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Maria de Fátima Ávila Pires¹ e Domingos Sávio Campos Paciullo²

¹Médica Veterinária, D.Sc. em Ciência Animal, pesquisadora da Embra- pa Gado de Leite, Juiz de Fora, MG, maria.pires@embrapa.br ²Agrônomo, D.Sc. em Zootecnia, pesquisador da Embrapa Gado de

Leite, Juiz de Fora, MG, domingos.paciullo@embrapa.br

Introdução

O componente animal é um fator importante na produção orgânica de alimentos. Em muitos sistemas biológicos, os animais, pela produção de dejetos e consequente utilização como fertilizante orgânico, constituem parte fundamental da reciclagem de nutrientes. Os sistemas orgânicos são projetados para atingir uma relação equilibrada entre os componen- tes do solo, das plantas e dos animais, e a contribuição de cada um é igualmente importante para o efeito global. É também uma premissa considerar o bem-estar animal como um dos atributos fundamentais nos sistemas agroecológicos e em especial nos sistemas orgânicos de pro- dução animal (VAARST et al., 2005).

Agricultura orgânica pode ter vários significados para diferentes pes- soas, mas, de acordo com Rutherford et al. (2009), a questão essencial é o impacto do sistema orgânico sobre os bovinos leiteiros. Quando a Ifoam (International Federation of Organic Agriculture Movimento) esta- beleceu as primeiras normas para a produção orgânica de leite, eles tra- balharam no princípio fundamental de que as vacas leiteiras deveriam ser criadas da maneira mais natural possível. Aos poucos, estas diretri- zes foram se ampliando e sendo incluídas às preocupações de uma so- ciedade que não confia no uso de produtos químicos não orgânicos, antibióticos, fertilizantes e pesticidas.

Atualmente, a ética do bem-estar animal tem atraído o interesse e a preocupação do público em geral e, para muitos, estas considerações podem significar a busca pelos produtos orgânicos. Os animais, como seres sencientes, possuem sistema nervoso central e necessidades comportamentais altamente desenvolvidos, o que representa uma res- ponsabilidade adicional para o produtor orgânico de leite. Nenhum sis- tema de produção é sustentável se os animais mostram evidências de dor, doença ou sofrimento como resultado de um sistema de criação inadequado ou de desarmonia entre os animais e estes sistemas (VAARST et al., 2005).

Independentemente das questões relacionadas ao sofrimento dos ani- mais, sabemos que a vaca de leite é particularmente susceptível aos fatores ambientais e às práticas de manejo, podendo estes se tornarem fonte de estresse para os bovinos de leite. Apesar da complexidade do tema, sabe-se que o estresse cumulativo provoca a liberação de agen- tes químicos que podem afetar adversamente os tecidos corporais e os sistemas reprodutivo e imunológico.

De acordo com normas estabelecidas para a produção orgânica, para se promover a saúde e o bem-estar dos animais é considerada prioritá- ria a utilização de medidas preventivas tais como o uso de raças e ali- mentação adequadas, além de práticas de manejo próprias para as es- pécies em questão (HOVI et al., 2003). Neste sentido, o objetivo da agricultura orgânica é dar as melhores condições de vida para os ani- mais atendendo aos aspectos básicos de seu comportamento inato (IFOAM, 1998). Deste modo, os princípios nos quais se baseiam a pre- venção de doenças nos sistemas orgânicos de produção é a garantia de manifestação do comportamento natural da espécie, de acesso à comi- da de boa qualidade e de evitar o estresse. Este conjunto de atitudes pode promover nos animais a capacidade de lidar com infecções e ou- tras doenças e assim reduzir os tratamentos veterinários (FALL et al., 2008). A manutenção de rebanhos fechados e melhoria da segurança da saúde em fazendas, além da utilização de sistemas de produção ex- tensivos, fazem parte do pacote de normas e recomendações para a

produção orgânica de leite. Neste sentido, as soluções, em termos de bem-estar animal, sustentabilidade ambiental e resultados econômicos lucrativos, passam, necessariamente, por sistemas mais diversificados e complexos como os sistemas silvipastoris (SSPs) (CAPORAL; COSTA- BEBER, 2004). Estes sistemas permitem a utilização de espécies forra- geiras em consórcio com espécies arbóreas (SOARES et al., 2009), e as árvores, além de serem cada vez mais necessárias para melhorar a produção, a qualidade e a sustentabilidade das pastagens, contribuem, pela provisão de sombra, para o conforto dos animais (ROCHA et al., 2010). Neste enfoque enquadram-se os modelos de sistemas agroeco- lógicos de produção animal que se baseiam nos princípios de sustenta- bilidade e que priorizam o conforto e o bem-estar dos animais.

Segundo Paranhos da Costa (2006), ao melhorar o bem-estar animal é possível obter melhores resultados econômicos, quer aumentando a eficiência do sistema de criação pela maximização dos desempenhos produtivo e reprodutivo, quer obtendo produtos de melhor qualidade. Lopes e Paiva (2009) acrescentam ainda que, do ponto de vista comer- cial, o bem-estar animal é importante por duas razões básicas:

• Atender à expectativa dos consumidores domésticos.

• Alcançar o mercado internacional que, muitas vezes, restringe a entrada de produtos devido à baixa qualidade.

A produção orgânica, além de agregar valor pela qualidade dos produ- tos, agrega também a percepção, por parte dos consumidores, de que a pecuária orgânica, ao estimular a criação dos animais em seu ambiente natural, permite que estes se beneficiem dos mais elevados padrões de bem-estar quando comparados com os animais criados em fazendas convencionais, constituindo esta uma importante razão para aquisição dos produtos orgânicos (VAARS et al., 2005). Estas percepções têm sido relatadas entre os consumidores suecos e, em uma pesquisa rea- lizada no Reino Unido, França, Itália, Alemanha e Irlanda, detectou-se que os consumidores associam produção orgânica com melhoria do bem-estar animal. Tais expectativas são classificadas como confiança

no processo de qualidade dos produtos orgânicos (VAARS et al., 2005) envolvendo questões relacionadas à segurança alimentar destes produ- tos (LOPES; PAIVA, 2009).