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3. MARCOS CONCEITUAIS E LEGAIS DA EDUCAÇÃO NO BRASIL

4.1 MARCOS REGULATÓRIOS PARA O ENSINO FUNDAMENTAL: OS CAMINHOS TRAÇADOS PELA EDUCAÇÃO BRASILEIRA

Busca-se, neste momento, discutir aspectos relacionados ao ensino no Brasil, objetivando compreender quais foram os caminhos que conduziram até o momento atual, em relação à educação básica, bem como às mudanças relacionadas com as legislações que influenciam as decisões hoje vigentes na educação nacional.

Como o propósito é elucidar e compreender o que foi dito acima, alguns recortes serão feitos, buscando-se destacar apenas o que possa se relacionar com a temática proposta neste projeto.

Esses recortes iniciam com o Decreto-Lei nº 8.529/46, quando foi criada a Lei Orgânica do Ensino Primário, a qual o dividia em duas categorias: primário fundamental, que se destinava às crianças de 7 a 12 anos; e primário supletivo, destinado aos adolescentes e aos adultos. O primário fundamental ainda era subdividido em elementar e complementar. Essa estrutura, de certa forma, permanece até hoje, porém denominada como ensino fundamental anos iniciais e ensino fundamental anos finais.

Percebe-se que as nomenclaturas sofrem alterações, mas o cerne que conduz à organização permanece o mesmo, o que leva à reflexão de que a escola ainda tem a mesma estrutura do século passado, com estudantes de um século à frente, que sofrem grandes influências das tecnologias e da globalização.

Cabe dizer, ainda, que o decreto também apresenta em seu texto as modalidades de ensino, que se relacionavam às atividades artesanais, industriais e agrícolas, ou seja, escola destinada a preparar para o trabalho - seja o doméstico, o fabril ou o agrícola -, sendo esse foco semelhante ao que encontramos nos tempos atuais.

Em dezembro de 1961, acontece a fixação das Diretrizes e Bases da Educação Nacional pela Lei nº 4.024/61 que, após, teve praticamente todos os seus artigos revogados pela Lei nº 9.394/96. Essa legislação já trazia em seu texto a educação como um direito de todos, porém o que se pode destacar é que essa educação poderia ser ofertada na escola e no lar, cabendo à família a escolha do “gênero de educação que deveria dar ao seu filho.” (BRASIL, 1961).

A Lei nº 5.692/71 propõe uma denominação diferente para o ensino brasileiro, fixando, por conseguinte, diretrizes e bases para o ensino de 1º e 2º graus, cujo objetivo era “proporcionar ao educando a formação necessária ao desenvolvimento de suas potencialidades como elemento de autorrealização, qualificação para o trabalho e preparo para o exercício consciente da cidadania”. Percebe-se que a preocupação com a educação continua voltada para o trabalho, tendo o acréscimo de “consciência para a cidadania”.

Diante disso, até a década de 70, constata-se um caráter burocrático e dualizado do ensino no Brasil, marcado pelo autoritarismo e pela expansão do acesso,

desacompanhado de qualidade. Ou seja, a política pública presente nesse período garantia o acesso, mas não o sucesso dos estudantes, não havendo a garantia de que os estudantes chegariam ao fim de sua escolarização e nem que aprenderiam o que fosse necessário durante o período escolar.

A partir do final do ano de 1970, muitos estudiosos iniciaram uma árdua luta pela educação no país, objetivando que respeitassem os direitos das crianças e de suas famílias. Assim, a Constituição de 1988, além de caracterizar as instituições de Educação Infantil como parte dos deveres do Estado, assegura que a educação é um direito de todos, postulando políticas sociais e educacionais, sob uma orientação universalizante.

Ademais, tal documento apresenta questões relacionadas à liberdade do ensino, à centralização versus descentralização, à obrigatoriedade e gratuidade, o ensino público versus o ensino privado e o financiamento do ensino. Porém, é preciso evidenciar que tais questões não surgem neste documento constitucional apenas, mas vêm se somando à trajetória das constituições brasileiras.

Na sequência, a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece diretrizes e bases para a educação nacional-LDB, é a legislação que se encontra em vigência e orienta a Educação Básica - embora ao longo dos anos tenha passado por inúmeras modificações. A referida Lei buscou garantir não só o acesso universal dos estudantes à escola, como também objetivou favorecer a progressão dentro dela, evidenciando um esforço em superar “a reprovação como único dispositivo capaz de garantir a qualidade da educação” (WEISZ apud MARFAN, 2002, p. 224).

Ainda, com o propósito de contribuir para as discussões que seguem neste projeto, destacam-se alguns pontos importantes da LDB: A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios são responsáveis pela organização em regime de colaboração; o artigo 10º trata das obrigações dos Estados com a educação; o artigo 11º apresenta a incumbência dos municípios para com a educação, em especial a Educação Infantil, que se constitui como a primeira etapa da Educação Básica.

