• Nenhum resultado encontrado

Marantz (2013): uma teoria de alossemia contextual

CAPÍTULO 5. A derivação do significado: mapeando o domínio da interpretação

5.3 O estado da arte: propostas para derivar o significado

5.3.2 Marantz (2013): uma teoria de alossemia contextual

A ideia central desenvolvida em Marantz (2013) é a de que há, no caminho para a interface semântica, uma noção equivalente ao que se conhece como alomorfia contextual, no caminho para PF.

A alomorfia contextual se dá quando formas competidoras realizam o mesmo conjunto de traços de um nó sintático, sendo que a escolha entre elas é determinada exclusivamente pelo contexto de inserção. Do ponto de vista semântico, isso é equivalente a dizer que múltiplos significados competem para serem realizados em um determinado nó sintático (a raiz, por exemplo), sendo que a interpretação vencedora deverá ser escolhida com base no contexto sintático local que envolve o nó relevante. O autor se refere a essa competição de significados como alossemia contextual.

Para perseguir tal ideia, uma teoria de alossemia se faz necessária. Explorando a hipótese de que as restrições impostas à alomorfia contextual e as restrições impostas à alossemia contextual são as mesmas, o autor adota o sistema proposto por Embick (2010), que

2 Cf. De Belder, Faust & Lampitelli (2009) para uma abordagem da (não)composicionalidade em formações diminutivas desenvolvida no escopo da hipótese de Maratz (2001, 2007)/Arad (2003). Mais especificamente, De Belder, Faust & Lampitelli (2009) propõem que, translinguisticamente, os diminutivos podem ocupar duas posições sintáticas diferentes. Uma delas está colocada entre o categorizador nominal e a projeção de número, enquanto a segunda delas está situada mais abaixo na estrutura sintática, a saber, diretamente concatenada à raiz. Segundo os autores, os diminutivos não-composicionais são derivados na posição mais baixa, enquanto os diminutivos composicionais ocupam a posição mais alta.

188

investiga, exclusivamente no ramo de PF, as relações locais responsáveis por licenciar interações alomórficas.

Mais especificamente, Embick (2010) argumenta que a alomorfia deve ser computada através de domínios locais. Na definição desse domínio de localidade, o autor propõe que adjacência é a relação responsável por licenciar as interações alomórficas. No entanto, é preciso lembrar que o sistema do autor se desenvolve dentro de um modelo teórico que segue a seguinte hipótese de categorização:

(11) Hipótese de categorização: “as raízes não podem aparecer sem serem categorizadas; as raízes são categorizadas através da sua combinação com um núcleo funcional definidor de categoria” (EMBICK & NOYER, 2007, p.296 – tradução nossa3)

Sendo assim, a noção de adjacência não é suficiente para dar conta de casos conhecidos, como a formação de passado no inglês, por exemplo, dada a intervenção dos núcleos categorizadores exigidos pela hipótese acima delineada.

(12) Interação alomórfica na formação de passado do inglês T

3

v T [passado] 2

√RAIZ v (EMBICK, 2010, p. 14)

Note que, na estrutura em (12) acima, a raiz e o nó de tempo não estão exatamente adjacentes um ao outro, uma vez que há a intervenção de um núcleo categorizador entre eles. Esse núcleo é exigido pela hipótese de categorização apresentada acima. No entanto, é sabido que a realização fonológica do núcleo T pode ser condicionada pelo nó que abriga a raiz: T se realizará como um vazio fonológico no contexto das raízes √HIT e √CUT, por exemplo; T se realizará como -t no contexto da raiz √BEND e essas realizações contrastam com a realização default para T, nomeadamente, -ed.

Diante de fatos como esse, Embick (2010) propõe que vazios fonológicos são invisíveis para o cálculo da relação de adjacência. Assim, na estrutura em (12), o

3 CATEGORIZATION ASSUMPTION: Roots cannot appear without being categorized; Roots are categorized by combining with category-defining functional heads. (EMBICK & NOYER, 2007:296)

189

categorizador v, por ser fonologicamente vazio, não bloqueia a adjacência entre a raiz e o núcleo T, o que possibilita a interação alomórfica entre eles.

Além disso, o autor ainda identifica uma assimetria entre núcleos de fase e núcleos que não constituem fase no cálculo do domínio em que a alomorfia é licenciada. Essa assimetria está esquematizada na representação abaixo, em que x e y são categorizadores, enquanto Z não o é.

(13) Assimetria entre núcleo cíclicos e núcleos não-cíclicos a. ... α] x] Z]

Generalização: Z não-cíclico pode apresentar alomorfia contextual determinada por α, desde que x não seja realizado.

b. ...α] x] y]

Generalização: y cíclico não pode apresentar alomorfia contextual determinada por α, mesmo que x não seja realizado.

(Embick, 2010, p.16 – tradução nossa4)

Segundo (13a), se x é fonologicamente vazio, então a forma de Z pode ser determinada por α, uma vez que Z não é um núcleo de fase. Esse é exatamente o contexto que se tem na alomorfia do núcleo T em (12). Por outro lado, segundo (13b), não há possibilidade de interação entre α e y, independentemente do estatuto fonológico de x, precisamente nos casos em que y é um núcleo de fase.

O sistema proposto em Marantz (2013) para lidar com o que ele chama de alossemia contextual é consideravelmente paralelo ao sistema desenvolvido em Embick (2010), que foi brevemente apresentado acima. Nesse sentido, em Marantz (2013), para que dois elementos possam influenciar a interpretação um do outro, eles devem estabelecer entre si uma relação local de adjacência. Nesse contexto, a adjacência relevante é semântica. Para que a adjacência semântica entre dois nós seja mantida, apesar da presença um interventor, o elemento interventor precisa ser semanticamente nulo. Em outras palavras, o elemento que intervém precisa ser irrelevante para a interpretação.

4 a. ... α] x] Z]

Generalization: Noncyclic Z may show contextual allomorphy determined by α, as long as x is not overt. b. ...α] x] y]

Generalization: Cyclic y may not show contextual allomorphy determined by α, even if x is not overt.

190

Dessa maneira, o primeiro núcleo de fase não é o único domínio possível para a interpretação não-composicional, uma vez que tal núcleo pode ser fonologicamente realizado, mas semanticamente nulo, não contando como um interventor efetivo.

Além disso, Marantz (2013) também adota a assimetria entre núcleos cíclicos e núcleos não-cíclicos proposta em (13). De maneira concreta, isso significa que configurações estruturais como a apresentada em (12) também podem desencadear alossemia contextual, desde que (i) o núcleo interventor seja semanticamente nulo e (ii) o núcleo mais alto – representado por T em (12) – não seja um núcleo de fase. Vejamos a estrutura hipotética abaixo, a título de exemplo, sendo x e y núcleos de fase e sendo Z um núcleo que não constitui fase:

(14) Estruturas hipotéticas: núcleos cíclicos vs. núcleos acíclicos a. Z b.

3 x Z 2

Root x

Para que raiz e Z estejam semanticamente adjacentes na estrutura em (14a) é preciso que x seja semanticamente nulo, não sendo, então, computado como interventor entre os núcleos relevantes. Se assim for, segundo o sistema proposto em Marantz (2013), é possível que Z condicione a semântica da raiz em (14a), uma vez que Z é um núcleo não-cíclico. Por outro lado, dada a natureza cíclica do núcleo y na estrutura em (14b), ainda que x seja semanticamente nulo, a interação entre raiz e y não é possível, uma vez que eles nunca estarão semanticamente adjacentes.

Documentos relacionados