sula leucogaster) foi a espécie mais freqüente em associação com os botos, corroborando outros trabalhos (Monteiro-Filho, 1992; Monteiro-Filho et al., 1999; Lodi, 2002), provavelmente devido à sua estratégia de caça mais eficiente na interação, em relação às outras aves marinhas. O maior tamanho de grupo foi observado em interação com aves, provavelmente pelo fato de cardumes maiores atraírem mais botos e conseqüentemente mais aves marinhas. Esta interação é considerada por alguns autores como comensalismo, onde somente as aves se beneficiariam (Martin, 1986; Monteiro-Filho et al., 1999). Já as interações observadas neste estudo, como também por Würsig & Würsig (1979), indicam que inicialmente as aves se beneficiariam de um cardume localizado pelos botos, mas depois os botos se beneficiariam da intensa atividade das aves durante a pesca, o que poderia auxiliar no atordoamento do cardume. Para confirmar este tipo de associação

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mutualística, faz-se necessário um maior acompanhamento das interações entre botos e aves.

Ao se comparar à existência de neonatos para as diferentes estações do ano, foi constatado que apesar da maior ocorrência desses indivíduos no verão, não houve um pico sazonal de nascimento. Isto, provavelmente, se deve à pequena amplitude na variação da temperatura da superfície da água nas estações e à grande disponibilidade de recursos ao longo do ano, que são fatores fundamentais para restringir o nascimento em certas épocas do ano. No Brasil, a maioria dos trabalhos reporta a inexistência de um pico reprodutivo bem definido para a espécie estuarina (Geise et al., 1999; Santos et al., 2001; Rosas & Monteiro-Filho, 2002), embora outros trabalhos tenham encontrado diferentes picos, em diferentes épocas do ano (Ramos et al., 2000; Bonin, 2001; Lodi, 2002).

A maior presença observada de filhotes e neonatos foi obtida no interior da baía, o que poderia estar diretamente ligado a uma área de criação e ensinamento de estratégias de captura de alimento. Sendo o interior um local de baixas profundidades e possuidor de cardumes mais abundantes, isso facilitaria o aprendizado e o ensinamento. No estuário de Cananéia/São Paulo, Monteiro-Filho, (2000) e Santos et al., (2001) também consideram a área como sendo de extrema importância para a reprodução e criação da espécie. Um outro fator poderia ser evitar predadores, já que durante o estudo, oito orcas (Orcinus orca) foram observadas pela comunidade local na baía de Sepetiba, predando raias ticonha (Rhinoptera bonasus). As orcas também foram vistas deslocando no canal da entrada até a divisão entre a entrada e interior da baía, mas não chegaram a adentrar nas águas rasas do interior.

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Ameaças antrópicas e implicações conservacionistas

Para que estratégias de conservação sejam estabelecidas para qualquer espécie, faz-se necessário o conhecimento biológico, ecológico e populacional da mesma (Karczmarski et al., 1998). Assim sendo, Flach (2004) iniciou o estudo sobre estimativa populacional do boto-cinza na baía de Sepetiba, onde o número estimado foi de 415-886 animais, sendo este número extremamente expressivo para a região Sudeste. Isto é um indicativo de que a baía de Sepetiba supre as necessidades de uma população relevante da espécie, com diversidade de habitats para que os mesmos possam desempenhar suas atividades, reproduzirem e se abrigarem contra predadores. Além disso, a área de estudo disponibiliza importantes regiões de criação para neonatos e filhotes, tendo em vista que os mesmos foram avistados ao longo de todo o ano.

Mas é necessário frisar que a baía vem sofrendo forte pressão antrópica ao longo das ultimas décadas. Por apresentarem hábitos costeiros, Sotalia guianensis é uma das espécies que mais sofre com esse tipo de degradação (Barros & Teixeira, 1994; IBAMA, 1997). As áreas de mangue estão sendo substituídas por habitações e acúmulos de lixo urbano, fazendo com que as espécies de peixes e crustáceos percam suas áreas de reprodução (Menezes et al., 2000). As dragagens no interior da baía, para ampliação e manutenção do canal do porto de Sepetiba são constantes, disponibilizando poluentes na cadeia trófica (Amado-Filho et al., 1999). A pesca predatória com arrasto e traineiras, até mesmo advindas de outros estados (observação pessoal) tem crescido nos últimos anos, tornando-se uma ameaça não só para os botos como também para a população local que utiliza a pesca artesanal. Uma prova disto é que muitos pescadores disponibilizam seus barcos de pesca para operações turísticas.

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A espécie Sotalia guianensis esta incluída no plano de ação para a conservação de cetáceos, onde uma das medidas prioritárias é o conhecimento do uso do habitat onde estão inseridos. Juntamente com a estimativa populacional realizada por Flach (2004), este trabalho contribui para um maior conhecimento sobre a ecologia da espécie em uma de suas áreas de ocorrência. Entretanto, faz-se necessário um estudo de longa duração para verificar se a população da baía de Sepetiba está estável, em declínio ou em crescimento. Além disso, é importante estudar se esta população está ligada, através de indivíduos migrantes e fluxo gênico, a populações de outras regiões, como por exemplo da baía de Guanabara e baía de Paraty, ou até mesmo da população da região de Cananéia. Isto pode ser feito, pelo menos parcialmente, através de iniciativas de estudos com foto-identificação. Um estudo mais aprofundado, entretanto, deverá empregar coleta de tecido para análise de variabilidade genética e filogeografia. Só assim a real importância desta população para a conservação da espécie, tanto para a região Sudeste como para todo o Brasil, poderá ser conhecida.

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