Além disso, o artigo 32º estipula que o ensino fundamental é obrigatório, gratuito na escola pública, com duração de 9 (nove) anos - iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade -, tendo por objetivo a formação básica do cidadão. Também se destaca, no mesmo artigo, o parágrafo 1º, que diz: “É facultado aos sistemas de ensino desdobrar o ensino fundamental em ciclos” (BRASIL, 1996). Embora a LDB

aponte para a organização do currículo em ciclo, não há uma orientação de como essa deve ocorrer.

Tal organização torna-se clara a partir da Lei nº 11.274, de 6 de fevereiro de 2006, que altera a redação dos artigos 29º, 30º, 32º e 87º da LDB e dispõe sobre a duração de 9 anos para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 anos de idade, da Resolução nº 7 de dezembro de 2010 que fixa as Diretrizes Curriculares para a Educação Fundamental de 9 (nove) anos e do Plano Nacional de Educação que orienta a organização dos currículos por ciclos, evidenciando a interdependência e articulação entre o tempo e o espaço necessários à aprendizagem ao longo dos 9 (nove) anos de duração do Ensino Fundamental (BRASIL 2010), conforme vemos a seguir:

Os três anos iniciais do Ensino Fundamental devem assegurar: I- a alfabetização e o letramento; (...) III- a continuidade da aprendizagem, tendo em conta a complexidade do processo de alfabetização e os prejuízos que a repetência pode causar no Ensino Fundamental como um todo e, particularmente, na passagem do primeiro para o segundo ano de escolaridade e deste para o terceiro. § 1º Mesmo quando o sistema de ensino ou a escola, no uso de sua autonomia, fizerem opção pelo regime seriado, será necessário considerar os três anos iniciais do Ensino Fundamental como um bloco pedagógico ou um ciclo sequencial não passível de interrupção, voltado para ampliar a todos os estudantes as oportunidades de sistematização e aprofundamento das aprendizagens básicas, imprescindíveis para o prosseguimento dos estudos (BRASIL, 1996, p.8).

Igualmente, o Conselho Estadual de Educação do Rio Grande do Sul, através do Parecer 545/2015, orienta as escolas através das Diretrizes Curriculares Gerais para a Educação Básica: educação infantil, ensino fundamental e ensino médio no Sistema Estadual de Ensino, determinando a implementação do “bloco pedagógico” em todas as escolas que oferecem o ensino fundamental.

Diante disso, em 2017, as escolas vivenciaram a reestruturação de seus regimentos, tornando efetivamente o período do 1º ao 2º ano e do 2º ao 3º ano como uma sequência lógica sem interrupções, considerado como o ciclo de alfabetização e letramento. O mesmo parecer ressalta que esse período não deve ser confundido com organização ciclada, o que deixa ainda mais evidente a pretensão em considerar a alfabetização e o letramento como processo.

Chegamos ao Plano Nacional de Educação (PNE), que se configura como uma lei ordinária, com vigência de dez anos, já prevista na Constituição Federal, cujo objetivo é estabelecer diretrizes, metas e estratégias de concretização no campo

educacional e, portanto, os Estados e os Municípios devem elaborar seus Planos de Educação em consonância como o PNE.

Desse modo, as políticas educacionais implicam, efetivamente, no comprometimento de diferentes atores, incluindo os gestores e os professores vinculados aos diferentes Sistemas de Ensino. Para concretizar tal afirmativa, destaca-se a análise da Meta 5 do PNE (2014-2024), que apresenta a seguinte estimativa para o Ensino Fundamental: “Alfabetizar todas as crianças, no máximo, até o final do 3º ano do ensino fundamental”.

A meta 5 relaciona-se com a alfabetização que se configura como referência de estudo desta dissertação, pois o Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa apresenta o propósito de reafirmar e ampliar o compromisso previsto no Decreto nº 6.094, de 24 de abril de 2017, de “alfabetizar as crianças até, no máximo, os oito anos de idade, ao final do 3º ano do ensino fundamental, aferindo os resultados por exames periódicos específicos”. O Programa foi planejado a partir de três eixos que se referem à: formação continuada de professores alfabetizadores; disponibilização de materiais didáticos, de literatura e tecnologias educacionais às escolas; e avaliação13 e gestão,

controle e mobilização social.

Levando em consideração a caminhada descrita até aqui, entende-se que essa longa trajetória avançou a passos lentos, no sentido de compreender que a educação é um direito de todos e que a aprendizagem é um processo de construção de conhecimento que precisa de tempo e espaço apropriado para que se efetive uma aprendizagem significativa, ou como defende Morais (2012, p.75), “todos têm o direito a se alfabetizar" e, para que isso se efetive, precisamos partir do ponto em que as crianças se encontram, mesmo que haja muita heterogeneidade dentro do grupo.

Por fim, tudo isso precisa ser compreendido na discussão das políticas educacionais tecidas a partir das legislações e das modificações que sofreram ao longo dos anos, com o propósito de compreender como políticas curriculares podem estar presentes nos Programas, Projetos ou Pactos propostos pelo Estado.

13 O Eixo avaliação trouxe a execução da ANA - Avaliação Nacional da Alfabetização, uma avaliação em larga escala aplicada nas turmas de 3ª ano do Ensino Fundamental.

4.2 O PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO: DA ORIGEM AOS DESAFIOS DA